Acórdão nº 87/18.0PILRS.L1.-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 24 de Junho de 2020

Magistrado ResponsávelMARGARIDA RAMOS DE ALMEIDA
Data da Resolução24 de Junho de 2020
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na 3ª secção criminal do Tribunal da Relação de Lisboa.

* I–RELATÓRIO 1.

– Em 10 de Abril de 2019, no seguimento da apresentação pelo Mº Pº de requerimento para aplicação de pena, em processo sumaríssimo, à arguida C_______, imputando-lhe a prática de um crime de receptação, p. e p. pelo art.º 231º nº1 do C. Penal, no âmbito de processo sumaríssimo, foi proferida decisão que determinou o seguinte: Assim, e por entender que a sanção proposta, na sua totalidade, não realiza de forma adequada as finalidades da punição, ordeno o reenvio do processo para outra forma processual, nos termos dos arts. 395º nº1 al. c) e 398º do CPP.

  1. – Inconformado, veio o Mº Pº interpor recurso, pedindo a revogação da decisão recorrida, substituindo-a por outra que importe o recebimento do requerimento do Ministério Público, in totum, e ordene a sua notificação à arguida, tudo nos termos do art.º 396º do Código de Processo Penal.

  2. – O recurso foi admitido.

  3. – A arguida não apresentou resposta.

  4. – Neste tribunal, o Sr. Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se no sentido da procedência do recurso.

    II.

    –PONTO PRÉVIO.

    Pese embora a questão que se passará a apreciar pudesse ser decidida por despacho proferido pela relatora - nos termos do artº 417 nº6 al. b) do C.P. Penal - a verdade é que desse despacho cabe reclamação para a conferência, atento o vertido no nº8 da mesma disposição legal.

    Assim, atendendo-se à natureza dos autos e ao lapso de tempo já decorrido desde a prolação da decisão, opta-se por se proceder ao conhecimento da questão da admissibilidade do recurso directamente em conferência, nos termos do artº 420 do C.P. Penal.

    III–APRECIANDO.

    DA ADMISSIBILIDADE DO RECURSO INTERPOSTO 1.

    Façamos uma breve resenha do desenrolar dos autos: i.

    – Em 19 de Março de 2019, o Mº Pº apresentou o seguinte requerimento: O Ministério Público vem, nos termos dos artigos 392º, nº 1, e 394º do Código de Processo Penal, requerer a aplicação de sanções penais em processo especial sumaríssimo à arguida: C_______das , filha de, nascida a 19.04.1968, natural da freguesia de Algoz, concelho de Silves, Solteira, e residente na rua __; Porquanto indiciam suficientemente os autos que: 1)-Indivíduos de identidade não concretamente apurada, publicitaram na plataforma informática OLX um anúncio para arrendamento de uma vivenda para férias em Albufeira.

    2)-Sucede que, os anunciantes não tinham a disponibilidade desse imóvel e pretendiam apenas apropriar-se das quantias que fossem transferidas pelas pessoas que se mostrassem interessadas no mesmo por conta da falsa promessa do seu arrendamento.

    3)-Ao visualizar o mencionado anúncio, e pretendendo arrendar a referida vivenda, R_______, aqui ofendido, estabeleceu contacto com os anunciantes, o que foi feito para os números 91770 e 9150.

    4)-Nessa sequência, acordaram que para garantir a reserva do imóvel, o ofendido tinha de proceder ao pagamento, primeiro de € 450,00, correspondente a 30% do valor da renda, depois de mais € 900,00, e posteriormente de mais € 900,00, referindo os anunciantes que estes dois últimos valores eram uma mera formalidade para assegurar o pagamento da renda e que seriam devolvidos na conta do ofendido.

    5)-Não desconfiando dos reais intentos dos anunciantes, e acreditando que estava a reservar o arrendamento do imóvel em causa, o ofendido procedeu ao pagamento dos valores solicitados, o que foi feito no dia 19.02.2018 para entidade 11854 e as referências 809107335, 808436666 e 808468006.

    6)-O ofendido só se apercebeu que tinha sido enganado quando, após os pagamentos já efectuados, os anunciantes continuavam a pedir mais dinheiro para a regularização do negócio e depois verificou que já tinha sido publicitado outro anúncio em relação ao mesmo imóvel.

    7)-A entidade 11854 tem contrato com o Banco BPI e é gerida pela Ldt, correspondendo as referências 809107335, 808436666 e 808468006 a um cartão de crédito pré-pago Viabuy, titulado pela arguida.

    8)-Com efeito, os anunciantes, em circunstâncias de tempo e lugar não concretamente apuradas, contactaram a arguida e solicitaram-lhe que, a troco de uma quantia monetária, criasse uma conta cartão para aqueles poderem movimentar quantias provenientes de factos ilícitos contra a património.

    9)-Nessa sequência, e acedendo ao pedido que lhe foi feito, a arguida, no dia 20.01.2018 solicitou on line a criação de uma conta cartão, a qual tinha o ID 5776241 e à qual estavam associados dois cartões de crédito pré-pagos Viabuy, tendo a conta sido activada no dia 31.01.2018.

    10)-Depois, seguindo as indicações que lhe foram dadas, reteve um dos cartões e o outro enviou para a morada que os indivíduos de identidade não concretamente apurada lhe indicaram.

    11)-No dia 19.02.2018, após o ofendido ter transferido para essa conta o valor total de € 2.200,00, que a mesma sabia ter origem em burlas a terceiros, a arguida, seguindo as indicações que lhe foram dadas e como contrapartida da sua actuação, numa ATM sita em Algoz, procedeu ao levantamento da quantia total € 250,00, que gastou em proveito próprio.

    12)-A arguida sabia que a conta que abriu se destinava a receber quantias provenientes de factos ilícitos contra o património e, ainda assim, quis e conseguiu agir do modo descrito, tendo-o feito com o propósito de obter para si uma vantagem económica que sabia não lhe ser permitida por lei.

    13)-A arguida agiu livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida pela lei penal.

    Pelo exposto, cometeu a arguida, em autoria material e na forma consumada, um crime de receptação, previsto e punido pelo artigo 231º, nº 1, do Código Penal.

    Prova: (…) Estatuto processual da arguida: (…) Da aplicação do processo sumaríssimo: À arguida é imputada a prática de um crime de crime receptação, previsto pelo artigo 231º, nº 1, do Código Penal, o qual é punível com pena de prisão até 5 anos ou com pena de multa até 600 dias.

    a)- Da escolha da pena Ao tipo legal de crime que a arguida praticou é, assim, aplicável uma pena de prisão ou uma pena de multa, o que implica, previamente, a escolha da espécie da pena.

    O artigo 70º do Código Penal, fornece-nos o critério de escolha da pena, de acordo com o qual “se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.

    Por seu turno, o artigo 40º do Código Penal, indica-nos a protecção de bens jurídicos (prevenção geral) e a reintegração do agente na sociedade (prevenção especial) como finalidades das penas e das medidas de segurança.

    Resulta de forma clara que o artigo 70.º do Código Penal dá prevalência à pena não privativa da liberdade, sendo a pena detentiva ou privativa da liberdade encarada como a ultima ratio.

    Ou seja, o tribunal deve dar preferência à pena de multa sempre que formule um juízo positivo sobre a sua adequação às finalidades de prevenção geral positiva e de prevenção especial.

    No caso vertente, cabe ponderar que, atenta a natureza do crime em apreço, as necessidades de prevenção geral são altas, tratando de crime cometido com alguma frequência.

    As exigências prevenção especial são baixas, uma vez que a arguida aparenta estar socialmente inserida e não regista antecedentes criminais.

    Face ao exposto, entendemos as finalidades da punição ainda ficarão suficientemente asseguradas com a aplicação de uma pena de multa.

    b)- Da determinação da medida concreta da pena Importa agora proceder à determinação da medida concreta da pena.

    Dispõe o artigo 71º, nº 1, do Código Penal que “a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos pela lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção”.

    Culpa e prevenção são os dois termos do binómio com auxílio do qual há-de ser construído o modelo de medida da pena. As finalidades da aplicação de uma pena residem primordialmente na tutela...

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