Acórdão nº 527/19.0GCMTJ-A.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 25 de Junho de 2020
Magistrado Responsável | FERNANDO ESTRELA |
Data da Resolução | 25 de Junho de 2020 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam na 9.ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa: I - No proc.º n.º 527/19.0GCMTJ-A do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte, Juízo Local Criminal de Loures, por despacho judicial de 4 de fevereiro de 2020 foi decidido indeferir o pedido de constituição de assistente (s) formulado por MM e AA, II – Inconformados, os demandantes civis MM e AA, interpuseram recurso, formulando as seguintes conclusões:
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O Douto Tribunal "a quo", proferiu a despacho de não admissão dos ora Recorrentes como assistentes, porquanto serem pessoas da mesma "classe", do já admito assistente JJ, filho da vítima falecida.
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Encontram-se preenchidos os requisitos legais para constituição como assistentes, quer no que concerne à legitimidade material, quer a legitimidade processual.
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Legitimidade material, corresponde à verificação da condição que o "titular do interesse que a lei quis proteger com a incriminação", ao passo que a legitimidade processual é operada através de uma decisão judicial, ou seja, haver um procedimento formal.
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O artigo 68° do CPP define quem são as pessoas ou entidades com legitimidade para se constituírem assistentes.
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No caso em apreço, os ora Recorrentes, enquadram —se na ai) c do supra mencionado artigo, porquanto tratar-se de cônjuge não separado judicialmente e filha menor, da vitima falecida.
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Em 5 de Novembro de 2019, após notificação da douta Acusação, foi apresentado pelos ora Recorrentes, requerimento, no prazo legalmente previsto, a requerer sua constituição como Assistentes, ou seja, conforme estatui o n° 3 do artigo 68° do CPP.
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Violação do art.° 68 do CPP e do princípio da igualdade, previsto no art.° 13 da CRP.
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O despacho de indeferimento proferido pelo douto tribunal "a quo", foi fundamentado no facto de o outro filho da ofendida falecida, JJ, membro da primeira classe, segundo o disposto no art.° 68, n° 1 do CPP, tal como os ora Recorrentes, ter requerido a sua constituição como assistente, em primeiro lugar e por isso foi aceite.
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A argumentação vertida pelo douto tribunal " a quo", foi alicerçada na opinião do Doutor Paulo Pinto Albuquerque, que agora expomos: "As pessoas com legitimidade para representar o ofendido falecido estão divididas em duas "classes", preferindo qualquer membro da primeira classe sobre qualquer membro da segunda classe ("ou na falta deles') e não havendo ordem de preferência entre os membros de cada classe. Entre os membros da mesma classe, o primeiro que apresentar um pedido que reúna os requisitos legais é o assistente." j) A adoção desta posição viola, desde logo e claramente, o princípio da igualdade.
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Assim e de acordo com o Princípio da igualdade, consagrado constitucionalmente no artigo 13.° da Constituição da República Portuguesa no seu artigo n.° 1, " todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei".
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No caso em apreço, a constituição como assistentes, foi recusada com base no lapso temporal entre os pedidos, havendo deste modo uma discriminação relativamente ao outro assistente já constituído.
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Logo, e salvo melhor opinião, não se alcança, sequer se concorda com a fundamentação vertida pelo douto tribunal "a quo", porquanto foi muito alem da letra da lei e da orientação do legislador, bem como da Jurisprudência e Doutrina existente.
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Atente-se à hipótese académica, de que todas pessoas supra mencionadas, requeriam, ao mesmo tempo e/ou num só requerimento a sua constituição como assistentes, pelo que somos a questionar, desde já, qual seria a posição do douto tribunal "a quo"? o) Se tal tivesse sucedido, no caso em apreço, já não poderia o tribunal utilizar a mesma argumentação, uma vez que o período temporal não poderia ser utilizado como argumento no caso e uma vez que não existe doutrina que responda a esta questão, teria o tribunal de aceitar a constituição de todos os respetivos requerentes.
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Por mero dever de patrocínio, a situação académica apresentada, demonstra como se revela discriminatório o argumento utilizado pelo douto tribunal "a quo", uma vez que se tivesse sido requerido em simultâneo e no mesmo requerimento já teriam de ser aceites todos os requerentes como assistentes.
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Acresce que, que os interesses dos Requerentes embora convergentes, certamente serão distintos entre si.
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Importa salientar a posição de José da Costa Pimenta que "Essa titularidade é plural, ou seja, pertence a dois grupos de pessoas, podendo todos os elementos do grupo constituírem-se assistentes ou apenas algum ou alguns deles" (cfr. Código do Processo Penal Anotado, 2.ª edição, José da Costa Pimenta, Rei dos Livros, 1991, páginas 226 e 227).
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Posição esta que adotamos e que nos parece ser a mais correta, uma vez que não viola o princípio constitucional da igualdade e que permite serem constituídos como assistentes várias pessoas do mesmo grupo, independentemente do momento em que requerem a sua constituição.
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No preceito legal da figura do Assistente, o legislador não estabeleceu nenhum critério discriminatório relativamente às pessoas a quem deve ser conferido o direito especial de se constituir assistentes, referindo em primeira linha o cônjuge sobrevivo não separado judicialmente de pessoas e bens e em seguida os descendentes.
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Há uma hierarquização por parte do legislador, mas o preceito legal nunca refere que apenas uma pessoa, da mesma classe poderá ocupara posição de assistente no processo.
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A não constituição como Assistentes dos ora Recorrentes, revela-se discriminatória e violadora de um princípio fundamental constitucionalmente consagrado, ou seja, o da igualdade.
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Os interesses dos ora Recorrentes, manifestam-se de modo diferente relativamente a cada um deles e relativamente ao Assistente já constituído.
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Assim sendo, e com o respeito que é devido, andou mal o Tribunal a quo ao decidir pela não admissão dos Recorrentes como Assistentes.
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Ao não proferir tal decisão, violou o Tribunal a quo o disposto no artigo 68° n.° 1 alínea c) do CPP e o art.° 13 da CRP, ou seja, violação do Princípio da Igualdade.
Assim, e sem prescindir do Douto Suprimento de V. Ex.ªs deve ser concedido provimento ao presente recurso, devendo em consequência ser reformulado o Douto...
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