Acórdão nº 410/19.0T8OLH.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 04 de Junho de 2020
Magistrado Responsável | ISABEL PEIXOTO IMAGIN |
Data da Resolução | 04 de Junho de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam os Juízes no Tribunal da Relação de Évora I – As Partes e o Litígio Recorrente / Requerente: (…) Recorrida / Devedora: (…) – Construção, Lda.
Os presentes autos consistem em processo de insolvência através do qual o Requerente peticionou se declare a insolvência da Requerida. Para tanto, alegou que detém crédito decorrente da condenação da Requerida a pagar-lhe o montante de € 201.584,75 (duzentos e um mil, quinhentos e oitenta e quatro euros e setenta e cinco cêntimos), no prazo de 90 (noventa) dias. Mais alegou que não são conhecidos quaisquer bens à requerida, tendo a mesma ocultado e dissimulado o seu ativo, num contexto em que aparenta ter cessado em definitivo a sua atividade, tendo, igualmente, interrompido os pagamentos a fornecedores e a instituições financeiras das quais era devedora e bem assim à Fazenda Pública e à Segurança Social. Considera ainda que a insolvência que vier a ser decretada deve ser qualificada de dolosa, já que a Requerida alienou, em 03/06/2016 (por valor muito abaixo do seu valor de mercado e, bem assim, por valor que se afigura igualmente inferior ao seu próprio valor aquisitivo) um imóvel, o que fez na sequência das interpelações para pagamento que lhe foram dirigidas pelo Requerente, que pretende que tal negócio seja resolvido em benefício da massa.
A Requerida deduziu oposição invocando que o Requerente já anteriormente havia instaurado no Tribunal da Comarca de Faro - Juízo do Comércio de Olhão ação idêntica à ora instaurada, à qual coube o n.º 406/17.6T8OAZ, e no âmbito da qual a requerida foi absolvida da instância por se ter aí considerado que o Requerente não tinha legitimidade para requerer a insolvência da requerida em face da natureza do crédito reclamado, já que se tratava de um crédito emergente de suprimentos. O Requerente instaura esta ação omitindo, de forma propositada, os factos que foram fundamento da decisão de absolvição da instância. A Requerida contraditou ainda a factualidade alegada pelo requerente (isto sem prejuízo de admitir a existência do crédito e a impossibilidade, em face da inexistência de património e da ausência de atividade, de proceder ao seu pagamento).
II – O Objeto do Recurso Decorridos os trâmites processuais legalmente previstos, foi proferida decisão, em sede de despacho saneador, conforme segue: «Em face do exposto: 1) julgo procedente a exceção de caso julgado, e, consequentemente, absolvo a requerida (…) – Construção, Lda. da instância – cfr. artigos 278.º, al. e), 576.º, n.º 2, 577.º, al. i), 578.º, 579.º, 580.º, 581.º todos do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi do artigo 17.º do CIRE.
2) julgo o requerente (…) litigante de má-fé, condenando-o, atenta o grau de censurabilidade da sua conduta, em multa processual que fixo em 10(dez) Ucs.» Inconformado, o Requerente apresentou-se a recorrer, pugnando pela anulação da decisão recorrida, devendo os autos prosseguir para Audiência Prévia ou Julgamento conforme for decidido, absolvendo-o da litigância de má fé. Conclui a sua alegação de recurso nos seguintes termos: «A- Considerados assentes os 4 pontos dos “factos Provados” da sentença recorrida, verifica-se que ali não consta um facto importante e diferenciador, a saber: - a sentença do processo 1563/16.4T8OAZ só foi proferida a 23/03/2018, cfr. consta da mesma, junta aos autos na PI como doc. nº 2, e tal sentença só transitou em julgado em Maio de 2018; e - a sentença no processo 406/17.6T80AZ foi proferida em 30/06/2016 e transitou em 25/07/2017, ou seja, Conclui-se que o Recte quando propôs e Requereu a Insolvência da Rda no processo 406/17.6T8OAZ, ainda não tinha a sentença do processo 1563/16.4T8OAZ, facto que não consta assente como deveria.
B - A sentença deveria ter considerado provado o facto que: “quando o A. propôs e Requereu a Insolvência da Rda no processo 406/17.6T8OAZ, ainda não tinha sido proferida a sentença do processo 1563/16.4T8OAZ, o que veio a alterar os factos e a perceção do A. sobre o seu crédito.” C - É este o elemento diferenciador que se apresenta a concluir a V/EXAS, no sentido de não ser considerado caso julgado por existir esta diferença jurídica, porque quando o Recte instaura a ação de insolvência 406/17.6T8OAZ, fê-lo na convicção e fundamento no crédito por suprimento, este considerado como um crédito interno da empresa, de natureza contabilística e não firmada, sem exigibilidade e exequibilidade, e naquela data Certo, mas ainda Ilíquido ( desde logo por juros a contabilizar), e ainda NÃO Exigível, por falta de prazo e de natureza extrajudicial.
D - Ao ser proferida a sentença com transito no processo 1563/16.4 T8OAZ onze meses depois daquela sentença, o Recte forma a convicção e conclui que aquele reconhecimento alterou a tipologia do seu crédito, ou seja, este passou a ser um crédito certo, liquido e exigível, características que não possuía até essa data; passou a ser um crédito pecuniário reconhecido por sentença nos termos do artº 774º, 777º, 798º, 804º e 806º do Código Civil; passou a ser um crédito exigível à Sociedade, não por ser um suprimento, mas por ser uma obrigação jurídica pecuniária, deixando de ser aplicável o Código das Sociedades Comerciais, e passando a aplicar-se o Código Civil, facto que a sentença recorrida não considerou como provado, como deveria por força da Lei.
E - O Recte defende e conclui que a sentença proferida no processo 1563/16.4T8OAZ em maio de 2018, sana a ilegitimidade julgada no processo 406/17.6T8OAZ, pelo que não é de aplicar as normas dos arts. 278º, al. e), 576º, nº 2, 577º, al. i), 578º a 581º todos do Código Processo Civil, como aplicou.
F - O Recte defende e conclui que por força da sentença proferida no processo 1563/16.4T8OAZ deixou de ter um crédito por suprimento regulado pelo Código das Sociedade Comerciais, para passar a ser um crédito emergente de obrigação pecuniária regulado pelo Código Civil, devendo ser aplicados os artigos 774º, 777º, 798º, 804º e 806º do Código Civil, o que o Tribunal recorrido não aplicou.
G - O Recte defende e conclui que o seu crédito se alterou na forma e tipologia (mas não no valor), passando a assumir natureza de obrigação judicial cível, em vez de comercial, motivo em que fundamenta o recurso, concluindo não ser de considerar a exceção e consequências de CASO JULGADO.
H - Defende e conclui que no caso dos autos deve prevalecer e ser aplicado o disposto no artº 20º, nº 1, do CIRE sobre o artº 245º, nº 2, do CSC, e não o contrário como decidiu a sentença, por ser o CIRE o Código e legislação especial aplicável que derroga a legislação geral das Sociedades Comerciais, até porque o CIRE persegue...
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