Acórdão nº 2727/19.4T8STR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 04 de Junho de 2020

Magistrado ResponsávelTOM
Data da Resolução04 de Junho de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo nº 2727/19.4T8STR.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Santarém – Juízo de Comércio de Santarém – J3 * Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: * I – Relatório: O “Banco (…) Português, SA” intentou a presente acção com vista à declaração de insolvência da sociedade “(…) e (…), SA”. Em sede de despacho saneador foi proferida decisão de indeferimento do pedido de declaração de insolvência e a instituição financeira veio interpor o presente recurso.

* O “Banco (…) Português, SA” invocou que tem um crédito sobre a requerida no montante global de € 13.740,41, por ser dono e legítimo portador de 2 letras de câmbio vencidas em que a “(…) e (…), SA” figura como aceitante.

Mais adianta que, em 13/01/2014, no âmbito do processo registado sob o nº 752/13.8TBABT, na sequência da homologação de plano de insolvência, foi encerrado o respectivo processo em que havia sido declarada a insolvência da requerida e reclamou créditos, os quais foram reconhecidos sob condição.

No ano de 2017, a requerida deduziu processo especial de revitalização (PER), que correu termos sob o nº 1746/17.0T8STR. E, de acordo com o plano de revitalização homologado, a “(…) e (…), SA” obrigou-se a satisfazer o crédito da requerente no prazo de 132 meses, com carência de capital durante os primeiros 12 meses, tendo ainda sido estipulado que a requerida constituiria hipoteca sobre determinados imóveis a favor dos credores bancários e na proporção de cada crédito.

A quantia em causa não foi paga e a requerente disse que notificou a requerida para que esta procedesse ao pagamento dos valores que lhe eram devidos no âmbito do plano especial de revitalização.

* Realizada a citação, a requerida “(…) e (…), SA” deduziu oposição, na qual sustenta a prescrição das letras de câmbio e a ineptidão da petição inicial ou, caso assim não se entenda, defende que a pretensão da requerente deve ser dada como não provada.

* Em sede de despacho saneador, o Tribunal «a quo» julgou improcedente a excepção de ineptidão da petição inicial e indeferiu o pedido de declaração de insolvência, por o considerar manifestamente improcedente.

* A instituição financeira não se conformou com a referida decisão e o recurso interposto continha as seguintes conclusões: «1. A ora requerente requereu a declaração de insolvência da requerida, sustentado deter sobre a mesma um crédito no montante total de € 13.740,41.

  1. Bem como alegando que, quanto à requerida, estaria preenchido o requisito previsto na alínea f) do art.º 20.º do CIRE, na medida em que a mesma já havia sido declarada insolvente no âmbito do processo número 752/13.8TBABT, 2º Juízo, tendo sido reconhecido um crédito reconhecido à requerente e tendo sido aprovado e homologado um plano de insolvência, que não foi pontualmente cumprido e ainda, posteriormente, no ano de 2017, a devedora e ter-se-ia apresentado a PER – 1746/17.0T8STR – com crédito reconhecido à requerente, com plano homologado, mas, e igualmente, não cumprido quanto à requerente, apesar de notificada para tal.

  2. A ora requerente entende que, para além do preenchimento da alínea f) do artº. 20º do CIRE, o facto de a requerida, não ter cumprido dois planos de insolvência a que se propôs, deter um passivo tão elevado – € 8.247.168,91 – e a dívida da ora requerente ser de valor diminuto e incumprida, revela a incapacidade da devedora solver o seu passivo e impossibilidade de cumprir as suas obrigações já vencidas.

  3. Ora, a Sentença a quo assim não entendeu, porquanto, considera que as “razões justificativas que fundamentariam a aplicação analógica da alínea f) não se verificam (art.º 10.º, n.º 2, do CC), pelo que o incumprimento do plano de revitalização não integra o facto índice da alínea f) do nº 1 do artº 20º. Incumbe então ao requerente da insolvência alegar outros factos que conjuntamente com o alegado incumprimento do PER permitam concluir pela situação de insolvência da requerida”.

  4. Pelo seu significado, o crédito da ora requerente, no conjunto do passivo da devedora evidencia a impotência, para a obrigada de continuar a satisfazer a generalidade dos seus compromissos.

  5. Na verdade, uma sociedade que vem de dois procedimentos recuperatórios – plano de insolvência e PER – sem pagamento de qualquer valor ao requerente – sendo que durante vários anos não realizou qualquer pagamento, está necessariamente insolvente.

  6. Estamos perante sociedade que deste 2013 recorre a procedimentos destinados a empresas insolventes ou em situação iminente de insolvência, sem que consiga cumprir perante a ora recorrente.

  7. Acresce que entendemos que os factos-índices elencados nas alíneas a) a h) do nº 1 do artº. 20º do CIRE manifestam a insusceptibilidade de o devedor cumprir pontualmente as suas obrigações, sendo presuntivos da insolvência.

  8. Nestes termos, entende a requerente que cabia ao requerido e na intenção de impedir a declaração de insolvência demonstrar que não se verificava qualquer dos invocados “factos-índice”, ou demonstrar que, não obstante a ocorrência desse facto não se verificava, no caso concreto, a situação de insolvência.

  9. Ora, o requerido não o fez, tendo apenas alegado razões de direito para que a sua insolvência não fosse decretada. Não alegou um único facto que comprovasse a sua solvência, nem afastou a aplicabilidade da alínea f) do n.º 1 do art.º 20.º do CIRE, o que lhe cabia.

  10. Acresce que, no que respeita ao incumprimento do plano de recuperação aprovado no âmbito do PER, dispõe o artigo art. 20º, 1, f), que poderá ser requerida a insolvência por qualquer credor, verificando-se o incumprimento de obrigações previstas em plano de insolvência ou em plano de pagamento.

  11. Assim, resulta claro que se encontram cumpridos dois requisitos essenciais para que seja declarada a insolvência da Recorrida.

  12. A verdade é que devedora já beneficiou de várias oportunidades para sair do processo de insolvência, pelo que, há que lhe exigir um cuidado acrescido perante uma situação de incumprimento das obrigações que foram motivo da sua primeira insolvência e da sua apresentação a PER, sendo que foi com esperança nesse cumprimento que a os credores lhe confiaram esse voto.

  13. Ora, não sendo aproveitada essa oportunidade e teimando o incumprimento, o Tribunal deveria ter declarado a insolvência devedora, por esta se encontrar em estado de insolvência.

    Farão V. Exªs., com toda a certeza, Justiça, se se dignarem revogar a Sentença de que se recorre e nos termos requeridos!».

    * Não houve lugar a resposta.

    * Admitido o recurso, foram observados os vistos legais. * II – Objecto do recurso: É entendimento uniforme que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do Tribunal ad quem (artigo 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608º, nº 2, ex vi do artigo 663º, nº 2, do mesmo diploma).

    Analisadas as alegações de recurso, o thema decidendum está circunscrito à apreciação de erro na aplicação do direito, por não existir fundamento para decidir pela improcedência do pedido de insolvência.

    * III – Factos com interesse para a decisão da causa: Os factos com interesse para a justa solução do caso são os que constam do relatório inicial e ainda os seguintes: 1) No âmbito do processo registado sob o nº 752/13.8TBABT, do 2º Juízo do Tribunal Judicial de Abrantes, a requerida “(…) e (…), SA” foi declarada insolvente por decisão datada de 02/07/2013, publicada no dia 03/07/2013.

    2) O “Banco (…) Português, SA” reclamou créditos e o respectivo crédito foi reconhecido no valor de € 10.300,00 (dez mil e trezentos euros), acrescida de juros.

    3) O plano de insolvência foi aprovado, o processo foi encerrado e o acto de encerramento foi publicitado através de anúncios em 13/01/2014.

    4) Posteriormente, já no ano de 2017, a devedora apresentou-se a Processo Especial de Revitalização, que correu termos sob o nº 1746/17.0T8STR do Juízo de Comércio de Santarém (Juiz 2).

    5) A sociedade requerente reclamou créditos e o respectivo crédito foi reconhecido.

    6) De acordo com o plano homologado a requerida ficou obrigada ao reembolso à aqui requerente no prazo de 132 meses, com carência de capital durante os primeiros 12 meses a contar do trânsito em julgado da Sentença homologatória. Foi ainda estipulado que a requerida constituiria hipoteca sobre determinados imóveis a favor dos respectivos credores bancários e na proporção de cada crédito.

    7) À data da apresentação do Processo Especial de Revitalização o passivo total da devedora ascendia a € 8.247.168,91.

    8) Em 12/01/2018, foi proferida sentença de homologação do plano de recuperação.

    9) O “Banco (…) Português, SA” disse ter remetido carta para notificação da “(…) e (…), SA” em 12/06/2018, pretendendo assim dar cumprimento ao disposto no artigo 218º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, invocando que se encontravam em dívida três prestações, no valor total de € 64,63. Notificando, então, por essa via, a sociedade devedora para que, no prazo de 15 dias, procedesse ao pagamento dos valores que lhe eram devidos.

    10) A referida correspondência não tem aposta qualquer assinatura do destinatário no aviso de recepção (RD892263736PT) e, ao serem interpelados sobre a respectiva entrega, os serviços dos CTT afirmam que tal registo corresponde a «objecto não encontrado».

    * IV – Fundamentação: É considerado em situação de insolvência o devedor que se encontre impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas, face à regra inscrita no nº 1 do artigo 3º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.

    Na interpretação de Luís Carvalho Fernandes e João Labareda «o que, verdadeiramente, releva para a insolvência é a insusceptibilidade de satisfazer obrigações que, pelo seu significado no...

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