Acórdão nº 2973/18.8T8BRR.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 18 de Junho de 2020

Magistrado ResponsávelJORGE LEAL
Data da Resolução18 de Junho de 2020
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa RELATÓRIO: Em 16.10.2018 o Ministério Público requereu, em representação de Enzo, ação especial de regulação das responsabilidades parentais contra João e Vera.

O requerente alegou, em síntese, que Enzo, nascido a 26.9.2015, é filho dos requeridos. Os requeridos viveram maritalmente durante vários meses, mas encontram-se separados. O menor reside com a mãe. Os progenitores ainda não regularam as responsabilidades parentais e não estão de acordo no que respeita ao seu exercício. É do superior interesse da criança que se proceda à regulação do exercício das responsabilidades parentais.

Realizou-se, em 04.12.2018, conferência de pais, não se tendo conseguido acordo entre os pais, “pelo motivo de haver conflito em relação à residência do mesmo, a mãe pretende a residência não estando o pai de acordo com essa solução.” (conforme consta na respetiva ata).

Na mesma data e de seguida foi proferido o seguinte despacho: “Ao abrigo no disposto no artº. 38º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, fixo o seguinte Regime Provisório: 1) – O menor ficará a residir com pai e com a mãe, nos seguintes moldes, rotativamente: Segunda-feira e Terça-feira, o menor estará com a mãe; Quarta-feira e Quinta-feira, o menor estará com o pai; Fim de semana de Sexta-feira a Domingo, alternadamente.

Todas as questões correntes do menor serão resolvidas por quem com ele estiver nesses dias, sendo as responsabilidades parentais, nas questões de particular importância, exercidas por ambos os progenitores - artº 1906º, nº1 do Código Civil, com as alterações introduzidas pela Lei nº 61/2008 de 31/10.

2)– As despesas diárias do menor serão suportadas pelo progenitor com quem o menor estiver, sendo as restantes despesas escolares, médicas e medicamentosas suportadas por ambos os progenitores, mediante documento fiscalmente relevante.” Mais se determinou a suspensão da conferência a fim de se remeter as partes para audição técnica especializada, nos termos do disposto no art.º 23.º do RGPTC.

Em 30.01.2019 a requerida solicitou que se atribuísse urgência ao processo e se alterasse o regime provisório atribuindo-se à requerente a guarda e o exercício das responsabilidades parentais. Para tanto alegou que durante a separação o pai do menor manifestou desinteresse e frieza em relação ao menor e que este, arrancado pelo tribunal dos braços e do colo maternos, se sente infeliz em casa do pai, tendo-se tornado agressivo no infantário, tendo ataques de pânico em casa da mãe e manifestando medo que a mãe desapareça, sempre em sobressalto, estrebuchando por todos os lados para não ir para casa do pai. Depois de analisado no Centro de Saúde, foi encaminhado para a Pedopsiquiatria do Hospital – Centro Hospitalar Barreiro/Montijo.

Em 06.02.2019 o Ministério Público promoveu se notificasse a requerente para vir aos autos juntar documento comprovativo do alegado encaminhamento do menor Enzo para consulta de pedopsiquiatria. Mais se promoveu que se oficiasse ao C.D.S.S.

– Setúbal solicitando que informasse para que data se encontrava agendada a audição técnica especializada.

Em 13.02.2019 deu entrada nos autos a pedida avaliação técnica especializada, na qual se salienta que o requerido considera que o regime provisoriamente fixado deve ser alterado, devendo a alternância ser semanal, o que permitirá maior estabilidade de rotinas para o filho e permitirá que as suas folgas sejam sempre passadas com Enzo. Mais considerou o requerido que o regime fixado “tem sido uma mais valia pois considera que Enzo está adaptado à casa do pai e aos hábitos do seu agregado familiar.” Mais informou o requerido que não estabelece contacto com a requerida, delegando na sua companheira alguma troca de informações. A requerida, segundo a avaliação técnica, manifestou a sua discordância com a residência alternada (tendo reiterado o que supra afirmara no requerimento de alteração do regime provisório). Adiantou que, a manter-se a residência alternada, prefere o atual regime (em vez da alternância semanal, proposta pelo requerido), pois obsta a que a requerida esteja tanto tempo seguido sem ver o filho. A requerida manifestou disponibilidade para vir a gerir em conjunto com o requerido os assuntos de particular importância da vida do filho com o progenitor.

Em 19.02.2019 foi proferido despacho designando a continuação da conferência de pais no dia 02.4.2019.

Na conferência de pais não foi possível o acordo, “porquanto ambos os progenitores mantém as posições assumidas em sede de Audição Técnica Especializada.

” Notificados para apresentarem alegações, ambos os requeridos o fizeram, nos seguintes termos, em síntese: A requerida reiterou o que afirmara aquando do requerimento de alteração do regime provisório fixado.

O requerido alegou que sempre quis ser um pai presente, o que a requerida não deixava, pretextando que a criança estava doente. A mãe não cuida bem do menor, dando-lhe a comer maioritariamente gomas e lasanha. O menor não tem regras sendo que a sua vontade é que impera. Faz birras e atira-se para o chão seja onde for. Bate nos adultos e nos colegas da escola. Tem um vocabulário pouco próprio para a sua idade. O requerido e a sua companheira estão a tentar inverter a situação criada pela mãe. O menor quando está com o pai passou a ter regras. Explicam-lhe que não pode bater nos outros, a razão por que não pode fazer o que quer, que não pode estar o dia todo com o tablet. Consequentemente, quando está com o pai a criança já tem um comportamento normal para a idade, denotando alegria por estar com o pai, sendo certo que o menor também mantém uma relação de muita afetividade com a companheira do pai. O requerido propôs, pois, que se mantivesse a residência partilhada, em termos semanais.

Em 20.5.2019 determinou-se se solicitasse ao Centro Distrital da Segurança Social territorialmente competente a elaboração de relatório social sobre a situação dos progenitores e da criança.

Em 30.9.2019 deu entrada nos autos o aludido relatório social.

Aí se refere que o relatório assenta nos elementos constantes nos autos, em entrevista com a requerida, contacto telefónico com a educadora de infância do menor em 18.9.2019, contacto telefónico com a psicóloga no dia 18.9.2019 e visita domiciliária no dia 23.9.2019. Aí se fez constar que o agregado familiar da requerida é composto por esta, pelo menor e pelo companheiro daquela, referindo-se os respetivos rendimentos e despesas. Mencionou-se que Enzo dispõe de quarto próprio, estando salvaguardada a sua privacidade. Exarou-se que as trocas de Enzo (entre os pais) “são realizadas no estabelecimento de ensino frequentado pela criança, momento no qual não oferece resistência em ir para casa do pai. No mês de Agosto, em que o estabelecimento se encontrava encerrado para férias, as trocas foram realizadas diretamente pelos progenitores, tendo Enzo mostrado resistência quando tinha de ir para casa do pai”.

Mais se disse que no contacto telefónico estabelecido com a educadora de infância de Enzo esta, que está com o aluno desde setembro, afirmou que a criança se apresenta cuidada, que a encarregada de educação é a progenitora, a qual se mostra interessada pela situação escolar do filho. Mais informou a docente que a companheira do progenitor também já foi ao estabelecimento de ensino conhecer a educadora de infância. A psicóloga Sónia (…), contactada pelo telefone, informou que apenas esteve uma vez com Enzo, a pedido da progenitora, em agosto. No rastreio realizado nessa altura, não observou a existência de indicadores que apontassem recusa de Enzo relativamente à figura paterna. Foi agendada nova consulta, mas a progenitora não compareceu. No que concerne às condições de vida do requerido, exarou-se que o agregado familiar do requerido é composto pela sua companheira e pelo Enzo, mencionando-se os rendimentos e despesas do agregado. Mais se escreveu que na casa o Enzo tem um quarto próprio.

No final do relatório concluiu-se nestes termos: “Ambos os progenitores apresentam condições para continuarem a manter a residência de Enzo junto de si, dispondo ambos de condições económicas e habitacionais para o efeito. Apesar de não haver comunicação entre os pais de Enzo, ambos reconhecem a importância do outro no crescimento e desenvolvimento do filho. Ambos reconheceram que Enzo apenas demonstra resistência em ir para a casa do pai quando as entregas e recolhas são feitas diretamente pela progenitora, situação que não ocorre quando a criança é recolhida no estabelecimento de educação.” Em 14.10.2019 a requerida pronunciou-se acerca do relatório social, afirmando, no que aqui releva, que o requerido não reside no local indicado no relatório, que não sabe onde o requerido reside, nem com quantos filhos da companheira do requerido, sendo certo que o menor diz que dorme na “cama gaveta” com outras crianças. Requereu que se solicitasse ao ISS para vir aos autos esclarecer onde reside atualmente o progenitor, quantos filhos tem a companheira do mesmo, quantas pessoas constituem o agregado familiar deste e quem partilha o quarto com Enzo.

Em 30.10.2019 designou-se a realização de audiência de julgamento em 10.12.2019.

No início da audiência de julgamento a requerida juntou aos autos um relatório clínico de psicologia, datado de 9 de dezembro [de 2019?] e, após apontar a inverosimilhança do relatório social quanto à residência do pai e a regressão do menor após a aplicação do regime provisório, requereu que se adiasse a audiência para que se procedesse à apreciação psicológica do menor.

Nesse relatório clínico consta o seguinte: “… Há cerca de 10 meses e por decisão do tribunal, deu-se início à guarda partilhada provisória e, segundo o relato da mãe Vera (…), o Enzo manifesta alterações do comportamento, indicadores de regressão no seu desenvolvimento, como enurese, terrores nocturnos, necessidade de pernoitar no leito da mãe e ansiedade generalizada.

Neste sentido, a mãe...

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