Acórdão nº 237/18.6T8VFL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 28 de Maio de 2020
Magistrado Responsável | ANA CRISTINA DUARTE |
Data da Resolução | 28 de Maio de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO C. M. deduziu ação declarativa contra J. M. pedindo que seja judicialmente declarada de nulidade e nenhum efeito ou mesmo inexistente a escritura de justificação notarial promovida pelo réu e impugnada pela presente ação, decretando-se o cancelamento do registo de propriedade lavrado pelo réu, bem como de qualquer registo operado com base na escritura aqui impugnada, sendo o réu condenado a pagar, a título de indemnização, a quantia de € 1.086,00. Alegou ser proprietária do prédio que foi objeto da escritura de justificação notarial por parte do réu.
O réu contestou, excecionando a ilegitimidade da autora por preterição de litisconsórcio necessário (por estar desacompanhada dos demais comproprietários), bem como ilegitimidade da autora por estar desacompanhada do respetivo cônjuge. Excecionou, também, a falta de interesse em agir por parte da autora, uma vez que a justificação notarial diz respeito apenas a ¼ do prédio, não contendendo com o direito de compropriedade alegado pela autora em ¼ do mesmo prédio. Contestou, ainda, por impugnação.
A autora respondeu, considerando extemporânea a contestação. Respondeu á matéria de exceção, considerando que não se verificam as invocadas ilegitimidades e falta de interesse em agir.
Por despacho foi considerada tempestiva a apresentação da contestação e convidada a autora a aperfeiçoar a sua petição inicial, esclarecendo como a totalidade do bem imóvel passou a integrar a sua esfera jurídica ou concretizando qual a parte da propriedade da autora sobre o referido artigo ....º, que fica prejudicada com a escritura de justificação notarial ora impugnada.
A autora respondeu ao convite, enunciando as partes do prédio que lhe pertencem e esclarecendo que uma delas lhe adveio por adjudicação em inventário por óbito da mãe do réu (sua avó), sendo que na justificação notarial o réu afirma ter essa mesma parte sido doada por seus pais.
Foi proferido despacho saneador-sentença que julgou procedente a invocada exceção dilatória inominada de falta de interesse em agir da autora, absolvendo o réu da instância.
A autora interpôs recurso, tendo finalizado a sua alegação com as seguintes Conclusões: 1 – O presente recurso recai sobre o despacho saneador/sentença que absolve o réu da instância.
2 – Tal decisão baseou-se na procedência da invocada exceção dilatória inominada de falta de interesse em agir.
3 – A decisão recorrida fez incorreta interpretação de interesse em agir e ainda do disposto nos artigos 101.º do Código do Notariado e n.ºs 2 do artigo 202.º e 205.º da CRP.
4 – O interesse em agir é um pressuposto processual que consiste na necessidade de se usar do processo, de instaurar ou fazer prosseguir a ação (cfr. Antunes Varela, Manual de Processo Civil, 2.ª edição, pág. 179).
5 – O facto constitutivo que o réu alega na justificação notarial colide, conflitua, vai contra o facto constitutivo da propriedade da autora e daí o seu interesse no peticionado: a declaração de nulidade e de nenhum efeito, ou mesmo inexistente da escritura de justificação notarial celebrada pelo réu, bem como ser decretado o cancelamento do registo de propriedade lavrado também pelo réu.
6 – Nos termos do disposto no artigo 101.º do Código do Notariado, a justificação notarial pode ser impugnada por qualquer “interessado”, entendido este nos termos aplicáveis à definição da legitimidade processual, ou seja, é “interessado” o titular de uma relação jurídica ou direito que possa ser afetado pelo facto justificado.
7 – Do facto justificado pelo réu, por este colidir com os factos jurídicos fixados pelo trânsito em julgado do inventário 8/96 que correu termos no Tribunal Judicial de ..., e que fundamentam, legalmente, a aquisição de propriedade da mesma parcela por parte da autora, advém a necessidade da autora usar do processo, de instaurar ou fazer prosseguir a ação – eis aqui o interesse em agir da autora.
8 – E somente através da ação de simples apreciação poderá a autora obter a sua pretensão: a declaração de nulidade e de nenhum efeito, ou mesmo inexistente a escritura de justificação notarial celebrada pelo réu, bem como ser judicialmente decretado o cancelamento do registo de propriedade lavrado também pelo réu, bem como de qualquer registo operado com base na escritura impugnada.
9 – Relembrando Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto, in “Código de Processo Civil anotado”, vol. 2.º, 2.ª edição, pág. 713 e seguintes: a sentença produz também, fora do processo, o efeito de caso julgado material: a conformação das situações jurídicas substantivas por ela reconhecidas como constituídas impõe-se, com referência à data da sentença, nos planos substantivo e processual (…).
10 – A escritura de justificação celebrada pelo réu ofende pois, de acordo com a tese da autora, ora recorrente, a...
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