Acórdão nº 389/18.5IDFAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 26 de Maio de 2020

Magistrado ResponsávelBEATRIZ MARQUES BORGES
Data da Resolução26 de Maio de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na 2ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I. RELATÓRIO 1. Da decisão No processo comum singular n.º 389/18.5IDFAR do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Juízo Local Criminal de Albufeira, J3 foi realizado julgamento e proferida decisão em que foi:

  1. Absolvido o arguido AA, pela prática, como coautor material, de um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelo artigo 105.º, n.ºs 1, 2, 4, alínea a) e 7 do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT); b) Absolvida a sociedade arguida, “B…, Unipessoal, Lda.”, pela prática, como coautora material, de um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelo artigo 105.º, n.ºs 1, 2, 4, alínea a) e n.º 7 e artigo 7º do RGIT; c) Condenado o arguido AA, pela prática, como autor material, de um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelo artigo 105.º, n.ºs 1, 2, 4, al. a) e 7 do RGIT, aprovado pela Lei n.º 15/2001, na pena especialmente atenuada de cem dias de multa à taxa diária de cinco euros, perfazendo a quantia de quinhentos euros; d) Condenada a sociedade arguida, “B…, Unipessoal, Lda.”, pela prática, como autora material, de um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelo artigo 105.º, n.ºs 1, 2, 4, alínea a) e 7 e artigo 7.º do RGIT, aprovado pela Lei nº 15/2001, de 5 de junho na pena especialmente atenuada de cento e vinte dias de multa, à taxa diária de seis euros, o que totaliza uma quantia de setecentos e vinte euros.

    * 2. Do recurso 2.1. Das conclusões do arguido AA Inconformado com a decisão o arguido AA interpôs recurso extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões (transcrição): “1.ª A sentença recorrida equimosou o sentido profundo da coerência, apreensibilidade, operacionalidade e justeza dos meios e das soluções de que a actividade interpretativa deve servir-se para encontrar a justa e correcta resolução do caso concreto.

    1. E atento o manadeiro fáctico e probatório carreado aos autos, impunha-se uma decisão diversa, no sentido da absolvição dos arguidos.

    2. A convicção do julgador há-de formar-se, após, uma ponderação serena de todos os meios de prova produzidos, guiado sempre, por padrões de probabilidade, num processo lógico-dedutivo de montagem do mosaico fáctico, perspectivado pelas regras da experiência comum.

    3. Andou, mal o Tribunal “a quo” ao dar como provados os factos descritos nos Pontos 8, 10, 11, 12, e 13 dos factos provados da sentença.

    4. O Tribunal “a quo” fundou a sua decisão, diz-se com o devido respeito, que muito é, na esteira que a arguida sociedade comercial não efectuou qualquer pagamento ao Estado em sede de IVA, referente ao 3º trimestre de 2017, verberando, que esta postergou todos os prazos suplementares, e cronologicamente, desenhados na lei, para a catarse que se impunha no relacionamento com a Administração Tributária.

      Resulta à saciedade do cabedal documental aportado aos autos, que a sociedade arguida procedeu, sponte sua, e ainda no pleno decurso do prazo de 90 dias plastificado no artigo 105º, n.º4, alínea a) do RGIT, ao pagamento da quantia de 2.694,74 €, atirando o valor debitório em sede de IVA para patamares inferiores à quantia charneira de 7.500,00 €.

    5. Deverá, desta forma, considerar-se como não provada a factualidade, tal qual, vertida nos pontos 8, 10, 11, 12 e 13 dos factos provados da sentença.

    6. O arguido, em sede das suas declarações prestadas em Audiência de Julgamento, logrou trazer à discussão, a afectação efectiva e concreta das verbas, numa guisa de sub-rogação do dever de entregar ao Estado o IVA referente àquele período de tributação e que foi, completamente, desconsiderado e omitido na sentença.

    7. O Tribunal nada disse, nada fundamentou, nada decidiu neste segmento concreto, fazendo, inelutavelmente, resvalar a sentença para o vício da Nulidade, por omissão de fundamentação, como infra melhor se desenvolverá.

      Fazemos aqui uma navegação à cabotagem do eloquente Aresto do TRE de 20/12/2012, no sentido de apontar o vício de insuficiência para a matéria de facto provada, da sentença em que faltou apurar a afectação concreta das verbas que deveriam calçar o cumprimento da obrigação tributária.

      Invoca-se, expressamente, o alegado vício, da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, não obstante ser de conhecimento oficioso, nos precisos termos plasmados no artigo 410.º, n.º 2, alínea a) do CPP.

    8. O Tribunal “a quo” bordou uma motivação para respaldar a sua decisão, numa retórica, manifestamente, insuficiente, que não cumpre os mínimos de consagração constitucional, do universal dever de fundamentação.

    9. Perfila-se vítrea a falta de fundamentação da sentença, maxime, neste segmento do contraditório, ficando o arguido privado de conhecer o percurso cognitivo traçado pela Srª. Juiz para desconsiderar a sua tese, rectius no que tange à afectação das verbas.

    10. A sentença, ora, posta em crise, padece de Nulidade prevista no artigo 379.º, n.º 1, alínea a) do CPP, que para os devidos efeitos aqui, expressamente, se invoca, e que é de conhecimento oficioso.

      A falta de fundamentação, consubstancia, igualmente, uma violação clara da Lei Fundamental, por equimose dos artigos 20.º, 32.º, n.º 1, e 205.º todos da CRP, prefigurando a interpretação do artigo 374.º do CPP no sentido de não incluir-se na estrutura da fundamentação da sentença toda a dimensão contraditória da hipótese apresentada pela Defesa e valoração crítica de todos os meios de prova não atendidos na decisão, bem como, a falta de narração crítica dos factos não provados, claramente, inconstitucional por violação dos preditos normativos, imanentes dos princípios da garantia da tutela jurisdicional efectiva, desenvolvido nas garantias de defesa, onde se inclui o direito ao recurso nas garantias do processo criminal.

      Inconstitucionalidade esta que, expressamente, se invoca para os devidos efeitos legais, e que, também, esta, é de conhecimento oficioso.

    11. Alguns segmentos decisórios por serem, completamente, estranhos ao thema decidemdum, bem como, aos próprios sujeitos processuais, terão contaminado o iter cognitivo e decisório espelhado na sentença, como sucede, v.g. quando a Sr.ª Juiz do Tribunal “a quo” decide a dosimetria da pena no pressuposto que o arguido já é reincidente neste tipo de Tatbestand, quando a verdade, é que ambos os arguidos não têm quaisquer antecedentes criminais.

      A sentença, ora, posta em crise, padece, assim, da Nulidade prevista no artigo 379º, n.º 1, alínea a) do CPP, que para os devidos efeitos aqui, expressamente, se invoca, e que é de conhecimento oficioso.

    12. É, serenamente, acolhido na Jurisprudência, que a notificação prevista no artigo 105º, n.º 4, alínea b) do RGIT deve ser, autonomamente, efectivada na pessoa colectiva e na pessoa do seu representante legal. (Vide urbi et orbi o Aresto do TRP de 26-02-2014).

      A sentença é omissa quanto à notificação do arguido AA, enquanto gerente da sociedade comercial.

      Tal omissão faz resvalar a sentença para o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, nos precisos termos plasmados no artigo 410º, n.º2, alínea a) do CPP, que para os devidos efeitos, aqui, expressamente, se invoca.

    13. A infracção tributária com relevância criminal, opera-se no dia seguinte ao prazo de 90 dias plasmado no artigo 105º, n.º 4, alínea a) do RGIT, por corresponder a uma mora qualificada.

    14. O quantum debitório, na data de 14/02/2018 era de 6.680,64 €, portanto, inferior à cifra de 7.500,00 € bordada no artigo 105º, n.º 1 do RGIT.

      Logo, é vítrea a conclusão, que, in casu, falha um elemento essencial do tipo de ilícito criminal, pois, a quantia em dívida era inferior ao valor de 7.500,00 €, pelo que o putativo crime não se consumou.

    15. A Sr.ª Juiz do Tribunal “a quo” lavrou uma alteração não substancial dos factos, na própria sentença, ao modificar a qualificação jurídica do tipo de participação imputado a cada arguido.

      De facto, no libelo acusatório, a imputação era feita a título de co-autoria material.

      E na sentença a Sr.ª Juiz alterou para autoria material.

      Sucede, que a predita alteração não substancial não foi precedida da necessária comunicação prévia plasmada no artigo 358º do CPP.

      Tal omissão faz resvalar a sentença para o vício da Nulidade, prevista no artigo 379.º, n.º 1, alínea b) do CPP, e que aqui expressamente se invoca, para os devidos efeitos.

    16. Violou, assim, a sentença em análise o plasmado nos artigos 358º; 410º, n.º2, alíneas a), b) e c) todos do CPP; O artigo 5º, n.º2 do RGIT, e os artigos 18º; 20º; 32º, n.º 1 e 2 e 205º todos da CRP e, ainda, o artigo 6º, n.º2 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

      Ex.ªs deve dar-se provimento ao presente recurso e ipso facto:

  2. Revogar-se a sentença recorrida, considerando-se como não provados os Factos indicados nos pontos 8, 10, 11, 12, e 13 da sentença, e consequentemente absolver-se o arguido do crime por que foi condenado.

  3. Não se entendendo, assim, deverá revogar-se a decisão recorrida para que, face à posição a assumir por esse Alto Tribunal, se profira nova Decisão em conformidade.”.

    * 2.2. Das contra-alegações do Ministério Público Motivou o MP defendendo o acerto da decisão recorrida, embora sem apresentar conclusões.

    * 2.3. Do parecer do MP em 2.ª instância Na Relação o Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de ser julgada a improcedência total do recurso interposto pelo arguido, nos seguintes moldes: “(…) O recurso interposto tem por objectivo a revogação da sentença e a sua substituição por outra que o absolva do ilícito em que foi condenado.

    Para tanto, impugna a matéria de facto dada como provada invocando a violação do principio da livre apreciação da prova, alega a existência de nulidade respeitante à falta de fundamentação da sentença, mencionada no artigo 379.º n.º 1 a) do CPP e também a prevista na alínea b) e ainda o vicio de insuficiência para a decisão da matéria de facto, a que se reporta o artigo 410.º n.º 2 a) do CPP.

    II - Considerando as...

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