Acórdão nº 77/16.7T8PCV.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Maio de 2020

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução25 de Maio de 2020
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na Secção Cível (3.ª Secção) do Tribunal da Relação de Coimbra Proc. n.º 77/16.7T8PCV.C1 1. -Relatório 1.1.- F..., Lda instaurou a presente acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra o Banco B..., S.A. peticionando a condenação deste no pagamento à A. da quantia de €7.000,00, respeitante ao pagamento indevido do cheque nº ..., quantia esta acrescida de juros vencidos e vincendos desde 24/01/2014 até integral e efectivo pagamento.

Para tanto alega, em síntese, que emitiu o mencionado cheque sobre o Banco B..., S.A., no valor de €7.000,00, tendo esse cheque sido emitido sobre a conta que a A. é titular no referido Banco; que preencheu integralmente o cheque em causa, designadamente quanto ao beneficiário do mesmo, J..., tendo-lhe entregue o mesmo para pagamento de uns eucaliptos que lhe houvera adquirido, no pressuposto dos meus serem seus; que o cheque em apreço é não endossável e cruzado; que tendo apurado que os ditos eucaliptos não pertenciam ao referido J... dirigiu-se ao Banco para proceder ao cancelamento do cheque em causa, tendo tido conhecimento que o mesmo houvera já sido pago a M..., nome este entretanto acrescentado, por aquele, pelo seu próprio punho, no lugar destinado ao beneficiário, extravasando a linha existente para o efeito.

1.2. – citada a Ré contestou a acção, pugnando pela sua improcedência e, consequentemente, pela sua absolvição do pedido. Alegou, em síntese, que o cheque não continha qualquer rasura, emenda ou alterações que suscitasse dúvidas quanto à genuinidade da indicação do nome da beneficiária, inexistindo, por isso, qualquer situação que obstasse ao seu pagamento.

Além do mais, a Ré deduziu ainda incidente de intervenção acessória provocada de M... e de J..., o qual foi admitido por decisão datada 15/09/2016 1.3. - Designada data para o efeito, procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento da causa, conforme consta das respectivas actas.

Após procedeu-se á prolação da sentença tendo sido julgada a ação procedente e em consequência, condenou o R. Banco B..., S.A. a proceder ao pagamento à A. da quantia de €7.000,00 (sete mil euros), a que acrescem juros vencidos e vincendos, à taxa legal, desde 24/01/2014 até integral e efectivo pagamento.

Custas pelo R.

1.4. Inconformado com tal decisão dela recorreu o R. – Banco B..., S.A -, terminando a sua motivação com as conclusões que se transcrevem: ...

1.5. - Feitas as notificações a que alude o art.º 221.º, do C.P.C. não houve resposta.

1.6. - Colhidos os vistos cumpre decidir 2 – Fundamentação A) Factos Provados Com relevância para a presente decisão, mostram-se provados os seguintes factos: 1. A autora tem por objecto social, além do mais, a exploração florestal e actividades complementares relacionadas com a compra e venda de madeira e limpeza de florestas; 2. No desenvolvimento do seu objecto social a autora negociou com J..., residente no lugar e freguesia de ..., aquisição de eucaliptos e outras árvores em diversos prédios rústicos de que este se arrogava dono; 3. No início de Janeiro de 2014 a autora deslocou-se aos referidos prédios com o mencionado J...; 4. Este indicou os limites dos prédios que dizia ser de sua pertença, exibindo mesmo documentação alegadamente demonstrando serem referente a aqueles; 5. Após negociação entre as partes, a autora acordou adquirir as árvores existentes nos citados prédios pelo preço global de €7.000,00 (Sete mil euros); 6. E no dia 24 de Janeiro de 2014 a autora emitiu o cheque número ..., sobre o Banco B..., SA, aqui réu, no montante de €7.000,00 (Sete mil euros); 7. O referido cheque foi emitido sobre a conta que a autora é titular no referido banco, com o número ...; 8. O cheque em causa foi totalmente preenchido pela autora indicando o montante, o local de emissão, a data de emissão, quem era beneficiário e o valor do mesmo; 9. O cheque em questão fazia parte de um livro de cheques emitidos pelo réu com duplicados, permitindo que com o preenchimento do original, com os elementos identificativos supra referidos, ficassem estes gravados no respectivo duplicado; 10. O mencionado cheque foi entregue ao referido J... tendo este assinado o respectivo recibo de quitação com o número 0119, com a data mesma data, isto é, 24 de Janeiro de 2014; 11. O cheque emitido e identificado em 6 a 8 não é endossável; 12. E é um cheque cruzado; 13. Após a entrega do cheque ao referido J..., este ou alguém por ele acrescentaram, pelo próprio punho, “ou M...”; 14. Tal alteração extravasou as linhas existentes para indicar o beneficiário do cheque; 15. Nestas condições, no dia 27/01/2014 o aludido cheque foi apresentado para depósito por M..., junto da agência de S... do Banco R., para crédito na sua conta bancária no ...; 16. E o R. descontou-o; 17. Acontece que a autora veio a verificar que os prédios que lhe foram indicados pelo referido J... não lhe pertenciam; 18. Tendo sido impedida de proceder ao corte e abate das árvores que alegadamente havia adquirido ao legítimo dono; 19. Na sequência de tal facto dirigiu-se à agência do réu onde estava sedeada a sua conta bancária, então sita em ..., para cancelar o cheque que emitira; 20. Aí, a A. foi informado que o cheque já havia sido pago; 21. O A. solicitou cópia do mesmo e quando lhe foi fornecida tal cópia verificou que o cheque preenchido e assinado pelo gerente da autora fora acrescentado “ou M....”.

22. O referido “aditamento” foi realizado numa letra que a “olho nu” se constata que não é a do gerente da autora; 23. E ultrapassa a linha existente para mencionar o beneficiário do cheque; 24. Tais elementos do cheque e a forma como mesmo fora preenchido deveria ter constituído um sinal de alarme para o funcionário incumbido de validar os elementos constitutivos do cheque e nomeadamente a letra e assinatura de quem preencheu o cheque, aconselhando alguns cuidados acrescidos; 25. Bastaria a simples comparação das assinaturas em questão, a olho nu, sem utilização de qualquer equipamento específico, logo revelava estar-se na presença de letra bem distinta; 26. O que justificava, desde logo, que à cautela se fizesse um simples telefonema para o titular da conta, indagando o que se passava; 27. Após o pagamento do cheque, M... efetuou um levantamento avulso da quantia de €6.000,00; 28. No seguimento daquela exposição efetuada pela ora A., por carta de 29.01.2014, o R. contactou a M... e titular da conta bancária onde havia sido depositado o cheque junto da agência de S..., tendo a mesma referido ao Banco R. que o primeiro beneficiário do cheque, J..., é seu tio, a quem tinha emprestado €1.000,00 e que, para pagamento dessa dívida, o aludido J... lhe entregou o cheque em causa nos autos preenchido nos termos em que o apresentou para depósito no Banco R.; 29. E lhe transmitindo que poderia apresentar o cheque a pagamento, por ser também beneficiária do cheque; 30. Mais esclareceu que o montante de € 6.000,00 que levantou após o pagamento daquele cheque, entregou-o ao seu tio, primeiro beneficiário do cheque, já que, após o pagamento da referida dívida, tal importância lhe pertencia; 31. No dia 03.02.2014, na agência de ... do R., M... entregou uma declaração subscrita por J..., datada de 27.01.2014 e com a assinatura do mesmo reconhecida na mesma data; 32. Por carta de 24/03/2014, o R. informou a A. de que, concluída a análise da situação exposta na carta de 29.01.2014, o Banco considerava “(...) que o pagamento do supra referido cheque foi efectuado regularmente, porquanto não existia qualquer impedimento ao pagamento do mesmo à data da apresentação, a Lei Uniforme Relativa ao Cheque não determina que um cheque “não à ordem” não possa ser emitido a favor de mais do que um beneficiário e que a inscrição do nome dos dois beneficiários nele constantes esta efectuada de modo legível e sem rasuras.” B) Factos não provados Com relevância para a boa decisão da causa dão como não provados os seguintes factos: i. Do aludido cheque não resultam diferenças do tipo de letra visíveis “a olho nu” ou quaisquer adulterações que suscitassem dúvidas quanto à genuinidade da indicação do nome da beneficiária portadora do cheque; ii. da invocada análise cuidada do cheque, verificam-se de facto diferenças no tipo de letra aposta no local de emissão/valor em numerário/data de emissão, por um lado, na assinatura do representante da sacadora, aqui A., por outro, e por último, na identificação dos beneficiários e na quantia por extenso; iii. O cheque não foi preenchido e assinado pelo seu gerente, já que são bem visíveis as diferenças no tipo de letra entre o preenchimento do cheque e a assinatura aposta pelo gerente.

Os restantes factos constantes dos articulados da A. e do R. não foram tidos em consideração ou por consubstanciarem matéria de facto irrelevante para a boa decisão da causa, ou pura e simplesmente se tratarem de factos conclusivos e/ou matéria de Direito.

3. Motivação 3.1. Em principio, é pelo teor das conclusões do/a recorrente que se delimitam as questões a apreciar no âmbito do recurso (cfr. art.s 608, n.º 2, 635, n.º 4 e 639, todos do C.P.C.).

Assim...

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