Acórdão nº 279/19.4T8LAG.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 23 de Abril de 2020

Magistrado ResponsávelV
Data da Resolução23 de Abril de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo n.º 279/19.4T8LAG.E1 * (…), Lda. propôs a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra (…), (…) e (…), Lda., formulando os seguintes pedidos: a) Ser considerada válida a declaração de oposição à renovação do contrato de arrendamento identificado em 4, supra, e que consta do documento 3, por via da comunicação efectuada em 10/11/2017; b) Ser decretado o despejo do arrendado, condenando-se a ré a efectuar a sua entrega imediata; c) Ser a ré condenada a pagar à autora a indemnização equivalente ao valor da renda mensal nos termos do artigo 1045.º, n.º 1, do Código Civil, sendo esta elevada para o dobro nos termos do n.º 2 do preceituado legal, caso a entrega do locado não venha a ser efectuada em prazo, na sequência da decisão judicial que a determine. Alegou, em síntese, ser locatária financeira de determinado prédio urbano e que o anterior proprietário deste último se opôs validamente à renovação do contrato de arrendamento, incidente sobre parte do mesmo prédio, de que era contraparte a ré.

A ré contestou, invocando a “ilegitimidade substantiva” da autora e sustentando que o contrato de arrendamento não se extinguiu.

A autora respondeu à excepção suscitada pela ré, sustentando que, apesar de não ser proprietária do prédio, foi investida na posse deste, por efeito do contrato de locação financeira, para o usar e fruir de acordo com os fins a que o mesmo se destina, pelo que adquiriu a posição de senhoria nos contratos de arrendamento das várias divisões independentes do prédio; relativamente à ré, a autora não a reconhece como arrendatária, tendo sido por isso que lhe solicitou a desocupação da parte do prédio que ocupa; concluiu, assim, no sentido da improcedência da excepção de ilegitimidade.

Foi proferido despacho saneador que julgou a autora parte ilegítima, absolvendo a ré da instância.

A autora recorreu do despacho saneador, tendo formulado as seguintes conclusões: A) O presente recurso emerge do, aliás douto, despacho saneador/sentença, o qual julgou a autora/recorrente como parte ilegítima para a presente acção, absolvendo a ré da instância; B) Com o devido respeito, a decisão recorrida deverá ser revogada, uma vez que a recorrente tem interesse directo em demandar, interesse esse manifestado na utilidade que resulta da procedência da acção, enquanto sujeita da relação material controvertida tal como é configurada pela autora; C) A recorrente é locatária financeira do imóvel dos autos, foi investida na posse do prédio para o usar e fruir, de acordo com os fins a que o mesmo se destina, sendo da sua responsabilidade exercer quaisquer direitos referentes ao imóvel locado ou à sua utilização, designadamente no que respeita a dar de arrendamento, cobrar as respectivas rendas e exercer todos os direitos comuns a qualquer senhorio; D) Nos termos do Decreto-Lei 149/95, de 24 de Junho, resulta que o locatário financeiro tem o direito a i) usar e fruir o bem locado, ii) defender a integridade do bem e o seu gozo, nos termos do seu direito e, iii) usar das acções possessórias, mesmo contra o locador, tudo conforme artigo 10.º, n.º 2, alíneas a), b) e e), do referido diploma legal; E) Mas mais, resulta do contrato de locação financeira dos autos que compete à recorrente o exercício de qualquer acção ou direito contra qualquer terceiro – conforme cláusula 12 (parte final) das condições particulares do contrato de locação financeira imobiliária n.º (…); F) A recorrente, embora não tendo um título jurídico de proprietário, enquanto locatária exerce, durante todo o período do contrato, um domínio sobre o bem dado em locação financeira – ou seja, um direito de o usar, retirando, em exclusividade, as suas utilidades – em termos de poder praticamente excluir o proprietário jurídico; aliás, a pretensão de ambos os contraentes é a de, após pagamento de todas as rendas do contrato, o bem ser definitiva e formalmente transferido para a esfera jurídica do locatário; G) E mesmo durante o tempo pelo qual perdura o contrato, o locatário entra na posse material do bem dado em locação e, tal como um mero arrendatário, tem poderes de fruição temporária, pelo que, qualquer acto ilícito praticado contra o bem locado, não pode deixar de conferir-lhe legitimidade para demandar quem, com tais actos, o prejudicou; H) A recorrente é titular de interesse relevante para efeitos de reclamar em juízo o despejo da ré, por forma a melhor usar e fruir do bem, com vista a retirar, em exclusividade, todas as utilidades e rentabilidades económico-financeiras que aquele é passível de proporcionar; I) É pois inegável que a recorrente tem interesse directo em demandar, devendo ser considerada parte legítima para a presente acção; J) A decisão recorrida violou o preceituado nos artigos 30.º, 277.º e 278.º do CPC.

A recorrida não contra-alegou.

O recurso foi admitido.

* A única questão a resolver consiste em saber se a autora e ora recorrente tem legitimidade para propor a presente acção.

* Resultam dos autos os seguintes factos com relevância para a decisão do recurso: 1 – Em 30.05.1989, (…) e mulher, (…), então proprietários do prédio urbano destinado a comércio e habitação sito na Praça (…), n.ºs 1 a 5, e Rua (…), n.ºs 2 a 10, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lagos sob o n.º …/19900316 da freguesia de São Sebastião, Concelho de Lagos, celebraram, na qualidade de...

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