Acórdão nº 91/14.7TBBNV-B.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 23 de Abril de 2020

Magistrado ResponsávelV
Data da Resolução23 de Abril de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo n.º 91/14.7TBBNV-B.E1 * O executado (…) deduziu incidente em que requereu: - A manutenção da sustação da instância executiva quanto ao imóvel hipotecado e penhorado a favor da exequente; - O não prosseguimento dos autos para a venda do mesmo imóvel; - A extinção da instância nos termos dos artigos 277.º, 794.º, n.º 4 e 849º, n.º 1, al. a), do CPC, caso se verifique a sua aplicabilidade.

O incidente foi processado autonomamente.

A exequente respondeu, pugnando pelo indeferimento do requerido.

Em seguida, foi proferida sentença que, julgando o incidente improcedente, ordenou o levantamento da sustação da execução quanto ao imóvel em causa e o prosseguimento da mesma execução. A sentença condenou ainda o executado requerente nas custas do incidente, tendo fixado a taxa de justiça em 5 UC por considerar que este último assumiu natureza infundada e dilatória.

O executado (…) recorreu da sentença, tendo formulado as seguintes conclusões: A) Como foi alegado pela exequente, o seu crédito está garantido por hipoteca, penhora e foi reclamado na execução fiscal, o que levou à sustação da execução quanto ao imóvel penhorado nos termos do artigo 794.º do C.P.C.; B) A execução fiscal é um processo de natureza especial, como de decorre do preâmbulo do D.L. n.º 4336/99, de 26 de outubro; C) O imóvel penhorado pela AT, no âmbito da execução fiscal, está afecto à habitação própria e permanente dos executados, nomeadamente da executada (…), mãe do recorrente; D) Por esse facto, a execução fiscal mantem-se suspensa quanto à venda do imóvel, por aplicação do disposto no artigo 4.º da Lei n.º 13/2016, de 23 de Maio, que alterou o CPPT, quanto à concretização da venda, na sequência de penhora ou execução de hipoteca; E) O regime de lei especial que caracteriza a execução fiscal prevalece sobre o regime da execução comum, o qual tem natureza geral, como decorre do preâmbulo da Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho; F) A lei geral não revoga a lei especial, excepto se outra for a intenção inequívoca do legislador; G) Da alteração legislativa decorrente da Lei n.º 13/2016, de 23 de Maio, resulta claramente que o legislador quis salvaguardar a realização da venda de imóvel afecto a habitação própria e permanente do executado, alterando a lei especial para acomodar aquele pensamento legislativo; H) A interpretação da lei não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada; I) O pensamento legislativo que levou à aprovação da Lei n.º 13/2016, de 23 de Maio, tem de prevalecer em relação ao regime do processo executivo comum, já que o regime de execução fiscal emana de uma lei especial, a qual terá de prevalecer em relação à lei geral; J) A exequente, por ter reclamado primeiro o seu crédito na execução fiscal, acautelou os seus direitos quando for possível proceder à venda do imóvel na venda fiscal; K) Ao contrário do pensamento do juiz a quo, a venda na execução fiscal não fica a aguardar ad eternum, bastando, para afastar o regime especial de impedimento de venda do imóvel, que o mesmo deixe de estar afecto à habitação própria e permanente dos executados, nomeadamente da executada (…), mãe do recorrente; L) Do confronto daqueles três princípios constitucionais (direito à propriedade privada, direito à habitação e direito à proteção de pessoas idosas), e perante a opção do legislador em limitar o poder da administração fiscal em vender a casa afecta à habitação própria e permanente do executado, resulta claramente que prevaleceu o direito de constitucional do direito à habitação e de salvaguarda do direito à habitação por pessoas idosas; M) A decisão em crise, a ser mantida, irá subverter o princípio de direito que caracteriza a aplicação da lei especial versus lei geral, permitindo à recorrida/exequente prosseguir com uma execução comum que tem de estar sustada nos termos do artigo 794.º do C.P.C., por a lei especial que regula a execução fiscal prevalecer sobre a lei geral que define os termos do regime de execução comum; N) Deve, pelo exposto, ser revogado por outra que determine a sustação da execução e ordene o não prosseguimento dos autos, sem prejuízo da aplicabilidade do disposto nos artigos a extinção da instância nos termos dos artigos 277.º, 794.º, n.º 4 e 849º, n.º 1, al. a), do Código de Processo Civil; O) É de conhecimento oficioso que o executado (…) faleceu e que o imóvel penhorado e hipotecado pela exequente, prédio urbano sito na Rua da (…), n.º 225, Marinhais, descrito na CRP sob a ficha n.º (…) da freguesia de Marinhais e inscrito na matriz urbana sob o artigo (…), passou a fazer parte da herança aberta na sequência do referido falecimento; P) Sem que a partilha daquele bem esteja feita, não é possível a execução prosseguir com a execução para a venda do bem, já que o mesmo deixou de pertencer ao falecido (…) e (…) e passou a fazer parte de um património em comum, adquirido por sucessão mortis causa, de que são herdeiros a executada viúva e o filho, ora recorrente; Q) Deve, por isso, ser decretada a suspensão da instância até à realização da partilha do referido imóvel; R) O incidente deduzido pelo recorrente levanta questões de direito que merecem ser apreciadas e julgadas pelos tribunais; S) A pretensão do recorrente não é infundada e dilatória; T) O juiz a quo não fundamenta e justifica em que termos o incidente deduzido pelo recorrente não é sério, não é construtivo, não tem cabimento processual e em que se traduziu para torpedear e retardar o prosseguimento da execução, com consequências na tramitação do processado e na realização da justiça; U) Consultados os autos, o recorrente apenas encontra justificação para a decisão desproporcionada do juiz a quo o facto de ter respondido negativamente ao despacho de 11.5.2019, em que o executado foi convidado a desistir do incidente; V) A administração da justiça em nome do povo rege-se pela aplicação da lei e não ao sabor de respostas positivas ou negativas dos sujeitos processuais, que dão azo a mais ou menos trabalho aos magistrados judiciais; W) Deve, por isso, a decisão quanto a custas ser declarada nula e revogada por outra; X) A decisão em crise violou as seguintes normas e regime jurídicos: - Artigos 65.º e 72.º da CRP; - Artigos 7.º e 9.º do Código Civil; - Artigos 615.º, n.º 1, al. b) e d), e 794.º do Código de Processo Civil; - D.L. n.º 4336/99, de 26.10 e artigo 4.º da Lei nº 13/2016, de 23.5.

A recorrida apresentou contra-alegações, com as seguintes conclusões: 1. As conclusões formuladas pelo apelante esmaltam a matéria que, em princípio (exceptuando as meras razões de direito e as questões de conhecimento oficioso), delimitam o âmbito e objecto do recurso, conforme dispõe o n.º 2 in fine do art.º 608º; n.º 4 do art.º 635º e n.º 1 a 3 do art.º 639º, todos do C.P.C., pretendendo o ora apelante que se “julgue procedente a presente oposição deduzida, ordenando-se a sustação da execução e o não prosseguimento dos autos, sem prejuízo da aplicabilidade do disposto nos artigos 277.º, 794.º, n.º 4 e 849.º, n.º 1, al. a) do Código de Processo Civil” bem como “seja decretada a suspensão da instância até à realização da partilha do referido imóvel”.

  1. Sucede que a douta sentença proferida pelo meritíssimo juiz a quo fez a melhor interpretação e aplicação do direito à pretensão formulada nos autos, não apresentando o opoente/apelante, nas suas alegações, por ser manifestamente impossível, qualquer razão de facto ou de direito plausível para sustentar o recurso apresentado.

  2. O direito de recorrer do apelante encontra-se caduco, desde logo, porque, abrigo do disposto na al. g) do n.º 2 do artº. 644º do C.P.C., tendo 15 dias para apresentar recurso da douta decisão proferida pelo tribunal a quo – que julgou totalmente improcedente o incidente deduzido e por consequência declarou não ter aplicação ao caso o disposto no art.º 794º do CPC, impondo-se, em contrapartida, que a presente execução prossiga os seus ulteriores termos, determinando o levantamento da sustação da instância quanto ao imóvel em causa – e que lhe foi notificada em 24/09/2019, apenas apresentou o recurso em 28/10/2019, pelo que não deve ser admitido o recurso e o seu direito ser julgado extinto (n.º 3 do artigo 139º do C.P.C.).

  3. Em face da douta sentença proferida pelo tribunal a quo e das conclusões esmaltadas nas alegações de recurso do apelante, que aqui se dão por reproduzidas para todos os devidos e legais efeitos...

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