Acórdão nº 962/19.4T8TVD.L1-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 29 de Abril de 2020

Magistrado ResponsávelCELINA NÓBREGA
Data da Resolução29 de Abril de 2020
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa: Relatório Porque se frustrou a tentativa de conciliação veio a sinistrada, AAA, residente (…), com o patrocínio do Ministério Público, intentar contra BBB, com sede na Rua (…), a presente acção especial emergente de acidente de trabalho, pedindo que, julgada procedente a acção, a Ré seja condenada a pagar à Autora: -789 euros relativos a despesas de reparação dos óculos estragados por causa do acidente de trabalho; e - 12 euros por despesas com deslocações e transportes e demais quantias que a Autora ainda vier a desembolsar com transportes nas suas deslocações obrigatórias a Tribunal, acrescidos dos juros legais.

Invocou para tanto, em síntese, que: -A 12 de Abril de 2019, a Autora era trabalhadora por conta de outrem da empresa (…). e estava colocada nas instalações da (…) exercendo as funções de cozinheira de 3.ª; -Cerca das 12h45m desse dia, a Autora estava em tal local de trabalho e durante o horário de trabalho procedendo à arrumação de alguidares grandes por cima de uns armários de inox quando, de repente, tais alguidares caíram e bateram-lhe na cabeça e os óculos que utiliza normalmente durante o trabalho, com a pancada, caíram no chão e partiram-se.

- Por força do acidente acima descrito, a Autora sofreu estragos nos seus óculos cuja reparação, que ainda não efectuou, orça o valor de 789 euros e que lhe é devido de acordo com o previsto no art. 43.º, n.º 1,al.a) da Lei dos Acidentes de Trabalho; - Em deslocações ao Tribunal, gastou quantia não inferior a €12,00.

Citada, a Ré contestou invocando, em resumo, que apenas aceita que estivesse para si transferida a responsabilidade emergente de acidentes de trabalho, em função da retribuição de 635,00€ x 14 meses, num total anual de 8.890,00€, por força do contrato de seguro celebrado com a empregadora da Autora, que não aceita a existência do alegado acidente de trabalho, nem o nexo de causalidade entre os danos causados aos óculos da Autora e qualquer eventual acidente de trabalho, que, não tendo resultado do incidente descrito pela Autora quaisquer lesões corporais, tal não permite qualificar como de trabalho o acidente que a sinistrada terá sofrido.

Concluindo que não é responsável pelo pagamento de quaisquer indemnizações à Autora e que o orçamento junto aos autos é um orçamento para a aquisição de uns óculos novos e não para reparação dos alegadamente danificados, pediu, a final, que a acção seja julgada improcedente e a contestante absolvida do pedido.

Foi proferido despacho saneador, fixados os factos assentes, identificado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova.

Procedeu-se a julgamento.

Após, foi proferida a sentença que finalizou com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto julgo a ação parcialmente procedente, e em consequência: 1.º) Condeno a Ré a pagar à Autora a quantia de €789,00 (setecentos e oitenta e nove euros) acrescida de juros de mora à taxa legal vencidos desde 20.09.2019 e vincendos até integral pagamento.

  1. ) Absolvo a Ré do mais peticionado pela Autora; 3.º) Condeno a Autora e a Ré no pagamento das custas do processo na proporção dos decaimentos, sem prejuízo da isenção que assiste à Autora, nos termos do disposto no artigo 4º, n.º 1, al. h, do R.C.P..

Valor da causa: Tendo em conta os pedidos efetuados pela Autora, fixo o valor da causa em €801,00 (€789,00 + € 12,00).

Notifique.” Inconformada, a Ré recorreu e sintetizou as alegações nas seguintes conclusões: “1. Vem a presente apelação interposta da douta sentença de fls., que, considerando que o acidente sofrido pela autora deve ser qualificado como acidente de trabalho, condenou a ora recorrente a pagar à autora os óculos danificados por esse acidente.

  1. Salvo o devido respeito, essa decisão deve ser revogada, por enfermar de erro de interpretação e aplicação da lei aos factos, ao considerar aquele acidente como acidente de trabalho.

  2. Na douta sentença recorrida foram considerados provados os seguintes factos: - A 12 de Abril de 2019, a Autora era trabalhadora por conta de outrem da empresa (…). e estava colocada nas instalações da Escola (…)exercendo as funções de cozinheira de 3.ª; - Cerca das 12h45m do dia 12 de Abril de 2019 a Autora estava em tal local de trabalho e durante o horário de trabalho procedendo à arrumação de alguidares grandes por cima de uns armários de inox; - Em tal data a entidade empregadora da Autora tinha transferida a sua responsabilidade por acidentes de trabalho para a Ré através da celebração de um contrato de seguro titulado pela apólice n.º 203544111 do ramo de acidentes de trabalho; - Durante a realização da tarefa referida no ponto 2) alguns alguidares caíram e atingiram a Autora na cabeça, fazendo com que os óculos que usava caíssem ao chão e se partissem (na própria armação e, pelo menos, numa das lentes), impossibilitando a sua reparação; - A substituição/aquisição de novos óculos (armação e lentes adequadas à mesma) foi orçamentada em €789,00; - A Autora deslocou-se entre a zona da sua residência em Lourinhã para comparecer neste tribunal em tentativa de conciliação.

  3. Com base nestes factos, o Mtº Juiz recorrido entendeu que o acidente sofrido pela autora – cuja ocorrência não se põe em causa – deve ser qualificado como de trabalho “porquanto a ocorrência do acidente [de trabalho] não pressupõe necessariamente a existência de lesão corporal bastando que o evento ocorrido no tempo e local de trabalho produza perturbação funcional a qual pode resultar da simples danificação de ajudas técnicas que o sinistrado já fosse portador, como é caso dos óculos que visam a compensação de deficiência visual”.

  4. O Mtº Juiz recorrido qualifica, assim, o acidente em causa como acidente de trabalho porque dele resultaram danos nuns óculos (ajuda técnica) de que a sinistrada já era portadora e por entender que da danificação desses óculos resultou uma perturbação funcional.

  5. Ora, a perturbação funcional que afectaria a autora não foi, seguramente, causada por este acidente, sendo-lhe pré-existente e não foi por este agravada.

  6. Não foram os danos causados nos óculos da autora que lhe causaram qualquer perturbação funcional: a eventual (porque não alegada) perturbação funcional...

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