Acórdão nº 1877/18.9T8BGC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 23 de Abril de 2020

Magistrado ResponsávelVERA SOTTOMAYOR
Data da Resolução23 de Abril de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães APELANTE: A. R.

APELADO: CORREIO ... – CORREIO …, S.A., Tribunal Judicial da Comarca de ... – Juízo do Trabalho de ...

I – RELATÓRIO A. R., residente na Rua … ... intentou a presente acção, com processo especial, de impugnação da regularidade e licitude do despedimento promovido pela sua entidade empregadora CORREIO ... – Correio ..., S.A., com sede na Av. … Lisboa, apresentando para tanto o respectivo formulário a que alude o artigo 98.º C do CPT. e requerendo a declaração da ilicitude ou irregularidade do seu despedimento Realizada a audiência de partes e não tendo sido obtida a conciliação, foi a empregadora notificada para, no prazo de 15 dias, apresentar articulado fundamentador do despedimento e juntar o original do procedimento disciplinar que conduziu ao despedimento do impugnante.

A entidade empregadora apresentou o respectivo articulado pugnando pela improcedência da acção e manutenção da decisão de despedimento com justa causa.

O Trabalhador contestou, arguindo a nulidade do procedimento disciplinar e impugnando, parcialmente, os factos alegados pelo empregador, invoca a ilicitude do despedimento, por improcedência do motivo justificativo da justa causa e pede a sua reintegração, com a condenação no pagamento dos salários não pagos desde o início da suspensão, tudo acrescido das demais consequências legais.

O empregador veio responder pugnando pela improcedência da nulidade do procedimento invocada pelo trabalhador e reiterando a regularidade e licitude do despedimento.

Foi proferido despacho saneador tabelar, não tendo o tribunal a quo delimitado o objecto do litígio, nem enunciado os temas da prova, atenta a simplicidade da selecção da matéria de facto controvertida.

Realizada a audiência de julgamento, foi pela Mma. Juíza a quo proferida sentença, que terminou com o seguinte dispositivo: “Perante o exposto, julgo totalmente improcedente, por não provada, a presente acção especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento e, em consequência, absolvo a R. empregadora CORREIO ..., S.A.

do pedido contra si formulado pelo A. trabalhador A. R.

.

Custas pelo A. trabalhador, sem prejuízo da isenção de custas que lhe foi reconhecida.

Notifique.

Registe.” Inconformado com o decidido apelou o Trabalhador para este Tribunal da Relação, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões: 1. A decisão em crise decidiu absolver a recorrida da ação especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento.

  1. Vem o recorrente/trabalhador contestar a matéria que a decisão em crise entende provada nos seus pontos 40 a 46, atenta a prova produzida e carreada para o processo.

  2. Entende o recorrente que a matéria de facto provada e supra citada não poderia ter sido aquela face às várias incoerências, contradições e omissões relevadas em audiência de julgamento e prova documental existente no processo.

  3. Os factos que efetivamente ocorreram foram os relatados pelo recorrente, e trabalhador, A. R., em audiência de julgamento no dia 08.07.2019 nos minutos 6:18 a 6:40, 7:41 a 8:02, 15.55 a 16:28, 17:08 a 17:42 e 18:20 a 18:50.

  4. Depoimento no qual afirmou e reiterou que se defendeu de uma agressão eminente de C. C., técnico de gás do IEP, que vinha em sua direção com o punho levantado, que o empurrou de frente, que o mesmo caiu para o chão, não bateu no carro durante a queda, que as chaves que levou por engano não eram as mesmas que constam do processo e sim outras, e que nunca viu qualquer medidor de monóxido de carbono ou qualquer telemóvel pertencente ao técnico.

  5. No âmbito da mesma sessão de julgamento, no dia 08.07.2019, ao minuto 37:36, percebe-se que a testemunha C. C., o técnico de gás, prestou o seu testemunho, através de videoconferência, coadjuvado por documentos, para os quais olhava constantemente.

  6. Atenta a gravidade da situação que consta da acusação efetuada ao recorrente não se compreende como é que o alegado ofendido, técnico de gás, se possa esquecer do que aconteceu e pretenda ter documentos consigo para se “recordar” de todos os pormenores.

  7. Dai só se poderá concluir que a testemunha C. C. prestou um depoimento que reflete, não o que se lembrava de ter acontecido à data dos factos, mas antes a informação que constava de um documento que não se chegou a perceber bem se era um documento manuscrito efetivamente por ele ou não.

  8. Pelo que só se poderá concluir que o testemunho do técnico de gás, não foi efetuado de forma natural pelo que não deveria ter sido sequer valorado pelo Tribunal a quo.

  9. Ainda no âmbito das declarações da testemunha C. C., técnico de gás, e porque o recorrente/trabalhador se encontrava no tribunal, foi efetuada uma acareação entre os dois da qual resultaram as declarações entre a hora 1:11:04 a 1:15:53.

  10. De tal confronto entre os dois percebe-se que as declarações do recorrente foram consistentes e autênticas negando e justificando de forma clara a acusação de que foi alvo.

  11. Apesar do exposto, a decisão em crise entendeu, erradamente, que as “explicações” apresentadas pelo recorrente “não lograram convencer o tribunal, já que as lesões apresentadas pelo C. C. e descritas na ficha clínica do Hospital de ...

    -traumatismo da região cervical/occipital com hematoma não se mostra compatíveis com a sua versão dos factos e o seu veículo particular seria um Renault Clio de 1996, ao passo que o veículo de C. C., pela matrícula, é do ano de 2016 e tinha uma chave em forma de cartão, diferente da do veículo do A., que este exibiu em sede de audiência de julgamento”.

  12. O recorrente tem de discordar totalmente com tal entendimento.

  13. Ora não se compreende que se diga que as lesões descritas na ficha clínica do Hospital de ... (a folhas 48 do procedimento disciplinar, não se referindo ás folhas do processo judicial por desconhecimento) não são compatíveis com a versão dos factos relatada pelo recorrente, atento se ter percebido claramente que o técnico de gás foi empurrado pela frente, caindo necessariamente de costas, e de lado, o que claramente foi consequência do referido traumatismo/hematoma da região cervical/occipital com hematoma.

  14. Relativamente às chaves do veículo do técnico de gás não considerou o tribunal a quo a versão do recorrente, e aceita como prova nomeadamente, as fotografias constantes no processo disciplinar a folhas 9 a 11 e folhas 37 e 38, onde por incrível que pareça em nenhuma delas se consegue identificar a matrícula do automóvel e assim se o carro em questão é efetivamente o mesmo em que se fazia deslocar o técnico de gás à data dos acontecimentos. Portanto tal conclusão do Tribunal a quo é totalmente incompreensível face à prova documental (as fotografias do veiculo).

  15. O teor do auto a folhas 25 e 26 do processo disciplinar, concretamente nas suas linhas 14 e 17, onde se diz, por interposta pessoa, que a testemunha B. R. viu a agressão, foi desmentido pelos próprios assinantes.

  16. Em audiência de julgamento, os assinantes do auto de folhas 25 e 26 do processo disciplinar, o Sr. Inspetor D. C. (sessão de julgamento de dia 18.09.2019, o minuto 17:04) e L. M. (sessão de julgamento do dia 08.07.2019, do minuto 20:18 ao minuto 21:08) afirmam perentoriamente que a testemunha B. R. nunca lhes disse que viu qualquer agressão do carteiro ao técnico do gás.

  17. També a testemunha M. P., gestora de loja de Mirandela, pessoa que presenciou e assinou o auto de noticia a folhas 49 e 50 do processo disciplinar, em 13.08.2013, vem afirmar em audiência de julgamento no dia 08.07.2019, do minuto 5:41 ao 5:57, perentoriamente que a testemunha B. R. em nenhum momento diz que viu o recorrente a agredir o técnico de gás.

  18. O depoimento da testemunha B. R., em audiência de julgamento em 18.09.2019 foi confuso, contraditório e nada claro.

  19. A testemunha B. R. teve um discurso confuso quando ao que acha que se passou, refere a simples ideia com que ficou do sucedido afirmando que não sabe se o técnico de gás caiu nem de como foi agredido.

  20. Apesar da sentença em crise considerar o testemunho de B. R. confuso, inexplicavelmente, entendeu valorar o depoimento da testemunha.

  21. Não se concorda nem se compreende que seja valorado o teor das declarações da testemunha B. R. que prestou um testemunho destruturado e sem qualquer noção concreta e precisa.

  22. A testemunha B. R. referiu por diversas vezes ao tribunal que estava muito esquecida e que não se lembrava dos factos em concreto, relatando uma vaga ideia com que tinha ficado, e sem pormenores de relevo do ocorrido, veja-se do minuto 32:16 ao minuto 32:51 do seu testemunho, onde não se lembra se o técnico de gás caiu e levanta a hipótese do recorrido ter um objeto para bater no técnico, depois afirmando sempre que não tinha a certeza do que dizia.

  23. Mostra-se assim, de forma evidente que, ou a testemunha B. R. não chegou a ver o corrido, ou tendo visto não se lembrava do sucedido, expressando apenas uma vaga ideia que tinha no momento em que estava a ser questionada em julgamento.

  24. Não se podendo olvidar que a referida testemunha foi várias vezes confrontada com a situação ao longo do tempo, pelas várias tentativas de inquirição no processo disciplinar, e assim ao longo do tempo pode ter firmado uma convicção de uma realidade que não presenciou (veja-se o referido no pontos 16 e 17 das presentes conclusões).

  25. Veja-se que após 38 minutos de inquirição, concretamente entre o minuto 38:18 e 45:37 das declarações da testemunha B. R., em audiência de julgamento, no dia 18.09.2019, ainda não se tinha conseguido chegar a uma conclusão válida face ao que efetivamente aconteceu.

  26. Paradoxalmente âmbito do processo disciplinar a testemunha B. R. assina um auto de declarações, a folhas 54 e 55 do processo disciplinar, onde referiu que não viu qualquer agressão, só viu o eletricista (técnico de gás) no chão a queixar- se do braço.

  27. Mais disse, no âmbito desse mesmo auto, que viu o eletricista no chão e que não viu nenhuma agressão, que não sabe se...

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