Acórdão nº 5319/17.9T8BRG.G de Tribunal da Relação de Guimarães, 23 de Abril de 2020

Magistrado ResponsávelROS
Data da Resolução23 de Abril de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam em conferência na 1ª seção cível do Tribunal da Relação de Guimarães: RELATÓRIO J. F., M. R.

, C. M.

E G. M.

intentaram a presente ação declarativa, sob a forma comum, contra F. L.

pedindo que se condene o Réu a indemnizar os Autores: 1. pelos danos patrimoniais no montante total de €304.567,17 acrescidos de juros de mora até integral pagamento, pelos seguintes prejuízos: a) € 35.237,17 referentes ao equipamento e material extraviado; b) 47.960,00, referentes à cultura destruída e ao não cultivo do prédio; c) €141.370,00, relativos aos edifícios demolidos, abandonados e mal conservados; d) € 80.000,00 referentes à mina de água; 2. no valor que lhe foi pago pelas entidades publicitárias que procederam à edificação e fixação de publicidade a liquidar em sede de sentença; 3. pelos danos não patrimoniais no montante global de €10.000,00.

Mais peticionam que o Tribunal ordene: 4. a extinção do usufruto do Réu sob o prédio descrito na conservatória do registo predial do concelho ... sob o n.º ..., inscrito na matriz urbana sob o n.º ... ..., pela perda total do mesmo, ou, em alternativa, 5. a extinção do usufruto do Réu sob o prédio descrito na conservatória do registo predial do concelho ... sob o n.º ..., inscrito na matriz urbana sob o n.º ... ..., pelo não cultivo do mesmo por mais de 20 anos, ou, em alternativa, 6. a entrega do prédio descrito na conservatória do registo predial do concelho ... sob o n.º ..., inscrito na matriz urbana sob o n.º ... ..., aos Autores pelo mau uso no âmbito do art.º 1482,º do C.C.

Como fundamento dos seus pedidos alegaram, em síntese, que são proprietários da raiz ou nua propriedade do prédio urbano, atualmente inscrito na matriz sob o art. ... da freguesia de ..., Barcelos, com a área total de 6435m2, do qual o Réu é usufrutuário desde 06.01.1995.

Com efeito, M. H. e marido A. R., pais do Autor J. F., doaram-lhe em 13.03.1986 a si e à esposa, segunda Autora, metade da nua propriedade conhecida por Quinta ... constituída por casa com dois pavimentos, eirado, estábulo, garagens, adega, arrecadações e quintal, no lugar da ....

Nessa doação foi incluída uma cláusula fideicomissária a favor dos filhos dos donatários, terceiros e quartos autores. O casal M. H. e marido A. R., em 06.01.1995, vendeu metade da nua propriedade e o usufruto total dos prédios identificados que, no conjunto, formam a Quinta ..., ao réu F. L..

No âmbito da ação de divisão de coisa comum que correu termos sob n.º 3608/05.4TBBCL no Tribunal Judicial de Barcelos, 3º Juízo Cível, em 20.01.2014, a dita Quinta ... foi dividida em três partes: parcela C), que foi adjudicado aos Autores (fiduciários e fideicomissários); parcela A), que foi adjudicada ao Réu e a parcela B), considerada indivisível, foi vendida através de propostas em carta fechada ao Réu, tendo o preço de venda sido dividido em partes iguais entre os Autores.

O prédio dos Autores, em 06.01.1995, era composto por edifícios, materiais e culturas com o valor de, pelo menos, €292.127,17, que o Réu destruiu, dissipou e não cultivou.

As edificações, encontravam-se à data (06.01.1995), em bom estado de conservação e valiam pelo menos €200,000,00.

Desde tempos imemoriais que se cultivavam na dita Quinta ... diversas culturas, com o intuito de as vender. O prédio gerava €12.440,00 de frutos anuais e deixou de produzir pelo não cultivo e destruição do prédio pelo Réu.

O prédio dos autores, em 06.01.1995, no seu conjunto de edificações, bens móveis e cultura existente valia, pelo menos, € 292.127,17.

Sucede que o réu impediu e ameaçou os Autores de entrar no prédio no período compreendido entre 06.01.995 e setembro de 2017. Até outubro de 2017 apenas conheciam o estado do seu prédio urbano através do exterior dos muros, aquando das suas visitas a Barcelos, quando eram informados por vizinhos. Foi assim que tiveram conhecimento que o prédio tinha sofrido alterações de cotas, estava cheio de entulho, coberto de silvas e mato e as edificações encontravam-se em ruínas. O cata vento existente no prédio encontra-se em situação de iminente derrocada, constituindo um perigo para pessoas e bens. Souberam que a Câmara Municipal de ... ordenou a reposição das cotas, face ao aterro ilegalmente feito pelo Réu, e a limpeza do prédio e que o Réu nada fez.

Entretanto, após 06.10.2017, os Autores tiveram conhecimento de que tinha havido extravio de equipamento e material, no valor de € 35.237,17 e que o prédio ficou inculto e por isso deixou de gerar o rendimento anual de € 12.440,00. Além disso, o réu destruiu por completo a ramada com ferro em T, arame e esteios em granito, bardos em arame e esteios em granito, custando a reconstituição € 35.520,00.

Em consequência, pelo menos durante 5 anos, os Autores ficarão privados de usufruir da produção da vinha e das árvores de fruto, cifrando-se o prejuízo decorrente da falta de cultivo no indicado período no valor corresponde ao valor da multiplicação do valor da cultura anual de € 12.440,00.

O Réu procedeu, ainda, à destruição de muros de vedação, cubos de granito assentes em massame por força da remodelação de terrenos efetuada; ramadas, os bardos e o caramanchão; não efetuou as obras de reparação ordinárias na garagem e habitação do motorista; não efetuou as obras de reparação ordinárias na vacaria e eira; não efetuou as obras de reparação ordinárias na pocilga; não efetuou as obras de reparação ordinária do anexo destinado ao alambique; não efetuou as obras de reparação ordinárias respeitantes ao catavento que se encontra em risco de derrocada.

A reposição da situação anterior à posse do Réu terá um custo para os Autores de € 200.000,00.

Mais alegam os Autores que o Réu, propositadamente, destruiu a linha de água de mina com nascente a 1 km de distância. É necessário levar a cabo trabalhos de limpeza da mina, abertura e fecho de valas, reparação de condutas, reparação de depósito mãe e reparação do depósito recetor final. A limpeza da mina, abertura e fecho de valas, reparação de condutas, reparação de depósito mãe e reparação do depósito recetor final e todos os trabalhos e materiais necessários a que a água volte a jorrar na propriedade, custa pelo menos € 80.000,00.

O Réu procedeu, também, à edificação de dois outdoors publicitários no prédio dos Autores, contra a sua vontade, provocando alteração do objeto do usufruto, posto que o prédio não tinha qualquer fim comercial. Este facto gerou nos Autores sentimentos de frustração e desrespeito e passaram a recear ir a ... devido ao gozo e comentários depreciativos que se ouviam nos cafés nas imediações do seu prédio. Sofreram de ansiedade privações de sono e perda de apetite por se sentirem tristes, por força da humilhação e gozo impostos pelo Réu.

Desde a data de colocação dos outdoors que os Autores filhos, nunca mais tiveram coragem de se deslocar ao seu prédio, devido aos comentários e vexame que sofriam com tal deslocação. Continuamente, os populares que ali se encontravam comentavam de forma audível que “nem no vosso prédio vocês mandam”.

O comportamento do Réu, enquanto usufrutuário, teve única e exclusivamente a intenção de desvalorizar o prédio, obrigando os coautores a venderem ao “desbarato” o prédio. Aliás, através de interposta pessoa, o Réu apresentou uma proposta de compra da propriedade aos Autores.

O Réu sabe o valor patrimonial e sentimental do prédio para os coautores, atuando com a intenção de destruir por completo o prédio dos Autores, provocando-lhes sentimento de receio, impotência e medo de não conseguir repor a sua propriedade como se encontrava antes do Réu a destruir. Tal sentimento causou profunda revolta e dor nos Autores, pois o seu prédio sempre pertenceu à sua família.

O prédio tem para os autores um valor sentimental não quantificável, pois ali moraram, passaram Natais, Páscoas e deram festas em família e amigos. A conduta do Réu levou os Autores a passarem noites sem dormir; causou discussões no seio familiar; obrigou os Autores a deslocarem-se por diversas vezes a Barcelos.

Consideram que o comportamento do Réu consubstancia um comportamento ilícito, na medida em que não respeitou a vontade e interesses dos proprietários Autores, deteriorando o imóvel por inércia, descuido e destruição. Ainda que a destruição e desvalorização do imóvel fosse devido a causas alheias ao Réu, este, enquanto usufrutuário, tem a obrigação de “avisar o proprietário de qualquer facto de terceiro, de que tenha notícia, sempre que ele possa lesar os direitos do proprietário; senão o fizer responde pelos danos que este venha a sofrer”. O comportamento ilícito do Réu, causou danos na casa, nos cobertos, nos bens imóveis e móveis, bem como na cultura existente no prédio, pelo que a sua conduta afetou a esfera jurídica dos proprietários. Tal conduta é fundamento de extinção do usufruto, seja pela perda total do prédio, seja pela falta de cultivo do prédio por mais de 20 anos, bem como, da peticionada indemnização aos Autores no valor de € 344.567,17, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos em decorrência da atuação do Réu.

*Regularmente citado, o réu contestou excecionando a sua ilegitimidade processual para os termos da ação desacompanhado da esposa, com quem casou em 1951 no regime da comunhão geral de bens.

Impugnou também os factos constitutivos alegados pelos Autores. Alegou, em síntese, que o réu e a esposa não são da família dos Autores e celebraram os contratos de compra e venda de metade da propriedade e do usufruto total da Quinta da ... não para irritar o Autor marido, mas porque a propriedade estava à venda. Não tiveram, nem têm, qualquer interesse, intenção, vontade, ou outra qualquer reação para humilhar, ofender, ter amizade, dar-se ou ser das relações dos Autores.

Só após trânsito em julgado da ação de divisão de coisa comum é que os Autores adquiriram a raiz do prédio (urbano) que lhe foi adjudicado por sorteio, sendo certo que o valor que no âmbito dessa ação foi atribuído ao prédio contrasta com aquele que os...

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