Acórdão nº 453/18.0T9VVD.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 09 de Março de 2020
Magistrado Responsável | AUSENDA GON |
Data da Resolução | 09 de Março de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam, em conferência, na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório 1.1. Nos autos supra identificados, a arguida M. F.
foi pronunciada pela prática de um crime de injúria, p. e p. pelo artigo 181.º, n.º 1 do Código Penal, no termo da instrução por esta requerida, na sequência da dedução de acusação pela assistente C. F., não acompanhada pelo Ministério Público.
1.2. Inconformada com a referida decisão, a arguida interpôs recurso cuja motivação rematou com as seguintes conclusões (sic): «1º) Nem no Inquérito, nem na Instrução, se apuraram factos suscetíveis de prova que pudessem constituir indícios de a Recorrente ter praticado o crime de injúrias, objecto da acusação particular e da pronúncia.
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) A admitir-se que tais factos indiciários foram apurados, jamais os mesmos podem ter-se por certos, seguros, e considerar-se suficientes, deles não resultando uma possibilidade razoável ou uma probabilidade mais forte de condenação do que de absolvição de, à recorrente, vir a ser aplicada, por força deles, em julgamento, uma pena ou uma medida de segurança.
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) No quadro circunstancial em presença, nem as regras da experiência, nem a livre apreciação do julgador, poderiam ter conduzido à ilação, lógica, congruente e minimamente segura, no quadro de factos indiciários suficientes e bastantes, de modo a que logicamente relacionados e conjugados, consubstanciem um todo persuasivo da culpabilidade da recorrente, de onde possa extrair-se com normal probabilidade que esta tenha chamado “ ladra” à recorrida ou que conduzissem à comprovação indiciária e suficiente do “animus injuriandi”.
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) O tribunal recorrido interpretou e aplicou erradamente o disposto nos artigos 127º. 283º, nrº2 e 308º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Penal, não tendo acolhido interpretação e aplicação daqueles preceitos legais de harmonia com os princípios legais e constitucionais da presunção da inocência da arguida – recorrente e do princípio “ in dubio pro reo”, com os quais não se conformou, e, antes, violou.
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) A douta decisão instrutória que pronunciou a recorrente, pelo crime de injúrias, violou o disposto dos artigos 124º nº1, 127º, 283º, nsº 1 e 2, 308º nº1, do Código Processo Penal, e bem assim, o disposto do artigo 32º, nº2 da Constituição da República Portuguesa, designadamente os princípios da presunção da inocência da arguida e o princípio “ in dubio pro reo”, que interpretou e aplicou por forma a não se compaginar, ou conformar, com aquela norma constitucional e princípios garantísticos da arguida-recorrente que nela se contêm, enfermando tal interpretação e aplicação, com o sentido plasmado no douto despacho impugnado, de inconstitucionalidade material.».
1.3. O recurso foi admitido por decisão que apreciou a reclamação deduzida pela arguida para este Tribunal da Relação.
1.4. O Ministério Público, junto da 1ª Instância, respondeu ao recurso, acompanhando e subscrevendo integralmente os fundamentos do recurso, dizendo, em síntese, que «qualquer juízo actual sobre a validade e suficiência dos indícios recolhidos nos autos, que se resumem às declarações da arguida e marido e da assistente e marido, para além de alguns documentos que ajudam a perceber o contexto em que os factos ocorreram, terá de concluir que, quanto muito, não há motivos que permitam dar prevalência à versão da assistente e, consequentemente, afirmar que a probabilidade de uma condenação em julgamento é maior do que a de uma absolvição.
» 1.5. A assistente também respondeu, pugnando pela improcedência do recurso interposto pela arguida, considerando sem fundamento o apelo ao princípio in dubio pro reo, na medida em que é perfeitamente possível, com os dados e com os elementos constantes dos autos, apurar, pelo menos indiciariamente, que aquela incorreu na prática do crime imputado na acusação particular.
1.6. Neste Tribunal, o Exmo. Sr. Procurador-Geral Adjunto emitiu fundamentado parecer acolhendo a argumentação do Sr. Procurador de 1ª Instância, asseverando que os indícios colhidos nos autos são de tal ordem ténues que não resta qualquer dúvida de que se a arguida fosse submetida a julgamento seria certamente absolvida, devendo ser negado provimento ao recurso e, consequentemente, revogada a decisão de pronúncia.
1.7. Cumprido o art. 417º, n.º 2, do CPP, a assistente apresentou resposta sustentando a pronúncia da arguida e, colhidos os vistos, o processo foi presente à conferência.
*II – Fundamentação Na medida em que o âmbito dos recursos se delimita pelas respectivas conclusões (art. 412º, n.º 1, do CPP), sem prejuízo das questões que importe conhecer oficiosamente, por obstarem à apreciação do seu mérito, suscita-se neste recurso a questão de aferir se a decisão recorrida fez uma correcta apreciação da prova indiciária recolhida à luz dos pressupostos do ilícito criminal em causa e, consequentemente, concluir pela sua suficiência ou insuficiência para sujeitar a arguida a julgamento.
Para tanto, deve considerar-se como pertinentes ao conhecimento do objecto do recurso os elementos considerados no seguinte trecho da decisão instrutória: «(…) Os autos tiveram início com a queixa inicial, na qual a ora assistente dava conta de que no dia 10/5/2018 pelas 16H00 num terreno anexo à casa da queixosa, a arguida, dirigindo-se-lhe disse: “ladra, deves-me 1000 euros”, o que fez com o fito de ofender a honra e consideração da queixosa.
Foi interrogada a arguida a fls. 21 e ss. e disse que não chamou ladra à queixosa, embora lhe tenha dito que lhe devia 1000€ relativos a uma dívida não paga de...
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