Acórdão nº 3614/17.6T8VCT-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelALDA MARTINS
Data da Resolução06 de Fevereiro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães: 1.

Relatório Em 31/10/2017, N. F.

veio participar acidente de trabalho ocorrido em 20 de Julho de 2017, pelas 12h30, em ..., Espanha, quando, prestando a sua actividade profissional de canteiro por conta de L. T., Unipessoal, Lda., estava em formação na empresa F. R., S.L., estando a responsabilidade emergente de acidentes de trabalho transferida pela sua empregadora para a X – Companhia de Seguros, S.A.

através de contrato de seguro de acidentes de trabalho titulado pela apólice n.º AT63655950.

Em 20/03/2018, a X veio recusar a responsabilidade pelo acidente, alegando que o mesmo não lhe foi participado e na respectiva data não tinha contrato de seguro com a empregadora do sinistrado.

Em 17/04/2018, a empregadora veio dizer que, ao contrário do invocado pela X, o acidente foi participado e a apólice referida na participação estava válida na respectiva data, acrescentando que a empresa espanhola onde o sinistrado estava ao abrigo dum acordo com a requerente é beneficiária dum seguro que cobre todos os riscos decorrentes da prestação de trabalhos nas suas pedreiras, pelo que o sinistro foi também participado à correspondente seguradora, a Y espanhola.

Na sequência de diligências determinadas pelo Ministério Público, a Y Seguros Generales interveio nos autos, juntando documentação clínica, apólice de seguro e acordo celebrado com o sinistrado.

O sinistrado foi submetido a exame médico-legal em 29/10/2018, informando o Senhor Perito que a sua finalização ficava dependente apenas de análise de documentos ainda não constantes dos autos, não sendo necessário voltar a examinar o sinistrado.

Em 22/11/2018, o Ministério Público lavrou a seguinte promoção: «N. F. participou acidente de trabalho ocorrido no dia 20/07/2017, pelas 12h30, em ..., Espanha, em consequência do qual sofreu amputação da perna direita.

Segundo a participação e documentos juntos, o sinistrado era trabalhador da L. T. Unipessoal, Lda., exercendo funções de pedreiro, mas na altura do acidente encontrava-se a receber formação por conta de F. R., S.L., com sede no Lugar de ..., ..., ..., Espanha.

Esta empresa faz parte de um grupo de empresas da qual também faz parte a BG., S.L., com sede em ..., ..., ..., Espanha.

Por sua vez, esta empresa tinha um contrato de seguro com a Y Seguros Generales, Sociedad Anonima de Seguros y ...seguros, com sucursal em Palma de Maiorca, Espanha, titulado pela apólice nº ..., que cobre os riscos da prestação de trabalhos nas suas pedreiras, incluindo responsabilidade civil por acidentes de trabalho, constando do contrato, como segurada adicional, a empresa F. R., S.L.

O sinistrado foi tratado em Espanha.

A fls. 91 e 92 veio juntar um acordo extrajudicial realizado entre ele, assistido por advogado, e a Y espanhola, pela quantia de €240.000,00, com a qual se declara totalmente ressarcido das consequências do acidente, nada mais tendo a reclamar, renunciando a quaisquer acções contra a Y e a BG., S.L.

Verifica-se, assim, que o acidente ocorreu em ..., Espanha, quando o sinistrado se encontrava ao serviço de F. R., S.L./ BG., S.L., ambas com sede em ..., Espanha, encontrando-se a responsabilidade decorrente de acidente de trabalho ocorrido com o sinistrado transferida para a Y, sucursal espanhola, com a qual já chegou a acordo extrajudicial.

A Y tem sede em França.

Estabelece o art. 10º nº 1 CPT que, na competência internacional dos tribunais de trabalho estão incluídos os casos em que a acção pode ser proposta em Portugal, segundo as regras de competência territorial estabelecidas neste código, ou terem sido praticados em território português, no todo ou em parte, os factos que integram a causa de pedir na acção.

E nos termos do art. 15º CPT, o tribunal competente para as acções emergentes de acidente de trabalho é o do local do acidente, devendo as respectivas participações ser dirigidas a esse tribunal. Se o acidente ocorrer no estrangeiro, a acção deve ser proposta em Portugal, no tribunal do domicílio do sinistrado. É também competente o tribunal do domicílio do sinistrado se ele o requerer até à fase contenciosa do processo ou se aí tiver apresentado participação.

Porém, de acordo com o art. 59º CPC, os tribunais portugueses são internacionalmente competentes quando se verifique algum dos elementos de conexão referidos nos arts. 62º e 63º ou quando as partes lhes tenham atribuído competência nos termos do art. 94º, sem prejuízo do que se encontre estabelecido em regulamentos europeus e em outros instrumentos internacionais.

Ora, temos o Regulamento(UE) n.º 1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho de 12/12/2012 relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial, que estabelece regras de competência internacional, pelo que, por força desse Regulamento são afastadas as normas de competência do Código do Trabalho.

As tribunais superiores já foram chamados a pronunciar-se sobre situações de competência internacional em casos de acidente de trabalho ocorrido noutros Estados-Membros com responsáveis doutros Estados-Membros, para concluir pela incompetência internacional em razão da nacionalidade dos tribunais portugueses.

E embora esses Acórdãos tenham sido proferidos no âmbito do Regulamento (CE) nº 44/2001, os fundamentos mantêm-se, uma vez que as regras nas quais se apoiam se mantêm.

Dispõe o art. 4º nº 1 Reg (UE) n.º 1215/2012 Sem prejuízo do disposto no presente regulamento, as pessoas domiciliadas num Estado-Membro devem ser demandadas, independentemente da sua nacionalidade, nos tribunais desse Estado-Membro.

Art. 5º nº 1 As pessoas domiciliadas num Estado-Membro só podem ser demandadas nos tribunais de outro Estado-Membro nos termos das regras enunciadas nas secções 2 a 7 do presente capítulo.

Art. 7º, nº 2 Em matéria extracontratual, perante o tribunal do lugar onde ocorreu ou poderá ocorrer o facto danoso.

Art. 11º, nº 1, al. b) O segurado domiciliado no território de um Estado-Membro pode ser demandado: b)Noutro Estado-Membro, em caso de acções intentadas pelo tomador do seguro, o segurado ou o beneficiário, no tribunal do lugar em que o requerente tiver o seu domicílio.

Pode ler-se no sumário do Ac. TRP de 12/09/2011, Proc. 1710/10.0TTPNF.P1, confirmado pelo Ac. STJ de 25/01/2012: I - O objecto do Regulamento (CE) nº 44/2001 do conselho, de 2000-12-22, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial abarca a matéria laboral.

II - Os tribunais portugueses são incompetentes em razão da nacionalidade para conhecer um incidente de revisão de incapacidade de acidente de trabalho, ocorrido em Andorra, ao serviço de uma empregadora com sede neste país, em que o sinistrado tem domicílio em Portugal e a seguradora tem sede em França.

E consta dos fundamentos do Acórdão Assim, atento o art. 2º do Regulamento, prevalece o foro da R., da seguradora, que é em França ou até o forum delecti, que é em Andorra, nos termos do Art. 5º, nº 3 do mesmo diploma, afastando a competência internacional do tribunal do trabalho português. Na verdade, qualquer uma das conexões não conduz à competência internacional dos tribunais portugueses. Verifica-se, destarte, a incompetência do tribunal em razão da nacionalidade, o que determina a incompetência absoluta do mesmo e integra excepção dilatória, a implicar a absolvição da instância da seguradora, atento o disposto nos Arts. 101º, 102º, nº 1, 105, nº 1, 228º, nº 1, alínea a), 494º, alínea a) e 495º do Cód. Proc. Civil. Nem se diga, como o apelante, na conclusão 17ª do recurso que 17. .Há lugar à aplicação do factor de conexão previsto no Arigo 9º/1, al. b), Seccção 3 (Competência em Matéria de Seguros) do Regulamento (CE)nº 44/2001, de 22 de Dezembro, refere o seguinte: O segurado domiciliado no território de um estado-membro pode ser demandado: (.) b) noutro Estado-Membro, em caso de acções intentadas pelo tomador do seguro, o segurado ou o beneficiário, no tribunal do lugar em que o requerente tiver o seu domicílio.

Na verdade, pretendendo o sinistrado efectivar a revisão da sua incapacidade por acidente de trabalho contra a seguradora para a qual se encontra transferida a responsabilidade infortunística da empregadora, certo é que nenhum litígio existe quanto ao contrato de seguro. Pois, como se vê do relatório que antecede a seguradora assumiu a sua responsabilidade, tendo tratado o sinistrado, pelo que a única responsabilidade aqui em causa é a derivada do acidente de trabalho. Daí que a matéria em discussão não seja de seguros, mas infortunístico-laboral, não sendo aplicável, por isso, a norma...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT