Acórdão nº 770/18.0T8LSB.L1-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 13 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelCARLA MENDES
Data da Resolução13 de Fevereiro de 2020
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na 8ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa A [ ….Crédito Popular, S.A] , propôs acção de simples declaração negativa contra B [ ….Sociedade S.R..Lda. ] , C [ ….Banco,S.A.] e D [ Banco …..] , pedindo que se declare que o arrendamento titulado pela autora e posterior ao registo de hipoteca tituladas pelos réus Bancos, mas anterior às penhoras realizadas no âmbito do processo executivo 28597/16.6T8LSB, Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa – Instância Central, 1ª secção de Execução – 17, não caduca com a venda que venha a ocorrer nesse processo.

Nas contestações os réus defenderam a caducidade do arrendamento em caso de venda no processo de execução, tendo os réus B e C , arguido a excepção de litispendência e a falta de interesse em agir, respectivamente.

Em sede de audiência prévia foi proferido despacho saneador que julgando improcedentes as excepções, elaborou os temas de provas.

Após julgamento foi proferida sentença que, julgando a acção procedente, declarou que o arrendamento titulado pela autora e posterior aos registos das hipotecas tituladas pelos réus Bancos, mas anterior às penhoras realizadas no âmbito do processo de execução 28597/16.6T8LSB, Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa – Instância Central, 1ª secção de Execução – 17, não caduca com a venda que venha a ocorrer nesse processo – fls. 209 e sgs.

Inconformados, apelaram os réus, formulando as seguintes conclusões: Réu C 1. Vem o presente recurso interposto da Sentença proferida em 25.07.2019, com a referência nº 386322646 pelo Tribunal a quo que, em suma, julgou a presente ação procedente e, em consequência, declarou que o arrendamento titulado pela Autora e posterior ao registo das hipotecas tituladas pelos Réus C e D , mas anterior às penhoras realizadas no âmbito do processo nº 28597/16.6T8LSB, a correr termos pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Lisboa – Instância Central, 1ª Secção de Execução – J7, não caduca com a venda que venha ocorrer no âmbito do processo de execução promovido pelos Réus.

  1. Com efeito, entende o ora Recorrente que decisão diferente se impunha, designadamente, por não ter sido feita uma correcta subsunção dos factos ao direito.

  2. Ora, o thema decidendum dos presentes autos é o de saber se o contrato de arrendamento celebrado entre o Autor e a Ré B que incide sobre as fracções “A” e “ B” do prédio urbano sito na Rua do Arco do Marquês de Alegrete, nºs 6, 6ª a 6O, da freguesia de S. Cristóvão e S. Lourenço, concelho de Lisboa, descrito na Sexta Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º 3 e inscrito na matriz sob o artigo 1760º, da freguesia de Santa Maria Maior, posterior às hipotecas dos RR C e D, caduca ou não com a venda judicial que venha a ocorrer no âmbito do processo de execução n.º 28597/16.6T8LSB, onde é exequente e credor reclamante as aludidas instituições bancárias aqui demandadas.

  3. Ora, a maioria dos tribunais portugueses tem decidido no sentido da aplicação do artigo 824/2 CC, e dessa forma fazerem caducar o arrendamento, quando constituído anteriormente ao registo da penhora e posteriormente ao registo da hipoteca que lhe serve de base.

  4. No caso em concreto, o arrendamento foi constituído depois da hipoteca, mas antes do registo da penhora e coloca-se a questão de se saber se deve ou não manter-se a decisão de 1ª instância que fez caducar o contrato de arrendamento por este se compreender integrado no artigo 824/2 CC.

  5. Ora, apesar de não se poder considerar o arrendamento como um direito real, pois é, como tem entendido a maioria da jurisprudência e da doutrina, um direito de cariz obrigacional, terá que ponderar-se devidamente se essa conclusão o excluirá de se integrar na norma em apreço (o artigo 824/2 CC).

  6. Tendo a doutrina e jurisprudência sido unânime que entendimento pela natureza do direito do arrendatário, deve considerar-se integrado no artigo 824/2 CC, à luz de uma interpretação extensiva, por analogia.

  7. Pois não se vê o fundamento de não fazer caducar uma oneração tão gravosa para o credor hipotecário e tão limitativa do prédio, como é o arrendamento, invocando-se para tal consideração o artigo 695 CC.

  8. Em suma, a doutrina e jurisprudência têm sufragado, de forma unânime, que com a venda judicial em processo executivo de imóvel hipotecado, caduca o arrendamento celebrado posteriormente à hipoteca, “por na expressão «direitos reais» mencionada no artigo 824/2 CC, se incluir, por analogia, aquele arrendamento.

  9. Veja-se pois, quanto a esta temática e de acordo com o entendimento acima enunciado o Acórdão do TRG, datado de 14.05.2009, Ac. do TRC (Proc. 3624/05.6TBLRA-B.C1 – Relator Manuel Capelo), datado de 01.06.2010, Ac. do TRC (Proc. 6/09.4TBCBR.C1 – Relator Maria Inês Moura), datado de 26.02.2013, Ac. do TRC (Proc. 6699/06.4TBND-A.C1 – Relator Hélder Roque), datado de 2.10.2008, cuja consulta se encontra disponível in www.dgsi.pt.

  10. Quanto esta mesma problemática, em torno de se saber se o contrato de arrendamento caduca ou não com a venda executiva de imóvel hipotecado, mostra-se igualmente unânime no Tribunal da Relação de Lisboa, pelo menos a partir de 2007, considerando que na expressão “direitos reais” na norma do artigo 824/2 CC deverá incluir-se o arrendamento, quer o que esteja sujeito a registo, quer aquele que não esteja sujeito a registo. Embora, se considere, como a maioria da doutrina e jurisprudência, que o arrendamento é um direito de crédito, conclui-se ser unânime que deve aplicar-se o artigo 824/2 CC, por analogia, aos arrendamentos, pois não seria justo uma oneração tão pesada comos esta “escapar” e ficar intocável com a venda executiva do imóvel hipotecado.

  11. No mesmo sentido vide os Acórdãos do TRL datados de 28 de setembro de 2006; de 22 de fevereiro de 2007; de 26 de junho de 2008; de 30 de abril de 2009; de 20 de janeiro de 2011; de 24 de maio de 2012 e de 14 de março de 2013, cuja consulta de todos eles se encontra disponível in www.dgsi.pt.

  12. E na mesma senda vide o Ac. do STJ, datado de 05.02.2009, cuja consulta se encontra disponível in www.dgsi.pt, que nos diz que: “O arrendamento constituído depois do registo da hipoteca do prédio, no qual se incluem os espaços arrendados, caduca com a venda executiva deste.

    ” 14. Sendo ainda que o Acórdão do STJ, datado de 09.07.2015, cuja consulta se encontra disponível in www.dgsi.pt, é referido que: “Com a venda judicial de um imóvel hipotecado que tenha sido dado de arrendamento a terceiro após o registo da referida hipoteca, caduca o direito do respectivo locatário, nos termos do n.º 2 do art. 824.º do CC” 15. E o Acórdão do STJ, datado de 22.10.2015, cuja consulta se encontra disponível in www.dgsi.pt, refere que: “(...) V - O STJ, preocupado sobretudo com a dimensão real do arrendamento, vem decidindo uniformemente que com a venda judicial de um imóvel hipotecado que tenha sido dado de arrendamento a terceiro após o registo da referida hipoteca caduca o direito do respectivo locatário, nos termos do n.º 2 do art. 824.º do CC.

    VI - Tendo a arrendatária celebrado dois contratos de arrendamento – um anterior e outro posterior ao registo da hipoteca –, uma vez que a celebração do segundo contrato de arrendamento só pode ter como pressuposto, ou como efeito, a extinção ou cessação do primeiro, o contrato de arrendamento a considerar é o posterior à hipoteca o qual, face ao referido em V, caducou com a venda judicial da fracção a que respeita.” 16. E por último o Acórdão do STJ, datado de 15.02.2018, cuja consulta se encontra disponível in www.dgsi.pt, que refere que: “I - O contrato de arrendamento de bem imóvel, com hipoteca registada em data anterior, caduca com a venda judicial, nos termos do art. 824.º, n.º 2, do CC.

    II - Não obstante o arrendamento não assuma a natureza de um direito real, a tese da não caducidade não é a que melhor responde às exigências de justiça, nem aos interesses teleologicamente detectáveis no art. 824.º, n.º 2, do CC, cuja ratio é a de os bens vendidos judicialmente serem transmitidos livres de quaisquer encargos.” 17. Atento todos os arestos acima citados, entre muitos outros que se poderiam citar, parece inequívoco que o arrendamento constituído e registado (se for necessário registo) antes do registo da penhora mas depois da constituição e registo da hipoteca deverá caducar por força do artigo 824/2 CC.

  13. Contudo, mesmo que este não fosse o entendimento a perfilhar, o que atento o supra exposto não é o caso, e considerássemos que o direito do arrendatário se trata de um direito pessoal ou de crédito, cumpre referir a posição defendida pelo Prof. Oliveira Ascensão2 no sentido de poder recorrer-se à analogia e interpretar extensivamente a norma constante do artigo 824/2 CC.

  14. Teríamos que equiparar o arrendamento aos direitos reais de gozo, pelas suas similitudes, pois o arrendamento é um direito, indubitavelmente, de essência inerente, e daí poderíamos inclui-lo no conceito de “direitos reais” em referência naquela norma.

  15. Acresce ainda que, o arrendatário, ao tomar de arrendamento das fracções em apreço, não devia ignorar ou desconhecer o facto de aqueles imóveis estarem já sujeitos a duas onerações, ou seja, ser objeto de duas garantias hipotecárias.

  16. Com efeito, o artigo 824/2 CC deve aplicar-se ao arrendamento até pelo princípio da adequação. A eficácia da hipoteca não podia ficar prejudicada por se entender que um direito de gozo menor, limitativo do direito de propriedade, não se integrasse na norma do artigo 824/2 CC.

  17. A finalidade do artigo 824/2 CC é a de fazer extinguir todos os direitos que...

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