Acórdão nº 8592/17.9T8CBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 11 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelISA
Data da Resolução11 de Fevereiro de 2020
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam neste Tribunal da Relação de Coimbra I- Relatório 1. No Tribunal Judicial da Comarca de Coimbra – Juízo Local Cível de Coimbra, os autores, J...

, divorciado, e R...

, divorciada, residentes na Rua ..., instauraram (em 16/11/2017) contra a ré, C...

, com sede na Rua ...

, a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, pedindo a condenação desta última a: a) Restituir ao autor a quantia de €21.036,17; b) Restituir à autora a quantia de €9.954,01; c) Restituir as aludidas importâncias acrescidas de juros à taxa legal acrescidos de dez pontos percentuais desde a data em que foram executadas as operações não autorizadas até integral pagamento e que, à data da propositura da ação, ascendem a €2.477,07 e € 1.172,12, respetivamente; d) Pagar uma indemnização a cada um dos autores por danos não patrimoniais no valor de €2.500,00, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.

Para tanto, e em síntese, alegaram: Viverem em união de facto, em condições análogas às dos cônjuges, e enquanto clientes da ré eram então titulares de duas contas de depósitos à ordem e uma conta de depósitos a prazo (que melhor identificam), sedeadas no balcão do ..., em Coimbra.

No ano de 2016, e após ter sido convencido para tal pela sua gestora de conta (na base de uma relação de confiança que se estabelecera entre ambos) que lhe deu conta das vantagens daí resultantes, o autor aderiu ao serviço homebanking fornecido pela ré (conhecido por serviço Net 24), que lhe permitia realizar operações bancárias por via da internet.

Acontece que no dia 11/01/2017 o autor recebeu um telefonema da sua gestora de conta, dando-lhe conta da necessidade de comparecer imediatamente no aludido balcão da ré, alegando que haver uns problemas com as aludidas contas o que veio a fazer.

Aí foi informado pela sua gestora de conta e pelo gerente do balcão que as referidas contas tinham sido alvo de um “ataque informático”, exibindo-lhe extratos das mesmas, tendo o autor então constatado uma série de operações de transferências e pagamentos que não foram por si ordenadas ou autorizadas e que ocorreram entre os dias 3 e 11 de janeiro de 2017, num total de €21.036,17.

Também a conta à ordem titulada pela autora fora alvo de operações de débito, não ordenadas nem autorizadas, entre os dias 3 e 5 de janeiro de 2017, num total de €9.954,01.

Numa das outras idas ao balcão da ré foi comunicada ao autor a receção de uns códigos e cartão do aludido serviço que lhe foram entregues, sem que então nenhuma informação lhe tenha sido comunicada/dada ao nível dos procedimentos a adotar e nomeadamente no que concerne àqueles referentes à segurança (apenas lhe tendo sido dito que teria que introduzir tais dados sempre que quisesse aceder ao site).

Que naquele citado dia dia 11 de janeiro, os identificados colaboradores da ré perguntaram ao autor se havia recebido algum email por parte do Banco, ao que o autor respondeu recordar-se de o ter recebido, tendo posteriormente reenviado o mesmo para aquela sua gestora de contra.

No dia 8 de novembro de 2016, pelas 13h34, o autor recebeu um email proveniente de “M...pt”, pelo que, confiando tratar-se de um email fidedigno que lhe havia sido remetido pela ré, terá “clicado” sobre os dizeres “ACTIVAR CARTÃO MATRIZ”, que o reencaminhou para a página/site da ré, tendo seguido as instruções que lhe foram dadas.

Autores que responsabilizam a ré por terem sido desfalcados daquelas importâncias, que se tem vindo a recusar a pagar-lhas/repô-las, e pelos danos não patrimoniais que sofreram em consequência dessa situação, e cuja indemnização igualmente reclamam nos termos acima peticionados.

2. Contestou a ré, defendendo-se por impugnação.

Na sua essência, e com relevância, negou qualquer responsabilidade pelo sucedido aos AA. – com as operações de transferência e pagamentos indevidos de que foram alvo as suas contas, nos termos que se deixaram exarados -, alegando ter cumprido com todas as suas obrigações técnicas e legais a que estava vinculada, inexistindo da sua parte qualquer quebra de segurança na criação, gestão e execução de operações no seu sitio informático, tendo prestado todas as informações necessárias aos AA. para acederem de forma segura àquelas suas contas, através do serviço homebanking que lhes disponibilizou, pelo que tal situação se ficou exclusivamente a dever à utilização imprudente/negligente que o A. fez desse serviço (“Net 24”) e do acesso ao mesmo, o que permitiu que terceiros, apropriando-se dos respetivos códigos, tivessem acesso às referidas contas e as movimentassem nos termos que que se deixaram referidos, sem a que a ré nada pudesse fazer para a tal obstar.

Terminou pedindo a improcedência da ação, com a sua absolvição do pedido.

3. Na audiência prévia foi proferido o despacho saneador, onde se afirmou a validade e a regularidade da instância, após que se fixou o objeto do litígio e se enunciaram os temas de prova, sem que tivesse sido alvo de qualquer reclamação.

4. Realizou-se a audiência de discussão e julgamento (com a gravação da mesma).

5. Seguiu-se a prolação da sentença que, no final, decidiu julgar a ação parcialmente procedente e, em consequência, condenar a ré a pagar: « 1.

Ao Autor: a) A quantia de €21.036,17 (vinte e um mil e trinta e seis euros e dezassete cêntimos), acrescida da quantia de €2.477,07 (dois mil quatrocentos e setenta e sete euros e sete cêntimos), bem como de juros de mora, à taxa legal sobre a quantia de € 21.036,17, acrescida de dez pontos percentuais, desde a citação até integral pagamento, a título de danos patrimoniais; b) A quantia de €2.000,00 (dois mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a presente decisão até integral pagamento, a título de danos não patrimoniais; 2.

À Autora: a) A quantia de €9.954,01 (nove mil novecentos e cinquenta e quatro euros e um cêntimo), acrescida de €1.172,12 (mil cento e setenta e dois euros e doze cêntimos), bem como de juros de mora, à taxa legal sobre a quantia de €9.954,01, acrescida de dez pontos percentuais, desde a citação até integral pagamento, a título de danos patrimoniais; b) A quantia de €2.000,00 (dois mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a presente decisão até integral pagamento, a título de danos não patrimoniais; Absolvendo a ré do demais peticionado.

» 6.

Inconformada com tal sentença, a ré dela apelou, tendo concluindo as suas alegações de recurso nos seguintes termos: ...

7.

Contra-alegaram os autores (fls. 143/153 do processo físico), pugnando pela improcedência total do recurso e pela manutenção do julgado.

8. Corridos os vistos legais, cumpre-nos, agora, apreciar e decidir.

II- Fundamentação 1. Do objeto do recurso 1. Como é sabido, e é pacífico, é pelas conclusões das alegações dos recorrentes que se fixa e delimita o objeto dos recursos, pelo que o tribunal de recurso não poderá conhecer de matérias ou questões nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso (cfr. artºs. 635º, nº. 4, e 639º, nº. 1, e 608º, nº. 2 – fine -, do CPC).

1.1 Ora, calcorreando as conclusões das alegações do recurso da R./apelante, verifica-se que as questões nelas colocadas e que cumpre aqui apreciar são as seguintes: a) Da impugnação/alteração da decisão da matéria de facto; b) Da responsabilidade da ré (pelos danos, e sua indemnização, que os autores alegam ter sofrido).

2.

Factos dados como provados pelo tribunal da 1ª. instância.

...

3. Quanto à 1ª. questão.

3.1 Da impugnação/alteração da decisão da matéria de facto.

A ré impugna a decisão proferida sobre a matéria de facto, no que concerne aos pontos a seguir indicados, alegando, quanto a eles, ter o tribunal a quo procedido a uma incorreta apreciação da prova produzida (a qual indica para suportar essa mesma impugnação e o sentido da decisão que entende dever ser proferida sobre os mesmos).

A prova produzida nos autos é natureza documental e testemunhal, acrescida ainda da declarações de parte do A. marido.

Importa, desde já, referir que não estamos perante factos sujeitos a prova vinculada; pelo que estão sujeitos (no que concerne à prova produzida) à livre apreciação do tribunal.

Procedemos à audição integral do registo da prova produzida em audiência de julgamento (através do suporte áudio que nos foi remetido para o efeito).

E desse registo de gravação, verificamos que em audiência de julgamento foram ouvidos: ...

Devemos dizer que, ouvida tal gravação, a descrição feita na sentença sobre o teor das declarações do A. e depoimentos das referidas testemunhas corresponde, a nosso ver, à essência daquilo que mais de relevante disseram em audiência de julgamento.

3.2 Passemos, agora, à enunciação dos concretos pontos impugnados da decisão da matéria de facto e à sua apreciação.

...

Termos, pois, em que se decide julgar parcialmente procedente a impugnação deduzida à decisão da matéria de facto proferida pelo tribunal a quo, na exata medida em que atrás se deixou exarado.

Pelo que, de seguida, se passará a proceder, em conformidade, à descrição da matéria de facto dada (definitivamente) como assente/provada, e com a alteração da sua numeração, daí decorrente 4.

Os Factos (definitivos) Provados 1. Os autores vivem em comunhão de mesa e habitação, em condições análogas às dos cônjuges, há mais de 20 anos; 2. A ré é uma instituição de crédito, da espécie caixa económica, que exerce profissionalmente actividade bancária; 3. Há data dos factos, a seguir descritos, os autores eram clientes da ré, sendo então titulares das seguintes contas (sedeadas no Balcão da mesma sito em ...): a) De depósitos à ordem nº ..., titulada pelo autor, constando a autora como autorizada; b) De depósitos à ordem nº ..., titulada pela autora, constando o autor como autorizado; c) De depósito a prazo ..., titulada pelo autor.

4. No dia 1 de Janeiro de 2017, a conta nº ..., titulada pelo autor, apresentava um saldo credor de valor baixo uma vez que era uma conta muito pouco utilizada por este, quase...

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