Acórdão nº 35/18.7T8VRL-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 16 de Janeiro de 2020

Magistrado ResponsávelMARGARIDA ALMEIDA FERNANDES
Data da Resolução16 de Janeiro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I – Relatório S. M.

, casado, residente na Rua … Amarante, instaurou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma comum, contra M. L.

, residente no lugar da … Mondim de Basto, pedindo a declaração de nulidade do testamento outorgado por S. M. em 17/03/2014 ou, caso assim não se entenda, a declaração de anulabilidade, alegando que nesta data já o falecido não tinha capacidade para querer e entender o alcance do acto.

A ré apresentou contestação.

Foi dispensada a audiência prévia. Foi proferido despacho saneador, foi fixado o objecto da acção, enunciados os temas da prova e foram admitidos os requerimentos probatórios.

*Na sessão de julgamento de 25/09/2019, após ter o tribunal recorrido identificado a testemunha J. M.

, as partes pronunciaram-se acerca da sua inquirição tendo o autor defendido que poderia haver conflito de interesses e tendo a ré adoptado posição contrária.

Após, foi proferida a seguinte decisão: “A testemunha indicada confirmou que usa o nome profissional J. M. sendo advogado.

Tendo estado a analisar os presentes autos verifico que corre termos uma acção declarativa sob a forma de processo comum no Juízo Central de Penafiel 1296/17.4T8AMT.

Nesse processo é autora a aqui ré e são réus o aqui autor e esposa (inquirida nestes autos na qualidade de testemunha).

Com a petição inicial oferecida nesses autos foi junta a procuração de fls. 38/vº mediante a qual foram conferidos poderes à aqui testemunha, bem como ao Ilustre Mandatário que subscreve a contestação no processo 35/18.7T8VRL.

É certo que com a contestação foi junta outra procuração (fls. 25) na qual consta como mandatário forense apenas o Srº Drº C. S., sendo outorgada com data posterior.

De notar ainda que não ocorreu, segundo se sabe, a revogação ou renúncia do mandato conferido à testemunha. Este circunstancialismo coloca-nos uma dificuldade que vai para além da questão de saber se o Srº Advogado está ou não impedido de depor em virtude do sigilo profissional.

O Srº Bastonário da Ordem dos Advogados A. C. na obra do Segredo Profissional da Advocacia pág. 82/83 escreveu o seguinte: “Deverá deixar-se bem claro que é inaceitável autorizar a depor um Advogado para prestar depoimento em processo no qual esteja constituído.

É que, embora não haja disposição expressa que o proíba, afigura-se-nos que isso seria completa subversão do próprio sistema processual, em que o Advogado, entre nós, se não pode nunca confundir com simultânea testemunha. E seria outrossim altamente desprestigiante para a Advocacia.

Quer isso, pois, dizer que ao Advogado incumbe ponderar e prever, antes de propor a acção, as principais condicionantes do seu decurso. Se o seu depoimento veio a tornar-se necessário, muito mal estruturou o seu trabalho e não pode já emendar a mão. A absoluta necessidade não pode resultar, nesse caso, do modo como foi proposta a acção e antes deve ser aferida objectivamente.

Isso também se aplica a outro tipo de situações que na essência não diferem da que analisámos. Referimo-nos a que não será lícito obter dispensa para depor ao Advogado que, tendo iniciado o processo com procuração aí junta, trata de substabelecer depois sem reserva para esse efeito. Seria incompreensível a todas as luzes que ele pudesse despir a toga, sair formalmente do processo e passar a sentar-se no banco das testemunhas em vez de na bancada prestigiada que em antes ocupara.

Igual solução merece o caso de a pretensão de depor incidir apenas em apenso da acção principal, ainda que iniciado só depois do substabelecimento (em providência cautelar, embargos, incidente da instância, etc.).” No caso que nos traz aqui de facto não foi junta procuração forense a favor da testemunha, mas tratando-se de alguém que noutros processos contra o aqui autor representa a mesma parte não vejo razão para solução diversa, pois são válidas as mesmas restrições.

Temos mais de que um processo entre estas partes e não é pela circunstância de não ter sido junta procuração forense a favor da testemunha nestes autos que se pode ignorar que se trata de Mandatário da parte.

Não se trata aqui, a meu ver, de uma compressão desproporcionada do direito de defesa da ré, pois a questão radica a montante, devendo sim é questionar-se se o Srº advogado deve aceitar ser testemunha de um testamento, prevendo que mais tarde possa existir um conflito quanto a tal testamento que implique o exercício de um mandato forense.

Aliás, são recorrentes as situações em que a jurisprudência não tem admitido que um advogado possa em simultâneo representar um constituinte e ser testemunha nomeadamente no Acórdão de 30/01/2017 do Tribunal da Relação do Porto Relator Carlos Gil (processo 881/13.8TYVNG-A.P1) e nas decisões aí citadas.

Refira-se ainda que não existe qualquer problema de caso julgado formal, pois limitei-me a admitir o rol de testemunhas sem qualquer pronúncia específica acerca desta questão, e como se diz no Acórdão de 30/01/0 2017, apenas se forma caso julgado formal relativamente às questões concretamente conhecidas.

Termos em que, considerando o exposto, decido não admitir o depoimento da testemunha.

Notifique.”*Não se conformando com esta sentença veio a ré dela interpor recurso de apelação, apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões: “1. A questão a decidir nesta apelação consiste apenas em saber se um advogado, com mandato num dado processo, está impedido de depor como testemunha num outro processo que não patrocina, mas onde figura como parte a sua constituinte, na primeira daquelas ações.

  1. No despacho recorrido o Tribunal a quo decidiu não admitir o depoimento da testemunha J. M., oportunamente indicada pela Ré.

  2. louvando-se nas razões invocadas pelo Sr. Bastonário da Ordem dos Advogados, A. C., em estudo onde se considera não ser de autorizar um Advogado a depor em processo no qual esteja constituído.

  3. Em causa nestes...

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