Acórdão nº 1835/18.3T8TMR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 16 de Janeiro de 2020

Magistrado ResponsávelEM
Data da Resolução16 de Janeiro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1]♣Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias Transformadoras, Energia e actividades do Ambiente do centro Sul e Regiões Autónomas (SITE) (A.) intentou a presente acção declarativa de condenação, emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma de processo comum, contra “Mitsubishi Fuso Truck Europe”(R.), solicitando, a final, que: - a R. seja condenada a anular o MAPP – Mecanismo de Ajustamento ao Planeamento da Produção, por o mesmo ser ilegal, com efeitos reportados a01-01-2018, sendo impedida de proceder à sua aplicação aos trabalhadores associados do A. e que não o aceitam.

Para o efeito, alegou, em síntese, que o A. é uma associação sindical na qual estão associados inúmeros trabalhadores que exercem a sua actividade profissional na R., tendo esta entregue a todos os seus trabalhadores, para estes assinarem, um documento datado de 26-11-2017, designado MAPP, para vigorar entre 01-01-2018 e 31-03-2019, no qual estabelecia alterações ao horário de trabalho através de um sistema de crédito de horas, sendo tais alterações ilegais, pelo que não podem ser aplicadas aos trabalhadores associados do A. e que não as aceitaram.

Alegou ainda que o sábado é o dia de descanso semanal complementar, sendo o horário que sempre vigorou na R. de segunda a sexta-feira, com sábado e domingo como dias de descanso semanal, pelo que a R. não podia ter determinado a obrigatoriedade dos trabalhadores passarem a trabalhar 8 horas ao sábado.

…Realizada a audiência de partes, não foi possível resolver por acordo o litígio.

…A R. contestou solicitando, a final, que fosse julgada procedente a invocada inutilidade superveniente da lide, extinguindo-se a instância e absolvendo-se a R. da mesma, ou, caso assim se não entenda, que seja julgada totalmente improcedente a presente acção, absolvendo-se a R. do pedido.

Em síntese, invocou a inutilidade superveniente da lide, uma vez que uma decisão sobre a invocada nulidade do MAPP só será proferida após 31-03-2019, ou seja, após o MAPP ter deixado de produzir efeitos, devendo, por isso, determinar-se a extinção da instância, nos termos do art. 277.º, al. e), do Código de Processo Civil.

Na contestação por impugnação, alegou, em síntese, que devido às características específicas das sua actividade tem vindo a recorrer a mecanismos de bancos de horas desde, pelo menos, 2015, sendo esse o caso do MAPP, tendo mais de 75% dos seus trabalhadores aderido ao mesmo, razão pela qual foi o mesmo aplicado a todos os seus trabalhadores, não sofrendo o mesmo de qualquer ilegalidade, não sendo de confundir banco de horas com horário de trabalho.

…O A. respondeu à excepção deduzida de inutilidade superveniente da lide, pugnando pela sua improcedência, salientando que o MAPP vigorará na R. até 31-03-2019, pelo que não ocorreu qualquer facto na pendência da instância que possa ser considerado superveniente e que impossibilite a manutenção da lide, a que acresce a circunstãncia de o A. ter pedido a condenação da R. a anular o MAPP com efeitos reportados a 01-01-2018, ou seja, à data da sua entrada em vigor e não à data do seu términus.

…Realizada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador, onde se procedeu à selecção da matéria de facto entre assente e controvertida.

…O tribunal respondeu à matéria de facto em 08-04-2019 e proferiu sentença em 13-05-2019, com o seguinte teor decisório: Pelos fundamentos de direito e de facto supra mencionados, julga-se a ação parcialmente procedente e, em consequência: 1) Declara-se nula e de nenhum efeito com respeito aos trabalhadores referidos em 4) dos factos provados a cláusula 1.3, al. b) do MAPP – Mecanismo de Ajustamento ao Planeamento da Produção, com efeitos reportados a 01/01/2018, devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente; 2) No mais, absolve-se a ré do peticionado pelo autor; 3) Julga-se improcedente a extinção da instância com fundamento em inutilidade superveniente da lide; 4) Condeno o autor e a ré no pagamento das custas, na proporção do decaimento, sendo 75% da responsabilidade do primeiro e de 25% da responsabilidade da segunda.

…Não se conformando com a sentença, veio o A. interpor recurso de apelação, terminando as suas alegações com as conclusões que se seguem: 1.

A presente apelação incide apenas sobre a parte da sentença condenatória em que reduz os efeitos da condenação aos trabalhadores referidos em 4) dos factos provados; e incide também sobre a restante matéria de que decidiu absolver a R.

  1. A sentença fez uma incorrecta interpretação dos factos provados e uma errada aplicação do Direito aos mesmos.

  2. Entende, incorrectamente, a sentença que a decisão se deve aplicar apenas aos trabalhadores associados do A. referidos em 4) dos factos provados, mas a decisão deve incidir sobre o universo de trabalhadores associados do A. que prestam trabalho na R. e que não aceitaram o MAPP.

  3. Decidir restringir a sua decisão apenas ao núcleo retricto dos trabalhadores que aceitaram que o A. os representasse na presente acção é restringir, colocando em causa, à partida o direito de representação conferido pelo citado artigo 5º do CPT.

  4. Mesmo que o MAPP seja considerado um verdadeiro “banco de horas” este nunca poderá ser qualificado como um “banco de horas” grupal, devido à inexistência de IRCT, - nos termos do artigo 208º do CT (redação da Lei 23/2012) o “banco de horas” só pode ser criado por um IRCT -,pelo que é manifestamente ilegal qualquer “banco de horas” grupal, não podendo aplicar-se aos trabalhadores que o não aceitem ainda que ele tenha sido aceite por 75% dos trabalhadores (artigos 208º, 208º-A e 208º-B do CT).

  5. A única conclusão a que se pode chegar é que o MAPP poderá ser, na melhor das hipóteses, um “banco de horas” individual, ou seja pode ser aplicado a quem o aceitar, mas a mais ninguém.

  6. A duração do trabalho deve ser apurada por referência ao período que esteja fixado em IRCT, no máximo de 12 meses, ou na falta de previsão (é o caso dos autos) por um período de 4 meses – sendo este o período de referência - (artigo 207º do CT), e como o período de referência do MAPP é de 15 meses, este período é absolutamente ilegal por violação ao artigo 207º do CT.

  7. O MAPP só pode consubstanciar-se num “banco de horas” individual, mas absolutamente ilegal pelas razões agora aduzidas, e sendo essa ilegalidade grave torna inválido todo o documento, pelo que este deve ser considerado totalmente inválido e nulo, reportando-se os seus efeitos a 01.01.18.

  8. A sentença violou o disposto no artigo 5º do CPT e nos artigos 207º, 208º, 208º-A e 208º-B do CT.

    Assim se fará a competente JUSTIÇA!…Não se conformando igualmente com a sentença veio a R. interpor recurso de apelação, terminando as suas alegações com as conclusões que se seguem: A.

    Emerge o presente recurso da sentença proferida nos autos a quo, na parte em que julgou a ação intentada pelo Recorrido parcialmente procedente e, em consequência, declarou nula e de nenhum efeito, com respeito aos trabalhadores representados pelo Recorrido, a cláusula 1.3, al. b) do MAPP, com efeitos reportados a 01.01.2018, condenando a Recorrente a restituir tudo o que tiver sido prestado ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente.

    B.

    A sentença proferida pelo Juiz a quo é nula porque – tendo o Recorrido pedido que a Recorrente fosse condenada a anular o MAPP, com efeitos reportados a 01.01.2018, sendo impedida de proceder à sua aplicação aos trabalhadores associados do Recorrido que não o aceitaram, foi a final proferida sentença que declarou nula e de nenhum efeito com respeito aos trabalhadores representados pelo Recorrido a cláusula 1.3, al. b), do MAPP, com efeitos reportados a 01.01.2018, devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente – ultrapassa o pedido formulado pelo Recorrido, tendo condenado a Recorrente em objeto diverso do pedido, conforme estabelecido na alínea e), do n.º 1, do artigo 615.º do CPC.

    Sem prejuízo do exposto, C.

    Com efeito, o entendimento do Tribunal a quo ao julgar parcialmente procedente a ação assenta na confusão dos conceitos de duração e de organização do tempo de trabalho e, em particular, de dois institutos – banco de horas e horário de trabalho – que não são confundíveis.

    D.

    Na verdade: (a) Enquanto que o banco de horas surge, nos termos da lei, associado ao conceito de período normal de trabalho, como modalidade de organização do tempo de trabalho que permite o aumento do período normal de trabalho, o horário de trabalho constitui a fixação concreta, no tempo, do número de horas que o trabalhador se comprometeu a prestar e é quem delimita o espaço temporal em que o trabalhador está vinculado a prestar o trabalho ou permanece adstrito à sua realização.

    (b) O banco de horas está, em primeira linha, dependente do acordo (alcançado a um nível coletivo ou individual), mediante o qual as partes acordam, no âmbito da sua autonomia, no aumento do período normal de trabalho, ao passo que o horário de trabalho não está, regra geral, dependente do acordo, podendo ser livremente determinado pelo empregador, dentro dos limites da lei, ao abrigo do poder de direção e organização do trabalho que lhe são reconhecidos pela lei.

    (c) Alcançado o acordo de banco de horas, o empregador fica obrigado a cumpri-lo nos exatos termos em que foi exarado, só podendo alterar tais termos com novo acordo, ao passo que o horário de trabalho é livremente alterável pelo empregador sem o acordo do trabalhador, dentro dos limites estabelecidos na lei.

    (d) Quanto aos limites aplicáveis, o período normal de trabalho pode ser aumentado no banco de horas individual até 2 horas diárias e atingir 50 horas semanais, tendo o acréscimo por limite 150 horas por ano, ao passo que, na fixação do...

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