Acórdão nº 1012/16.8T9STS.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 13 de Janeiro de 2020

Magistrado ResponsávelTERESA COIMBRA
Data da Resolução13 de Janeiro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Juiz Presidente: Fernando Monterroso.

Juiz Desembargadora Relatora: Maria Teresa Coimbra.

Juiz Desembargadora Adjunta: Cândida Martinho.

Acordam, em conferência, os juízes da secção penal do Tribunal da Relação de Guimarães: I.

No processo comum coletivo que, com o nº 1012/16.8T9STS, corre termos pelo Juízo Central Criminal de Braga foi decidido, além do mais: - Condenar o arguido F. M. pela prática como autor material de um crime de detenção de arma proibida p.p. art.º 86 nº 1 al. d) da Lei 5/2006 de 23/2 na pena de 240 (duzentos e quarenta) dias de multa à taxa diária de 8,00€ (oito euros).

- Condenar o arguido F. M. pela prática como autor material de 1 (um) crime de tráfico de estupefacientes p.p. art.º 21.º n.º 1 do DL 15/93 de 22.01 na pena de 6 (seis) anos de prisão, absolvendo-o da prática do mesmo crime na forma agravada, p.p. art.º 24.º nº 1 al. b) do mesmo diploma legal.

(…)*Inconformado com a condenação recorreu o arguido para este Tribunal da Relação apresentando as seguintes conclusões ( transcrição): 1- Invoca a nulidade da prova, este ponto prende-se com o facto de que no dia 19/01/2018, o aqui Recorrente foi constituído arguido na sua residência, bem como o cidadão de nacionalidade Espanhola de nome M. F..

2- Os agentes do OPC em audiência para além de confirmarem os pontos da douta acusação relativos a este cidadão espanhol, também confirmaram que o viram a entrar na residência do aqui Recorrente n a rua da …, com um saco na mão.

3- O aqui Recorrente confessou em audiência, que o saco descrito nos pontos 22, 23 e 24 dados como provados no douto acórdão, foi o saco que o co – arguido M. F. lhe entregou nesse dia 19/01/2018, cerca das 11:00horas.

4- Este cidadão espanhol foi constituído arguido no mesmo momento que o aqui Recorrente, no entanto não foi abordado na residência deste mas sim, em momento ulterior já quando conduzia o seu veículo automóvel conforme ponto 10 dos factos dados como provados.

5- Nessa abordagem foi detetado uma embalagem com 912,450 gramas de Procaina, que se destinava a ser misturada com cocaína.

6- Isso mesmo resulta do relatório de exame pericial n.º 201800555-NTX, realizado a 04/06/2018, e junto aos autos a 05/06/2018.

7- O diploma legal que rege o crime de tráfico de estupefaciente é o Decreto – Lei 15/93 de 22 de Janeiro, diploma esse com mais de 26 anos, totalmente desatualizado com a realidade e com a sociedade atual.

8- Veja-se o caso da canábis que hoje é admitido o seu uso para fins medicinais e veja-se as novas drogas, que não constam da tabela do referido diploma legal.

9- Repare-se que este produto apreendido ao cidadão espanhol com cerca de 1 quilo liquido, não consta do referido diploma legal e como tal não é sancionado pelo mesmo.

10- A questão que aqui se coloca é que este cidadão espanhol veio a casa de aqui Recorrente trazer uma embalagem de cocaína, com o peso líquido de 149,683 gramas com um grau de pureza de 75,03%, suficiente para 563 doses.

11-Ora esta entrega ocorre, conforme relata a testemunha R. D., Militar que chefiou toda a operação e cuja melhor transcrição temos no douto acórdão no último parágrafo de fls 43.

12-Isto é, o cidadão espanhol veio encontra-se com o aqui Recorrente para trocar um produto de estupefaciente sem qualidade por um produto com qualidade, daí o elevado grau de pureza, que os envolvidos terão usado para dissimular a expressão “ trocar um autocolante de um carro que não estava bom ”.

13-Resta saber o porquê do cidadão espanhol não ter sido abordado antes de entrar na habitação do aqui Recorrente ou no momento em que esteve nessa habitação, que segundo o que foi dado como provado no ponto 9 do douto acórdão, este permaneceu no interior da residência cerca de 7 minutos.

14-Este cidadão espanhol deixou de ser arguido no processo aquando da prolação da douta acusação, tendo sido indicado como testemunha pelo aqui Recorrente na abertura de instrução por forma a ajudar a sua defesa, a descoberta da verdade e a boa decisão da causa.

15-No entanto, este cidadão espanhol nunca foi ouvido, nem na abertura de instrução nem nas várias audiências de julgamento, apesar da sua relevância, para a boa decisão da causa e para a descoberta da verdade.

16- Sendo óbvio que o M. F. é quem abastece o aqui Recorrente, até porque este era consumidor á data dos factos conforme resulta provado no douto acórdão, (nomeadamente nos pontos 98 e 104 do factos provados), e o Recorrente guardava produto para esse cidadão espanhol.

17-Ora, para além do interesse do Recorrente, está o interesse da sociedade e o interesse do próprio Tribunal na descoberta da verdade e na boa decisão da causa, no entanto esta defesa não ocorreu.

18-Ora o Tribunal a quo não colheu depoimentos que recaíssem diretamente sobre esta questão, nomeadamente sobre os factos relativos á concreta atuação do cidadão espanhol, M. F., mas devia tê-lo feito, até por força do princípio do dispositivo de que gozam os Magistrados Judiciais.

19- Por outro lado, a atuação do OPC relativamente a este cidadão espanhol, criou dúvidas no aqui Recorrente no sentido de que o cidadão espanhol foi utilizado naquele concreto dia de 19/01/2018, como alguém a mando do OPC, atuando como agente provocador e tendo um papel determinante na ocorrência do crime.

20-Salvo melhor opinião, esta duvida tida pelo Recorrente só poderia ser dissipada com a inquirição do cidadão espanhol M. F., para termos a certeza se este com a sua atuação, precipitou o próprio crime ou não, e se foi ou não a mando do OPC.

21-A existir esta dúvida legítima, acrescendo o facto do aqui Recorrente não ter podido defender-se em toda a sua plenitude, podemos dizer estamos perante uma nulidade invocada a todo o tempo (artigo 118º do C.P.P.) e consequentemente nos termos do artigo 126º do C.P.P, declarar a ação encoberta e os métodos usados para prova como nulos com todas as consequências legais.

22-O que tradicionalmente se designa “ por árvore envenenada”, conduz a que todo o processo fique viciado e consequentemente nulas todas as provas obtidas neste processo.

23-O acórdão recorrido, não conheceu do objeto do processo quanto á verdadeira atuação e envolvimento dos cidadão espanhol, com o crime imputável ao aqui Recorrente, e tinha de conhecer, porque este consta da acusação e da pronúncia. Tendo sido constituído arguido, e deixado de o ser, apesar da relevante intervenção deste nos factos em questão.

24-Caso não seja esse o entendimento de Vªs Exªs sempre se dirá que por falta de apreciação de prova relevante, por diminuição da defesa do aqui Recorrente deverão Vªs Exªs ordenar o reenvio do processo, baixando ao Tribunal a quo, para a realização de prova com vista a suprir a insuficiência da prova produzida para a decisão da matéria de facto dada como provada.

25-Deve pois este douto Tribunal de recurso, declarar Nulo o douto acórdão nesta parte, ordenando o seu reenvio, para novo julgamento, nos termos do art. 426º, do CPP.

26-O Tribunal a quo dá como provado no ponto n.º 1 que “ desde Setembro de 2016 e até 19 de Janeiro de 2018 ”, no entanto no ponto 3 é mais específico e dá como não provado o facto “A” ocorrendo aqui uma certa contradição quanto ao momento temporal, sendo certo que no douto acórdão é referido e muito bem que a discrepância de datas ficou a dever-se às declarações proferidas pelo aqui Recorrente, essa explicação vem alegada a fls 34 do douto acórdão.

27-Não colocando em causa que é referido o douto acórdão de que a alteração das datas ocorreu de acordo com as declarações do aqui Recorrente, importa frisar que quando este referiu Setembro de 2016, queria dizer Setembro de 2017, até porque, toda a prova dos autos é neste sentido e foi o erro do aqui Recorrente ao trocar o ano em que iniciou essa atividade ilegal.

28-Sendo importante fazer-se a ressalva de que o aqui Recorrente em todo esse período temporal desempenhou funções de comércio de veículos automóveis, conforme resulta dos fatos provados e da fundamentação dos mesmos.

29-Assim, deste modo no ponto 1 dos factos provados deverá ser corrigido o ano de 2016 para o ano de 2017, em face da prova produzida.

30-Vamos agora apreciar alguma da prova testemunhal decorrida em audiência e que se entende ser relevante para a boa decisão da causa.

31- O aqui Recorrente quando prestou declarações confirmou que vendeu produtos de estupefacientes ao Arguido D. B., e confirmou que guardava estupefacientes por conta de traficantes, agora e ao contrário de que foi acrescentado no ponto 81 dos factos provados nunca referiu que o estupefaciente se destinava a ser distribuído por um grande número de consumidores nem o Tribunal em momento algum reconhece que este tenha vendido a vários consumidores.

32- Portanto nessa parte o ponto 81 in fine devia ser dado como não provado.

33- Tendo o douto Tribunal estado muito bem quando afasta a conduta do aqui Recorrente do crime de tráfico agravado, tendo em conta que reconhece que apenas ficou provado que este arguido só vendeu a um único consumidor no caso ao arguido D. B., vid fls 65 do douto acórdão.

34- Outro ponto relevante tem haver com o desentendimento entre o Arguido D. B. e o aqui Recorrente, tendo sido confirmado por ambos que chegaram a zangarem-se por falta de qualidade do produto.

35- Vejamos relatório do exame pericial n.º 201800584 – NTX, realizado a 04/06/2018 e entregue nos autos a 05/06/2018, como se referiu anteriormente, o aqui Recorrente recebeu no dia 19/01/2018 do cidadão espanhol um saco com 149.617 gramas com um grau de pureza de 75,03%, estupefaciente esse para substituir os estupefacientes sem qualidade que este havia deixado anteriormente.

36- Isto comprova-se pelo relatório elaborado pela Policia Cientifica onde refere que a regina de canábis tinha um grau de pureza de 6.6% e a cocaína encontrada na habitação possuía um grau de pureza de 12.06%.

37- Dizem as regras da experiencia comum que obviamente graus de pureza tão baixos nunca poderiam dar o numero de dozes indicadas no relatório, até...

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