Acórdão nº 2541/17.1T8BCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 28 de Novembro de 2019

Magistrado ResponsávelESPINHEIRA BALTAR
Data da Resolução28 de Novembro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam em Conferência na Secção Cível da Relação de Guimarães P. T. instaurou ação declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra X - Sucursal em Portugal, S.A., pedindo que a ação seja julgada procedente e, em consequência, que a ré seja condenada a pagar ao autor:

  1. A título de indemnização por danos não patrimoniais quantia nunca inferior a €.6.000,00, já causados em consequência dos factos que se alegam nesta petição inicial, acrescida dos respetivos juros de mora à taxa legal aplicável, desde a citação até efetivo e integral pagamento; b) O montante que se vier a liquidar em execução de sentença em consequência da incapacidade que se vier a apurar, através da realização de exame médico-legal na pessoa do Autor, e nas despesas com deslocações, hospitalares, consultas, exames médicos e cirurgias que se venham a revelar absolutamente necessários (artigo 609.º, n.º 2 do Código de Processo Civil).

Para sustentar o pedido, o autor alegou, em síntese, que: - Era atleta do Clube de Futebol de …, onde jogava nas camadas jovens, até que em 26.11.2015 foi vítima de um acidente durante um jogo de futebol, do qual resultaram para si ferimentos graves, que descreve.

- Nessa sequência foi observado pelo massagista do clube e encaminhado para fisioterapia que fez e após terminadas as sessões de fisioterapia, foi submetido a uma cirurgia, tendo ficado internado 3 dias.

- Após, realizou mais sessões de fisioterapia, e terminadas as ditas sessões de fisioterapia, foi dada alta definitiva.

- Como consequência do acidente, e desde essa data, o autor sofre permanentemente de dores no joelho direito e nunca mais pôde jogar futebol, nem praticar as atividades que mais gostava. As dores agravam-se com os esforços e as mudanças de tempo.

- Desconhece se necessita de nova cirurgia, bem como o grau de incapacidade de que ficou a padecer em consequência do acidente.

- Sofre com o sucedido, sentindo grande desgosto, tristeza e angústia permanentes, tendo ficado muito abalado.

- A ré, por força do contrato de seguro celebrado com o Clube de Futebol de …, é parte legítima para a presente ação.

A ré foi válida e regularmente citada e veio contestar nos termos de fls. 13 e ss. dos autos, onde aceita a existência do contrato de seguro de grupo do ramo de acidentes pessoais desportivos, de acordo com o qual, o capital seguro é de €.28.000,00 com o limite de €.5000,00 para despesas de tratamento, por sinistro, e com uma franquia de €75,00. Mais refere relativamente à cobertura de invalidez, a mesma não é indemnizável se for inferior a 10%. Acresce que se o autor padecer de uma incapacidade entre os 10% e os 66%, nunca o mesmo poderia receber uma indemnização pela totalidade do capital seguro. Mais refere que em virtude de tal contrato de seguro não estão cobertos danos morais. Aceita a existência do sinistro e já assumiu despesas de tratamento no valor de €.4.964,59, pelo que, não cabe à ré indemnizar quaisquer custos acrescidos que se devam a despesas de tratamento. O autor foi considerado curado sem desvalorização.

Termina defendendo a improcedência da ação e com a consequente absolvição do pedido.

Na sequência da contestação apresentada pela ré, o autor foi notificado para, querendo, se pronunciar sobre a matéria de exceção deduzida e nessa sequência apresentou o requerimento de fls. 42. Em tal requerimento, o autor defende que os danos morais por si sofridos cabem no âmbito de proteção dos seguros de danos pessoais e como tal a ré deve ser condenada a indemnizar os mesmos. Também a incapacidade funcional de que o autor ficou a padecer deve ser ressarcida pela ré. Assim, a ré deve ser condenada a indemnizar o autor por danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, não tendo aplicação as limitações defendidas pela ré.

O autor deduz incidente de intervenção principal provocada Futebol Clube..., pois o autor era atleta desse clube e caso existam os limites invocados pela ré, deve tal Clube ser responsabilizado por todos esses danos, em virtude de ter contratado um seguro que não protege eficazmente os seus atletas. Existe assim uma situação de litisconsórcio voluntário.

A fls. 46 e ss., foi proferido despacho que no admitiu o incidente de intervenção provocada deduzido, foi dispensada a realização da audiência prévia, foi fixado o valor da ação, foi realizado o saneamento dos autos, foi fixado o objeto do litígio e os temas da prova e foi admitida a prova requerida.

Foi realizada perícia colegial de avaliação do dano corporal em direito civil, conforme relatório de fls. 93 a 96.

Procedeu-se à realização da audiência de julgamento, conforme decorre das respetivas atas de fls. 122, 123 e 125 dos autos.

Foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos: “Por todo o exposto, decide-se: A. Absolver a ré X - Sucursal em Portugal, S.A. do pedido de condenação no pagamento de €6000,00 (seis mil euros) a título de danos não patrimoniais.

  1. Relega-se para liquidação de sentença a eventual necessidade de realização de tratamentos pelo autor P. T. em consequência das sequelas que ficou a sofrer com o acidente em apreço, fixando-se em €.185,41 (cento e oitenta e cinco euros e quarenta e um cêntimos) o montante máximo a pagar pela ré por despesas de tratamento.

  2. Relega-se para liquidação de sentença o montante a pagar pela ré X - Sucursal em Portugal, S.A. ao autor P. T. pelo deficit funcional permanente na integridade físico-psíquica de 5,92 pontos de que o mesmo ficou a padecer em consequência do sinistro.” O autor, não se conformando com o decidido, interpôs recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões: “I. Salvo o devido respeito por melhor opinião, o Recorrente não pode deixar de discordar do enquadramento dado pela douta sentença, devendo extrair-se das normas jurídicas aplicáveis, in casu, interpretação diversa.

  1. O que está em causa nos autos é um acidente desportivo coberto por um contrato de seguro desportivo de natureza obrigatória, previsto e regulamentado pelo Decreto-Lei nº 10/2009, de 12 de Janeiro (doravante, DL 10/2009), sendo que o “thema decidendum” consiste em determinar o âmbito de proteção de tal contrato de seguro celebrado entre a ré e a Associação de Futebol de … titulado pela apólice nº PA14AHO2016, e o quantitativo da prestação debitória a cargo da ré/recorrida.

  2. É, assim, inequívoco que o contrato de seguro em causa titulado pela apólice nº PA14AHO216 é um seguro obrigatório, como decorre da sentença ora em crise, e das condições e cláusulas juntas aos autos pela Ré.

  3. Atendendo à natureza obrigatória e imperativa deste tipo de contrato, não podem admitir-se as limitações constantes da douta sentença nas coberturas abrangidas, designadamente as despesas relativas aos tratamentos e a não valoração dos danos não patrimoniais, prejudicando-se, de forma grave e flagrante, a vítima do acidente, no caso, o Recorrente.

  4. O contrato de seguro de natureza obrigatória, regulamentado pelo Decreto-Lei nº 10/2009, de 12 de Janeiro, subscrito pelas partes estabelece no seu artigo 5º, nº 2, al. b), as coberturas mínimas abrangidas: "pagamento de despesas de tratamento, incluindo internamento hospitalar, e de repatriamento". Neste tipo de contrato a liberdade de modulação da relação contratual aparecemos nestes casos, frequentemente, bastante mitigada e como uma faculdade quase residual, sujeitos ao denominado regime das "cláusulas contratuais gerais", dada a fortíssima presença de cláusulas padronizadas, previamente elaboradas pela seguradora, em o Recorrente, ou qualquer outro atleta, não tem a hipótese de aceitar ou de rejeitar, em bloco, um conjunto de cláusulas préformuladas ou em cuja elaboração intervieram apenas a seguradora e a tomadora.

  5. Estamos perante seguro obrigatório, modelado nos seus...

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