Acórdão nº 4604/08.5TJCBR-B.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 03 de Dezembro de 2019

Magistrado ResponsávelISA
Data da Resolução03 de Dezembro de 2019
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam neste Tribunal da Relação de Coimbra I- Relatório 1. Através dos autos que correm atualmente no Tribunal Judicial da Comarca de Coimbra – Juízo de Execução de Soure -, a exequente, A...

, instaurou (em 16/12/2008) execução para pagamento de quantia certa contra os executados O..., Lda.

e C..., todos melhor identificados nos autos, visando obter o pagamento coercivo da quantia de € 8.587,96 (sendo €6.452,44 a título de capital, €2.111,52 a título de juros de mora já vencidos, e €24,00 a título de taxa de justiça devida com a presente execução).

Execução essa que fundamentou nos seguintes termos alegatórios: « A exequente foi sócia na empresa A..., Lda, até Agosto de 2007, tendo mutuário à referida empresa o valor de €10.000,00, perante a sua não liquidação, foi efectuada dacção em pagamento, tendo-lhe sido entregue o crédito ora reclamado sob os executados. (doc. 1 e 2) A 1º Executada é pessoa colectiva e comercializa relógios, ouro e outros materiais preciosos.

O 2º Executado interveio na relação comercial enquanto garante do pagamento da quantia, numa verdadeira assunção de divida.

No âmbito da sua actividade comercial, a empresa cedente do crédito á ora exequente forneceu ao 1º executado as mercadorias que este encomendou e recebeu, todas no valor de €6.000,00.

Para pagamento dessas mercadorias foram emitidos vários cheques, que aquando da sua apresentação ao banco foram devolvidos pelo Banco de Portugal por falta de provisão. Perante tais devoluções e alguma relutância em efectuar o pagamento, foram emitidos novos cheques, desta vez pelo 2º executado, que assumiu assim pessoal e comercialmente o pagamento da quantia em divida.

Emitiu assim o 2º executado os seguintes cheques: - cheque nº ..., sacado sobre o Banco C..., com data de 06-07-2005 e no valor de € 1 000. (doc. 3) - cheque nº ..., sacado sobre o Banco C..., com data de 06-08-2005 e no valor de € 1 000. (doc. 4) - cheque nº ..., sacado sobre o Banco C..., com data de 06-09-2005 e no valor de € 1 000. (doc. 5) - cheque nº ..., sacado sobre o Banco C..., com data de 06-10-2005 e no valor de € 1 000. (doc. 6) - cheque nº ..., sacado sobre o Banco C..., com data de 06-11-2005 e no valor de € 1 000. (doc. 7) - cheque nº ..., sacado sobre o Banco C..., com data de 06-12-2005 e no valor de € 1 000. (doc. 8) No entanto tais cheques foram também devolvidos, pelos mesmos motivos dos anteriores.

Resultaram de tais devoluções despesas bancárias que são da responsabilidade dos executados, visto terem sido os mesmos a dar-lhes causa, despesas que se cifram no valor de €452,44.

Sobre tais valores vencem-se juros que calculados tendo-se em conta as taxas legais correspondentes e previstas para cada período, e que até á presente data (12-12-2008). Perfazemos valor de €2.111,52.

Tais cheques devem-se considerar admissíveis como títulos executivos pois "tem-se entendido que prescrita a obrigação cartular constante de um cheque, esse título de crédito poderá continuar a valer como título executivo, desta vez enquanto escrito particular consubstanciando a obrigação subjacente, nos termos do art. 46, nº 1, al. c) do Código de Processo Civil.” » 2. Por despacho datado de 21/08/2013 (referência ...), foi a 1ª. executada (O..., Ldª) julgada parte ilegítima e, em consequência, indeferiu-se liminarmente o requerimento executivo no que à mesma concerne, tendo, assim, e nos termos do aí ordenado, a execução prosseguido os seus termos apenas contra o 2º. executado C..

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  1. Na sequência de despacho judicial (de 18/12/2018), foi a exequente convidada a concretizar quais os cheques dados à execução que foram devolvidos por bloqueio de conta e aqueles que o foram por falta de provisão, o que a mesma veio fazer (fls. 27 destes autos físicos) nos seguintes termos: ...

  2. Por despacho (liminar) de 29/03/2019 a sra. juíza a quo decidiu indeferir liminarmente a execução (requerimento executivo) no que concerne aos 5 primeiros cheques - com o fundamento de os mesmos, enquanto documentos particulares, não se encontrarem revestidos de força executiva -, ordenando, em consequência, que a execução prosseguisse os seus ulteriores trâmites apenas quanto ao 6º. e último cheque acima identificado.

  3. Inconformada com esse despacho decisório a exequente dele apelou, tendo concluído as alegações desse seu recurso nos seguintes termos: ...

  4. Contra-alegou o executado C..., pugnando pela improcedência do recurso e pela manutenção do julgado, o fez depois de concluir as suas contra-alegações nos seguintes termos: ...

  5. Cumpre-nos, agora, apreciar e decidir.

    II- Fundamentação

    1. De facto.

  6. O tribunal a quo deu como provado os seguintes factos: Os seis cheques dados à execução são: 1) o cheque nº ..., datado de 06-07-2005, que foi devolvido em 08-07-2005 por conta bloqueada (cfr. Doc. nº 1, junto com o Requerimento Executivo); 2) o cheque nº ..., datado de 06-08-2005,que foi devolvido em 23-11-2005 por conta bloqueada e em 04-10-2006 por conta bloqueada (cfr. Doc. nº 2, junto com o Requerimento Executivo); 3) o cheque nº ..., datado de 06-09-2005, que foi devolvido em 04-04-2006 por conta bloqueada (cfr. Doc. nº 3, junto com o Requerimento Executivo); 4) o cheque nº ..., datado de 06-10-2005, que foi devolvido em 04-05-2006 por conta bloqueada (cfr. Doc. nº 4, junto com o Requerimento Executivo); 5) o cheque nº ..., datado de 06-11-2005, devolvido em 05-12-2005 por conta bloqueado (cfr. Doc. nº 5, junto com o Requerimento Executivo); 6) e o cheque nº ..., datado de 06-12-2005, devolvido em 09-11-2005 por falta de provisão (cfr. Doc. nº 6, junto com o Requerimento Executivo).

  7. Para além desses, devem ter-se como assentes os factos que se deixaram descritos no Relatório que antecede, sendo que no que concerne aos cheques deve considerar-se como assente toda a realidade factual descrita no ponto 3. desse Relatório e bem assim todo o demais teor desses cheques que aqui se dá por reproduzido (os quais foram extraídos e resultam do teor das peças processuais e documentais que integram estes autos de recurso ou dos autos principais de execução, por via de consulta do processo eletrónico).

    1. De direito.

    Como é sabido, é pelas conclusões das alegações dos recorrentes que se fixa e delimita o objeto dos recursos, pelo que o tribunal de recurso não poderá conhecer de matérias ou questões nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso (cfr. artºs. 635º, nº. 4, 639º, nº. 1, 608º, nº. 2, e 852º do CPC).

    Ora, calcorreando as conclusões das alegações do recurso da exequente/apelante verifica-se que a única questão que aqui nos cumpre apreciar traduz-se em saber se estão ou não os 5 (cinco) cheques em relação aos quais foi indeferida liminarmente a execução (requerimento executivo) dotados/revestidos de força executiva? O tribunal a quo entendeu que não.

    Para o efeito, e em síntese, aduziu (nem sempre de forma, e salvo sempre o devido respeito, que não se nos afigura muito clara) os seguintes tópicos argumentativos: Começou por convocar para o efeito o acordão de uniformização de jurisprudência do STJ nº. 3/2016, de 10/11/2015 (publicado no DR, 1ª. Serie, de 22/01/2016), citando as seguintes passagens insertas a fls. 217 e 218 da sua fundamentação “A revogação, neste contexto (do cheque), deve ser interpretada como uma instrução unilateral para não pagamento de um cheque que tenha sido emitido em beneficio de – ou endossado a – terceiro. O cheque, uma vez revogado, deixa de ser cheque e é destituído nas suas virtualidades jurídicas: em rigor, ao revogar a ordem incorporada no cheque o sacador está a proibir o seu pagamento. (…) Quer isto dizer que o débito emergente da obrigação subjacente permanece incólume, pelo que se é verdade que a obrigação cambiária se extingue de modo indevido, a verdade é que a relação subjacente, que tem por objecto o direito de crédito da autora cuja falta de liquidação consubstancia o concreto prejuízo patrimonial, subsiste in totum.

    ” Considerou que um cheque não pago por conta bloqueada tem o mesmo significado que revogação, e que “deve ser equiparado ao cheque não pago por não ter sido apresentado dentro do prazo de validade.” A partir daí concluiu que os aludidos 5 cheques dados à execução ao serem “devolvidos por conta bloqueada, deixaram de valer como títulos cambiários”, não podendo, assim, valer como títulos executivos, deixando o seu portador “de possuir qualquer direito cambiário em relação à sacadora/emitente do cheque ou contra o subscritor/avalista, já que essas obrigações cambiárias de garantia de pagamento dos cheques extinguiram-se (cfr. artºs. 12 e 17 da LUCh.) Logo, não podendo a exequente “sufragar-se dos cinco cheques como títulos cambiários” e não podendo os mesmos “valer como cheques, também não podem ser tidos como meros quirógrafos”, e “isso porque se os cinco referidos cheques não chegam a possuir força executiva, como títulos de crédito, também não poderão revestir a executoriedade como quirógrafo nos termos da alínea c) do artº. 703, nº. 1, do CPC.” Por fim, ainda concluiu que os referidos documentos (os 5 cheques) não podem valer como reconhecimento de dívidas, por não preencherem os requisitos externos mencionados na al. b) do artº. 703º, nº. 1, do CPC.

    Em suma, a tribunal a quo justificou aquele sua decisão de indeferir liminarmente a execução no que concerne os ditos 5 cheques, com o facto de os mesmos não possuírem força executória como títulos de crédito e, por isso, também...

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