Acórdão nº 3754/15.6T9PTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 08 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelS
Data da Resolução08 de Outubro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Évora

ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA I. Relatório Por sentença proferida em 21/6/2018 no Processo Comum nº 3754/15.6T9PTM, que correu termos no Juízo Local Criminal de Portimão do Tribunal Judicial da Comarca de Faro foi decidido: Julgar a acusação parcialmente procedente, por parcialmente provada e, em consequência:

  1. Condenar o arguido LF como autor material de três crimes de ameaça agravada, p. e p. pelos arts. 153º/1 e 155º/1 alíneas a) e c) do C.Penal na pena de 8 (oito) meses de prisão, por cada um deles; b) Procedendo ao cúmulo jurídico destas penas, condenar o arguido na pena única de 18 (dezoito) meses de prisão efectiva; c) Absolver o arguido da prática de um crime de ameaça agravada, ocorrido em 29.06.2016, reconduzindo os factos praticados e dados como provados a um crime de ameaça simples, para o qual o Ministério Público não tem legitimidade para prosseguir criminalmente contra o arguido face à vontade manifestada pela ofendida no decurso do inquérito de não apresentar queixa contra o mesmo; Com base nos seguintes factos, que então se deram como provados: 1. Durante a manhã do dia 14.08.2015, SP e CL, na qualidade, respectivamente, de psicóloga e técnica social da unidade social do Município de Lagoa, efectuaram uma vistoria a uma gaiola de pássaros e um depósito de sucata existentes num terreno do Município, contíguo à casa do arguido LF.

    1. Nesse mesmo dia, próximo da hora de almoço, o arguido deslocou-se ao Gabinete de Acção Social do Município de Lagoa e dirigiu-se ao balcão de atendimento dizendo em voz exaltada ”Quem é que foi lá? Quem é que foram as doutoras que foram lá? Eu mato-as!”.

    2. Como ninguém respondeu às suas perguntas, o arguido acabou por sair do local, mas manteve-se na rua, em frente á porta que dá acesso ao supra referido gabinete de acção social, proferindo as seguintes expressões: “Quem é que foi, quem é que foi? Suas putas, eu mato-as!”.

    3. A hora não concretamente apurada do dia 13.06.2016, o arguido deslocou-se novamente ao Gabinete de Acção Social do Município de Lagoa, dirigindo-se a CI, funcionária daquele Município com a intenção de pedir à Câmara que lhe pagasse uma factura da água.

    4. Como aquela lhe transmitiu nada poder fazer para o auxiliar, o arguido desferiu pontapés numa cadeira, enquanto, bastante exaltado dizia “vocês só ajudam nalguma coisa no dia em que eu vier aqui e der um tiro nos cornos a alguém”.

    5. Mais uma vez, desta feita no dia 29.06.2016, cerca das 14:45, o arguido dirigiu-se ao Gabinete de Acção Social do Município de Lagoa, mais concretamente à funcionária CI, que estava no balcão de atendimento, e disse-lhe: “foste chamar a bófia…logo te encontro por aí”, o que fez em tom de voz elevado e agressivo.

    6. Ao proferir as expressões acima descritas, tinha o arguido intenção de intimidar as visadas SP, CL e CI, de lhes provocar medo, receio e inquietação, assim como prejudicar a sua segurança, liberdade e autodeterminação.

    7. O que logrou conseguir.

    8. Sabia o arguido que SP, CL e CI eram funcionárias do Município de Lagoa e se encontravam naquele local no exercício das suas funções ou por causa delas, tendo actuado por não concordar com a forma como haviam exercido essas mesmas funções.

    9. Agiu de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo serem as suas descritas condutas proibidas e punidas por lei, tendo a liberdade necessária para se determinar de acordo com tal avaliação.

      Resultam do relatório social elaborado, ainda, os seguintes factos relativos à situação pessoal do arguido, com relevo para a determinação da sanção: 11. À data dos factos como no presente, o arguido mantém a sua principal referência a família de origem, residente num dos bairros sociais da cidade de Lagoa, ainda que por alguns períodos vá vivendo aparte, em tentativas de organização de vidas maritais, que não correm bem.

    10. O agregado é titulado pela progenitora, de 62 anos, cozinheira e agora só inclui o arguido e uma namorada deste, FM, de 25 anos, na sua dependência.

    11. LF é desempregado de longa duração, não se conhecendo outras actividades laborais além de biscates eventuais ligados à construção e recolecção de sucata.

    12. O arguido tem as origens em Lagoa, num contexto sócio-familiar multi-problemático, de fracos recursos económicos. Integrou uma numerosa fratria, num referencial educativa de negligência e ambiente de violência doméstica, associado a um pai alcoólico, que faleceu quando o arguido contava 26 anos.

    13. No processo de desenvolvimento foram sinalizados desde idade precoce problemas comportamentais, a par de dificuldades de integração e aprendizagem escolares que determinaram o envolvimento do sistema de promoção e protecção, do sistema de justiça juvenil e, desde os 16 anos, do sistema de justiça penal.

    14. Agravante foi a adopção de hábitos de consumo de produtos estupefacientes, a marcar toda a trajectória de vida, desde a adolescência. As ligações foram tendencialmente com pares igualmente envolvidos em práticas desviantes e criminais.

    15. Mesmo nos períodos em que não se encontrava privado de liberdade, nunca se envolveu numa actividade formativa ou laboral continuada. Só conseguiu obter habilitações literárias de 9º ano já em fase adulta, em contexto prisional.

    16. Cumpriu pena de prisão efectiva, ininterruptamente, entre os 16 e os 22 anos e entre os 25 e os 34 anos. Em ambos os casos só beneficiou de liberdade condicional aos 5/6 da pena e em ambos os casos observaram-se novos confrontos com o sistema de justiça pouco depois do regresso ao meio livre.

    17. Nunca chegou a estruturar um modo de vida socialmente inserido ou produtivo, vigorando sempre a necessidade de dependência de terceiros, apoios sociais, família ou companheiras.

    18. Para fazer face às necessidades de consumo, nunca se terá efectivamente desligado de contextos de transacção de produtos estupefacientes. Ainda assim, observa-se no presente uma evolução positiva, pelo menos no que concerne à abstinência de produtos narcóticos.

    19. O último retorno ao meio livre ocorreu em Dezembro de 2013, após o que iniciou acompanhamento no SICAD (Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e Dependências). Cumpriu programa de metadona, que concluiu há cerca de um ano. Revela nestes serviços uma evolução relativamente favorável, designadamente no que respeita a consumos mais controlados e no trato interpessoal mais respeitoso. Pese embora os traços de impulsividade e descontrole, não se tem mostrado sensível a um acompanhamento individual complementar do foro psiquiátrico.

    20. Mantém uma atitude de revolta face aos múltiplos problemas e alegada discriminação com que se confronta em meio residencial, mas pouco se empenha em mudar, designadamente a habitual atitude de inércia face a uma ocupação laboral estruturada.

    21. Os factos na base da acusação em apreço decorreram ainda durante a vigência do período de liberdade condicional (medida que terminou em 25/09/2015), enquadrando-se na atitude geral do arguido de descontrole e desrespeito das regras básicas de vida em sociedade.

    22. Não acata a oportunidade do processo, negando o dano causado a terceiros, pelo contrário desresponsabilizando-se face aos factos, pelos seus próprios problemas como a toxicodependência, o estado de descompensação emocional da altura, a falta de ajuda ou a provocação dos outros, vendo-se como vítima de uma alegada discriminação dos serviços.

    23. Tem ainda pendente o Proc. ---/16.6GDPTM, envolvendo múltiplas situações a configurar crimes de ofensa à integridade física e de ameaça.

    24. Prevalecem factores de risco como o desemprego, a carência económica, os hábitos aditivos e os surtos de descontrole psico-afectivo.

    25. Ainda assim, dentro dos recursos limitados que a caracterizam a várias gerações, dispõe de uma família interessada e preocupada em proporcionar a ajuda possível.

    26. Por acórdão proferido em 16.10.1996, no âmbito do Proc. ---/96, foi o arguido condenado pela prática, em 09.05.1996, de um crime de tráfico de estupefacientes, na pena de 20 meses de prisão efectiva.

    27. Por acórdão proferido em 11.07.1997, no âmbito do Proc. --/97, foi o arguido condenado pela prática, em 16.01.1996, de um crime de furto qualificado, na pena de 2 anos e 10 meses de prisão efectiva.

    28. Por sentença proferida em 20.10.1997, no âmbito do Proc. --/97, foi o arguido condenado pela prática, em 06.03.1996, de um crime de consumo de estupefacientes, na pena de 20 dias de prisão, substituída por igual tempo de multa.

    29. Por acórdão proferido em 19.12.1997, no âmbito do Proc. ---/97, foi o arguido condenado pela prática, em 14.02.1996, de um crime de roubo, na pena de 5 anos de prisão efectiva.

    30. Por acórdão proferido em 22.06.2004, no âmbito do Proc. --/02.1PAPTM, foi o arguido condenado pela prática, em 19.01.2002, de um crime de roubo, na pena de 2 anos de prisão efectiva.

    31. Por sentença proferida em 06.10.2004, no âmbito do Proc. ---/01.0JELSB, foi o arguido condenado pela prática, em 22.06.2001, de um crime de tráfico para consumo, na pena de 70 dias de multa.

    32. Por acórdão proferido em 02.06.2006, no âmbito do Proc. ---/05.2PAPTM, foi o arguido condenado pela prática, em 06.10.2004, de um crime de roubo, na pena de 2 anos e 3 meses de prisão efectiva.

    33. Por acórdão proferido em 24.03.2006, no âmbito do Proc. ---/04.3GDPTM, foi o arguido condenado pela prática, em 08.10.2004, de um crime de furto qualificado, na pena de 7 anos de prisão efectiva.

    34. Por sentença proferida em 08.05.2007, no âmbito do Proc. ----/04.0PTM, foi o arguido condenado pela prática, em 25.11.2004, de um crime de resistência e coacção sobre funcionário, na pena de 18 meses de prisão efectiva.

    35. Por sentença proferida em 17.07.2007, no âmbito do Proc. ---/04.0GDPTM, foi o arguido condenado pela prática, em 02.07.2004, de um crime de ofensa à integridade física simples, na pena 230 dias de multa.

    36. Por decisão proferida em 29.11.2013 foi concedida ao arguido a liberdade condicional pelo período de prisão que lhe faltava cumprir, até...

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