Acórdão nº 2149/13.0TBGMR-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 03 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelEVA ALMEIDA
Data da Resolução03 de Outubro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I – RELATÓRIO Por apenso aos autos de execução hipotecária, fundada em incumprimento de contrato de mútuo, que o “Banco ..., SA” move a J. C. e M. C., vieram os executados deduzir incidente inominado, requerendo se declare extinta a execução.

Alegam, para tanto e em síntese: – Em 2011 a exequente celebrou com os executados um contrato de mútuo com hipoteca, no montante de €51.000,00, que os executados receberam, comprometendo-se a reembolsar em 300 prestações mensais e sucessivas, tendo a primeira vencimento no dia 2 e seguintes e as restantes em igual dia dos meses subsequentes. Ainda nos termos do referido contrato, para garantia de todas as responsabilidades nele assumidas, os executados hipotecaram o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ..., da freguesia de ..., inscrito na matriz sob o artigo ....

– Tal prédio constitui a casa de habitação dos executados, única e permanente, desde 29-09-2011 até aos dias de hoje, na qual residem também os dois filhos menores do casal.

– A meio do ano de 2012, à semelhança de muitas famílias portuguesas, os executados passaram a viver numa situação económica muito difícil, causada pelo desemprego involuntário da executada e pela quebra drástica das vendas verificadas no estabelecimento comercial do executado, onde exercia a actividade de electricista.

– Para tentar ultrapassar as dificuldades económico-financeiras, o executado emigrou para a Alemanha, onde, após alguns meses de trabalho, teve que regressar a Portugal por causa dum infortúnio acidente de trabalho, que o impedia de trabalhar.

– Com dois filhos menores a seu cargo, com a mulher desempregada, os executados deixaram de poder pagar atempadamente as prestações acordadas no contrato de mútuo em causa.

– Face a esse incumprimento a exequente intentou a presente acção executiva em 25-06-2013.

– No decorrer da presente acção executiva, a executada conseguiu encontrar emprego, permitindo ao casal ora executado melhorar um pouco a sua situação económico-financeira, pelo que os executados deslocaram-se à agência do exequente Banco ..., onde tinham contraído o mútuo em causa, situada em Vizela, solicitando um acordo de pagamento das prestações em atraso, a fim de regularizar o citado contrato de mútuo.

– Em resposta ao solicitado, o banco exequente, através da agência, acordou com os exequentes a regularização solicitada, que tinha que passar obrigatoriamente pelo pagamento das prestações em atraso e pelo pagamento atempado das prestações vincendas acordadas no citado contrato de mútuo.

– Assim, conforme tal acordo, os executados andaram, durante vários meses, a pagar as prestações em atraso e, simultaneamente, as prestações que se iam vencendo.

– Tal acordo não foi reduzido a escrito, mas os executados, de boa-fé, acreditaram na validade do mesmo, sendo que a exequente nunca recusou o pagamento das prestações em atraso, efectuado pelos executados por meio de depósitos em numerário na agência que o exequente possui em Vizela.

– Com o pagamento das prestações, o banco exequente emitia um talão de depósito com a indicação “Transferência para Dep. Recuperação Crédito” (docs. 1 a 7). Tendo efectuado o último depósito concretizado em 12-10-2018 (doc.8).

– A regularização do valor do mútuo em atraso foi confirmada por escrito aos executados em 19-10-2018, pelo Departamento de Recuperação de Crédito Retalho – Núcleo Recuperação Negócios – do banco exequente (doc. 9).

– Assim, com o último depósito de 12-10-2018 (doc. 8), os executados deixaram de estar em incumprimento com o banco exequente no que respeita ao contrato de mútuo em causa, deixando de haver prestações em atraso, sendo que as que se vão vencendo, estão a ser pagas atempadamente nas datas acordadas no citado contrato de mútuo.

– Em consequência do supra exposto, os executados requereram à agente de execução, em 29-10-2018, a extinção da presente execução relativamente ao banco exequente (doc. 10).

– Em resposta ao pedido de extinção, a agente de execução notificou os executados de que o banco exequente tinha requerido o prosseguimento da execução, invocando que o contrato de mútuo em causa “encontra-se resolvido, estando em dívida a totalidade do valor relativo ao mesmo” – Ora, depois do acordo efectuado com o banco exequente acima relatado e depois deste ter recebido dos executados as prestações em atraso para regularizar o mútuo, conforme se alcança dos documentos ora juntos, o prosseguimento da presente execução constitui um manifesto abuso de direito.

* Notificado, o Banco exequente veio pugnar pela improcedência deste incidente, alegando, em síntese: – Os contratos em questão foram resolvidos, tendo operado o vencimento antecipado da totalidade do valor em dívida.

– Ainda que com a totalidade do valor vencido, o Exequente nunca fecha a porta a pagamentos, negociações e possíveis extinções de execuções. Contudo, tais decisões são sempre tomadas pela direcção do Banco, em conjunto com os seus mandatários.

– No presente caso, havendo outros contratos incumpridos e outra execução a correr contra os mesmos Executados, nunca a Direcção do Exequente ou algum dos seus mandatários, deu acordo a alguma proposta de extinção da execução.

– Até porque, estando outra execução a correr, acabar-se-á por penhorar o mesmo imóvel penhorado nos presentes autos.

– Sustando-se essa outra execução e passando-se a aproveitar esta mesma execução, para cobrança de todos os créditos do Exequente.

*Os requerentes responderam pronunciando-se sobre o alcance dos documentos juntos pelo Banco requerido.

*Foi então proferido despacho saneador em que se decidiu: – «Da natureza do incidente.

Os executados intentaram o presente incidente “ao abrigo do disposto nos artigos 292.º, 293.º e 294.º do C.P.C.”.

E pretendem com o presente incidente que seja declarada “extinta a execução apensa”.

Ora, nos termos do disposto nos artigos 292.º, do C.P.C. em quaisquer incidentes inseridos na tramitação de uma causa observa-se, na falta de regulamentação especial, o que vai disposto neste capítulo.

Dito isto, é ponto assente que este preceito apenas regula a forma do processo dos incidentes da instância, remetendo para os demais artigos do respetivo capítulo.

Por sua vez, o artigo 293.º, do C.P.C., afirma que: (n.º 1), no requerimento em que se suscite o incidente e na oposição que lhe for deduzida, devem as partes oferecer o rol de testemunhas e requerer os outros meios de prova; (n.º2) a oposição é deduzida no prazo de 10 dias; (n,º 3) a falta de oposição no prazo legal determina, quanto à matéria do incidente, a produção do efeito cominatório que vigore na causa em que o incidente se insere.

Neste contexto, também facilmente ajuizamos que este normativo também se cinge à forma do processo dos “incidentes da instância”, nada afirmando quanto ao objecto e alcance dos mesmos.

Por fim, afirma o artigo 294.º, do C.P.C., que: (n.º 1) a parte não pode produzir mais de cinco testemunhas; (n.º 2) os depoimentos prestados antecipadamente ou por carta são gravados nos termos do artigo 422.º.

Como se infere dos dizeres deste último artigo, o mesmo apenas regula a instrução do processo dos incidentes e nada mais.

À luz do exposto, facilmente concluímos que qualquer “incidente da instância”, no que concerne ao seu formalismo processual, tem de respeitar os citados artigos, “na falta de regulamentação especial”.

Por essa razão, nenhum incidente que respeite apenas esses citados artigos visará, por si só, a extinção de uma execução, como é aqui peticionado.

Na verdade, para se atingir tal desiderato – extinção da execução -, terá de ser apresentado o respectivo “incidente” de “oposição à execução”, conforme previsto no artigo 728.º, do C.P.C..

Mais nenhum outro incidente, atento o teor da argumentação vertida pelos executados, poderá atingir esse fim, além daquele que está expressamente previsto no artigo 728.º, do C.P.C..

E o presente incidente não pode constituir este tipo de incidente a que alude o artigo 728.º, do C.P.C., porquanto já se encontra esgotado o prazo de 20 dias a contar da citação que a lei confere aos executados para a sua dedução.- cfr. artigo 728.º, n.º 1, do C.P.C..

Assim, em face do exposto, indefere-se o incidente porquanto já se encontra precludido o direito dos executados deduzirem embargos à execução, como agora pretendem, ao abrigo deste incidente que intitularam de “incidente ao abrigo dos artigos 292.º, 293.º e 294.º do C.P.C.”.

Custas pelos requerentes.»*Inconformados, os requerentes interpuseram o presente recurso, que instruíram com as pertinentes alegações, em que formulam as seguintes conclusões: «1ª – A sentença recorrida violou o disposto nos artigos 292º, 293º e 294º do CPC, pois ao não apreciar o incidente dos recorrentes, vedou-lhes a possibilidade de provarem a regularização do contrato de mútuo em causa; 2ª-...

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