Acórdão nº 1935/18.0T8CHV.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 26 de Setembro de 2019
Magistrado Responsável | ANT |
Data da Resolução | 26 de Setembro de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO (…) e esposa (…); e (…) e esposa (…), instauraram a presente ação especial de tutela da personalidade, contra (…) e marido (..); e (…) e mulher (…) , pedindo que: a) sejam os réus condenados a manter fechados e encerrados ao público os respetivos estabelecimentos de café/bar, aludis sob os arts. 3º e 4º da p.i., no período noturno, compreendido entre as 21 horas e as 9 horas; b) sejam cada um dos réus condenados, em conformidade com o disposto no art. 879º, n.º 4, do C. P. Civil, no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória no montante de € 500,00, sempre que violem a proibição de não abertura dos estabelecimentos ao público nos termos peticionados em a).
Para tanto, alegaram os autores, em síntese, que: · São donos, respetivamente, das frações autónomas, designadas pelas letras Q, M, e AE, do prédio urbano constituído em propriedade horizontal designado por “Edifício ...
”, sito na Praceta ..., em Chaves; · É nessas frações que os autores habitam, dormem, descansam, tomam as refeições, recebem as pessoas das suas relações, tendo ali centrada toda a sua vida.
· No rés-do-chão, do Bloco 3, deste Edifício ...
, funcionam dois estabelecimentos de café/bar denominados “X” e “Y Bar”, lojas 7 e 8, correspondentes às frações X e Y, as quais confinam entre si através de uma parede comum.
· Desde o início do ano de 2017, os réus A. I. e marido exploram o estabelecimento denominado “X” e os réus P. E. e mulher, o bar “Y Bar.” · Ambos os apartamentos dos autores se situam em pisos superiores relativamente àqueles estabelecimentos, mais concretamente no 1º piso a fração M e no 2º piso as frações Q e AE, mas próxima verticalmente desses estabelecimentos.
· Ambos os estabelecimentos estão equipados com aparelhos de televisão, aparelhagem de som e várias máquinas frigorificas e karaoke, tendo ainda o “Y Bar” uma mesa de bilhar e várias máquinas de jogo.
· Os estabelecimentos funcionam ininterruptamente desde as 10h até às 02h da manhã e nas noites de sábado para domingo até às 03h da manhã e no período de Julho e Agosto até às 04h00m.
· Tais estabelecimentos são muito frequentados, em especial no período noturno.
· Os aparelhos de televisão e música produzem muito barulho, é muito intenso o ruído provocado pelo bater das portas das máquinas frigoríficas e de um modo especialmente audível e incomodativo o bater do cachimbo do café para a extração das borras.
· É intenso o barulho produzido pelas vozes dos clientes do estabelecimento quer no seu interior quer quando se concentram no exterior, bem como o produzido pelo rojar as mesas e cadeiras.
· É também intenso o barulho associado ao bilhar, ao bater dos tacos quer nas bolas quer no chão, bem como o produzido pelas máquinas de jogo e pelo entusiasmo colocado pelos clientes quando os utilizam.
· Muitas vezes ocorrem discussões entre os clientes do estabelecimento em tom de voz elevado, sobretudo durante a madrugada, tanto no interior como no exterior do estabelecimento.
· Os réus equiparam ainda os seus estabelecimentos com aparelhos de ar condicionado e extratores de fumo, aparelhos esses que se encontram pendurados debaixo da varanda do 1º andar do bloco 2, mantendo-se toda a noite ligados o que incomoda o descanso dos autores.
· Em consequência dos barulhos e ruídos referidos os autores passam muitas noites sem dormir bem como acordam muitas vezes sobressaltados.
· A autora P. F. padece de cefaleias, apresenta valores tensionais elevados e dilatação da aorta ascendente e esta situação tem agravado o seu estado de saúde uma vez que não consegue descansar convenientemente.
· Este estado barulhento e ruidoso trás os autores sob um constante nervosismo e intranquilidade, causando-lhes insónias e todo um mal-estar físico e psicológico que afeta a sua vivência diária e o seu equilíbrio psicossomático.
Os requeridos A. I.
e J. A.
contestaram, impugnando no essencial a factualidade alegada pelos autores, tanto quanto é certo que os requeridos respeitam o horário de funcionamento legalmente previsto para o seu estabelecimento comercial e do mesmo não provém ruído suficiente que justifique que os requerentes lancem mão da presente ação; para além de que a exploração do café “X” constitui o sustento dos requeridos e da sua filha menor.
Pugnam pela improcedência da ação.
Por sua vez, os requeridos P. E.
e C. M.
Também apresentaram, impugnando a factualidade alegada pelos requerentes.
Procedeu-se à realização da audiência final.
Na sequência, por decisão de 7 de Junho de 2019, veio a presente ação especial julgar-se parcialmente procedente por provada e, em consequência (transcrevendo-se a parte final do item Decisão): “
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Determino que as esplanadas dos estabelecimentos comerciais “X”, explorado pelos réus A. I. e J. A. e “Y Bar”, explorado pelos réus P. E. e C. M., apenas podem funcionar nos seguintes períodos: - De domingo a quinta-feira até às 0h00; e - Sexta, sábado e vésperas de feriado até às 02h00.
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Absolvo os réus do demais peticionado.
” Inconformados com o assim decidido, vieram os requerentes interpor recurso de apelação, nele formulando as seguintes CONCLUSÕES A. Os recorrentes deduziram o presente procedimento autónomo urgente de tutela da personalidade pedindo que fossem os réus condenados: a- a manter fechados e encerrados ao público os estabelecimentos de café/bar que exploram no período noturno, compreendido entre as 21 h e as 9 h; b- serem cada um dos réus condenados, em conformidade com o disposto no art. 879º, nº 4 C.Pr.Civil, no pagamento de uma sanção pecuniária no montante de 500,00 € sempre que violem o determinado neste procedimento.
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A sentença recorrida, ainda que dando como assente que o direito ao repouso e descanso dos autores é afetado, mas principalmente devido à concentração de pessoas no espaço exterior e nas esplanadas, apenas determinou que estas só poderiam funcionar de domingo a quinta-feira até às 00,00 h e sexta, sábado e vésperas de feriado até às 02,00 h, mantendo incólume o funcionamento dos cafés.
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Ainda que a sentença tenha considerado credíveis os depoimentos das testemunhas arroladas pelos Autores, deixando inclusive consignado que É certo que os cafés, no seu funcionamento regular, também produzem ruídos, por vezes a horas desadequadas e que incomodam os moradores, conforme referido, designadamente, o barulho dos tacos e bolas de bilhar e o bater do cachimbo da máquina do café –fls. 23, § 3º, conclui que No entanto da ponderação global dos depoimentos das mencionadas testemunhas (testemunhas arroladas pelos autores) maior incómodo resulta do barulho da rua e dos comportamentos que as pessoas que ali se encontram adoptam –fls. 23, § 4º.
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O mesmo ruído proveniente do interior dos cafés é igualmente afirmado pelos Autores em suas declarações de parte, declarações essas que se apresentaram credíveis e fiáveis à Mmª Juíza e tanto assim que, na sua apreciação crítica, deixa exarado que Das declarações prestadas pelos autores resulta e tal também decorre de regras de senso comum, que o funcionamento dos estabelecimentos de café/bar, provoca ruídos, que são, obviamente, incomodativos para quem reside nas fracções próximas, em especial durante o período nocturno –fls. 15, § 2º.
Porém, o que efectivamente mais incomoda os autores são os barulhos feitos pelos clientes no exterior do estabelecimento, quer quando se encontram na esplanada, quer quando se concentram nas partes comuns (pracetas e arcadas) do edifício –fls. 15, § 3º.
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Daqui decorre que a Mmª Juíza aceita como fiáveis e dignos de crédito tanto os depoimentos daquelas testemunhas como as declarações de parte destes Autores, transcrevendo partes desses depoimentos e declarações, e, na conjugação de uns e outros, extrai a conclusão que efectivamente no interior dos cafés são produzidos ruídos incomodativos para os moradores do prédio, embora afirme que a maior intensidade dos ruídos são produzidos no exterior, tanto nas esplanadas dos mesmos cafés como na praceta adjacente.
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E efetivamente, as testemunhas M. P. (passagem da gravação de seu depoimento de 02:22 m a 02:40 m; 02:45 m a 03:14 m; 03:19 m a 03:58 m; 04:16 m a 05:09 m; 06:30 m a 07:44 m; 07:95 m a 08:02 m; 08:28 m a 09:15 m; 13:15 m a 14:01 m; 14:03 m a 14:40 m); M. A.
(passagem da gravação de seu depoimento de 01:05 m a 01:32 m; 01:40 m a 02:23 m; 02:53 m a 03:50 m; 04:33 m a 05:31 m; 05:32 m a 07:12 m; 10:00 m a 10:35 m); M. L.
(passagem da gravação de seu depoimento de 02:34 m a 04:08 m; 04:41 m a 05:27 m; 05:31 m a 06:10 m; 06:22 m a 07:33 m; 08:55 m a 09:09 m; 09:39 m a 11:10 m; 12:50 m a 18:02 m); F. F. (passagem da gravação de seu depoimento de 01:40 m a 02:26 m; 02:48 m a 03:20 m; 03:33 m a 04:15 m; 07:02 m a 07:40 m); E. A. (passagem da gravação de seu depoimento de 01:16 m a 01:43 m; 02:02 m a 02:36 m; 03:10 m a 04:18 m; 05:25 m a 05:41 m); J. C.
(passagem da gravação de seu depoimento de 01:32 m a 02:50 m; 03:56 m a 04:08 m; 03:56 m a 04:08 m); e J. J.
(passagem da gravação de seu depoimento de 01:25 m a 02:25 m; 02:28 m a 03:22 m; 03:35 m a 03:58 m; 03:59 m a 04:23 m; 04:27 m a 04:42 m; 05:16 m a 05:20 m), em seus depoimentos, gravados nos termos e tempos referidos e também constantes do art. 6º das alegações, bem como os Autores F. P.
(passagem da gravação de suas declarações de 01:49 m a 03:18 m; 03:50 m a 04:10 m; 07:30 m a 08:32 m; 08:46 m a 09:30 m; 11:20 m a 11:34 m; 13:48 m a 14:06 m; 23:50 m a 24:50 m; 25:23 m a 26:28 m); J. L.
(passagem da gravação de suas declarações de 03:00 m a 03:52 m; 04:05 m a 05:11 m; 05:18 m a 06:39 m; 06:45 m a 07:12 m; 09:12 m a 09:35 m; 12:00 m a 12:47 m; 27:50 m a 30:51 m; e J. N.
(passagem da gravação de suas declarações de 01:50 m a 03:54 m; 04:56 m a 05:50 m; 06:40 m a 06:57 m), em suas declarações de parte, gravados nos termos e tempos referidos e também constantes do art. 9º das alegações, afirmam clara e indubitavelmente a existência de ruídos provenientes dos cafés, pela madrugada dentro...
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