Acórdão nº 37/16.8GLBJA.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 24 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelANA BARATA BRITO
Data da Resolução24 de Setembro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: 1.

No processo abreviado n.º 37/16.8GLBJA, do Tribunal de Comarca de Beja, foi proferido despacho de revogação da suspensão da execução da pena de um ano e três meses de prisão em que o arguido TP foi condenado nos autos e determinado o seu cumprimento efectivo.

Inconformado, recorreu o arguido, concluindo da forma seguinte: “Concluindo: encontra-se o Recorrente social, laboral e familiarmente inserido dentro da sua comunidade, o que diminui as exigências de prevenção especial.

  1. Devendo à vista do que fica dito ser de reinterpretar o Facto Provado n.º 8 em Sentença, sob Ref. 29123812, de diferente modo. Melhor dizendo, o Recorrente já não vive sozinho tendo actualmente outras despesas em função da vida comum que iniciou com a atrás referida SA LII. Sendo que, além do casal, residem com estes mais dois filhos desta companheira, fruto de um outro relacionamento da mesma, os quais naturalmente, já se afeiçoaram ao Recorrente e muito sofrerão com a perda deste “pai” de afecto.

  2. Por outro lado, à cautela, se deixa dito, que, ainda que o cumprimento desta pena fosse fixado em regime de fins-de-semana, quanto a isso deve dizer-se que o Recorrente tem um horário de trabalho que vai das 22h00m-7h00m sob turnos e rotatividade e sujeito a trabalho suplementar o que torna por inconcretizável tal modalidade de pena atendendo aos fins-de-semana e à disciplina carcerária, o que colidiria com o seu direito ao descanso e até de possível execução de trabalho suplementar.

  3. Pois, tal jornada, repete-se SEMPRE e NECESSARIAMENTE sob os mesmos termos, extrapolando muitas vezes até o horário de trabalho convencionado por ser um dia de maior volume de serviço o que tornaria impraticável um horário fixo de entrada num estabelecimento prisional enquanto nenhum é próximo sequer da residência do Recorrente e nem transporte teria para se locomover ao mesmo.

  4. Deste modo, como daqui decorre, a aplicação de tal pena, também por aí, resultaria directa e inevitavelmente no DESEMPREGO DO RECORRENTE.

  5. Além disso, o Recorrente e companheira não habitam em casa própria advindo por isso outros encargos adicionais; despesas essas às quis se somam as demais correntes do dia-a-dia, v.g. alimentação, transportes, água, luz, comunicações…num cômputo de quatro pessoas.

  6. Posto Isto, encontra-se visto e demonstrado de forma idónea e suficiente que o vencimento do Recorrente é IMPRESCINDIVEL para a subsistência da economia comum com a companheira, filhos e para o cumprimento da pensão de alimentos das suas duas filhas.

  7. Porquanto, nem detém o Recorrente da ajuda de familiares ou amigos que os possam eficazmente auxiliar a nível financeiro.

  8. Deixando-se também dito que atendendo à idade do Recorrente e a todo o seu passado, bem como à localidade em que reside e a fraca escolaridade que detém, encontrar um outro trabalho após o cumprimento de uma pena de prisão nunca será tarefa fácil, pois se este já foi complicado de encontrar, agora com tantas limitações e novas condições pejorativas e estigmatizantes, tal tarefa, poderá ser praticamente irrealizável… LX. E veja-se que vive o Recorrente num local recôndito do Alentejo onde os níveis desemprego são particularmente acentuados.

  9. Daí ser imperioso consentir uma nova e derradeira oportunidade ressocializante ao Recorrente! LXII. Pois, tal medida, — essa SIM! —, permitirá ao mesmo interiorizar e reforçar os valores jurídico-penais inerentes às regras de circulação rodoviária.

  10. Acrescendo, lá está, à sua idade e fraca escolaridade, revela-se forçoso ao mesmo ser concebido um plano de intervenção, — diferente da prisão efectiva e continuanda em estabelecimento prisional —, por forma a atender em toda a plenitude e com o máximo de humanismo às necessidades de prevenção especial que este caso requer e que aliás já vem a ser eficientemente estabelecido em virtude do monitoramento que é realizado em virtude da vigilância electrónica e os planos para si estabelecidos pela equipe encarregue do seu cumprimento.

  11. Por tais motivos, e repisando as palavras de Anabela Rodrigues (cfr. in A Determinação da Medida da Pena Privativa da Liberdade) “Será tanto mais profundo e duradouro quanto a pena não se limite a intimidar o condenado, mas na sua execução vise ajudá-lo a superar o seu déficit de socialização”.

  12. Podemos assim entender que tal problema nunca será resolvido na cela de uma prisão durante 1 anos e 3 meses! LXVI. Portanto, in casu, a prisão simplesmente forçará o Recorrente a quebrar os seus laços sociais, potencializando o efeito criminógeno particularmente activo nestas penas privativas de liberdade de curta duração. LXVII. Tendo já o Recorrente no passado demonstrado alguma permeabilidade em aderir a comportamentos de risco, situação que actualmente já não se verifica fruto da estabilidade profissional e emocional que entretanto alcançara (v. Relatório Social, a fls.___).

  13. Fechando, tal pena privativa da liberdade nada mais fará do que um destruir laços que o mesmo detém, os quis demorou a constuir, mas mesmo que apesar de fortes, intensos e sinceros, sairão necessariamente fragilizados pela dureza da pena aplicada.

  14. Portanto, a um tempo, a actual companheira representa o seu principal suporte emocional de vida, i.e. aquela que lhe presta conforto, estabilidade e carinho; a outro tempo, encontra-se este casal seriamente empenhado em construir um projecto de vida comum representando tal ensejo um novo ânimo para a vida do Recorrente em plena comunhão com estes dois filhos da companheira.

  15. Devendo por tudo isso ser de abdicar – para já – do amargo sabor do cativeiro, onde a reclusão de nada resultará.

  16. Logo, uma pena privativa da liberdade, jamais permitirá, no caso concreto, satisfazer, de forma adequada e suficiente as finalidades de punição.

  17. Prevendo-se como consequências directas à aplicação de tal pena principal de prisão ao Recorrente: h) o seu desemprego; i) um inglório fardo para a progenitora das filhas; j) um sentimento de impotência face à miséria em que as filhas ficarão; k) um relacionamento desestruturado, se não mesmo destruído; l) o isolamento social; m) novas “amizades” de cárcere; n) e quiçá um retorno a um comportamento que se encontra remido da sua vida que era o abuso do álcool (v. Relatório Social, a fls.___.).

  18. Resultando daí que o fim que se pretende afastar poderá colidir, outrossim, naquilo que uma pena num Estado de Direito Democrático deve cumprir que é evitar ao agente ingressar por novas fugas ao direito.

  19. Por ai só restará entender que a pena aplicada, sobretudo quando cotejada com a fundamentação do Despacho proferido pelo Tribunal a quo (sob Ref. 30337247), jamais assentou na inexistência de condenações por outro tipo de crime por longo período, as condições pessoais do arguido, ora Recorrente, e a sua situação económica e profissional em que actualmente se encontra.

  20. Ora, como consta na jurisprudência, que seguimos de perto, in Processo do TRL n.º 5380/04-3.ª Secção, Desembargadores: Rodrigues Simão - Carlos Sousa - Miranda Jones -, “Havia pois que a considerar, no seu conteúdo e que a conjugar com os demais elementos do processo, em ordem a poder depois formular um juízo fundado e seguro sobre os motivos e razões de ser da detectada atitude de incumprimento. Impunha-se assim um novo “julgamento” do dito e comprovado incumprimento.” LXXVI. Sendo entendimento da jurisprudência, concretamente da acolhida pelo Tribunal da Relação de Coimbra, in Processo 63/96.1 TBVLF.C1 de 04.06.2008, sendo Relator Jorge Gonçalves que “Ocorrendo uma situação de incumprimento das condições da suspensão, haverá que distinguir duas situações, em função das respectivas consequências: uma primeira quando no decurso do período de suspensão, o condenado, com culpa, deixa de cumprir qualquer dos deveres ou regras de conduta, ou não corresponde ao plano de readaptação (que com a revisão de 2007 passou a ser designado de “plano de reinserção”), pode o tribunal optar pela aplicação de uma das medidas previstas no artigo 55.º do C. P., a saber: fazer uma solene advertência; (…)”.

  21. Ora, tal não se verificou, manifestamente, no despacho recorrido.

  22. Que, por isso, violou o disposto nos art.ºs 55.º e 56., ambos do Código Penal.

  23. Sendo então este o momento de perguntar: face a este quadro será possível encontrar uma solução menos gravosa que uma pena de prisão efectiva? Em nosso modesto entender, CRÊ-SE QUE SIM! LXXX. Ora, bem observando o presente cenário é possível desde já antever um prognóstico bem favorável relativamente ao comportamento do Recorrente, ou seja, a simples censura do facto e a ameaça da pena já são...

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