Acórdão nº 678/18.9T8FIG.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 27 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelJORGE MANUEL LOUREIRO
Data da Resolução27 de Setembro de 2019
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 6.ª secção social do Tribunal da Relação de Coimbra I – Relatório O autor propôs contra a ré a presente acção com a forma de processo comum e emergente de contrato de trabalho, tendo deduzido o pedido seguidamente transcrito: “Nestes termos e na melhor forma em Direito admitidos, requer que a presente Acção seja julgada procedente, na sequência a condenação da Reclamada pelos sofrimentos, transtornos e sacrifícios infligidos ao Reclamante, nomeadamente o quantum doloris, o dano estético e a afirmação pessoal, o que se deduz uma indemnização razoável no montante de €30.000,00, por danos não materiais emergentes do contrato de trabalho.

”.

Alegou, em resumo, que sendo trabalhador subordinado da ré sofreu, na execução desse contrato e por força de uma conduta ilícita e culposa da ré, danos para indemnização dos quais deve a ré ser condenada a pagar a peticionada indemnização.

A ré contestou, pugnando pela improcedência da acção.

Em resumo, negou ter causado o autor os danos pelo mesmo invocados, pois que a patologia invocada pelo autor e as lesões dela decorrentes não estão ligadas com o seu trabalho, não tendo qualquer relação causal com o mesmo.

A acção prosseguiu os seus regulares termos, acabando por ser proferida sentença de cujo dispositivo consta o seguinte: “Pelos fundamentos expostos, julgo a presente ação parcialmente procedente e, em consequência:

  1. Condeno a R. a pagar ao A., a título de danos não patrimoniais emergentes do contrato de trabalho celebrado por A. e R. , a quantia total de € 10.000 (dez mil euros); b) Absolvo a R. do demais peticionado pelo A.

”.

Inconformada com o assim decidido, apelou a ré, rematando as suas alegações com as conclusões seguidamente transcritas: ...

Contra-alegou o autor, pugnando pela improcedência da apelação.

Nesta Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

II) - Questões a decidir Sendo pelas conclusões que se delimita o objecto do recurso (artigos 635º/4 e 639º/1/2 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei 41/2013, de 26/6 – NCPC – aplicável “ex-vi” do art. 87º/1 do Código de Processo do Trabalho – CPT), integrado também pelas que são de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido decididas com trânsito em julgado, são as seguintes as questões a decidir: 1ª) se a decisão sobre a matéria de facto padece, em relação ao descrito no ponto 8º) dos factos descritos como provados, de algum vício que implique a necessidade da sua reformulação; 2ª) se padece de lapso de escrita a data de 12/6/2018 constante do ponto 6º) dos factos descritos como provados e se foi incorrectamente julgada, devendo ser alterada no sentido de ser dada como não provada, a matéria de facto enunciada no ponto 8º) dos factos descritos como provados; 3ª) se não ocorre nexo de causalidade adequada entre algum comportamento da ré e o dano para a indemnização do qual o tribunal recorrido arbitrou ao autor uma determinada indemnização; 4ª) se não pode considerar-se culposa a conduta da ré que originou o dano para indemnização do qual o tribunal recorrido atribuiu a autor uma indemnização; 5ª) se a indemnização a atribuir ao autor deveria ser reduzida ou mesma excluída com fundamento no art. 570º do CC; 6ª) se é excessiva a indemnização de 10.000 euros arbitrada ao autor pela sentença recorrida.

III – Fundamentação

  1. De facto Factos provados O tribunal recorrido deu como provados os factos seguidamente transcritos: ...

  2. De Direito Primeira questão: se a decisão sobre a matéria de facto padece, em relação ao descrito no ponto 8º) dos factos descritos como provados, de algum vício que implique a necessidade da sua reformulação.

Nos termos do art. 607º/4 do NCPC, “Na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência.

”.

Na pretensão de se dar cumprimento ao enunciado nesta norma, discorreu assim o tribunal recorrido: “Para a fixação dos factos dados como provados (e que constam supra), atendeu-se, desde logo, aos factos alegados pelo A. que foram aceites pela R., que foram, deste modo, dados como assentes na sua parte aproveitável, tendo o Tribunal, na parte restante e para alicerçar a sua convicção, atribuído relevância ao conjunto da prova produzida, analisada e concatenada criticamente de acordo com as regras da experiência comum.

Assim, foram considerados, desde logo, os depoimentos das testemunhas ...

No mais, foi considerado todo o acervo documental junto pelas partes aos autos, sopesado e ponderado de forma crítica e conjugada com a restante prova produzida, em especial o contrato de trabalho celebrado por A. e uma outra sociedade e documento relativo à sua posterior “transferência” para a R., as várias “declarações” e “relatórios” médicos e documentos relativos à assistência clínica prestada ao A. e ao seu estado de saúde (incluindo fotografias), bem como, por último, a correspondência (eletrónica ou postal) trocada por A. e R., os documentos relativos a uma inspeção da Autoridade para as Condições do Trabalho (que tendem a confirmar o alegado pelo A.) e o horário de trabalho cumprido mais recentemente pelo A. ao serviço da R..

Quanto às respostas negativas/restritivas/modificativas dadas a parte da matéria de facto alegada, tal sucedeu, para além de tudo o que já referimos supra, devido à inexistência de prova suficiente e credível em relação a estes (considerando também a regra constante do Art. 414º do Novo Código de Processo Civil, aplicável subsidiariamente por força do disposto no Art. 1º, n.º 2, al. a) do Código de Processo do Trabalho, nos casos de dúvida), não tendo sido referidos de forma crível e convincente pelas pessoas inquiridas ou comprovados suficientemente pelos documentos juntos a este processo.

”.

A respeito do dever de motivação da decisão sobre a matéria de facto, já à luz do anterior CPC ensinavam Antunes Varela, Miguel Beleza e Sampaio Nora que “A motivação das respostas positivas aos quesitos exige, como suporte mínimo, a concretização do meio probatório gerador da convicção do julgador (o depoimento do autor ou do réu, o laudo de um dos peritos, o depoimento de certa testemunha, o trecho de determinada carta, etc.), como se depreende do disposto no n.º 3 do artigo 712, que admite o retorno do processo, da Relação ao tribunal da 1.ª instância, e a repetição eventual de certas diligências instrutórias, a fim de se identificarem os meios concretos de prova decisivos para a convicção dos julgadores.

Além do mínimo traduzido na menção especificada (relativamente a cada facto provado) dos meios concretos de prova geradores da convicção do julgador, deve este ainda, para plena consecução do fim almejado pela lei, referir, na medida do possível, as razões da credibilidade ou da força reconhecida a esses meios de prova.’’ - Manual de Processo Civil, 2.ª ed., Coimbra Editora, p. 653.

No mesmo sentido, ensinava Miguel Teixeira de Sousa que “A fundamentação da apreciação da prova deve ser realizada separadamente por cada facto. A apreciação de cada meio de prova pressupõe conhecer o seu conteúdo (por exemplo, o depoimento da testemunha) determinar a sua relevância (que não é nenhuma quando, por exemplo a testemunha afirmou desconhecer o facto) e proceder à sua valoração (por exemplo, através da credibilidade da testemunha ou do relatório pericial). Se o facto for considerado provado, o tribunal deve começar por referir os meios de prova que formaram a sua convicção, indicar seguidamente aqueles que se mostraram inconclusivos e terminar com a referência àqueles que, apesar de conduzirem a uma distinta decisão, não foram suficientes para infirmar a sua convicção. Se o facto for julgado não provado, a ordem preferível é a seguinte: primeiramente devem ser indicados os meios de prova que conduzem à demonstração do facto; depois devem ser expostos os meios que formaram a convicção do tribunal sobre a não veracidade do facto ou que impedem uma convicção sobre a não veracidade do facto ou que impedem uma convicção sobre a sua veracidade; finalmente, devem ser referidos os meios inconclusivos.’’ - Estudos Sobre o Novo Processo Civil, 2.ª ed., p. 348.

Não desconhecendo estes ensinamentos, bem assim como alguma adesão jurisprudencial aos mesmos (v.g. acórdão do STJ de 15/7/2007, proferido no processo 07A924; acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 8/3/2018, proferido no processo 4678/09.1TBALM.L1-8; os acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte de 25/5/2016, proferido no processo 00724/04.3BEVIS, e de 30/11/2017, proferido no processo 00742/13.0BEBRG), o certo é que os não sufragamos.

Com efeito, o art. 607º/4 do NCPC não exige que a...

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