Acórdão nº 150/18.7PCRGR.L1-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 10 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelJOSÉ ADRIANO
Data da Resolução10 de Setembro de 2019
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, na 5.ª Secção (Criminal) da Relação de Lisboa: I - Relatório: 1.

Após acusação do Ministério Público, o arguido A.

foi submetido a julgamento, em processo comum e perante o tribunal colectivo do Juízo Central Criminal de Ponta Delgada (J1), Comarca dos Açores, tendo sido condenado, por acórdão de 26 de Fevereiro de 2019, nos seguintes termos (transcrição do respectivo dispositivo): “Pelo exposto, acordam os Juízes que compõem este Tribunal Coletivo: Condenar A. pela prática de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152°, n° l, alínea a) e n° 2 do Código Penal, na pena de 4 anos de prisão.

Condenar A. pela prática de um crime de violação de imposições, proibições ou interdições, previsto e punido pelo artigo 353° do Código Penal, na pena de 10 meses de prisão.

  1. Condenar A. pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo artigo 143°, n° l do Código Penal na pena de 1 ano e 2 meses de prisão.

  2. Condenar A. pela prática de um crime de ameaça agravada, previsto e punido pelo artigo 153°, n° l, alínea a) e 155°, n° l, alínea a) do Código Penal na pena de 1 ano de prisão.

  3. Efetuado o cúmulo jurídico, condenar A. na pena única de 5 anos e 6 meses de prisão.

  4. Arbitrar, a título indemnizatório, 800,00€ a favor da ofendida TA.

  5. Determinar a recolha de amostra de ADN ao arguido e subsequente inserção na base de dados prevista na Lei n° 5/2008, de 12 de fevereiro.

  6. Condenar o arguido no pagamento das custas processuais, as quais se fixam em 3 UCS (artigos 513° e 514° do Código de Processo Penal e 8o, n°9 do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III Anexa].

    …” 2.

    Inconformado, o arguido A.

    recorreu daquela decisão, formulando as seguintes conclusões: 1. Não pode o Recorrente conformar-se com o subscrito no douto acórdão; 2. O Recorrente não pode conformar-se com o subscrito no douto Acórdão no que diz respeito à imputação ao Recorrente de um crime de violência doméstica, bem como no que concerne à pena que lhe foi aplicada, em cúmulo jurídico pela alegada prática do crime de violação de imposições, proibições ou interdições, p. e p. pelo artigo 353.° do CP; de um crime de ofensas à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143.° n.º l CP e de um crime de ameaça agravada, p. e p. pelo artigo 153.° n.° 1 al. a) e 155.° n.° 1 al. a) do CP; 3. Afigura-se ao aqui Recorrente que, salvo o devido respeito, carece de fundamento de facto e de direito a douta Sentença que o condenou na pena única de 5 anos e 6 meses (cinco anos e seis meses) de prisão efetiva; 4. Encontra-se errada e incorretamente julgada a matéria de facto dada como provada nos pontos 4, 7 e 12 a qual deveria antes ter sido dada como não provada porque assim o impunha toda a prova produzida e a ausência de prova da prática do crime pelo arguido A. ; 5. Nestes autos claramente também deveria ter sido ditada uma absolvição do crime de violência doméstica, uma vez que, de forma alguma, racional e logicamente, se poderia ter dado como provada a imputação de tal crime ao arguido, p. e p. pelo art.° 152.° n.° 1 al. a) e n.° 2 do Código Penal; 6. O Tribunal a quo deu como provado os pontos 4, 7 e 12 os quais por brevidade aqui se dão por reproduzidos para todos os efeitos legais; 7. Acontece que, salvo o devido respeito, não foi produzida prova segura e inequívoca que o arguido, ora Recorrente, foi autor dos alegados factos no ponto 12 e agente do crime de violência doméstica pelo qual veio a ser condenado; 8. Para formar a convicção do Tribunal a quo quanto à prática do crime de violência doméstica pelo aqui Recorrente na douta Sentença, foi apenas tido em consideração o depoimento da ofendida TA , desvalorizando-se por completo a prova pericial; 9. Acontece que o depoimento da ofendida TA não permitia (nem permite), salvo o devido respeito e melhor opinião, atribuir a prática do crime ao aqui Recorrente. O seu depoimento não passou de uma contradição do depoimento prestado pelo arguido; 10. Assim, não se podia ter formado no tribunal a convicção positiva, para além de qualquer dúvida razoável, de que o arguido praticou os factos que resultaram provados; 11. Não havendo provas concludentes teria que haver uma aplicação do princípio in dúbio pro reo; 12. Pelo exposto, o supra identificado depoimento da ofendida TA não permitia, nem permite, com o devido respeito, ao Tribunal a quo dar como provada a factualidade vertida no ponto 12 dos factos provados. Na realidade, impunha que esses factos fossem dados como não provados; 13. A não ter assim considerado a douta Sentença recorrida violou os artigos 118.º, 125.°, 127.°, 340.º, 374.º e 410.º, n.º 2, al. a) e c) todos do CPP e os artigos 40.° n.° 1 e 2, 50.º, 51.°, 70.°, 71.° n.° 1 e 2, 72.º e 152.° n.° 1 al. a) e n.° 2, todos do Código Penal e ainda os 205.° e 32.º da CRP; 14. Assim como também não devem ser dados como provadas as factualidades vertidas nos pontos 4 e 7; 15. Acresce que, conforme supra referido, perante a prova produzida em audiência de discussão e julgamento, a qual era manifestamente insuficiente para atribuir ao Recorrente a autoria do crime de violência doméstica, pelo que deveria o Tribunal a quo ter absolvido o arguido, e, a não o fazer, violou, entre outros, o princípio in dúbio pro reo e da verdade material; 16. A escolha da pena reconduz-se, numa perspetiva político-criminal a um movimento de luta contra a pena de prisão. A este propósito dispõe o art. 70.° do Código Penal que "se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e não privativa de liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição".

    Assim exprime, o legislador, a preferência pelas penas não privativas de liberdade; 17. É certo que a única vantagem que a pena de prisão pode apresentar face a qualquer outra pena não privativa de liberdade, reside precisamente na circunstância de corresponder ainda hoje ao sentimento generalizado da comunidade a convicção de que, em muitos casos criminais, a privação de liberdade é o único meio adequado de estabilização contrafáctica das suas expetativas, se em seu entender, "fazer-se justiça", abaladas pelo crime, na vigência da norma violada, podendo ao mesmo tempo servir a socialização do transgressor; 18. Todavia não se poderá corresponder a tal sentimento generalizado da comunidade, condenando em penas de prisão efetiva. Antes de mais há que atender às constatações da moderna criminologia tendentes à afirmação de que "aquele que cumpre uma pena de prisão é desinvestido profissional e familiarmente, sofre o contágio prisional, fica estigmatizado com o labéu de ter estado na prisão e não é compensado muitas vezes, com uma efetiva socialização".

    Para além de que a privação da liberdade pode representar um peso diferente consoante a personalidade de quem a sofre sem que essa diferente "sensibilidade à privação da liberdade" possa ser adequadamente levada em conta na medida da pena. Não se olvidem, por fim, embora num plano diferente, os elevadíssimos custos financeiros públicos do sistema prisional; 19. Por conseguinte, a opção pela pena de prisão só se justificará quando tal for imposto pelos fins das penas - previstos no art. 40.° n.° 1 do CP: "A aplicação de penas e medidas de segurança visa a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade" (sublinhado nosso); 20. Pelo exposto, e sem prescindir o supra referido quanto à absolvição do arguido, e admitindo-se a prática do crime de violência doméstica pelo arguido, ora Recorrente, para mero efeito de raciocínio, deveria o Tribunal a quo ter optado pela pena mínima prevista no art. 152.° n.° 2 CP e suspensa na sua execução por igual período, uma vez que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficientes as finalidades da punição; 21. Ainda, e relativamente aos restantes crimes pelos quais o arguido, ora Recorrente, vem acusado (um crime de violação de imposições, proibições ou interdições; um crime de ofensas à integridade física simples e um crime de ameaça agravada) e considerando que o mesmo assumiu, na sua generalidade, a prática dos factos, é do nosso entendimento que o arguido deve ser condenado em pena de multa, ou e, sem conceder, nas penas mínimas previstas para cada tipo legal de crime, suspensas na sua execução; 22. Quanto ao crime de ofensas à integridade física simples, importa ainda referir que é do nosso entendimento, considerando o depoimento da ofendida Teolinda Andrade, no qual não escondeu que também bateu no arguido, que deve o Tribunal a quo proceder à dispensa de pena por ter havido lesões recíprocas, não tendo ficado provado qual dos contendores agrediu primeiro (art.º 143.° n.° 3 al. a) do CP); 23. Também deve a indemnização fixada ser substancialmente reduzida atenta a diminuta gravidade dos ferimentos e a reciprocidade das ofensas físicas.

    TERMOS EM QUE E NOS DEMAIS DE DIREITO DEVE SER DADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, EM CONSEQUÊNCIA:

    1. DAR-SE COMO FACTOS NÃO PROVADOS A MATÉRIA DE FACTO DOS PONTOS 4, 7 E 12 - cfr. Art. 410.º n.º 2 Al. a) e c) do CPP; b) REVOGAR-SE A DOUTA SENTENÇA NA TOTALIDADE NOS PRECISOS TERMOS E PELAS RAZÕES SUPRA EXPENDIDAS; c) SER O ARGUIDO ABSOLVIDO DO CRIME DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA DE QUE VEM ACUSADO E FOI CONDENADO, OU SE ASSIM NÃO SE ENTENDER, DEVERÁ A PENA DE PRISÃO SER REDUZIDA AO MÍNIMO LEGAL (ART. 152.º N.º 2 CP) E SUSPENSA NA SUA EXECUÇÃO, UMA VEZ QUE A SIMPLES CENSURA DO FACTO E A AMEAÇA DA PRISÃO REALIZAM DE FORMA ADEQUADA E SUFICIENTES AS FINALIDADES DA PUNIÇÃO; d) SER O ARGUIDO, FACE AOS RESTANTES CRIMES PELOS QUAIS VEM ACUSADO, SER CONDENADO EM PENA DE MULTA PARA CADA UM DELES, OU E, SEM CONCEDER, NAS PENAS MÍNIMAS PREVISTAS PARA CADA TIPO LEGAL DE CRIME, SUSPENSAS NA SUA EXECUÇÃO; e) QUANTO AO CRIME DE OFENSAS À INTEGRIDADE FÍSICA SIMPLES, PROCEDER-SE À DISPENSA DE PENA POR TER HAVIDO LESÕES...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT