Acórdão nº 40/12.7IDVRL.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 25 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelAUSENDA GON
Data da Resolução25 de Junho de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório No processo comum singular n.º 40/12.7IDVRL, do Juízo de Competência Genérica de X do Tribunal Judicial da Comarca de Vila Real, por sentença proferida e depositada a 22-03-2018, os arguidos F. B., S. C., M. A., M. P.

e M. L.

foram condenados, como coautores materiais de um crime de fraude fiscal, p. e p. pelo artigo 103º, do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), nas penas de 160 dias de multa, os dois primeiros à taxa diária de € 4 e os restantes à taxa diária de € 8, e ainda, a pagarem solidariamente à demandante Autoridade Tributária e Aduaneira, representada pelo Ministério Público o montante de € 55.213,55.

Inconformado com a decisão, o Ministério Público interpôs recurso que rematou com as seguintes conclusões: «1. O presente recurso versa exclusivamente matéria de direito, na parte atinente à escolha e medida da pena aplicada.

  1. A douta sentença recorrida condenou cada um dos arguidos na pena de 160 dias de multa, pena a nosso ver inadequada, dado que, no caso, a pena não privativa da liberdade não se revela suficiente para acautelar as finalidades da punição.

  2. Entendemos que uma correta aplicação do normativo ínsito nos arts. 40, n.º 1 e 70.º, do Código Penal impunha a aplicação aos arguidos de uma pena privativa da liberdade, ainda que suspensa na sua execução, pelo que se pugna, pois, in casu apenas a pena detentiva satisfaz as necessidades da punição.

  3. Refere-se na douta sentença que: “As exigências de prevenção geral e especial revelam-se acentuadas, em face da banalização da prática do crime em análise, demonstrada pelos elevados índices de criminalidade fiscal; A ilicitude revela-se normal para o tipo; A consequência do ilícito reveste alguma gravidade, na medida em que os arguidos causaram ao Estado um prejuízo de valor relativamente elevado. O grau da culpa mostra-se elevado, tendo em conta que os arguidos agiram com dolo direto.” 5. E, baseia-se o Tribunal para a aplicação da pena de multa (saliente-se, 160 dias) apenas no facto de os arguidos não terem registados antecedentes criminais e de estarem social e familiarmente inseridos.

  4. A escolha das penas é determinada apenas por considerações de natureza preventiva, uma vez que as “finalidades da punição” são exclusivamente preventivas. Assim, a escolha da pena depende de critérios de prevenção geral e especial, pelo que o julgador, perante um caso concreto, tem que valorar os factos para depois optar por aplicar uma pena detentiva ou não detentiva.

  5. A escolha da pena, nos termos do artigo 70.º, do C. Penal, depende exclusivamente das finalidades da punição, pelo que o julgador só deve optar pela cominação de pena privativa da liberdade quando a mesma se mostre consentânea com os princípios de prevenção geral e especial, isto é, quando se mostre necessária porque a aplicação de pena não detentiva não se mostra adequada e suficiente às finalidades da punição. Mas em tal situação deve aplica-la.

  6. Sobre a escolha da pena a aplicar nos crimes fiscais são de considerar prementes no caso as exigências de prevenção geral.

  7. É certo que os arguidos não têm passado criminal, mas nada mais milita a favor dos mesmos, sendo que o arguido F. B., o único que prestou declarações, negou os factos.

  8. Não podem ser descuradas as exigências de prevenção especial que no caso se fazem sentir, na medida em que, pese embora, como se disse, os arguidos não tenham passado criminal e estejam inseridos social e familiarmente, no que respeita ao arguido F. B. negou os factos, chegando mesmo, numa de defesa concertada com os arguidos S. C. e M. A., e através de requerimentos iguais, a manifestar com eles oposição ao que foi determinado oficiosamente pelo Tribunal, quanto a obterem-se os extratos das suas contas bancárias, para se conhecer quem procedera ao pagamento do distrate da hipoteca do imóvel e com que dinheiro, vindo a apurar-se ser do montante de € 215.000,00.

  9. Assim, entendemos ser de aplicar aos arguidos pena de prisão, sob pena de as sanções para as condutas em análise serem tomadas como simples impostos, assim se contribuindo para a manutenção do grau de frequência do referido ilícito.

  10. Tal como refere o Dr. Jorge dos Reis Bravo, “nas infrações fiscais ou tributárias puníveis, em alternativa, com pena de multa ou de prisão, a opção por esta última impõe-se dadas as fortes razões de prevenção geral que particularmente se fazem sentir neste tipo de ilícitos e sempre que o benefício ilegítimo obtido pelo arguido, com o correspondente prejuízo para o Estado, seja significativo”.

  11. Assim, sendo o benefício obtido já considerado significativo (€55.213,55), entendemos ser de revogar a decisão recorrida, uma vez que a pena não detentiva (concretamente, a pena de 160 dias de multa) não se mostra suficiente para realizar as finalidades da punição (art. 70.º do C. Penal) e a proteção dos bens jurídicos e a integração do agente na sociedade (art. 40.º do mesmo diploma legal).

  12. No que respeita à medida da pena, importa dizer que na aplicação da medida da pena deve ter-se em conta o disposto no art. 71.º, nº 1 e 2, do C. Penal. Dispõe o n.º 1, que a determinação da medida da pena é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção (geral e especial). Visando-se, com a aplicação das penas, a proteção de bens jurídicos e a reintegração social do agente, conforme preceituado no art. 40.º, nº 1, do Cód. Penal.

  13. Dispõe ainda o art. 13.º do RGIT que “ Na determinação da medida da pena atende-se sempre que possível, ao prejuízo causado pelo crime”.

  14. No caso concreto entendemos que ilicitude revela-se acentuada e as consequências do ilícito assumem gravidade, na medida em que os arguidos causaram ao Estado um prejuízo de valor já considerável (€55.213,55), prejuízo esse que nenhum dos arguidos ressarciu.

  15. O grau da culpa mostra-se acentuado, tendo em conta que os arguidos agiram com dolo direto.

  16. Por sua vez as exigências de prevenção geral e especial revelam-se acentuadas, havendo que incentivar nos cidadãos a convicção que comportamentos desta natureza são punidos, assim como há que dissuadir os arguidos para que não voltem a prevaricar.

  17. Entendemos, assim, atenta a natureza de uma pena ou sanção, o condenado tem de senti-la, sob pena não surtir o efeito pretendido pela lei e não sentirá, certamente, com uma pena de multa de 160 dias.

  18. Tendo em conta o supra expendido e a moldura penal do crime (pena de prisão até três anos), e uma vez que os arguidos não têm passado criminal, temos como justa e adequada a pena concreta de 1 (um) ano de prisão.

  19. Quanto à suspensão da execução da pena, o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 8/2012, decidiu: «No processo de determinação da pena por crime de abuso de confiança fiscal, p. e p. no artigo 105.º, n.º 1, do RGIT, a suspensão da execução da pena de prisão, nos termos do artigo 50.º, n.º 1, do Código Penal, obrigatoriamente condicionada, de acordo com o artigo 14.º, n.º 1, do RGIT, ao pagamento ao Estado da prestação tributária e legais acréscimos, reclama um juízo de prognose de razoabilidade acerca da satisfação dessa condição legal por parte do condenado, tendo em conta a sua concreta situação económica, presente e futura, pelo que a falta desse juízo implica nulidade da sentença por omissão de pronúncia.».

  20. Tendo em conta as condições económicas dos arguidos que resultaram provadas, entendemos que existe o indicado juízo de prognose de possibilidade de satisfação da condição legal.

  21. Nos termos do art. 14.º do RGIT, a suspensão da execução da pena de prisão aplicada é sempre condicionada ao pagamento, em prazo a fixar até ao limite de 5 anos subsequentes à condenação, da prestação tributária e acréscimos legais, podendo ser acrescida do pagamento de quantia até ao limite máximo estabelecido para a pena de multa.

  22. Assim, não tendo os arguidos antecedentes criminais registados, entendemos que a pena de 1 (um) ano de prisão a aplicar aos arguidos, deverá ser suspensa na sua execução com a condição de os arguidos, solidariamente, procederem ao pagamento dos impostos em dívida e acréscimos legais.

  23. Ao assim não decidir, tendo condenado os arguidos em pena de multa (160 dias), violou o Tribunal a quo o disposto nos arts. 40º, 50.º, 70.º, 71.º do C. Penal, 13.º e 14.º, do RGIT.» Os arguidos M. A., M. P. e M. L.

    também interpuseram recurso, de cuja motivação se extraem as conclusões que seguem: «1) A Mmª Juíza “a quo”, entendeu, no que respeita ao elemento subjectivo, ou seja o dolo, com que os arguidos/recorrentes terão actuado, que se verificou, chegando a essa conclusão lançando da chamada “prova indirecta”, fazendo uma análise objectiva das condutas adoptadas por todos os arguidos e concluindo que os elementos do dolo estiveram presentes nas condutas de todos eles.

    2) Salvo o devido respeito, que é muito, não se pode concordar com essa conclusão, uma vez que o uso de prova indirecta implica dois momentos de análise: Um primeiro requisito, de ordem material, exigirá que os indícios estejam completamente provados por prova directa, os quais devem ser de natureza inequivocamente acusatória, plurais, contemporâneos do facto a provar e sendo vários devem estar interrelacionados de modo a que reforcem o juízo de inferência; 3) Posteriormente, um juízo de inferência que seja razoável, não arbitrário, absurdo ou infundado, respeitando a lógica da experiência e da vida (dos factos base há-de derivar o elemento que se pretende provar, existindo entre ambos um nexo preciso, directo, segundo as regras da experiência).

    4) Tendo presentes estes pressupostos e com relevo, veja-se o que é dito na douta sentença em crise: 5) “16. Em data não apurada, mas anterior a 03.06.2011, os arguidos F. B. e S. C. acordaram com os compradores, o arguido M. A. e com os seus pais, M. P. e M. L., que iam representar na escritura, a venda dos referidos imóveis e combinaram...

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