Acórdão nº 52/18.7T9MTR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 25 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelISABEL CERQUEIRA
Data da Resolução25 de Junho de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Relatório Nos autos de instrução que correram termos pelo Juízo de Competência Genérica de Montalegre, da Comarca de Vila Real, por decisão de 9/01/2019 (fls. 85 a 91), foi decidido não pronunciar o arguido J. F. pela prática do crime de furto simples que lhe era imputado no requerimento de abertura de instrução do assistente M. S., requerimento apresentado na sequência do despacho de arquivamento do M.P. de fls. 48 e seguintes.

O recorrente/assistente interpôs daquele despacho o presente recurso (fls. 101 a 106 verso), alegando, em síntese, terem sido em sede de inquérito recolhidos indícios suficientes da prática de actos materiais que integram subtracção de água alheia, pelo que, deveria o recorrido ter sido pronunciado pela prática de um crime de furto, por a água ter que ser considerada para efeitos penais um bem móvel, por esse conceito depender aqui à percepção social da norma que proíbe o furto, e não ao conceito civil previsto no art.º 204º do C.C., que classifica aquele bem como coisa imóvel, classificação acolhida na decisão recorrida.

A Magistrada do M.P. junto da 1ª instância e o arguido responderam (respectivamente fls. 116 a 119 e 126 e seguinte), pugnando ambos pela total improcedência do recurso interposto.

O Ex.mº Sr. Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu o douto parecer de fls. 133 a 136, no qual se pronuncia pela procedência do recurso.

Foi cumprindo o disposto no n.º 2 do art.º 417º do CPP, tendo o arguido apresentado a resposta de fls. 140 e seguinte, foram colhidos os vistos legais, e procedeu-se à conferência, cumprindo decidir.

*****É o seguinte o teor da decisão recorrida, que se transcreve apenas parcialmente: … IV. Fundamentação de facto

  1. Factos indiciados Resultaram indiciados os seguintes factos com relevo para a boa decisão da causa: A) O requerente é dono e legítimo possuidor de um prédio rústico, composto de lameiro, situado na "Ladeira ..." ou "Lamego" na localidade de ..., que sendo fisicamente um único prédio, é composto por três artigos matriciais rústicos, a saber: - Artigo 1438, composto de pastagem de sequeiro, com a área de 2680m2, que confronta de Norte e Sul com J. T., Nascente com baldio e Poente com A. T., - Artigo 1439, composto de pastagem de sequeiro, com a área de 4310m2, que confronta de Norte com A. S., Sul com J. L., Nascente com caminho e Poente com A. T.

    - Artigo 1440 composto de cultura arvense de sequeiro, com a área de 2200m2, que confronta de Norte e Poente com caminho, Sul e Nascente com J. T., não descritos na CR).

  2. É igualmente comproprietário de uma água que utiliza em proveito agrícola e para rega do seu terreno identificado no parágrafo anterior.

  3. Essa água nasce numas fragas num sítio conhecido por fraga do lamego, que por sua vez corre por gravidade para um poço situado um pouco a sul e daqui segue por gravidade através de rego a céu aberto, até ao caminho da cruz, por onde segue num rego ali existente desde sempre na borda do caminho, até ao prédio do queixoso.

  4. Daqui esse rego passa por um caminho público que bordeia um terreno do arguido J. F..

  5. Tal água é propriedade do queixoso e outros proprietários com quem não há qualquer problema para efeitos dos presentes autos.

  6. No ano de 2014, o arguido, procurou apoderar-se do caminho que bordeava o seu terreno e bem assim procurou ali derivar a água para o mesmo, cortando o regato por onde passava a dita água e com isso fez com que o requerente deixasse de poder aproveitá-la.

  7. Em reacção a tais actos, o requerente propôs no então Tribunal de Montalegre uma acção, que deu origem ao processo 242/13.9TBMTR, onde foi proferida sentença, na qual, o denunciado foi condenado a reconhecer que o caminho da cruz (que bordeia o terreno dele, denunciado), é público e a desobstrui-lo de pessoas e bens, sendo ainda condenado a reconhecer que a água acima descrita não lhe pertence e como tal deveria abster-se de a subtrair ou de praticar qualquer acto que perturbe o seu normal uso pelo requerente.

  8. O arguido desde então respeitou a sentença e nunca mais voltou a haver problemas.

  9. Sucede que, desde há dois Março/Abril do ano corrente a esta parte que o arguido voltou a praticar actos de subtracção da água, sendo que tais actos consistiram inicialmente em fazer derivações do regato por onde passa para o terreno dele, depois colocando tubos e ultimamente colocando pedras que impedem a passagem normal da água para o terreno do queixoso e fazendo com que a mesma derive para o que é dele arguido.

  10. O requerente quando se apercebe, procede à torna para o que é seu voltando costas o arguido ali vai, e volta a proceder à derivação e prossegue na sua conduta apesar de já intimado para o efeito.

  11. Factos não indiciados 1. O arguido actua de forma livre voluntária e consciente, bem sabendo que a sua conduta é proibida e punida por lei, com o propósito de subtrair e fazer sua o caudal de água que pertence ao requerente.

  12. Motivação da convicção A convicção do tribunal relativamente aos factos dados como indiciados e assentou em toda a prova produzida em sede de inquérito e instrução, nomeadamente: caderneta predial rústica referente aos prédios inscritos na matriz predial sob o n.º 1438; 1439 e 1440; ortofotomapa referente ao prédio em questão nos autos; petição inicial que deu origem ao processo n.º242/13.9TBMTR; cópia da sentença proferida no referido processo; auto de inquirição do ofendido de fls. 27, no qual confirma o teor da queixa-crime apresentada; auto de inquirição do arguido, de fls. 31, no qual afirmou existir um acordo com o queixoso no sentido de ambos tornarem a água em causa nos autos...

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