Acórdão nº 2699/17.0T8VCT-J-G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelEUG
Data da Resolução06 de Junho de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães*I.

RELATÓRIO O insolvente, (…) não se conformando com o despacho proferido a 24/01/2019, com o seguinte teor: “Conforme resulta do auto de apreensão junto ao presente apenso, o Sr. Administrador de Insolvência procedeu à apreensão da meação do insolvente em cada um dos concretos bens imóveis apreendidos, e isto porque o insolvente é casado. Porém, estando em causa bens comuns do casal, a meação do insolvente não incide sobre bens concretos e determinados mas, antes, sobre a totalidade do património comum do casal.

Por essa razão, a jurisprudência tem entendido que é inadmissível a penhora ou apreensão de "um direito à meação" em cada um dos bens que constitui o património comum do casal, uma vez que nenhum dos cônjuges possui uma quota-parte sobre bens em concreto, sendo titulares de um único direito sobre o património autónomo, que não suporta divisão, nem mesmo ideal (neste sentido, a título meramente exemplificativo, Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 11/03/2014, in www.dgsi.pt).

Assim, entende-se que não encontra fundamento legal a apreensão da meação de concretos bens imóveis, em função do casamento do insolvente, dado que cada um dos cônjuges não é titular de metade de cada um dos bens, mas da meação da totalidade dos mesmos, quando tais bens, obviamente, não se tratam de bens próprios ou excluídos da comunhão (neste sentido Acórdão da Relação de Guimarães, de 20/03/2018, proferido no âmbito do processo 4147/16.3T8VCT-A.G1).

Em face do exposto, determino a correcção do auto de apreensão, procedendo-se à apreensão da totalidade de cada um dos bens imóveis, seguindo-se a citação do cônjuge do insolvente para requerer a separação de bens ou juntar certidão comprovativa da pendência de acção em que a separação já tenha sido requerida (aplicando-se subsidiariamente o disposto no art.º 740º do CPC).

Notifique também os credores e o insolvente”.

dele vem interpor recurso de apelação, pugnando por que seja revogada a decisão recorrida e substituída por outra que mantenha o auto de apreensão inicial, apreensão essa que deve versar apenas sobre o direito à meação de que o insolvente é titular nos referidos bens. Formula, para tanto, as seguintes CONCLUSÕES: “1ª- Agiu correctamente e com cabimento legal, o Sr. Administrador Judicial ao apreender inicialmente apenas o direito à meação em cada um dos bens que constitui o património comum do casal.

  1. - Deverá manter-se nos autos a apreensão de apenas esse direito à meação nesses bens, de que o insolvente é titular.

  2. - É legalmente admissível a apreensão de um direito à meação em cada um dos bens que constitui esse património comum.

  3. - Por isso deverá ser mantido o auto de apreensão inicial desse direito à meação pertencente ao insolvente.

  4. - Não devendo por isso ser corrigido o auto de apreensão. Nem sendo necessário o pedido de separação de bens do cônjuge do devedor.

  5. - Ao decidir em contrário, determinando a correcção desse auto de apreensão inicial, aplicando a estes autos de forma subsidiária o disposto no artigo 740º do CPC, a Meritíssima Juíza a quo, com total respeito, violou esta norma legal por erro de interpretação e aplicação”.

*Não foram apresentadas contra alegações.

*Após os vistos, cumpre apreciar e decidir o mérito do recurso interposto.

*II. FUNDAMENTAÇÃO - OBJETO DO RECURSO Apontemos as questões objeto do presente recurso, tendo presente que o mesmo é balizado pelas conclusões das alegações do recorrente, estando vedado ao tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que se imponha o seu conhecimento oficioso, acrescendo que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do ato recorrido – cfr. arts 635º, nº4, 637º, nº2 e 639º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.

Assim, as questões a decidir são as seguintes: - Se cabia efetuar a apreensão da meação do insolvente nos bens comuns do casal ou se o Tribunal a quo bem andou ao ordenar a apreensão da totalidade de cada um dos bens imóveis que constituem bens comuns do casal e a citação do cônjuge do insolvente para requerer a separação de bens ou juntar certidão comprovativa da pendência de ação em que a separação já tenha sido requerida (aplicando subsidiariamente o disposto no art.º 740º do CPC).

*II.A - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Os factos provados, com relevância, para a decisão constam já do relatório que antecede.

*II.B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO Da apreensão da totalidade de cada um dos bens imóveis, seguindo-se a citação do cônjuge do insolvente para requerer a separação de bens (com aplicação subsidiaria do disposto no art.º 740º do CPC) O processo de insolvência é um processo de execução universal, que tem por finalidade a satisfação dos credores, baseado, designadamente, na liquidação do património do devedor insolvente e repartição do produto obtido pelos credores conforme estabelece o nº1, do artigo 1º, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, abreviadamente CIRE, regendo-se tal processo pelas disposições do referido diploma e, subsidariamente, em tudo o que não contrarie as disposições do referido Código, pelo Código de Processo Civil (nº1, do art. 17º, daquele diploma).

Para tanto, na sentença que declara a insolvência, o juiz, nos termos do art. 36º, nº1, al. g), do CIRE, “decreta a apreensão, para imediata entrega ao administrador da insolvência” de todos os bens do devedor “ainda que arrestados, penhorados ou por qualquer forma apreendidos ou detidos”.

A apreensão dos bens é, pois, um dos principais efeitos da declaração de insolvência.

A apreensão abrange “todos os bens susceptíveis de penhora, ainda que os mesmos tenham sido penhorados, arrestados ou por qualquer forma apreendidos ou detidos noutro processo. Apenas serão excluídos da apreensão os bens insusceptíveis de penhora …” (1).

“A lei é categórica e muito precisa quanto à extensão da operação de apreensão. (…) A norma não deixa, de facto, dúvidas quanto ao alcance geral da apreensão – à universalidade da apreensão -, ficando absolutamente claro que ela abrange todos os bens integrantes do património do devedor, que lhe pertençam já à data da declaração de insolvência ou venham a pertencer-lhe na pendência do respetivo processo” (2), sendo únicas exceções as consagradas no 149º, nº1, do CIRE, os casos de bens insuscetíveis de penhora nos termos gerais – arts 736º e seg, do CPC – e os que resultam da lei da...

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