Acórdão nº 60239/18.0YIPRT-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução06 de Junho de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO “(…) Ldª” apresentou requerimento de injunção (depois aperfeiçoado em nova petição) pedindo a notificação de “(…) SA” para lhe pagar certa quantia por esta devida com fundamento em facturas emitidas por trabalhos alegadamente realizados no âmbito de um contrato de sub-empreitada.

Esta deduziu oposição, além do mais, formulando o pedido (reconvencional) de condenação daquela a pagar-lhe quantia de que se afirma credora (62.943,17€) e, ainda, indemnização “pelo dano excedente” [1], articulado a que respondeu a autora primeiro, considerando apenas aquela como integrando a matéria de excepção, mediante impugnação do alegado bem como dos documentos e, depois, notificada para se pronunciar quanto à matéria da reconvenção, mantendo o requerimento injuntivo, seu aperfeiçoamento e resposta à oposição e acrescentando que a ré “não concretiza qualquer pedido reconvencional e não o faz porque inexiste prejuízos…”.

Em despacho de 04-12-2018, foi proferida a seguinte decisão: “Nos termos do disposto no artigo 266º, nº1, do CPC, “o réu pode, em reconvenção, deduzir pedidos contra o autor”, constituindo fundamentos admissíveis os constantes das alíneas a) a c) do nº2 do mesmo artigo.

Com efeito, a reconvenção é uma espécie de contra-acção ou acção cruzada, em que existe um pedido autónomo formulado pelo réu contra o autor. À acção proposta pelo autor contra o réu, responde este com outra acção por ele proposta contra aquele. Como acção que é, identifica-se não só através da pretensão formulada, mas ainda através do facto jurídico de que emerge essa pretensão. O pedido tem normalmente o mesmo conteúdo do do autor "embora de sinal contrário" (neste sentido, CASTRO MENDES, Direito Processual Civil, Volume II, página 15).

Os seus pressupostos substantivos, seriados no nº 2 do artigo 266º, são os seguintes: emergir o pedido cruzado do facto que serve de fundamento à acção ou à defesa; propósito de obter o direito a benfeitorias ou pagamento de despesas relativas à coisa cuja entrega é pedida; propósito de obter o reconhecimento de um crédito, seja para obter a compensação seja para obter o pagamento do valor em que o crédito invocado excede o do autor; e o propósito do Réu de lograr em seu benefício o mesmo efeito jurídico que o autor se propõe obter.

Nos termos do nº3 do artigo 266º, a reconvenção não é admissível "ao pedido do réu corresponda uma forma de processo diferente da que corresponde ao pedido do autor, salvo se o juiz a autorizar, nos termos previstos nos nºs 2 e 3 do artigo 37º, com as necessárias adaptações. São os chamados pressupostos processuais da reconvenção.

No caso dos autos, importa aferir se o pedido formulado pela ré passa pelo crivo dos pressupostos substantivos previstos no nº2 do artigo 266º do Código de Processo Civil, já acima aludidos.

Assim, nos presentes autos, vêm os réus, grosso modo, peticionar a condenação da autora no pagamento de determinados montantes devidos no âmbito de outras empreitadas existentes entre as partes.

Por conseguinte, invoca um direito de compensação, que cairia, deste modo, no âmbito do artigo 266º, nº2, al. c), do CPC, sendo certo que a admissibilidade da reconvenção neste caso se afigura pacífica – cf. por todos o Acórdão do TRP de 24.01.2018, proc. 200879/11.8YIPRT.P1, in www.dgsi.pt.

Não obstante, a admissibilidade processual de um tal pedido, importa verificar se a mesma contém todos os requisitos necessários à sua apreciação.

Com efeito, temos que no pedido reconvencional em apreço, a ré limita-se a invocar “outras relações contratuais” das quais decorrerá a existência do crédito que peticiona e que pretende compensar.

Todavia, não alega a concreta factualidade que justifica tais créditos, isto é, a sua concreta causa de pedir, composta pelos factos relativos à dita relação contratual, bem como ao seu concreto incumprimento.

Nessa medida, é nosso entender que o pedido reconvencional é inepto, atento o disposto no artigo 186º, nº2, al. a), do CPC.

E tanto assim é, que na sua resposta a autora não logrou contestar em concreto quaisquer factos, tomando apenas uma posição de índole genérica – cf. fls. 190-191; artigo 186º, nº3, a contrario, do CPC.

A ineptidão consiste numa nulidade de conhecimento oficioso – cf. artigo 196º do CPC – que não é passível de sanação – cf. Acórdão do TRG de 16.02.2017, proc. 243/11.1TCGMR.G1, in www.dgsi.pt.

Nestes termos e por estes fundamentos, julga-se inadmissível a reconvenção apresentada pela ré.” Não se conformando, a ré ...

apelou a que esta Relação revogue tal decisão, alegando e concluindo: “1. Nos autos, a R. deduziu em reconvenção contra a A. pedido de compensação de créditos e de condenação desta a pagar àquela o valor remanescente, quer no âmbito do contrato de subempreitada alegado pela A. na injunção, quer no âmbito de outros três contratos de subempreitada concretamente identificados pela R. na oposição com reconvenção.

  1. Além disso, em todos esses contratos, a R. identificou os fundamentos dos seus créditos, juntou aos autos as facturas que os titulam, liquidou os danos / créditos, invocou o incumprimento da A. e apurou o saldo a seu favor sobre esta: os créditos alegados estão em aberto ou por pagar pela A., com saldo a favor da R. de € 62.943,17.

  2. Nos termos do artigo 266º, nº 2, alínea c), do CPC, processualmente, esta compensação de créditos e a condenação da A. a pagar à R. o valor remanescente fazse por reconvenção, o que se justifica desde logo no estrito âmbito do contrato de subempreitada dos autos, onde a R. já tem a seu favor um saldo sobre a A. de € 19.772,83.

  3. Na resposta à reconvenção, a A. não alega qualquer ineptidão da reconvenção, sendo que a impugnação genérica que ela fez não permite concluir-se por essa ineptidão.

  4. Por isso, aqui, não estamos no domínio da falta ou inteligibilidade do pedido ou da causa de pedir, sobretudo quanto a todos os créditos que são invocados pela R., porquanto esta, nos termos do artigo 186º, nº 2, alínea a), do CPC, só existe quando é total e absoluta, o que manifestamente não é o caso.

  5. Por isso, fica claro que a reconvenção da R. deduzida na oposição à injunção não é inepta, nem por falta ou inteligibilidade do pedido ou das causas de pedir invocadas nem por qualquer outra razão. Nem é meio processual inadequado para esse efeito. Logo, nada obsta à sua admissão.

  6. Porém, ao assim entender, o Tribunal recorrido violou os artigos 186º, nº 2, alínea a), e 266º, nº 2, alínea c), do CPC, impondo-se, ao seu abrigo, a revogação do despacho recorrido e a admissão da reconvenção, com as inerentes consequências processuais, sem prejuízo dos demais poderes do juiz que ao caso caibam.

    Nestes termos, e nos demais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá o recurso ser julgado procedente por provado e, consequentemente, revogado o despacho recorrido, proferindo-se acórdão que: a) Admita a reconvenção, Ou, subsidiariamente, b) Admita pelo menos parcialmente a reconvenção, para efeitos do que vem alegado nos artigos 1º a 30º da oposição à injunção e consequente compensação de créditos nessa parte e condenação da A. a pagar à R. o remanescente; Seguindo-se a demais tramitação processual, Só assim se fazendo Justiça!” Em resposta, a autora pugna por que seja negado provimento do recurso e confirmada a decisão recorrida, uma vez que, resumindo, entende não terem sido alegados factos concretos integrantes da causa de pedir e justificativos do pedido, pois “a R., na ânsia de nada pagar faz uma mescla de diversos contratos e acaba por nada mais alegar”, não sendo sequer caso de convite ao aperfeiçoamento.

    O recurso foi admitido como de apelação, com subida imediata, em separado e efeito meramente devolutivo. [2] Corridos os Vistos legais, cumpre decidir, uma vez que nada a tal obsta.

    1. QUESTÕES A RESOLVER Pelas conclusões apresentadas pelo recorrente, sem prejuízo dos poderes oficiosos do tribunal, se fixa o thema decidendum e se definem os respectivos limites cognitivos.

      Assim é por lei e pacificamente entendido na jurisprudência – artºs 5º, 608º, nº 2, 609º, 635º, nº 4, 637º, nº 2, e 639º, nºs 1 e 2, do CPC.

      No caso, importa apreciar e decidir se a reconvenção não é inepta, pelo menos em parte, e deve ser admitida.

    2. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Além da factualidade decorrente do relato que antecede, releva o teor do articulado (oposição à injunção) em causa: “I – DOS FACTOS 1.º A Requerente intentou o presente Procedimento de Injunção solicitando o pagamento pela Requerida da quantia de € 24.668,06 (Vinte e quatro mil, seiscentos e sessenta e oito euros e seis cêntimos) referente a capital e € 398,56 (Trezentos e noventa e oito euros e cinquenta e seis cêntimos) correspondente a juros de mora, perfazendo o valor total de € 25.066,62 (Vinte e cinco mil, sessenta e seis euros e sessenta e dois cêntimos).

      1. No Procedimento de Injunção, a Requerente fundamenta o pedido na alegada falta de pagamento das faturas enunciadas no Ponto 4º, mencionando que apesar das várias insistências efetuadas a Requerida nada pagou.

        Pois bem, 3.º Requerente e Requerida no dia 8 de Setembro de 2017 firmaram o Contrato de Subempreitada N.º ...

        /17 NE N.º ...

        referente à “Execução de trabalhos de betão armado na empreitada Requalificação e Ampliação ...

        – Edifício” que aqui se junta e se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos como Doc.1.

      2. De acordo com a Cláusula 5 do supra aludido Contrato de Subempreitada os trabalhos teriam início no dia 11 de Setembro de 2017 com término no dia 17 de Novembro do mesmo ano.

      3. Ora, como facilmente se verifica pelas inúmeras comunicações trocadas pelas Partes, que aqui se juntam e se dão por integralmente reproduzidas para todos os legais efeitos como Doc. 2, a Requerente saiu da obra no mês de Abril de 2018 e a execução dos trabalhos da respectiva especialidade ainda não se encontravam concluídos, vedando de forma gravosa a frente de trabalho para as...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT