Acórdão nº 7/17.9T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelMARIA DA CONCEI
Data da Resolução06 de Junho de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I - RELATÓRIO (…) com sede na Rua (…), Parque Industrial (...), em (…), intentou ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum contra (…) com sede no Parque Comercial(..), peticionando, a final, a condenação da R. no pagamento à A. da quantia de €14.856,93, acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos.

Alega, para fundamentar a sua pretensão, que celebrou contrato de transporte de mercadorias com a R., mediante o qual esta se obrigou, contra o pagamento de um preço, a entregar certas mercadorias e bens da A. em Espanha, num local onde se iria realizar uma feira em que a A. estava inscrita para participar. Alega, ainda, que a R. não entregou os bens no local acordado, com o que lhe causou danos patrimoniais e não patrimoniais.

Citada, ofereceu a R. contestação, por exceção e impugnação.

Além de outras exceções, arguiu a R. a prescrição do direito da A., por ter transcorrido mais de um ano desde a ocorrência dos factos que, segundo a A., deram origem a danos.

Impugna os danos alegados, sustentando a inadmissibilidade legal de indemnização superior ao valor do transporte, e alega a existência de contrato de seguro, mediante o qual transferiu para a X – Companhia de Seguros, SA a responsabilidade pela perda total/parcial de mercadoria, atrasos e danos nas mesmas, causados no exercício da sua actividade de transportador de mercadorias. Conclui peticionando a improcedência da ação e a intervenção provocada da referida companhia de seguros, principal ou acessória.

Foi admitida a intervenção principal de X – Companhia de Seguros, SA. Que ofereceu articulado próprio.

*Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença que julgou a ação improcedente quanto à interveniente (…) – Companhia de Seguros, SA., e julgou parcialmente procedente a ação relativamente à R. (..) condenando-a pagar à A. (...), Lda a quantia de € 6.356,93 (seis mil trezentos e cinquenta e seis euros e noventa e três cêntimos), acrescida de juros, à taxa prevista para as dívidas civis, vencidos desde 14/Março/2016 e vincendos até efetivo e integral pagamento, absolvendo-se a R. do demais peticionado.

*Inconformada com a sentença veio a Ré interpor recurso terminando com as seguintes conclusões (que se transcrevem): 1. Salvo o devido respeito, não pode o Recorrente concordar com o teor da decisão em causa, porquanto efetuou um errado julgamento sobre a matéria de facto, bem como se afasta do melhor enquadramento jurídico.

DA IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO QUANTO À MATÉRIA DE FACTO: 2. Sob o ponto d) da matéria de facto provada, o Tribunal a quo julgou provado que, no contrato de transporte internacional de mercadorias por estrada as partes convencionaram que a mercadoria transportada deveria ser entregue, no destinatário, impreterivelmente, no dia 01 de Outubro de 2015. Entende a Recorrente que esta decisão foi incorretamente julgada, pelo que aqui a impugna.

  1. Lendo e relendo a prova documental junta aos autos não resulta da mesma nenhum documento, cujo respetivo teor permita a conclusão de que as partes (transportador e expedidor) convencionaram um prazo, ou data fixa para a entrega da mercadoria, sob pena de a Recorrida perder o interesse na execução do serviço.

  2. Em concreto, não resulta da guia de transporte que titula o serviço de transporte discutido nos autos – junta aos autos com a contestação da Recorrente, sob o doc. n.º 8 - o estabelecimento de um prazo, dentro do qual deveria ser efectuado o transporte. Caso a Recorrente se tivesse obrigado, perante a Recorrida, a executar o serviço de transporte num determinado prazo, essa obrigação deveria ter ficado exarada na respetiva guia de transporte, tal como determina o disposto na al. f) do n.º 2 do art. 6.º da Convenção CMR.

  3. A prova produzido nos autos e, em concreto, a prova invocada na douta sentença sob recurso para fundamentar a sua decisão permite concluir que, no contrato de transporte aqui discutido, não foi convencionado, entre Recorrente e Recorrida, um prazo dentro do qual deveria efetuar-se o transporte, nem que a mercadoria transportada deveria impreterivelmente ser entregue em Bilbao no dia 01.10.2015.

  4. Assim, por um lado, quer a fatura que titula o serviço de transporte – junta aos autos com a contestação sob o doc. n.º 4 – quer a referida nota de crédito – junta aos autos com a PI, sob o doc. n.º 1 – não fazem menção a uma qualquer obrigação do transportador (aqui Recorrente), quanto ao prazo de entrega.

  5. Por outro lado, a testemunha M. C., no seu depoimento, não fez qualquer menção aos termos em que a Recorrida contratualizou, junto da Recorrente, o contrato de transporte de mercadorias dos autos, designadamente os seus contornos, pressupostos e prazos estabelecidos. – cfr. depoimento da testemunha gravado no sistema “H@bilus Media Studio” no dia 24/04/2018; inicio às 14:07:23; termo às 14:44:56. Sobre esta concreta matéria, a testemunha L. G. referiu que, no âmbito do contrato dos autos, a Recorrida não requereu absolutamente nada de diferente - cfr. declarações da testemunha aos 01:45m até aos 03:05m; aos 21:36m até aos 21:57m in depoimento gravado através no sistema “H@bilus Media Studio” no dia 24.04.2018; inicio às 14:45:27 h; termo às 15:11:25.

  6. Ao abrigo do supra exposto deverá o Tribunal ad quem proferir uma decisão diametralmente oposta àquela que foi proferida em primeira instância, no sentido de julgar como não provado o ponto d) do elenco da matéria de facto provada.

  7. Sob o ponto v) do elenco da matéria de facto provada, o Tribunal a quo julgou provado que “a falta de participação na feira implicou que a Autora não realizou, de vendas na mesma, mercadorias do valor de € 4.000,00.” Esta decisão deve merecer censura pelo Julgador ad quem, no sentido de julgar tal facto como não provado, porquanto não tem suporte na prova produzida nos autos.

  8. A Recorrida não teve o cuidado de carrear para os autos qualquer prova documental da qual se possa concluir e determinar que, no âmbito daquele evento, existia uma expetativa real de efetuar vendas num valor de € 4.000,00 (quatro mil euros).

  9. Tal matéria, para ser julgada provada pelo M.mo Julgador a quo, deveria estar devidamente sustentada com documentação que permitisse determinar uma base na série histórica, constituída pelos valores de faturação que a Recorrida teve com a participação na referida feira realizada em Bilbao, em anos anteriores, ou em eventos/ feiras de dimensão e mercado semelhantes, agregada, portanto, a elementos contabilísticos da Recorrida, seja pela demonstração do valor da faturação que esta obteve, naquele evento ou em eventos similares, nos anos anteriores; seja pela verificação de estudos de mercado que permitissem projetar um valor de faturação resultante da participação na feira.

  10. Por outro lado, a prova testemunhal realizada sobre esta matéria em concreto não permite quantificar as denominadas “perdas com as vendas”, sendo, aliás, contraditória com a própria alegação da Autora. Com efeito, as declarações da testemunha M. C., por um lado, contradizem a própria alegação da Recorrida relativa a esta questão e, por outro lado, evidenciam que, quer a Recorrida, quer a testemunha, limitaram-se a indicar um valor, a título de vendas não realizadas, suportado por meras conjeturas, sem assentar numa base fáctica realística.

  11. Mais relevante, a própria testemunha reconhece que “não tem ideia”, “não sabe exatamente”, qual o volume de vendas expectável com a participação da feira de Bilbao; sabe apenas o volume de vendas obtido pela Autora, pela participação de outras feiras realizadas em Madrid, Barcelona, Sevilha e Valencia - Cfr. depoimento da testemunha aos 18:40m até 19:42 m; aos 21:46m até 22:10 m; aos 32:12m até 34:23 m, gravado no sistema “H@bilus Media Studio” no dia 24.04.2018; inicio às 14:07:23; termo às 14:44:56.

  12. Como se sabe, as cidades em cima indicadas (Madrid, Barcelona, Sevilha e Valencia) têm um substancial maior número de habitantes. O recurso a critérios de probabilidade permite a conclusão de que uma feira do ramo de atividade a que se dedica a Autora, em Madrid ou Barcelona terá necessariamente mais visitantes e, logo, mais clientes do que uma feira realizada em Bilbao.

  13. Do exposto resulta que todo o raciocínio da testemunha M. C. que a levou a concluir que o volume de vendas expectável seria calculável entre um valor de € 6.000,00 a € 8.000,00 está manifestamente distorcido e não assenta numa base fáctica realista, porquanto assenta sobre cenários que não são, entre si, comparáveis.

  14. Em sentido contrário, a sentença a quo evidencia erro de julgamento na matéria de facto ao julgar como não provado a seguinte matéria: 8) O destinatário colocou a sua assinatura, na respetiva guia de transporte, sem, na mesma, apor qualquer reserva; 12) A mercadoria que não chegou ao destino no referido dia 01.10.2015 foi entregue pela Ré à Autora, por solicitação expressa desta em 15.10.2015.

  15. A decisão, proferida pelo Tribunal a quo de julgar não provado que o destinatário colocou a sua assinatura, na respetiva guia de transporte, sem, na mesma, apor qualquer reserva deve merecer censura pelo Julgador ad quem, porquanto resulta de uma incorreta interpretação do documento junto com a contestação sob o n.º 8 (guia de transporte que titula o serviço de transporte internacional de mercadorias descrito nos autos.

  16. Com efeito, do teor da referida guia de transporte resulta que, no local destinado à aposição da assinatura do destinatário, foi colocado o carimbo da entidade que organizou a referida feira de Bilbao, tendo, ainda sido colocada uma menção com a data da aposição do carimbo (01.10.2015). Mais resulta do referido documento que não foi exarada qualquer reserva pelo destinatário, no caso a entidade organizadora da feira.

  17. Acresce que, tal como refere a douta sentença sob recurso, a testemunha L. G., sobre esta concreta matéria, confrontado com o teor do referido doc. n.º 8, junto com a contestação da...

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