Acórdão nº 134/17.2T9TMC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 27 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelF
Data da Resolução27 de Maio de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.

Secção Penal Relatora: Fátima Furtado; adjunta: Maria José Matos.

  1. RELATÓRIO No processo de instrução nº 134/17.2T9TMC, do Juízo de Competência Genérica de Torre de Moncorvo, da Comarca de Bragança, foi em 25 de outubro de 2018 proferido despacho de não pronúncia do arguido J. J., com os demais sinais dos autos.

    *Inconformada, a assistente A. M. interpôs recurso, apresentando a competente motivação, que remata com as seguintes conclusões: «1.º- A recorrente não se conforma com a decisão que não pronunciou o arguido J. J. pela prática de um crime de injúria, p. e p. pelo art. 181.º do Código Penal.

    1. - Para fundamentar a sua decisão, o Tribunal a quo ancorou-se em três considerandos: a) As expressões foram transmitidas oralmente, a quente, sem ter tempo para friamente se pensar no seu teor; b) Debatia-se no processo a prestação de contas que só por si origina uma tensão própria; c) As expressões foram proferidas de forma a serem ouvidas por quem estava no interior da sala de audiências.

    2. - Analisando cada um dos referidos considerandos, resulta que: a) As alegações foram proferidas pelo recorrido na sétima sessão de julgamento, pelo que teve oportunidade de preparar as mesmas e ponderar sobre o teor das expressões usadas, evitando assim o uso de expressões injuriosas.

      1. A tensão existente não justifica as expressões proferidas pelo recorrido, tornando-as ainda mais repreensíveis, agravando o seu grau de culpa, dado o dever de objetividade que deve nortear o comportamento de um advogado, por forma a não amplificar aquela tensão.

      2. O disposto nos arts. 180.º e 181.º do Cód. Penal não faz distinção de pessoas, lugares ou circunstâncias em que o crime é produzido.

      A honra e consideração de uma pessoa não é mais ou menos respeitável conforme o lugar em que tem lugar a ofensa.

    3. - Tendo por base aqueles considerandos concluiu a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo que: “Não se vislumbra que das expressões supra referidas, o Advogado tenha excedido exponencialmente o seu dever de patrocínio, permitindo imputar-lhe a prática dos factos ilícito-típicos.

      O Advogado em causa agiu no âmbito do patrocínio que lhe foi concedido e aludindo a situações enquadráveis dentro da defesa da sua cliente, dentro da acção que era discutida e que tinha a ver com dinheiros (prestação de contas).

    4. - Ora, a pergunta que se impõe face à referida conclusão é, na perpestiva da recorrente, a seguinte: Em que medida foi útil e necessário para a defesa da sua constituinte, o recorrido apelidar a recorrente de desonesta, maliciosa, de má fé (não má fé processual, como teve o recorrido cuidado de precisar) e extorsionária? 6.º - O recorrido usou as referidas expressões para além do que justificava o exercício do patrocínio judiciário, não sendo as mesmas necessárias para realizar qualquer interesse legítimo.

    5. - As expressões proferidas pelo recorrido não podem estar justificadas pelo contexto em que foram proferidas, porque desnecessárias para o cumprimento das suas obrigações para com a sua constituinte, antes se revelando especialmente censurável a circunstância do mesmo aproveitar a posição em que estava investido, de advogado, para através dessa posição atingir direitos de outra pessoa merecedores de protecção.

    6. - A recorrente não é desonesta, maliciosa, não está de má fé e não extorquiu ou tentou extorquir ninguém, muito menos no aludido processo de prestação de contas.

    7. - E se assim não fosse, o recorrido teve oportunidade de provar em sede de instrução (e não o fez) que falou verdade ao usar as referidas expressões. (art. 180.º n.º 2, al. b) do Cód. Penal) 10.º - A recorrente limitou-se a exercer um direito que lhe assiste e está consagrado na lei: O direito de exigir a prestação de contas à cabeça de casal. (art. 2093.º do Código Civil e art. 941.º e seguintes do Código de Processo Civil) 11.º - Foram assim recolhidos indícios suficientes, de se terem verificado os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ao arguido, aqui recorrido, pela prática do crime de injúrias na pessoa da recorrente, pelo que deveria o mesmo ter sido pronunciado. ( art. 308.º n.º 1, 1.ª parte do Código Processo Penal ) 12.º - Ao não pronunciar o arguido, aqui recorrido, face aos factos alegados no art. 1.º a 7.º da acusação e que se encontram consolidados dado o conhecimento funcional da Meritíssima Juiz do Tribunal a quo e a gravação das alegações proferidas pelo recorrido, violou o Tribunal a quo o disposto no art. 308.º n.º 1, 1.º parte, do Código Processo Penal.

      *O recurso foi admitido para este Tribunal da Relação de Guimarães com o regime e efeito próprios.

      *O Ministério Público junto do Tribunal a quo e o arguido responderam, ambos concluindo pelo não provimento do recurso.

      Nesta Relação, a Ex.ma Senhora Procuradora-Geral adjunta proferiu douto parecer no qual conclui que a «“Decisão de Não Pronúncia” por ser omissa quanto à descrição dos factos considerados indiciados e não indiciados não está de acordo com a Lei e, por isso deve ser substituída por outra que colmate essa falha, sendo certo que assim se decidindo se fará a habitual Justiça.» Foi cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2 do Código de Processo Penal, sem resposta.

      *Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

      *II. FUNDAMENTAÇÃO Conforme é jurisprudência assente o âmbito do recurso delimita-se pelas conclusões extraídas pelo recorrente a partir da respetiva motivação, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer (artigo 412º, nº 1 do Código de Processo Penal).

      *1. Questão a decidir A única questão suscitada pela recorrente é a da existência de indícios integradores da prática, pelo arguido J. J., de um crime de injúria, p. e p. pelo artigo 181.º do Código Penal.

      *2. A decisão recorrida tem o seguinte teor: «I. Veio o arguido, J. J., invocar nulidades e requerer a abertura de instrução, tecendo os considerandos vertidos de fls.141 e ss, onde se discute a acusação particular deduzida pela assistente e acaba a final (cfr. fls.102 e ss) por concluir pela não pronúncia do arguido tendo em conta a prática do crime de injúria, p. e p. pelo artigo 181, nº.1 do Código Penal.

      *II. A presente instrução foi declarada aberta em 13.07.2018 (cfr. fls. 162 e 518).

      Nenhuma diligência instrutória foi determinada, pelo que se procedeu à realização do debate instrutório, com observância do pertinente formalismo legal.

      Procedeu-se à realização do debate instrutório, com observância do formalismo legal.

  2. O Tribunal é competente.

    As partes são legítimas, estando o arguido devidamente representado.

    Questões prévias: O Arguido, veio com o seu requerimento de abertura de instrução – vide fls.141 e ss -, arguir várias nulidades.

    Desde logo, cumpre tomar posição acerca das mesmas. Assim, é certo que as referidas nulidades foram arguidas perante o Ministério Público oportunamente e aquele tomou posição acerca das mesmas por despacho de fls.138 e ss.

    Por se concordar, inteiramente, com os argumentos ali expendidos pela Sr. Procuradora-Adjunta, dão-se aqui os mesmos por inteiramente reproduzidos, sem mais delongas.

    Efectivamente e quanto ao prazo para a constituição de assistente da ofendida, a mesma constitui-se dentro do prazo legal de 10 dias, uma vez que a mesma foi notificada em 20.09.2017 – cfr. fls. 135 e 136-, terminando o prazo legal de 10 dias em 02.10.2017.Consta de fls. 8 a 12 que a ofendida requereu a sua constituição de assistente no dia 02.10.2018, constituindo mandatário judicial e tendo pago a taxa de justiça devida, tendo assim sido admitida a sua constituição como assistente – cfr. fls. 22.

    Quanto à alegada representação da ofendida por ilustre advogado ser extemporânea e juridicamente irrelevante, não se vislumbra qualquer razão para tal, atento o supra decidido.

    Quanto ao prazo para dedução da acusação particular, a mesma é tempestiva – cfr. fls. 81, acrescida de 5 dias – 19.05.2018, terminaria assim o prazo para dedução da...

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