Acórdão nº 1534/17.3T9TVD-A.L1-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 11 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelJOSÉ ADRIANO
Data da Resolução11 de Junho de 2019
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, na 5.ª Secção (Criminal) da Relação de Lisboa: I. RELATÓRIO: 1. Após primeiro interrogatório judicial (art. 141.º, do CPP) que teve lugar no Juízo Local Criminal de Torres Vedras (J1), Comarca de Lisboa Norte, e na sequência de promoção do Ministério Público (fls 14, destes autos), a Sr.ª Juíza de Instrução Criminal proferiu despacho, determinando que o arguido J. ficasse a aguardar os ulteriores termos processuais em prisão preventiva, por se indiciar ter cometido um crime de tráfico de estupefacientes, p. p. pelo art. 21.º, n.º 1, do DL 15/93, de 22/01.

  1. Inconformado com essa decisão, o arguido J. interpôs o presente recurso, que motivou, formulando conclusões que, depois de aperfeiçoadas na sequência de convite que lhe foi dirigido para o efeito, passaram a ter a seguinte redacção: I. Versa o presente recurso da aplicação ao arguido da medida de coacção de prisão preventiva em sede de 1.º Interrogatório Judicial de arguido detido.

    1. Diversamente do Tribunal a quo, entende o arguido que dos autos não resulta qualquer facto que permita a indiciação do Arguido pela prática do crime de tráfico de estupefacientes, tipificado no art. 21.º, n.º 1 , mas antes, na pior das hipóteses a pratica do crime de tráfico de menor gravidade, p.p. pelo art. 25.º do Dec. Lei 15/93.

    2. Devendo entender-se ainda que não estão preenchidos os pressupostos da aplicação da prisão preventiva ( art.º 202.º do CPP), pela sua desadequação e desproporcionalidade, revelando-se no caso concreto, por adequada e suficiente a aplicação de uma medida de coacção que restrinja em menor grau a liberdade do arguido ( arts 191.º, 193.º do CPP) IV. Carecendo a mesma de ser substituída por outra não privativa da liberdade, numa das previstas nos arts.198.º e 200.º do CPP; V. Ou se assim não se entender, dever ser de aplicar ao arguido uma medida de coacção de obrigação de permanência na habitação com recurso a meios electrónicos, prevista no art. 201.º, do CPP, e regulamentada pela Lei n.º 122/99 de 20/01 e Portarias 26/2001 de 15/01 e 109/2005, de 27/01, cumulada com proibição de contactos.

    3. O douto despacho recorrido que aplicou a prisão preventiva remete para as provas carreadas no inquérito, mas, com o devido respeito, estas contudo não indicam com grau de certeza razoável a prática pelo arguido do crime de tráfico de estupefacientes p.p. nos termos do art. 21.º do D.L 15/93 de 22/01.

    4. Inexiste na investigação suporte factual que possa dar como "fortemente" indiciado que o arguido J. se dedique à pratica dos ilícitos que lhe são aplicados, designadamente que desde há 3 anos atrás cedesse estupefaciente nos estabelecimentos "O. ", "M. " e "C. "; VIII. Porquanto, a prova testemunhal que consta dos autos, não consegue concretizar quando, nem como, nem que quantidade alegadamente o arguido terá cedido de estupefaciente, limitando-se, genericamente a dizer que tal sucedeu há cerca de 3 anos.

    5. É verdade que na sequência da busca efectuada à residência e ao carro do arguido, foi apreendido algum produto estupefaciente, designadamente 1,8 gr. de cocaína e pedaços de haxixe, alem de um canivete e uma faca de cozinha com vestígios de haxixe, bem como 365,00€ em numerário.

    6. No entanto, tal, per si, tal não significa que o arguido se dedique ao trafico de estupefacientes de maior gravidade, senão teria outro tipo de utensílios, designadamente balanças, sacos ... enfim material necessário a quem efectivamente se dedica ao trafico, ainda mais, ao de maior gravidade.

    7. Em sede de interrogatório o arguido esclareceu que é toxicodependente, e que ao fim de semana consome uma média de 2 a 3 gramas de cocaína na noite.

    8. Pelo que duvidas não deveriam restar de que aquela cocaína apreendida se destinava ao consumo do arguido e não para trafico.

    9. O mesmo se diga em relação ao haxixe, já que também a quantidade apreendida não era mais do que para consumo do arguido.

    10. Quanto às condições pessoais do arguido, a Meritíssima Juíza de Instrução, duvidou da sua veracidade, designadamente não atribuiu credibilidade ao facto de o arguido fazer biscates e se dedicar à venda de cachorros e que o valor em numerário apreendido provinha da venda que tinha efectuado, bem como dos biscates.

    11. No entanto e mais uma vez o arguido não se pode conformar com a convicção que a Meritíssima Juiz de Instrução e que a levou a optar pela prisão preventiva, sem que contudo fosse considerado que o arguido possui meios de subsistência, atribuindo desta forma a pratica do trafico como se do mesmo colhesse lucros, imputando-lhe uma vida desafogada o que não corresponde à verdade, nem foi devidamente averiguado.

    12. Carecia o processo de que fossem investigados esses factos, de que fossem recolhidos mais meios de prova que justificassem os alegados indícios fortes da pratica do ilícito criminal que lhe é imputado, para decidir por uma medida privativa da liberdade.

    13. E nem as escutas telefónicas retiradas do processo n.º 750/16.0T9TVD que correu termos no Juízo Central Criminal de Loures - Juiz 5, processo este já julgado, seria suficiente para aplicar tal medida.

    14. Aliás, acerca do referido processo, cujo julgamento em Tribunal colectivo, concluído em Novembro do ano transacto, poderá acrescentar-se que nenhum dos arguidos desses autos foi condenado a prisão efectiva ... e foram acusados com base em indícios muito mais fortes do que os que são imputados ao ora recorrente.

    15. O arguido esclarece ainda que conta com o apoio incondicional do seu pai, que o receberá de "braços abertos" em sua casa, sita em Cascais, de modo a não voltar para a localidade onde tem residido, afastando-se assim dos amigos com quem convive, também estes toxicodependentes.

    16. O arguido é toxicodependente, desse facto não restam duvidas, mas daí a ser traficante de estupefacientes, tipificados no art.º 21.º , n.º 1 , por referencia às Tabelas l-A e l-C , vai uma distância enorme.

    17. Quanto muito o arguido poderia sustentar o seu próprio vício com algumas vendas que fazia a amigos para quem adquiria produto, quando se deslocava para adquirir para si.

    18. Não há indícios de organização, quanto muito e como já se disse, existem indícios de trafico de menor gravidade ...

    19. Quer o produto estupefaciente, quer o dinheiro apreendidos não atingem grandes quantidades.

    20. O arguido vive modestamente e infelizmente é toxicodependente.

    21. Em suma, salvo o devido respeito a existirem fortes indícios nos autos, os mesmos apenas se podem subsumir ao ilícito p.p. pelo art. 25.º do D.L.15/93.

    22. No despacho de aplicação da medida de coacção, não foi avaliada sequer a possibilidade de estarmos perante um crime enquadrável no art. 25º., pois só quanto a este tipo de ilícito parece resultar existirem indícios.

    23. Ainda que, por mera hipótese, se provasse o tráfico da parte do arguido, a ilicitude dos factos sempre seria consideravelmente diminuta, tendo em conta os meios utilizados, a modalidade e circunstância da acção, a qualidade ou quantidade dos produtos e substâncias ou preparação, a área geográfica ....

    24. Há que ter ainda em conta que o arguido é toxicodependente, sendo a personalidade e a capacidade organizativa neste caso apenas a suficiente para subsistir como dependente da droga. Nunca numa actividade em exclusivo.

    25. Atentas as circunstâncias no caso concreto nunca ao arguido deveria ter sido aplicada a medida de coacção de prisão preventiva por não se indiciarem os pressupostos de que depende a aplicação de uma pena de prisão superior a 5 anos.

    26. A medida de coacção de prisão preventiva foi justificada com Perigo de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução do processo e, nomeadamente, perigo para a aquisição, conservação ou veracidade da prova; e Perigo, em razão da natureza e das circunstâncias do crime ou da personalidade do arguido, de que este continue a actividade criminosa ou perturbe gravemente a ordem e a tranquilidade públicas.

    27. A existir perigo de perturbação do inquérito, o mesmo pode ser evitado com medidas de coacção menos gravosas.

    28. Por outro lado nada revela que se verifique o perigo do recorrente persistir na continuação da actividade criminosa, porquanto, pese embora tenha antecedentes criminais, os mesmos não são por tráfico de maior gravidade ...

    29. O recorrente foi colaborante aquando das buscas em sua casa e no carro, optando por não prestar declarações apenas porque não se encontrava psicologicamente equilibrado.

    30. A opção pelas medidas de coacção deve fazer-se, em última análise, pela ponderação da gravidade das condutas verificadas/ indiciadas, compaginada com os factos pessoais, tais como a sua integração social e fonte de rendimentos licita, ou falta da mesma, e a existência ou inexistência de antecedentes criminais pela prática do mesmo crime.

    31. A proibição de contactos, a proibição de frequência de certos ambientes, a obrigação de apresentação periódica (ainda que diária), a sujeição a determinados tratamentos relativos à toxicodependência e imposição de regras de conduta, permitiriam que o Arguido J. não pusesse em risco, em definitivo, o seu futuro, e dos seus três filhos menores que apoiava não só monetariamente, como estava com eles muitos fins de semana.

    32. Caso assim não se entendesse, deveria o Tribunal aplicar a medida menos gravosa, de Obrigação de Permanência na Habitação sob Vigilância Electrónica, com proibição de contactos com indivíduos ligados ao trafico.

    33. A OPH com controlo à distância, permanecendo em casa de seu pai, sita em Cascais, com proibição de contactos com indivíduos ligados ao trafico, impedirá que o arguido se desloque para adquirir produto, e afasta o perigo de continuação de actividade criminosa.

    34. Ou seja, quanto ao perigo de eventual continuação de actividade criminosa, a Obrigação de Permanência sujeita a Vigilância Electrónica, com proibição de contactos afasta essa eventual perigosidade.

    35. Quanto a eventual...

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