Acórdão nº 1/19.5GDCBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Junho de 2019
Magistrado Responsável | VASQUES OS |
Data da Resolução | 12 de Junho de 2019 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, em conferência, na 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra I. RELATÓRIO No Tribunal Judicial da Comarca de Coimbra – Juízo Local Criminal de Coimbra – Juiz 3, o Ministério Público requereu o julgamento em processo especial sumário do arguido …, com os demais sinais nos autos, imputando-lhe a prática, em autoria material, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos arts. 69º, nº 1, a) e 292º, nº 1 do C. Penal.
Por sentença de 2 de Janeiro de 2019, foi o arguido condenado, pela prática do imputado crime, na pena de cento e dez dias de multa à taxa diária de € 6, perfazendo a multa global de € 660, e na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de seis meses.
* Inconformado com a decisão, recorreu o arguido, formulando no termo da motivação as seguintes conclusões:
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Ao arguido foi imposta a pena principal de multa, em obediência ao disposto no art. 70.º do Código Penal, sendo a mesma de 110 (cento e dez) dias de multa, à taxa diária de € 6,00 (seis euros), o que perfaz a quantia de € 660,00 (seiscentos e sessenta euros), acrescida da apena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados de qualquer categoria pelo período de 6 (seis) meses.
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Talvez a análise perfunctória dos factos imbuída pela forma de processo em que o arguido foi julgado, contribuiu para o exagero que, humildemente, não podemos deixar de sublinhar, já que lhe foi aplicada a pena de multa de 110 dias quando o máximo poderiam ser os 120 dias, e ainda, a pena acessória de 6 meses de proibição de conduzir veículos com motor.
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Não se descortina um tão elevado grau de ilicitude e de culpa (sendo esta o limite da concreta medida da pena) que permitam sustentar as penas concretamente aplicadas, sendo que a colaboração e o arrependimento demonstrado pelo arguido em sede de audiência de discussão e julgamento parecem ter sido menosprezados.
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Em sede de audiência de discussão e julgamento o arguido declarou encontrar-se desempregado, auferindo o subsídio de desemprego no valor de cerca de € 427,00 (quatrocentos e vinte e sete euros mensais), sendo que o Tribunal a quo não se inteirou, como devia, da concreta situação económica e financeira do arguido, ao passo que não quis saber dos encargos pessoais do mesmo, da composição do seu agregado familiar, dos encargos com despesas médicas e medicamentosas do agregado do arguido … enfim, todo um conjunto de circunstância que influiriam na determinação do quantitativo diário ao valor mínimo, isto é, 5,00 €.
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O tribunal a quo descurou, de todo em todo, o disposto no n.º 1 do art. 340.º do Código do Processo Penal ao desprezar, por completo, o dever ex officio, que tinha em obter todos os meios de prova aptos à boa decisão da causa.
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A descoberta da verdade material encontrava-se facilitada por dois factos: a detenção em flagrante delito, aliada à total colaboração do arguido em sede de julgamento que confessou e mostrou arrependimento.
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Desta forma, urge invocar o vício previsto na alínea a), do n.º 2 do artigo 410.º do C.P.P., designadamente, a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, pois, a factualidade dada como provada na sentença é insuficiente para fundamentar a solução de direito, sendo que o tribunal deixou de investigar toda a matéria de facto com interesse para a decisão final (Simas Santos e Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 6.ª Edição, p. 69).
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Prova essencial à boa decisão da causa, no caso de condenação e aplicação de pena, conforme resulta expressamente da própria lei (artigos 369.º e segs. do C.P.P.), é a relativa aos antecedentes criminais do arguido, à sua personalidade e às suas condições pessoais. A lei prevê até a possibilidade de produção suplementar de prova, tendo em vista a determinação da espécie e da medida da sanção a aplicar, para o que, sendo necessário, poderá ser reaberta a audiência (artigo 371.º do C.P.P).
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Nos termos do artigo 71.º, n.º1, do Código Penal, é por apelo aos critérios da culpa e da prevenção – geral e especial – que deve ser encontrada a medida concreta da pena, dentro da respectiva moldura abstracta, sendo certo que o n.º 3 do mesmo artigo prescreve que «na sentença são expressamente referidos os fundamentos da medida da pena».
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Da leitura da sentença recorrida extrai-se que, muito pouco, foi apurado quanto às condições pessoais do arguido e à sua situação económica, factores de determinação da pena que, entre outros, constam do elenco não taxativo previsto no artigo 71.º, n.º2, do Código Penal, como elementos relevantes a ponderar na determinação da pena.
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O tribunal tem o poder-dever de, oficiosamente, socorrer-se do disposto no artigo 340.º, do C.P.P., para investigar os factos sujeitos a julgamento, procedendo, autonomamente, às diligências que, numa perspectiva objectiva, possam ser razoavelmente consideradas necessárias, de modo a se habilitar a proferir uma decisão justa, não lhe sendo consentido remeter-se a uma atitude passiva e meramente dependente da iniciativa probatória dos sujeitos processuais.
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Esta situação traduz-se na insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, integradora do mencionado vício da alínea a) do artigo 410.º, n.º 2, do C.P. Penal, que aqui se deixa expressamente invocado.
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A sentença que aqui se impetra, violou, de entre o mais, os seguintes artigos 47.º, n.º 2; art. 71.º, n.ºs 1, 2 e 3. 72.º, n.ºs 1 e 2, al. c) e d), e 73.º do Código Penal, e ainda, o art. 340, n.º 1 do Código do Processo Penal.
Termos em que requer a V. Ex.as se dignem conferir provimento ao presente recurso, revogando a sentença proferida pelo Tribunal a quo, com todas as legais consequências, assim se fazendo a tão costumada e sã JUSTIÇA! * Respondeu ao recurso a Digna Magistrada do Ministério Público, formulando no termo da contramotivação as seguintes conclusões: 1. Analisada a sentença recorrida, não pode concluir-se que dela resulte que o Tribunal a quo se tivesse abstido de indagar e de conhecer quaisquer fatos cujo conhecimento fosse necessário à prolação de uma decisão justa.
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Se atendermos à moldura penal abstracta prevista para o crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p.p. pelo artº 292º, nº 1, do CP, aos limites, mínimo e máximo, previstos no artº 69º, nº 1, al. a), do CP para a pena acessória, aos critérios constantes nos artºs 40º, 47º, 70º e 71º, todos do CP e à factualidade dada como provada na sentença, constatamos que as penas, principal e acessória, fixadas pelo Tribunal recorrido são justas e adequadas à satisfação das finalidades de prevenção geral positiva ou de integração, à culpa do arguido pelos factos e às exigências de prevenção especial de socialização.
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Com efeito, o arguido havia sido já condenado pela prática de crime da mesma natureza, por sentença transitada em julgado em 09-05-2016, na pena principal de 80 dias de multa à taxa diária de € 6,00 e na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 4 meses e 15 dias.
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Acresce que não obstante a frágil situação económico-financeira do arguido, suficientemente apurada pelo Tribunal a quo, o quantitativo diário fixado na sentença é justo e adequado, por ter sido fixado muito próximo do limite mínimo legalmente admissível, de € 5,00 e muito longe do limite máximo de € 500,00.
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Atendendo à matéria de facto provada – estaria fora de questão o Tribunal fixar a pena concreta abaixo do limite mínimo da moldura legalmente prevista, pelo que inexiste fundamento para recorrer ao instituto da atenuação especial da pena.
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Pelo exposto, afigura-se-nos que a sentença recorrida é justa e adequada, que não violou quaisquer disposições legais e que deverá ser mantida.
Termos em que deverão Vªs Exas., negar provimento ao recurso, assim fazendo JUSTIÇA.
* Na vista a que se refere o art. 416º, nº 1 do C. Processo Penal, o Exmo. Procurador da República emitiu parecer, concordando com a resposta do Ministério Público, realçando a circunstância de...
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