Acórdão nº 272/11.5GDCBR-B.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 05 de Junho de 2019
Magistrado Responsável | BRIZIDA MARTINS |
Data da Resolução | 05 de Junho de 2019 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, em Conferência, na 4.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra.
* I.
Relatório.
1.1. No âmbito dos autos principais de execução sumária supra referenciados, de que estes se mostram apenso, nos quais é exequente …, S.A., com sede na Rua dos …, n.º …, …, ..., e executado …, residente na Rua do …, …, …, …, ... , ponderando requerimento apresentado pelo segundo identificado, foi proferido despacho judicial com o teor seguinte: «Fls. 93 e ss: …, executado nos presentes autos, veio a 23.06.2017 alegar, em suma, que a penhora efetuada nos presentes autos é nula.
Refere que o bem penhorado nos autos pertence a … (seu filho), o qual não é parte na execução, requerendo, assim, o levantamento da referida penhora.
Decidindo.
Como resulta dos autos, o aqui executado foi condenado na prática de um crime de receptação de bens pertencentes à exequente – cfr. fls. sentença crime proferida nos autos principais.
De igual modo, no pedido de indemnização cível enxertado na ação penal, foi condenado a pagar à exequente a quantia de € 57.403,89, acrescidos de prejuízos até € 9.900,00.
Sucede que, executado e esposa poucos meses antes do trânsito da sentença condenatória em questão, haviam doado o imóvel penhorado nos autos (capaz de garantir o pagamento do já conhecido crédito da exequente) ao seu filho ….
Como assim, na sequência da presente ação executiva pela ora exequente foi instaurada Ação de Impugnação Pauliana, aí peticionando a restituição/ineficácia do bem doado a fim de poder efectivar-se a execução de forma a cobrar o seu crédito.
De harmonia com a sentença proferida a 28.03.2016, e transitada em julgado a 15.02.2017 (cfr. certidão de fls. 163 e ss), a ação foi julgada procedente, declarando-se a ineficácia, relativamente à autora “…S.A.”, da doação titulada pela escritura pública outorgada a 29/05/2013, no cartório Notarial em ... , a cargo da Notária …, tendo por objeto o imóvel nela identificado, e reconhecendo-se à autora o direito de executar tal bem no património do réu adquirente”.
Quer isto dizer que, de harmonia com a decisão judicial proferida na ação cível, a doação impugnada não tem qualquer eficácia relativamente à Exequente, podendo esta continuar com a execução e respetiva penhora sobre aquele bem – cfr. artigos 610.º a 616.º do Código Civil e Sentença Judicial transitada.
Custas do incidente a cargo do executado, fixando-se a taxa de justiça devida em 2 UCs (artigo 531.º C.P.C. e artigo 27.º do R.C.J.).
Notifique.
DN.» 1.2. Porque se não revê no assim decidido, recorre o mencionado executado …, extraindo da minuta através da qual motivou a discórdia a seguinte ordem de conclusões (sic): «1. O ora Executado por requerimento datado de 23 de Junho de 2017, veio alegar em suma que a penhora efectuada nos presentes autos é nula. Em virtude de o bem penhorado pertencer ao seu filho …, o qual não é parte na execução. Requerendo a final o levantamento da penhora efectuada no âmbito dos presentes autos.
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O ora Executado não se conforma, nem se pode de modo algum conformar com o Despacho proferido, motivo pelo qual recorre nesta sede. No Despacho ora Recorrido considerou-se que na sequência da presente acção executiva pelo ora exequente foi instaurada Acção de Impugnação Pauliana, aí peticionando a restituição/ineficácia do bem doado a fim de poder efectivar-se a execução de forma a cobrar o seu crédito. Mais refere que de harmonia com a sentença proferida a 28.03.2016, e transitada a 15.02.2017 (cfr. certidão de fls. 163 e ss), a acção foi jugada procedente, declarando-se a ineficácia, relativamente à autora …, S.A., da doação titulada pela escritura pública outorgada a 29/05/2013, no Cartório Notarial da ... , a cargo da Notária …, tendo por objecto o imóvel nela identificado, e reconhecendo-se à autora o direito de executar tal bem no património do réu adquirente. Referindo ainda, que quer isto dizer que, de harmonia com a decisão judicial proferida na acção cível, a doação impugnada não tem qualquer eficácia relativamente à Exequente, podendo esta, continuar com a execução e respetiva penhora sobre aquele bem - cfr. artigos 610.º a 616.º do Código Civil e Sentença Judicial transitada.
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Deste modo, a única questão que importa apreciar, aqui e agora, consiste em saber se, no caso, a sentença, obtida no âmbito da ação de impugnação pauliana, constitui, sem mais, sem que o terceiro adquirente in casu, …, figure como parte como executado na presente acção.
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Acontece que a presente execução foi instaurada em 17 de Fevereiro de 2014, em data anterior á prolação da Sentença na Ação de Impugnação Pauliana, a qual data de 28 de Março de 2016 e que apenas transitou em julgado em 15 de Fevereiro de 2017. No respetivo requerimento executivo, a exequente alega ter um crédito para com o executado …. Não tendo sido instaurada até á data qualquer execução contra o filho de Executado o referido …, ou feita qualquer cumulação de Executados.
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Constata-se, pois, que o ora exequente, após o trânsito em julgado da sentença proferida na ação pauliana, não propôs ação declarativa de condenação contra o ora executado, nem na pendência desta, nem instaurou qualquer execução com base naquela sentença, ou efetuou qualquer cumulação de executados.
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Na decisão recorrida entendeu-se não existir qualquer motivo para considerar que a sentença de impugnação pauliana apenas constitui título executivo contra o terceiro adquirente, caso este figurasse como executado na presente execução.
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Como é sabido, o Código Civil (arts. 610.º e segs.) admite a ação pauliana pela qual o credor pode tornar relativamente ineficazes atos de alienação ou oneração patrimonial perpetrados pelo devedor para o prejudicar.
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Um dos direitos conferidos pelo n.º 1, do art.º 616.º, no caso de ser julgada procedente a impugnação, consiste no direito do credor executar os bens no património do obrigado à restituição. Direito este que é confirmado na 2.ª parte do art.º 818.º, do Código Civil, nos termos da qual o direito de execução pode incidir sobre bens de terceiro quando sejam objeto de ato praticado em prejuízo do credor, que este haja procedentemente impugnado.
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Deste modo, na impugnação pauliana, os bens alienados continuam a pertencer ao adquirente, mas respondem, dentro do seu património, pelas dívidas do alienante. Questão é que, nos termos do art.º 821.º, n.º 2, a execução seja movida contra ele.
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Como se refere no Acórdão da Relação de Évora, de 9/5/02, C.J., Ano XXVII, tomo III, pág. 250, subjaz a estas normas a necessidade de intervir no processo de execução quem, na realidade, seja directamente atingido pelos actos de execução, independentemente da qualidade de devedor pertencer a outrem.
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Acrescentando-se que tal solução é hoje inequivocamente assumida pelo...
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