Acórdão nº 350/17.7T8PRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 02 de Maio de 2019
Magistrado Responsável | FERNANDO FERNANDES FREITAS |
Data da Resolução | 02 de Maio de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES
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RELATÓRIO I.- R. F., identificado nos autos, intentou a presente acção de condenação com processo comum contra a Companhia de Seguros “X Seguros, Seguradoras ..., S.A.”, com sede em Lisboa, pedindo que esta seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 4.972,73 a título de indemnização pelos danos patrimoniais que sofreu, acrescida de juros moratórios sobre € 4.222,73 desde 20 de Dezembro de 2016 e sobre € 750,00 desde a data da citação, até efectivo e integral pagamento.
Fundamenta este pedido num acidente de viação ocorrido no dia 17/12/2016, no lugar da ..., freguesia de ..., concelho de Peso da Régua, no qual interveio quando conduzia o seu veículo automóvel de matrícula UT juntamente com o veículo ligeiro de mercadorias marca Nissan, com a matrícula PP, pertencente a S. F. e, aquando do acidente, conduzido pelo seu filho J. F., cabendo a este a culpa do referido acidente por circular a mais de 60 Km./hora e a ocupar parte considerável da faixa de rodagem contrária. Do referido acidente resultaram danos no seu veículo, cuja reparação foi orçada em € 4.222,73, tendo o tempo da reparação sido calculado em 15 dias.
A Ré contestou, impugnando os factos alegados, quer os relativos à dinâmica do acidente, quer os atinentes aos danos invocados.
Os autos prosseguiram os seus termos vindo a proceder-se ao julgamento que culminou com a prolação de douta sentença que, julgando a acção totalmente improcedente, absolveu a Ré dos pedidos formulados pelo Autor.
Inconformado, traz o Autor o presente recurso pretendendo que seja revogada a supra transcrita decisão, e em sua substituição seja proferida outra que julgue a acção procedente e condene a Ré nos termos peticionados, ou, pelo menos, seja a acção julgada parcialmente procedente, com a condenação da Ré a pagar-lhe o valor correspondente a metade dos prejuízos que sofreu.
Contra-alegou a Ré propugnando para que se mantenha o decidido.
O recurso foi admitido como de apelação com efeito devolutivo.
Colhidos, que foram, os vistos legais, cumpre decidir.- II.- O Apelante/Autor formulou as seguintes conclusões: 1. Conforme demonstrado nos autos a rua (e não avenida, "Avenida da ...", como é referida na sentença, referência essa para a qual se encontra como única razão o facto de a R. a utilizar na sua contestação - v. arts 25, 27, 30, 31, 32 e 33, mas que não tem características que a justifiquem pois, como também consta da sentença, é uma via estreita ladeada de edifícios - v. ponto 9 e 10 dos factos provados - de acentuada inclinação descendente - v. 2° parágrafo de fls.3 da sentença) em que circulava o veiculo segurado da R. termina ou desemboca num largo, o largo da ..., por isso não podendo considerar-se que a respectiva confluência forma um entroncamento, em termos de o A. estar obrigado a ceder prioridade, até porque, diversamente do que foi considerado na sentença e como se verifica pelas fotografias do local, o veiculo segurado da R. não se apresenta pela direita em relação ao veiculo do A..
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Mas, ainda que assim fosse e porque a regra da prioridade não actua em termos absolutos, o condutor do segurado da R. estava obrigado a tomar as cautelas necessárias à segurança do trânsito, tanto mais que circulava numa via estreita e de acentuada inclinação descendente.
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Mas assim parece não ter entendido a Mma Juiz recorrida, impondo todos os deveres ao A. e nenhum ao condutor do segurado da R. pois, apesar de até crer que o mesmo "circularia pelo meio da via" (v. parte final do último parágrafo de fls.3v da sentença) e mesmo que, como alegado pelo A., circulasse todo encostado à esquerda, nada disso estaria errado, antes reforçaria o dever de o A. ter que esperar pela sua passagem (v. parte final do 2°parágrafo da sentença) o que, com o devido respeito, nos parece de todo incorrecto.
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Sendo essas considerações uma clara manifestação de uma posição de princípio ou sentido da decisão isso mesmo nos parece ter viciado toda a decisão da matéria de facto pois, como ressalta da respectiva motivação, a Mma Juiz a quo desvalorizou e desconsiderou tudo o que poderia ser favorável à versão do A .. Não apenas as suas próprias declarações, como os depoimentos das outras duas testemunhas por ele arroladas.
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Mas o que mais se estranha e de forma alguma se pode aceitar é que se tenha ignorado a parte mais importante do depoimento do condutor do segurado da R. e que versou a forma como, segundo ele, o acidente aconteceu. Se tivesse sido devidamente analisado (mas como se referiu, foi totalmente ignorado) conclusões bem diversas se imporiam quanto à culpa do acidente. Na verdade essa testemunha, J. F., condutor do veículo segurado da R., ao relatar como o acidente aconteceu deu claramente a entender que conduzia distraído. Nem outro significado têm as expressões por ele repetidamente utilizadas "quando dou por mim" e "quando dou conta" (v.mins 2.20, 15.12 e 15.50). Além disso, também ignorado na sentença, não só reconheceu expressamente que o A. estava completamente encostado à sua direita (v. mins 6.10 e 15.12), como também reconheceu que, estando o A. assim encostado, dava espaço para ele passar, o que só não aconteceu porque "quando dou conta ele está em cima de mim" (v.min. 15.50). Ou seja, se dava para passar e estando o A. completamente encostado à direita é porque ele, condutor do segurado da R., além de vir distraído vinha contra a mão. A última parte do seu transcrito depoimento ("... quando dou conta ele está em cima de mim", por manifestamente contraditória, é que não pode corresponder à verdade, pois a conclusão que se impõe é que foi ele a cair/embater sobre o veículo do A. e não ao contrário.
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Diversamente do entendido na sentença, tanto pela sua coerência intrínseca, como pela forma segura e clara com que foram prestadas, as declarações do A. deviam ter merecido toda a credibilidade. Desde logo porque o A. sempre teve a mesma versão quanto ao avistamento da carrinha, veículo segurado da R.: "que quando olhou para o espelho e viu a carrinha parou" (v. min.s 1.05 e 2.26), isso mesmo tendo reafirmado ao ser confrontado pela mandatária da R. com uma alegada contradição: "não foi assim que eu expliquei"; "eu ia a meter para a rua e olhei para o espelho e quando me apercebo da carrinha eu parei" (v. mino 25.03).
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De resto, no essencial, essas declarações não são incompatíveis com o depoimento do condutor do segurado da R. e foram confirmadas pela testemunha C. C. que, como mediador de Seguros do A., por este foi chamado ao local e logo lhe relatou que o acidente tinha acontecido precisamente de acordo com o que declarou em audiência (v. mino 3.19). Além disso, foi sempre de forma clara e segura que asseverou ter parado logo que viu a carrinha por a ver a grande velocidade e contra a mão (v. min.s 03.15, 21.14 e 25.03). Bem demonstrando a preocupação de só dizer a verdade, cumpre salientar que o A., não hesitou em dizer que apesar de o condutor do segurado da R. circular contra a mão, não ocupava o espaço todo (v. mino 14.19).
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Por outro lado, a outra testemunha arrolada pelo A. M. A., demonstrando perfeito conhecimento do local (por ser da freguesia onde mora - v.min. 1.30), não hesitou em assegurar que a via em que circulava o segurado da R. permite o cruzamento de dois veículos (v. 1.30) e que quem vier de baixo (como vinha o A.) e se encostar à parede da casa (como o condutor do segurado da R. reconheceu que estava o A.) quem vier de cima passa à-vontade (v.min. 3.30) como também reconheceu o condutor do segurado da R.. Perante isso, não se entende e de modo algum se pode aceitar que também este depoimento não tenha merecido credibilidade e para tal se tenha aduzido como única justificação o facto de favorecer a posição do A.. Como nos parece evidente, trata-se de uma justificação sem qualquer consistência ou fundamento, bastando ter em conta que sempre poderia ser utilizada para desvalorizar ou descredibilizar qualquer depoimento porque, normalmente, todos são sempre a favor de qualquer das versões em confronto.
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Portanto, com base numa correcta, objectiva e completa (com a consideração da transcrita e ignorada parte do depoimento do condutor do veiculo PP, segurado da R.) análise da prova produzida, impunha-se dar como não provada a matéria dos pontos 4 e 9 dos factos provados e, de acordo com o constante da conclusão 1ª, ser eliminado o que consta do ponto 11 e ainda provada a matéria das als. a) ainda que sem a indicação da respectiva velocidade, c) e d) e acrescentar-se ao ponto 19 dos factos provados "o que lhe acarretou um prejuízo não inferior a 750€, esta última factualidade com base no depoimento do mediador do A., a testemunha C. C., que de forma clara e descomprometida assegurou que o aluguer de um veículo com características semelhantes ao do A. teria um custo diário não...
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