Acórdão nº 382/14.7JALRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 15 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelELISA SALES
Data da Resolução15 de Maio de 2019
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na secção criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I - RELATÓRIO No processo comum n.º 382/14.7JALRA supra identificado, após a realização da audiência de julgamento foi proferido acórdão que decidiu: a).- condenar o arguido A.

, autor de factos objectivos integradores de um crime de homicídio qualificado tentado p. e p. pelos artºs 131º, n.º 1 e 132º, n.º 2 als c) e e) do CP.

b).- declarar o arguido inimputável em relação aos ilícitos objectivamente praticados, com risco de perigosidade; c).

- aplicar ao arguido a medida de segurança de internamento em estabelecimento de cura, tratamento ou segurança, pelo período mínimo de 3 anos, salvo se a libertação se revelar compatível com a defesa da ordem jurídica e da paz social e máximo de 16 anos e 8 meses (limite máximo da pena correspondente ao crime) devendo o internamento findar quando o Tribunal verificar que cessou o estado de perigosidade que lhe deu origem; d).

- suspender a execução do internamento sob a condição de o arguido: i).

- cumprir todas as medidas de tratamento e regimes de cura que estão ou venham a estar recomendados, submetendo-se ao regular acompanhamento médico-psiquiátrico nas vertentes psicofarmacológica, psicoterapêutica e psicossocial, por parte dos Serviços de Psiquiatria do Hospital de (...) ; ii).

- se prestar aos exames e observações nos lugares que lhe forem indicados, no âmbito do decidido em “i”; iii).

- determinar o acompanhamento por parte da DGRS que vigiará tutelarmente a situação, elaborando ainda plano individual de readaptação social, que incidirá sobre a sua integração social, bem como observação do que seja determinado no que se refere a tratamentos médicos e medicamentosos, devendo o arguido acatar as prescrições que lhe venham a ser decididas no âmbito deste acompanhamento.

e).

- absolver o arguido do pedido de indemnização contra si deduzido pelo CHO.

* O Ministério Público por discordar da decisão proferida, interpôs o presente recurso, no exclusivo interesse do arguido nos termos do artigo 401°, n.º 1 a) do CPP e, da motivação extraiu as seguintes conclusões: 1ª -- Vem o presente recurso interposto pelo Ministério Público do douto Acórdão proferido no dia 19 de Março de 2018, no interesse exclusivo do arguidoA.

, na parte em que --- depois de ter julgado provada a factualidade dele constante, declarou o arguido inimputável, perigoso --- considerou aquela factualidade objectivamente subsumível ao ilícito do crime de homicídio qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 131º, nº 1 e 132º, nº 2 als. c) e e), ambos do Código Penal e, em consequência, aplicou-lhe a medida de segurança de internamento em estabelecimento psiquiátrico de tratamento e cura da anomalia psíquica de que padece, adequado à sua patologia, pelo período mínimo de 3 (três) anos, salvo se a libertação se revelar compatível com a defesa da ordem jurídica e da paz social e máximo de 16 (dezasseis) anos e 8 (oito) meses (limite máximo da pena correspondente ao crime) devendo o internamento findar quando o Tribunal verificar que cessou o estado de perigosidade social que lhe deu origem, ao abrigo do disposto nos artigos 91º, nºs. 1 e 2, 92º, nºs 1 e 3 e 93º, nºs. 1 e 2, ambos do Código Penal, medida de segurança de internamento essa que foi suspensa na sua execução nos termos do disposto no artigo 98º, do Código Penal.

  1. 1 – Dispõe o artigo 132º ([1]), do Código Penal: “1 - Se a morte for produzida em circunstâncias que revelem especial censurabilidade ou perversidade, o agente é punido com pena de prisão de doze a vinte e cinco anos.

    2 - É susceptível de revelar a especial censurabilidade ou perversidade a que se refere o número anterior, entre outras, a circunstância de o agente: (…) c) – Praticar o facto contra pessoa particularmente indefesa em razão da idade, deficiência, doença ou gravidez; (…) e) -- Ser determinado por avidez, pelo prazer de matar ou de causar sofrimento, para excitação ou para satisfação do instinto sexual ou por qualquer motivo torpe ou fútil”; (…)” 2ª.2 -- “O pensamento da lei é o de pretender imputar à “especial censurabilidade” aquelas condutas em que o especial juízo de culpa se fundamenta na refracção, ao nível da atitude do agente, de formas de realização do facto especialmente desvaliosas, e à “especial perversidade” aquelas em que o especial juízo de culpa se fundamenta directamente na documentação no facto de qualidades da personalidade do agente especialmente desvaliosas” ([2]), fundando-se a agravação da culpa na maior desconformidade que a personalidade manifestada no facto possui face à prática de um homicídio simples.

  2. 1 -- O Tribunal a quo julgou provado que: “(…) 22 - À data dos factos, o arguido apresentava grave sintomatologia psiquiátrica que o incapacitava de facto para avaliar a ilicitude dos factos ou de se determinar de acordo com essa avaliação.

    23 – Caso o arguido cumpra regularmente a terapêutica farmacológica e adira às consultas externas de psiquiatria com periodicidade, o risco de perigosidade fica atenuado.” 3ª.2 -- Com particular interesse para o thema decidendum foi, no entanto, o Tribunal a quo exarou a fls. 19 do douto Acórdão: “(…) O arguido praticou factos integradores de factos ilícitos tipo.

    Foi declarado inimputável, ou seja, agiu sem culpa na prática do facto ilícito típico, O facto ilícito e típico só configura a prática de um crime, caso o comportamento do arguido seja passível de uma censura ético-jurídica, ou seja, de culpa.” 4ª.1 -- Sendo o arguido inimputável e “sendo o inimputável incapaz de culpa, óbvio se torna não poder, quanto a ele, valor como “facto ilícito típico” (artigo 91º, nº 1, do Código Penal), pressuposto da medida de segurança de internamento, o homicídio qualificado do artigo 132º, do Código Penal, por aqui não estar previsto um tipo de ilícito, seja no seu todo ou em qualquer das suas alíneas, mas somente um tipo especial agravado de culpa que, por sua própria natureza, não pode ser atribuído ao inimputável”; 4.ª2 -- Tal determina que o facto ilícito típico, pressuposto da medida de segurança, se reconduza, no caso sub judice, ao tipo-base de homicídio simples, na forma tentada, previsto nos artigos 22º, 23º, 72º, 73º e 131º, todos do Código Penal; 4ª.3 -- Ao ter-se decidido no douto Acórdão a quo de forma diversa da ora sustentada, nele se violou o disposto no artigo 132º, nºs. 1 e 2, als. c) e e), do Código Penal; 4ª.4 – Pelo que o douto Acórdão proferido deverá ser substituído por outro que declare que o arguido A.

    praticou, como autor material e na forma consumada, o ilícito correspondente ao crime de homicídio, na forma tentada, forma tentada, previsto nos artigos 22º, 23º, 72º, 73º e 131º, todos do Código Penal.

  3. 1 -- O limite máximo da medida de segurança de internamento decorre do claramente estatuído no nº 2 do artigo 92º --- o internamento não pode exceder o limite máximo da pena correspondente ao tipo de crime cometido pelo inimputável --- enquanto que o limite mínimo se encontra igualmente previsto no nº 2 do artigo 91º, nomeadamente para as situações como a sub judice, prevendo um período de internamento com a duração mínima de 3 anos; 5ª.2 -- No caso sub judice, a medida de segurança a aplicar, de internamento em estabelecimento de tratamento e cura da anomalia psíquica de que o arguido padece, deverá ter como limite máximo 10 (dez) anos e 8 (oito) meses, correspondente ao limite máximo da pena do tipo de ilícito em apreço, fixando-se em 3 (três) anos o limite mínimo de internamento, devendo findar logo que cesse o estado de perigosidade criminal que o originou, ou seja logo que preenchido o legal pressuposto do nº 1, do artigo 92º, do Código Penal, sem prejuízo daquele período mínimo legalmente estipulado, e da possibilidade de prorrogação daquele máximo nos quadros do nº 3, do referido artigo 92º; 5ª.3 -- Ao ter-se decidido no douto Acórdão a quo de forma diversa da ora sustentada, nele se violou o disposto nos artigos 22º, 23º, 72º, 73º, 91º, nº 2, 92º, nºs. 2 e 3 e 131º, todos do Código Penal, razão pela deverá ser substituído...

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