Acórdão nº 324/17.8GAMCD-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 29 de Abril de 2019

Magistrado ResponsávelARMANDO AZEVEDO
Data da Resolução29 de Abril de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: I- RELATÓRIO 1.

No Tribunal Judicial da Comarca de Bragança, Juízo de Competência Genérica de Macedo de Cavaleiros, no processo comum com intervenção de tribunal singular nº 324/17.8GAMCD, em que é arguido A. R.

e assistente A. M.

, ambos com os demais sinais nos autos, com data de 18.12.2018, foi proferido despacho judicial pelo qual a acusação deduzida pelo M.P. foi rejeitada, por manifestamente infundada, nos termos do disposto no artigo 311º, n° 2, al. a) e n°3, al. d) do Código de Processo Penal, por se ter considerado que os factos objetivos nela descritos não integram o tipo legal de crime de ameaça.

  1. Não se conformando com tal despacho, o M.P. dele interpôs recurso, tendo concluído nos seguintes termos [transcrição]: 1. A factualidade vertida na acusação pública (que por brevidade de exposição e economia de texto se dá por reproduzida) contém factos com relevância criminal constitutivos, em abstrato, do crime de ameaça, p, e p, no art. 153°, n° 1, do Cód. Penal, anunciando um mal futuro e reclamando a intervenção do direito penal.

  2. As expressões imputadas ao arguido, descritas na acusação, integram, pelo menos, uma ameaça com a prática de crime contra a integridade física, prenunciando um mal futuro.

  3. Porquanto, o arguido disse ao assistente, por telemóvel, “que sabia onde parava à noite, para tomar café, e que não era por ser grande que lhe tinha medo e que fosse ter onde quisesse que levava uns amigos” ... “Perante o exposto, o assistente disse ao arguido que fosse ter ao posto da GNR, em Macedo de Cavaleiros, e que aí conversariam recebendo como resposta, do arguido, que não ia e que sabia onde o encontrar” ... o arguido enviou ao assistente um sms com o seguinte teor “eu t vergo”.

  4. Tais expressões, sob o ponto de vista da homem médio e segundo as regras da experiência, são aptas e idóneas a provocar medo ou inquietação, projectando-se para o futuro, não se esgotando naquele momento, prejudicando a liberdade de determinação.

  5. Inequivocamente o arguido deu a entender ao assistente que estava disposto a atingi-lo na integridade física.

    6 Depreende-se do teor daquelas expressões que o arguido quis transmitir ao assistente que iria procurá-lo e que, sendo este grande (fisicamente forte) se faria acompanhar de amigos que, em conjunto, iriam surpreender e agredir o assistente.

  6. Por outro lado, perante o convite do assistente para que conversassem no posto da GNR o arguido de imediato recusou a conversação, nesse local, e disse que sabia onde o encontrar indicando-lhe, mais uma vez, o seu intuito de o agredir de surpresa em local não seguro para o assistente, 8. Com aquele procedimento o arguido quis amedrontar o assistente, causando-lhe um sentimento de insegurança, levando-o a temer, dali em diante, pelo menos, pela integridade física, sendo o seu comportamento idóneo a atingir essas finalidades.

  7. Tendo o arguido o arguido actuado voluntária e conscientemente, com o propósito de causar temor no assistente, fazendo com que este receasse que, dali em diante, o propósito anunciado fosse concretizado, pois fez-lhe crer que, pelo menos, estava disposto a atentar contra a sua integridade física, o que foi levado a cabo com o intuito de causar medo e de criar um sentimento de insegurança, o que tudo quis, sabendo que a sua conduta era proibida por lei, daí resulta de forma inequívoca a prática do crime de ameaça p. e p. no art. 153°, nº 1 do Cód. Penal.

  8. Concluindo-se, assim, que os factos descritas e imputados na acusação pública contêm todos os elementos necessários, sob o ponto de vista objetivo e subjetivo, que enquadram o tipo de crime em apreço.

  9. Pelo que, existem indícios suficientes de que o arguido praticou o crime de ameaça de que se encontra acusado.

  10. É entendimento pacífico da jurisprudência que a rejeição da acusação, por ser “manifestamente infundada por inexistência de crime”, só deve ocorrer em casos limite e claramente inequívocos e incontroversos (o que, como supra referido, não é o caso dos autos).

  11. Por outro lado, a opção de sanear o processo considerando a acusação pública “manifestamente infundada por inexistência de crime” infringe o princípio do acusatório, pois não é inequívoco que os factos narrados não são subsumíveis ao tipo de crime de ameaça, p. e p. no art. 153°, nº 1 do Código Penal.

  12. Devendo, assim, o douto despacho ser substituído por outro que receba a acusação pública e que designe julgamento.

  13. Pois mostra-se efetuada uma incorreta interpretação dos normativos vertidos nos arts. 153°, n°1, do Código Penal e 311°. n° 2, al. a) e n°3 al. d) do Código de Processo Penal.

    Assim, em conclusão, pelos motivos expostos, julgando procedente o recurso V. Exas. farão a costumada e habitual, Justiça.

  14. O recurso foi admitido.

  15. O assistente e o arguido não responderam ao recurso.

  16. Neste Tribunal da Relação, o Exº Senhor Procurador-Geral Adjunto foi de parecer que o recurso deverá ser julgado procedente.

  17. Foi cumprido o disposto no artigo 417º, nº 2 do C.P.Penal, mas não foi apresentada qualquer resposta.

  18. Após ter sido efetuado exame preliminar, foram colhidos os vistos legais e realizou-se a conferência II- FUNDAMENTAÇÃO 1- Objeto do recurso O âmbito do recurso, conforme jurisprudência corrente, é delimitado pelas suas conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, sem prejuízo naturalmente das questões de conhecimento oficioso (1) do tribunal.

    Assim, e tendo presente o disposto no nº 1 do artigo 412º do C.P.P., face às razões de discordância do recorrente relativamente à decisão recorrida, temos que a questão a decidir no caso sub judice reconduz-se a saber se a acusação deduzida pelo M.P. é manifestamente infundada para efeitos do disposto no artigo 311º, nº 2 al. a) e nº 3 al. d) do CPP.

  19. A decisão recorrida 2.1- O despacho recorrido tem o seguinte teor [transcrição]: O Digno Magistrado do Ministério Público deduziu acusação contra A. R. pela prática de um crime de ameaça, p. e p. pelo artigo 153° do CP.

    Para tanto imputa ao arguido a seguinte conduta: “1. No dia 29.Nov.2017, pelas 18h22mn, o assistente A. M. encontrava-se na residência, sita na Rua …, Macedo de Cavaleiros, quando, no seu telemóvel n° …, recebeu uma chamada do...

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