Acórdão nº 846/18.3T8BCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 24 de Abril de 2019

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução24 de Abril de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes na 1ª Secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães: Recorrente(s): - (…); - (…) (subordinada).

Recorrido(a/s): - (…); - (…) (subordinada).

  1. RELATÓRIO A Recorrente ASSOCIAÇÃO (…) instaurou a presente “acção especial de prestação de contas, nos termos do artigo 941º e seguintes do CPC" contra (…), residente no Lugar da (…) , freguesia de (…), concelho de Braga, peticionando, a final, que seja “declarado que a Ré está obrigada à prestação das contas, sendo esta citada para contestar a acção ou as apresentar, querendo, no prazo de 30 dias, e sob a cominação legal, seguindo-se os demais termos dos artigos 942º a 946º do CPC, com a consequente condenação da Ré a pagar à Autora aquele valor de 5.065,00 € ou o saldo que vier a ser apurado como devedor, acrescido de juros de mora contados desde a citação, à taxa legal, até pagamento, bem como custas, por terem dado causa à acção.” Alega, em suma, para fundamentar a sua pretensão, que a R. exerceu funções de tesoureira da direcção da A. e, nesse período, apropriou-se da quantia de €: 5065, depositando na sua conta bancária e fazendo sua a quantia em causa, que estava titulada por 3 cheques. Mais alega que, cessadas as respectivas funções e qualquer obrigação da R. de prover por despesas da A., a R. se recusa a prestar contas de tais quantias.

    Citada a R. veio a mesma oferecer contestação, na qual excepcionou a incompetência territorial do Juízo Local Cível de (…) (por residir em … ), o caso julgado (por já ter corrido termos acção intentada pela A. contra a R. em que foi peticionada a condenação da R. na restituição da quantia aqui em causa, que foi julgada improcedente, tendo tal decisão transitado em julgado), a inexistência de obrigação da R. em prestar contas (por terem as funções exercidas sido enquanto membro de um órgão colegial – a Direcção – e ter esta prestado contas que foram aprovadas) e a ilegitimidade da A. (por não ter a mesma autorização da assembleia geral, nos termos exigidos pelo art. 172º, nº 2, do Cód. Civil). Requer, seja a acção julgada improcedente e a A. condenada como litigante de má-fé.

    A A. pronunciou-se sobre as excepções e sobre o pedido de condenação da A. como litigante de má-fé.

    Foi julgada procedente a excepção de incompetência territorial e remetidos os autos a este Juízo Local Cível de ….

    Em sede de tentativa de conciliação, e frustrada a mesma, concedeu-se às partes a palavra para se pronunciarem sobre a prolação imediata de decisão de mérito, o que as mesmas fizeram, nos termos constantes da acta, para cujo teor remetemos.

    Foi então proferido despacho saneador-sentença que decidiu julgar improcedente a excepção de caso julgado e, apreciando o mérito da causa, julgou improcedente a presente acção, com custas a cargo da Autora.

    Inconformado com essa decisão, a Recorrente …. acima identificada apresentou recurso da mesma, que culmina com as seguintes conclusões.

    1-Salvo melhor opinião a douta decisão recorrida, sem que previamente fosse feita prova ou permitida prova sobre os factos alegados, efectuou um juízo prévio sobre a inviabilidade da acção, nos termos decididos, com o qual não se concorda.

    2-A Ré (…) chegou a desempenhar as funções de Tesoureira da Direcção da Autora, cargo que desempenhou em 2010 e 2011, até 21 de Dezembro de 2011, data em que cessou essas funções.

    3-Assim, a partir de 21.12.2011 a Ré … passou a ser somente associada da Autora, sem desempenho de quaisquer funções sociais ou de qualquer outra natureza.

    4- Na acção 1114/14.5TBBCL resultou provado que: 4.1- Enquanto tesoureira da Direcção, em Fevereiro de 2010 a Ré integrou no seu património a quantia de 2.165,00 € (dois mil cento e sessenta e cinco euros), para o efeito procedendo à cobrança para si do cheque com o n.º 2450364924, do mesmo montante, sacado sobre a conta da Associação, sediada no Banco ... SA, subscrito pela própria Ré, enquanto Tesoureira e pelo então Presidente da Direcção.

    4.2-E de novo em Abril de 2010 a Ré integrou no seu património a quantia de 2.500,00 € (dois mil e quinhentos euros), para o efeito procedendo à cobrança para si do cheque com o n.º 2450365021, do mesmo montante, sacado sobre a conta da Associação, sediada no Banco ... SA, subscrito pela própria Ré, enquanto Tesoureira e pelo então Presidente da Direcção.

    4.3-Finalmente, em Maio de 2010 a Ré integrou no seu património a quantia de 400,00 € (quatrocentos euros), para o efeito procedendo à cobrança para si do cheque n.º 2450383257, do mesmo montante, sacado sobre a conta da Associação, sediada no Banco ... SA, subscrito pela própria Ré, enquanto Tesoureira e pelo então Presidente da Direcção.

    4.4-Todos aqueles valores inscritos naqueles cheques foram levantados pela Ré, que ficaram na sua posse, ficando a conta bancária da Autora sem aqueles valores, ao ser debitada dos valores dos cheques quando a Ré os apresentou a pagamento e cobrou os respectivos valores.

    4.5-Assim, o património da Ré ficou enriquecido por aqueles valores, ficando o património da Autora, Associação, diminuído nessa exacta medida e valor.

    5-OU SEJA ESTÁ PROVADO QUE A RÉ RETIROU DA CONTA BANCÁRIA DA AUTORA AQUELES VALORES, ATRAVÉS DA COBRANÇA PARA SI DAQUELES CHEQUES, À SUA GUARDA, SEM QUE EXISTISSE SUPORTE DELIBERATIVO DA DIRECÇÃO PARA TAIS OPERAÇÕES, O QUE GEROU UMA EVIDENTE APROPRIAÇÃO DE VALORES PERTENCENTES À AUTORA.

    6-Esses actos de cobranças de cheques não se podem inserir naquilo que o Tribunal designa por “poderes de administração”, muito menos resultou de decisão colegial da Direcção, de que fazia parte a Ré.

    7-Nem se destinaram a pagar o que quer que fosse, pois que nenhum crédito tinha a Ré sobre a Autora.

    8-Na verdade, apesar de naquela Assembleia Geral terem sido aprovadas as contas, das mesmas resulta ser a Autora credora de tais valores, em débito até prestação de contas pela Ré, assim como dos demais valores ali referidos na página 6 e o acordeão, que já foram recebidos e recuperado em acções judiciais intentadas pela Autora contra a Ré, em cumprimento do deliberado.

    9-Ao contrário do decidido na douta sentença recorrida, apesar de aprovadas as contas em 5.12.2011, a Ré não foi desonerada de justificar o destino que deu àqueles valores por si cobrados com cheques da Autora, de cujos montantes se apropriou, nem, apelando ao princípio da boa-fé, de oportunamente demonstrar que tais valores tenham sido, ainda que parcialmente, usados em pagamentos em benefício da Autora.

    10-É inequívoco que a Ré actuou a título individual e não em representação do órgão de que fazia parte, pelo que, apelando novamente ao princípio da boa-fé, tem o dever de prestar contas.

    11-Assim, o dever da Ré de prestar contas decorre dos artigos 941º e 942º do CPC e sobre o uso de cheques à sua guarda.

    12-E, tendo deixado de ser Tesoureira da Direcção da Autora desde Dezembro de 2011 e por escolha dos seus associados, não exercendo desde então quaisquer funções na Associação Autora, o órgão Direcção a que pertenceu já nada poderia deliberar, para além do decidido na Assembleia Geral de 5.12.2011.

    13-Assim, atento o disposto nos artigos 941º e seguintes do CPC o que está em causa é a prestação de contas pela Autora relativamente a quantias em dinheiro que pertencem ainda hoje ao activo da Autora e na sua posse desde o tempo em que foi tesoureira, por cobrança indevida de cheques que estavam à sua guarda.

    14-Na anterior acção n.º1114/14.5TBBCL foi ainda dado por provado, em resultado da instrução da causa, o facto ali elencado sob o n.º 7, ou seja: “ As entregas dos cheques ocorreram num período que antecedeu o conflito entre a ré e o presidente da direcção da autora, bem sabendo a ré que as mesmas não lhe eram devidas e pertenciam à autora.” 15-Assim, a Ré abusou do facto de ter à sua guarda aqueles cheques, cobrando com eles valores que pertencem à Autora e porque a ré até hoje não os entregou terá que prestar contas e entregar o saldo (total ou parcial) que vier a ser aprovado, sendo certo que até o depositário está obrigado a prestar contas e a restituir os valores ou coisa com os seus frutos (artigo 1187º CC).

    16-Na verdade, a Ré, em boa-fé, só tem que fazer algo muito simples, que é apresentar contas com documentos que justifiquem o eventual gasto daqueles valores ou de parte deles em benefício da Autora e que tais gastos ou despesas tenham sido ou sejam aprovados pela Autora.

    17-Deverá, assim, e salvo melhor opinião, ser revogada a douta sentença proferida e antes decidido que existe obrigação por parte da Ré de prestar contas, como decorre do artigo 941º do CPC, do teor da acta da Assembleia Geral de 05.12.2011 e da lei.

    18-Foram violadas as disposições legais citadas e, deste modo, deve ser julgado procedente o recurso e revogada a douta sentença proferida, no sentido de ser devida a prestação de contas, ainda que com realização de produção de prova prévia.

    NESTES TERMOS, E com o douto suprimento de Vs.ª Exs.ª deverá ser dado provimento ao recurso e no sentido das conclusões… A Recorrida opôs-se ao recurso e recorreu subordinadamente, concluindo nos seguintes termos.

    1. A Autora Recorrente não se conforma com a douta decisão recorrida, em virtude de esta ter efectuado um juízo prévio sobre a inviabilidade da acção, nos termos decididos, «sem que previamente fosse feita prova ou permitida prova sobre os factos alegados».

    2. Todavia, a douta sentença recorrida o Tribunal a quo deu por «assente» - e bem: «- o teor dos estatutos da A., constantes de fls. 10 a 12 dos autos» e «- o teor da acta da assembleia geral da A. de 5/12/2011.» (por lapso, ali se referiu 5/12/2012).

      Factos assentes esses que bastaram, e bem – para, por si só, dispensarem a produção de qualquer outro tipo de prova, por serem bastantes e suficientes para a douta sentença recorrida haver efectuado um juízo prévio, e imediato, sobre a inviabilidade da Acção.

      III.

      Com efeito, não tendo a Ré, enquanto Tesoureira da Direcção da A., autonomia em relação à Direcção de que fazia parte, não pode exigir-se à Ré a...

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