Acórdão nº 708/15.6T9CBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 24 de Abril de 2019
Magistrado Responsável | HELENA BOLIEIRO |
Data da Resolução | 24 de Abril de 2019 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, em conferência, na 4.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório 1.
No Tribunal Judicial da Comarca de Coimbra – Juízo Local Criminal de Coimbra, o Ministério Público requereu o julgamento em processo comum, com intervenção do tribunal singular, dos arguidos A.
e B.
, com os demais sinais dos autos, imputando a prática, a cada um dos arguidos, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de furto, na forma continuada, previsto e punido pelos artigos 30.º, n.º 2, 79.º, n.º 1 e 203.º, n.º 1, todos do Código Penal.
(…) [e também seu marido, (…), se bem que no relatório da sentença recorrida não conste a referência a este] deduziu pedido de indemnização civil contra os arguidos, peticionando a sua condenação no pagamento da quantia de 5 000,00 €, por danos patrimoniais, acrescida dos respectivos juros moratórios.
Realizada a audiência de julgamento, o tribunal a quo proferiu sentença em que decidiu condenar os arguidos pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de furto, na forma continuada, previsto e punido pelos artigos 30.º, n.º 2, 79.º, n.º 1 e 203.º, n.º 1, todos do Código Penal nas penas de: a) Arguida A.
, em 200 (duzentos) dias de multa à razão diária de 5,50 € (cinco euros e cinquenta cêntimos), o que perfaz o total de 1 100,00 € (mil e cem euros); b) Arguido B.
, em 200 (duzentos) dias de multa à razão diária de 7,50 € (sete euros e cinquenta cêntimos), o que perfaz o total de 1 500,00 € (mil e quinhentos euros).
Mais julgou parcialmente procedente o pedido de indemnização civil e, por conseguinte, condenou os arguidos/demandados, solidariamente, a pagar à demandante, (…), a quantia de 4 970,00 € (quatro mil novecentos e setenta euros), acrescida dos respectivos juros de mora vencidos e vincendos, desde a data da notificação daquele pedido aos arguidos, até efectivo e integral pagamento, absolvendo-os do mais peticionado.
-
Inconformado com a decisão, dela recorreu o arguido B.
, que finalizou a motivação com as seguintes conclusões (transcrição): “i - Não contendo a douta sentença a enumeração dos factos constantes da acusação e do pedido de indemnização civil, limitando-se a elencar ipsis verbis os constantes da acusação pública, violou tal decisão o disposto nos artigos 374º., nº.2, e 379º., nº.1, al. a), ambos do C.P.P., conduzindo à nulidade da referida sentença.
ii – Impugnam-se os pontos 7 a 15 dos “factos provados”, por se considerarem incorretamente julgados nos termos da parte “d”, supra desenvolvida, cujo segmento versa sobre a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, nomeadamente por excesso de presunção e violação do princípio “in dubio pro reo”.
iii - Não tendo sido produzida qualquer prova objetiva e inequívoca no sentido que o recorrente se apropriou efetivamente das peças de ourivesaria e das quantias referidas na acusação, com a intenção dolosa de as fazer suas, não poderá ser imputada a este a prática do crime de furto de que se encontra injustamente condenado, com as legais consequências.
iv – Não tendo, enfim, o recorrente praticado tal crime, nem tendo sido produzida prova suficiente, cabal e plausível em relação aos alegados prejuízos causados aos demandantes, deve decair o pedido de indemnização civil contra este deduzido.
v – O tribunal recorrido não só violou o disposto nos artigos 374º., nº.2, 379º., nº.1, al. a), ambos do C.P.P., bem como o princípio incontornável constante do artigo 32º., nº.2, da constituição da república, impugnando-se os pontos 10 a 15 dos factos provados, por se mostrarem incorretamente julgados, como também violou os artigos 349º., 563º. e 566º. nº. 3, do código civil, sendo inaplicável ao ora recorrente o disposto no artigo 203º., do código penal.
***** termos em que … e nos demais de direito, deve ― Excelentissimos Senhores Venerandos Juizes Desembargadores ― ser dado provimento ao presente recurso e, por via dele, ser revogada a sentença recorrida e, em consequência, ser o recorrente Carlos Manuel de Jesus Campos absolvido do crime de furto em que foi condenado, bem como absolvido do respetivo pedido de indemnização civil, fazendo-se assim a necessária e irrefragável … justiça”.
-
Admitido o recurso, a Digna Magistrada do Ministério Público apresentou resposta em que pugna pela sua improcedência e formula as seguintes conclusões (transcrição): “Deverá ser negado provimento ao recurso e mantida a douta decisão recorrida.
A sentença não enferma de qualquer vício, designadamente o previsto no art. 379º, nº1, al. c) do Código de Processo Penal.
A sentença encontra-se devidamente fundamentada.
Mostra que foi feita uma rigorosa e precisa apreciação da prova.
Não foram violadas quaisquer normas legais, nomeadamente, do art. 127º, 374º, nº 2 e 379º, nº1, al. a) do Código de Processo Penal, do art. 203º do Código Penal e do art. 32º, nº2 da Constituição da República Portuguesa”.
-
Subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, na intervenção a que alude o artigo 416.° do CPP, pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso.
-
Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2 do CPP, não foi apresentada qualquer resposta.
-
Efectuado exame preliminar e colhidos os vistos, foram os autos à conferência.
Cumpre agora decidir.
* II – Fundamentação. 1.
Dispõe o artigo 412.º, n.º 1 do CPP que a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido.
Constitui entendimento constante e pacífico que o âmbito dos recursos é definido pelas conclusões formuladas na motivação, as quais delimitam as questões que o tribunal ad quem tem de apreciar[1], sem prejuízo das que sejam de conhecimento oficioso[2].
Atentas as conclusões apresentadas, que traduzem de forma condensada as razões de divergência do recorrente com a decisão impugnada, são as seguintes as questões suscitadas no recurso: - Nulidade da sentença por falta de fundamentação quanto à decisão sobre a matéria de facto.
- A incorrecta decisão proferida sobre a matéria de facto e a consequente modificação daquela decisão e necessária absolvição do recorrente.
- Violação do princípio in dubio pro reo.
* 2.
A sentença recorrida.
2.1.
Na sentença recorrida, o tribunal a quo fez constar o seguinte quanto a factos provados (transcrição): “Discutida a causa, resultaram provados os seguintes factos: 1 – A arguida A.
trabalhou na residência de (…) e (…), sita na Rua (…), em (…), (...); 2 – Desde finais do mês de Setembro de 2014 até ao início de Fevereiro de 2015; 3 – Pernoitando, na dita habitação, com os mesmos; 4 – E auxiliando (…) na sua higiene, alimentação e demais atos quotidianos; 5 – Tendo o horário de trabalho das 21H00 às 08H00; 6 – O arguido B.
é filho da arguida A.
; 7 – O arguido B.
tinha acesso à habitação de (…) e (…) durante o horário de trabalho da sua progenitora; 8 – Em datas não concretamente determinadas, compreendidas entre finais de Setembro de 2014 até ao dia 01 de Fevereiro de 2015, os arguidos A.
e B.
, concertados entre si, foram retirando da referida residência, levando consigo, fazendo-as suas, as seguintes peças de ourivesaria: a) Cordão de ouro de cadeia simples com cerca de 55cm de comprimento; b) Crucifixo de ouro, com Cristo em ouro, de 3 por 2 centímetros; c) Crucifixo todo em ouro com resplendor, com diâmetro vertical de cerca de 4 a 5 cm; d) Crucifixo com Cristo rodeado de pequenos vitrais de várias cores, com Cristo branco, com comprimento de cerca de 3 a 4cm; e) Broche de ouro leve, forma retangular de cantos arredondados medindo cerca de 4x2,5cm x 1cm de profundidade, tendo no...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO