Acórdão nº 1012/15.5T8VRL-AS.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 28 de Março de 2019
Magistrado Responsável | MARIA DOS ANJOS NOGUEIRA |
Data da Resolução | 28 de Março de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Sumário do acórdão (art. 663.º n.º 7, do CPC): I – A tradição ou entrega da coisa prometida alienar, quando se trate de prédio urbano, pode manifestar-se simbolicamente através da entrega das chaves, não se confundindo a tradição a que se alude na alínea f), do n.º 1, do art. 755.º do CC, com a posse, dado que aquela pode existir sem esta.
II - A não conclusão da construção não é causa de impedimento ou impossibilidade da tradição do andar.
III - No caso de promessa de compra e venda de um andar integrado num prédio a submeter ao regime de propriedade horizontal, a tradição exigida para o direito de retenção não necessita que a construção do andar prometido vender e do prédio em que se insere esteja concluída.
* -ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES- I. Relatório No presente apenso de reclamação de créditos, na sequência da declaração de insolvência de "MR, Lda", veio o credor "BANCO ..., SA", substituído processualmente por "X, SA" e "Banco A, SA", impugnar o crédito reconhecido a A. S., Contribuinte Fiscal n.º ..., e marido A. M., Contribuinte Fiscal n.º …, ambos residentes na Rua …, em ....
Para tanto, impugnou o crédito de € 30.000,00, quer quanto à existência do crédito, quer quanto à natureza garantida do mesmo, por direito de retenção sobre a verba n.° 33 do auto de arrolamento de bens.
*Responderam à impugnação do Banco ... os credores A. S. e A. M., mantendo o alegado na reclamação, pugnando pela improcedência da impugnação e invocando a litigância de má-fé do Banco.
*Na sequência do despacho que ordenou a adequação formal dos autos, com vista à tramitação em separado das impugnações, foi proferido despacho saneador quanto à presente impugnação, com a identificação do objecto do processo e enunciação dos temas da prova.
*Realizou-se audiência de julgamento, após o que foi proferida sentença que julgou a impugnação deduzida pelo credor hipotecário totalmente improcedente e em consequência, reconheceu o crédito reclamado pelos credores A. S. e A. M., nos termos constantes da lista de créditos reconhecidos, pelo valor de € 30.0000,00 (trinta mil euros), garantido por direito de retenção sobre a verba n° 33 do auto de arrolamento (ref.ª 644452, apenso M) e absolveu o credor Banco do pedido de condenação como litigante de má-fé.
*II-Objecto do recurso Não se conformando com essa decisão, a X, S.A., Impugnante no presente de Reclamação de Créditos apenso ao processo de insolvência de MR, Lda, veio interpor o presente recurso, formulando as seguintes conclusões: A. Vem a aqui Recorrente interpor o presente recurso da sentença que reconhece o crédito reclamado pelos Credores A. S. e A. M., pelo valor de € 30.0000,00 (trinta mil euros), garantido por direito de retenção sobre a verba n.º 33, por não se conformar com a mesma.
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A matéria de facto assente e dada como provada na douta sentença em apreço e relevante para a boa decisão da causa é a seguinte: 1. Por sentença de 10/07/2015, transitada em julgado, foi decretada a insolvência de "MR, Lda.".
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Por escritura pública celebrada em 28/04/2009, e competente documento complementar que a integra, no Cartório Notarial de ..., perante a Notária M. J., a insolvente "MR, Lda." constituiu a favor do Banco impugnante hipoteca para garantia do bom cumprimento de todas e quaisquer obrigações e responsabilidades que existam ou venham a existir, em seu nome, emergentes ou resultantes de operações de crédito concedidas ou a conceder pelo Banco impugnante, até ao valor limite de quatro milhões e seiscentos mil euros, conforme Doc.1 junto com a impugnação do Banco cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido.
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A referida hipoteca foi constituída sobre diversos imóveis, bem como sobre quaisquer benfeitorias neles a realizar, todos situados na Quinta ..., freguesia de ... (…), concelho de ..., inscritos a favor da insolvente pela Ap. 1 de 1991/12/09, nomeadamente: a. Prédio urbano, composto por parcela de terreno para construção, designado por lote ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de ..., sob o número... (...), inscrito na respectiva matriz sob o artigo ... (cfr. Doc.1); b. Prédio urbano, composto por parcela de terreno para construção, designado por lote ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de ..., sob o número... (...), inscrito na respectiva matriz sob o artigo ... (cfr. Doc.1); c. Prédio urbano, composto por parcela de terreno para construção, designado por lote ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de ..., sob o número /... (...), inscrito na respectiva matriz sob o artigo ... (cfr. Doc.1).
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A hipoteca foi registada a favor do Banco impugnante na Conservatória do Registo Predial de ... pela AP. 3043 de 2009/04/07, conforme Doe. 2, Doe. 3 e Doe. 4 juntos com a impugnação do credor "BANCO ...", cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
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Por documento particular datado de 12 de Março de 2011, com reconhecimento presencial de assinaturas, denominado "Contrato Promessa de Compra e Venda", "MR, Lda." representada pelo seu sócio gerente MR, declarou prometer vender a A. S. e A. M., e estes declararam prometer comprar, livre de ónus e encargos, pelo preço de € 141.000 (cento e quarenta e um mil euros), a fracção autónoma tipo 13, situada no 2° …, com 1 lugar de garagem na cave, situado no prédio a construir em regime de propriedade horizontal, no lote …, entrada …, descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º ... e inscrito na matriz sob o artigo ..., actual artigo 21 da União das Freguesias de ..., (conforme doc. n.º 1 junto com a resposta dos credores A. S. e A. M., que aqui se dá por reproduzido).
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Mais declararam os outorgantes que o ajustado preço de € 141.000,00 seria pago nos termos e prazos seguintes: a. Na data do contrato e a título de sinal e princípio de pagamento, a quantia de € 30.000,00 (trinta mil euros), que a "MR, Lda." declarou ter recebido e declarou dar quitação; b. A restante parte do preço, isto é € 111.000,00 (cento e onze mil euros), seria paga pelos promitentes-compradores, no ato da escritura prometida.
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Os credores pagaram a aludida quantia de € 30.000,00 (trinta mil euros), através dos referidos cheques n.º 8802061245 e 160061253, datados respectivamente de 12/03/2011 e de 04/04/2011, nos valores de € 25.000,00 e de € 5.000,00, os quais foram descontados das respectivas contas bancárias em 15/03/2011 e em 05/04/2011.
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Nos primeiros meses do ano de 2014, a insolvente parou as obras de construção do referido lote 17, incluindo da fracção autónoma prometida vender.
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A matéria de facto não provada assenta apenas na questão de não ter ficado provado que os credores passaram a levar os seus familiares à fracção.
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Ao contrário do entendimento do douto Tribunal a quo, não ficaram provados os seguintes factos: 1. No acto de celebração do acordo, os credores entregaram à insolvente, a título de sinal e princípio de pagamento, através dos cheques na 8802061245 e 1602061253, sacados sobre o Banco ..., a quantia de €30.000,00 (trinta mil euros).
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A fracção destinava-se à sua habitação.
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Em sede de audiência e discussão de julgamento e com o depoimento das várias testemunhas arroladas pelos credores, ficou claro e tal como consta da douta sentença ora recorrida, que os credores entregaram dois cheques, um no valor de € 25.000,00 (vinte e cinco mil euros) e outro no valor de € 5.000,00 (cinco mil euros), em datas distintas.
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Ou seja, estes cheques não foram todos entregues na data da celebração do contrato de promessa de compra e venda, 12.03.2011, mas apenas um foi descontado nessa data (cheque n.º 8802061245 no valor de € 25.000,00), sendo que o outro cheque foi descontado um mês após a celebração do contrato-promessa (cheque n.º 160061253, no valor de € 5.000,00).
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Dir-se-á que andou mal o douto Tribunal ao considerar o pagamento destes dois cheques como pagamento a título de sinal de um contrato-promessa, conforme infra melhor explicado.
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Mais, não pode a aqui Recorrente concordar com a afirmação de que a fracção ora em apreço se destinava a habitação dos Credores, porquanto os mesmos nada fizeram para que a mesma se tornasse habitável, nem tão-pouco alguma vez lá moraram, como aliás, ficou provado com toda a prova testemunhal produzida, como melhor se entenderá com a exposição infra.
I. Surpreendeu-se a aqui Recorrente com a afirmação pelo douto Tribunal a quo de que existiu um acordo entre a insolvente e os credores A. S. e A. M. para que estes procedessem à conclusão das obras na fracção sub judice.
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Ora, não pode a aqui Recorrente concordar com tal afirmação, porquanto ficou provado de que os Credores nunca fizeram qualquer obra no apartamento, nem tão-pouco nele habitaram alguma vez.
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Diz-nos o artigo 441.
0 do Código Civil (adiante abreviadamente designado por CC) que: "No contrato-promessa de compra e venda...
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