Acórdão nº 611/12.1TYVNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 26 de Março de 2019
Magistrado Responsável | ANA LUCINDA CABRAL |
Data da Resolução | 26 de Março de 2019 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Proc. nº 611/12.1TYVNG.P1 Tribunal Judicial da Comarca do Porto Juízo de Comércio de Vila Nova de Gaia - Juiz 1 Acordam no Tribunal da Relação do Porto I - Relatório.
B…, solteira, residente, à data, na Rua …, n.º …, …, Lisboa, instaurou a presente acção de anulação de deliberações sociais, sob a forma de processo sumário, contra “C…, Lda.”, com sede no … pedindo que seja declarada a nulidade das deliberações adoptadas na assembleia geral de sócios da ré ocorrida no dia 23 de Março de 2012, exaradas em documento denominado de “acta n.º 14” – declarando-se nulo e de nenhum efeito tal documento – ou, quando muito, sem prescindir ou conceder, a anulação de tais deliberações.
Alegou, para o efeito, que, sendo sócia da ré, não recebeu, nem lhe foi remetida, qualquer convocatória para a referida assembleia geral, tendo apenas tido conhecimento da sua realização a 20 de Abril de 2012, por ter recebido, por carta, a acta correspondente.
A ré contestou, impugnando a versão apresentada pela autora e alegando que expediu, por carta registada com aviso de recepção, a convocatória destinada à autora para o seu domicílio, a qual foi devolvida ao remetente a 19 de Março de 2012, por não ter sido reclamada, pugnando pela efectiva e regular convocação da autora. Concluiu, pedindo a condenação da autora em multa e indemnização a seu favor, como litigante de má-fé.
A autora respondeu com os fundamentos constantes do articulado de fls. 50 a 55, os quais damos aqui por reproduzidos.
Foi proferido despacho saneador, no âmbito do qual se fixou à acção o valor de 30.000,01 euros, foi identificado o objecto do litígio e foram enunciados os temas da prova.
Realizou-se a audiência de discussão e julgamento com observância de todas as formalidades legais.
Foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:”a) Julgo improcedente a presente acção e, em consequência, absolvo a ré do pedido; b) Condeno a autora, como litigante de má-fé, na multa de 5 (cinco) unidades de conta e na indemnização, a favor da ré, no montante de 2.000,00 euros.“ A autora B… veio interpor recurso, concluindo: B1. O presente recurso vem interposto da decisão proferida pela primeira instância que condenou a ora recorrente como litigante de má fé, a qual não se pode conceder, por um lado porque a recorrente não foi notificada para se pronunciar sobre a sua eventual condenação e, por outro lado (mas sem prescindir) porquanto se entende que a recorrente não actuou com negligência grave.
B2. Do cotejo dos autos resulta, clara e sem margens para dúvidas, que a decisão sob escrutínio, emergiu como causa de profunda estupefacção para a ora recorrente constituindo, assim, uma decisão – surpresa, posto que não foi notificada para sobre ela se pronunciar.
B3. Sem mais, não tendo sido dada possibilidade à recorrente de se pronunciar sobre a possibilidade de ser condenada como litigante de má fé, a decisão recorrida incorre em nulidade, por violação do princípio do contraditório e do artigo 3°, do CPC.
B4. Destarte, conclui-se assim que a decisão recorrida é violadora do disposto nos art.sº 3º e 7º do CPC (princípio do contraditório) e dos princípios constitucionais de acesso ao direito e da proibição da indefesa.
B5. Inobservada uma regra processual crucial, geradora de nulidade – que se invoca para os legais e devidos efeitos – deve a decisão recorrida ser revogada e ordenar-se o cumprimento do disposto no art.º 3 .º do CPC.
B6. Resta referir que a interpretação do art.º 542º do CPC no sentido de não ser necessária a notificação do condenado, previamente à decisão da sua condenação como litigante de má fé, para, querendo se pronunciar sobre essa possibilidade ou com a interpretação de que basta a notificação da parte para se pronunciar em termos abstractos (nada referindo expressamente quanto à possibilidade da sua condenação como litigante de má fé) sobre teor de documento junto, é inconstitucional por violadora dos princípios do contraditório, acesso ao direito e proibição de indefesa, todos com assento constitucional (art. 20º- 5 da CRP), inconstitucionalidade esta que desde já se invoca. Sem prescindir, B7. A apelante não concede a interpretação do acervo probatório constante dos autos pelo que, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 640º do CPC passa a elencar os pontos de facto que se consideram incorrectamente julgados como não provados: A A. não recebeu qualquer convocatória para qualquer assembleia-geral/reunião de sócios da R. a ocorrer no dia 23.03.2012; Sendo falso que qualquer aviso tenha sido depositado na caixa postal da A. e que esta se tenha eximido de levantar a respectiva correspondência junto do expedidor postal; Sendo certo que a A. teve, mais do que uma vez, problemas com o distribuidor postal, que a levaram, inclusive, há alguns meses a esta parte, a apresentar reclamação junto dos CTT.
B8. Nos termos da alínea b) do já mencionado n.º 1 do artigo 640º do CPC passam a elencar-se os meios probatórios susceptíveis de determinar uma assunção factual diversa da propugnada pela decisão sob escrutínio: - Depoimento da testemunha D… (audiência de julgamento no dia 16.03.2017, pelas 9h30 e gravado através do sistema integrado H@bilus Media Studio, com a duração de 13minutos e 36egundos com o ficheiro n.º 20170316102841_6631473_2871617); - Declarações de parte da A.
(audiência de julgamento no dia 16.03.2017, pelas 9h30 gravadas através do sistema integrado H@bilus Media Studio, com a duração de 17minutos e 41egundos, ficheiro 20170316105315). Ora, B9. Da prova produzida resulta inequívoco que, quer a A. quer a testemunha D…, só tiveram conhecimento da realização da Assembleia-Geral através da carta posteriormente remetida e que continha a acta; que os respectivos avisos não foram depositados na caixa de correio de um e outro; que a R. teve conhecimento de que quer a A. quer a testemunha D… não foram notificados da convocatória e, ainda assim, não procedeu a uma segunda convocatória para a mencionada morada da A. e / ou a profissional, que bem conhecia; que a A., acaso tivesse sido depositado o respectivo aviso, tê-lo-ia levantado como sempre fez, de resto; a R. é uma sociedade familiar na qual os sócios estão em permanente conflito.
B10. A A., perante todas estas evidências – o facto de a testemunha D… também...
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