Acórdão nº 220/16.6PECSC.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 11 de Abril de 2019

Magistrado ResponsávelCALHEIROS DA GAMA
Data da Resolução11 de Abril de 2019
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, na 9a Secção (Criminal) do Tribunal da Relação de Lisboa: I – Relatório 1.

No âmbito do processo comum n.º 220/16.6PECSC, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste - Juízo Local Criminal de Cascais – Juiz 1, foi submetido a julgamento, com intervenção de Tribunal Singular, o arguido PP, casado, contabilista, nascido a …, natural da freguesia da …, concelho de Lisboa, filho de XX e de ZZ, titular do Cartão de Cidadão n.º …, residente na Rua … Carcavelos, acusado pelo Ministério Público da prática, em autoria material e na forma consumada, de factos que, em seu entender, integram um crime de ameaça, previsto e punido pelo art. 153.º, n.º 1, do Cód. Penal, consubstanciados nos factos descritos na acusação formulada a fls. 100 a 103 que aqui se dá por reproduzida.

MM constituiu-se na qualidade de assistente (fls. 90), aderiu à acusação pública e deduziu acusação particular contra o arguido PP, imputando-lhe, como autor material, a prática de factos que, em seu entender, integram a prática de um crime de injúria, previsto e punido pelo art. 181.º, n.º 1, do Cód. Penal, consubstanciado nos factos descritos na acusação formulada a fls. 113 e 113 verso, que aqui se dá por reproduzida, e deduziu pedido de indemnização cível contra o arguido/demandado, que integra fls. 113 verso a 115 dos autos, peticionando a condenação deste no pagamento da quantia de € 2.000,00 (dois mil euros), a título de indemnização por danos não patrimoniais, pelo receio e temor de que padeceu em resultado da ameaça que lhe foi dirigida, e no pagamento da quantia de € 1.000,00 (mil euros), a título de indemnização por danos não patrimoniais, em resultado do desgosto, tristeza, humilhação e perturbação de que padeceu, em resultado das injúrias que lhe foram dirigidas.

Por despacho, datado de 4 de outubro de 2017, que integra fls. 122 a 124, o Ministério Público declarou acompanhar a acusação particular deduzida pelo assistente.

Realizado o julgamento, por sentença, proferida e depositada em 6 de junho de 2018, foi decidido: "julgar parcialmente procedente, por parcialmente provada, a acusação deduzida pelo Ministério Público, e, consequentemente:

  1. Absolver o arguido PP relativamente à prática de um crime de ameaça, p.p. pelo art. 153.º, n.º 1 do Cód. Penal; B) Condenar o arguido PP, pela prática, em autoria material, de um crime de injúria, p.p. pelo art. 181.º, n.º 1 do Cód. Penal, na pena de 60 dias de multa, à taxa diária de € 5,00, o que perfaz o montante global de 300,00 (trezentos euros) C) Julgar improcedente, por não provado, o pedido de indemnização cível deduzido pelo demandante MM, e, em consequência, dele se absolver o arguido/demandado PP." (fim de transcrição).

  1. O arguido, inconformado com a mencionada decisão, interpôs recurso extraindo da sua motivação as seguintes conclusões: 1. O presente recurso limita-se à parte da sentença que julgou parcialmente procedente, por parcialmente provada, a acusação deduzida pelo MP e que, consequentemente, condenou o arguido pela prática, em autoria material, de um crime de injúria, p.p. pelo artigo 181.º, n.º 1 do CP (alínea b) do dispositivo), e nas custas do processo, e impugna-se a decisão proferida sobre a matéria de facto.

  2. O arguido nunca proferiu as palavras “seu filho da puta” e “vai para a puta que te pariu” ao assistente.

  3. O que o arguido disse, naquela noite do jogo de futebol no dia 06.03.2016, já na rua pública, foi “foda-se”, “caralho”, e “boca” em voz alta, e num contexto de desabafo depois de ter sido provocado por outro cliente (Sr. AA) por causa do futebol e por lhe ter sido recusado uma bebida, mas nunca disse “seu filho da puta”, nem “vai para a puta que te pariu”.

  4. Por conseguinte, não é verdade o alegado nos pontos 6., 8., 10., 11., 15., 18. e 24. da matéria de facto provada da sentença.

  5. Também existe uma contradição insanável na fundamentação da sentença, entre os pontos 9. a 11.

    da matéria de facto provada.

  6. Porquanto, no ponto 9. é referido que o arguido “abandonou o café” e no ponto seguinte (10.) refere que, ao mesmo tempo, dirigiu-se ao assistente; ora se ele já tinha saído do café como é que ele se dirigiu ao assistente que estava no interior do café? O arguido não podia estar a sair do café de costas voltadas para a porta.

  7. Também existe outra contradição insanável da fundamentação, pois no ponto 15. da matéria de facto provada é referido que o arguido “efectivamente ofendeu” o assistente. Contudo, no 2§ da página 8 da douta sentença é referido que o próprio assistente, nas declarações que prestou, não se considerou melindrado ou ofendido na sua honra e consideração em resultado das expressões injuriosas que alegadamente lhe foram endereçadas pelo arguido referidas no ponto 10.

  8. A tese trazida ao Tribunal a quo pelo assistente (gravado em suporte digital no ficheiro: file:///E:/20180516102638_4035718_2871350.html, no dia 16.05.2018, das 10:37:03 às 11:12:57) não foi corroborada pelas testemunhas inquiridas, pois nenhuma testemunha proferiu que o arguido disse: “vai para a puta que te pariu”.

  9. A testemunha VV demonstrou que o arguido não estava dentro do café, pois se disse “vocês aí dentro é tudo a mesma merda”, como é aliás referido na sentença (na página 6), é porque o arguido não estava dentro do café, por isso se eventualmente disse (o que não disse) “filho da puta” não foi para ninguém em especial, pois ele estava na rua sozinho a falar sozinho.

  10. Por outro lado, esta testemunha não devia ter sido considerada relevante, nem credível, pois nota-se perfeitamente no seu depoimento que tem algo contra o arguido (gravado em suporte digital no ficheiro: file:///E:/20180516102638_4035718_2871350.html, no dia 16.05.2018, das 11:13:48 às 11:30:34).

  11. A testemunha GG não assistiu aos acontecimentos de dia 06.03.2016 relatados na acusação, pelo que nunca o seu depoimento poderia ter qualquer influencia na condenação do arguido pela prática do crime de injúria ao assistente. Aliás, esta testemunha até relata factos que o assistente nunca relatou e que não aconteceram, pois disse que o arguido chamou o assistente de “filho da puta” na manhã de dia 19.03.2016 quando o assistente referiu que tal expressão foi proferida na noite do jogo em 06.03.2016 (cfr. a título de exemplo, o auto de declarações a fls. 13 a 14 do 1.º volume dos autos).

  12. O depoimento desta testemunha evidencia que não é ocular e que não esteve presente no café no referido dia e no momento em causa.

  13. Outro motivo ou prova de que o arguido não proferiu estas palavras é o depoimento da testemunha RR, pois esta testemunha nada depôs sobre ter ouvido estas palavras da boca do arguido, fossem dirigidas para quem fosse.

  14. Esta testemunha referiu foi a animosidade que tem para com o arguido, o que a torna uma testemunha parcial e inidónea para depor (gravado em suporte digital no ficheiro: file:///E:/20180516102638_4035718_2871350.html, no dia 16.05.2018, das 11:48:13 às 11:59:40).

  15. Pelo que, deveria ter sido considerada não provada a seguinte matéria de facto: “(…) g) Face ao comportamento conflituoso do arguido, o assistente chamou-o a atenção para moderar a linguagem.” “h) O assistente recusou-se a servi-lo, uma vez que o arguido já tinha consumido, durante o visionamento do jogo, seis cervejas, e face ao comportamento provocatório deste.” “i) E ao mesmo tempo, perante a presença de vários clientes, dirigiu-se ao assistente, em voz alta e sem que nada o justificasse, tendo proferido as seguintes palavras: “seu filho da puta” e “vai para a puta que te pariu” “j) As referidas expressões, lesivas da honra e consideração do assistente, foram proferidas em viva voz, em pleno café, onde se encontravam vários clientes do estabelecimento.” “k) Ao proferir ao assistente as expressões a que é feita menção em i), o arguido quis ofendê-lo na honra e consideração que lhe são devidas, como efectivamente e ofendeu, bem sabendo que tais expressões eram ofensivas da honra e consideração do assistente.” “l) O arguido agiu, assim, de modo deliberado, voluntário, livre e consciente, bem sabendo que os seus actos, a que é feita referência em i), eram proibidos e punidos por lei e, não obstante ter capacidade de determinação em sentido diverso, não se inibiu de os realizar.” “m) As expressões a que é feita menção em i), lesivas da honra e consideração do demandante MM, foram proferidas, repetidamente e de viva voz, perante os cliente do café “S…”.” 16. Os pontos 6. e 8. da matéria de facto provada da sentença deverá ser alterada para passar a ter a seguinte redacção: “6. O assistente chamou-o a atenção para moderar a linguagem.”, “8. O assistente recusou-se a servi-lo.” 17. Pelo que, em conclusão, não foi correctamente apreciada a prova gravada referente a estes factos, nem toda a restante prova carreada para os autos.

  16. Alterada a matéria de facto provada e não provada nos termos supra expostos, não se encontrará preenchido o tipo legal de crime de injúria no caso sub judice, devendo o arguido ser absolvido da prática do crime relativamente ao qual foi condenado pelo Tribunal a quo.

    Nestes termos e nos melhores de direito, deve ser concedido provimento ao presente Recurso, procedendo-se, entre o mais, à reapreciação da prova gravada, nomeadamente dos depoimentos das testemunhas VV, GG, e RR.

    Devendo, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida na parte que condenou o arguido pela prática, em autoria material, do crime de injúria e nas custas do processo, e substituída por outra que absolva o arguido da prática, em autoria material, do crime de injúria na pena de 60 dias de multa à taxa diária de 5€, pois só assim se fará JUSTIÇA.

    ” (fim de transcrição).

  17. Também o assistente inconformado com a mencionada decisão, interpôs recurso extraindo da sua motivação as seguintes conclusões: “I - O Tribunal a quo absolveu o arguido da prática de um crime de ameaça, previsto e punido pelo artigo 153.º, n.º 1, do Código Penal, por a acusação não...

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