Acórdão nº 502/17.0T9LRS.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 11 de Abril de 2019

Magistrado ResponsávelCLÁUDIO XIMENES
Data da Resolução11 de Abril de 2019
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acórdão da 9.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: I. AA recorre da sentença que a condenou, como autora de um crime de abuso e simulação de sinais de perigo previsto e punido pelo artigo 306.º, do Código Penal, na pena de 40 dias de multa, à razão diária de €5,00 a que correspondem, subsidiariamente, 26 dias de prisão. Pretende ser absolvida da acusação ou ser condenada em pena inferir à aplicada.

Termina a motivação do recurso com as seguintes conclusões: 1. O Tribunal a quo julgou como provado o ponto 5, 6 e 7. Acontece que nenhuma testemunha esteve presente durante os acontecimentos que motivaram a Arguida a acionar o dispositivo de teleassistência e que lhe provocaram o justo receio vivido por aquela, ao ponto de solicitar ajuda através do uso aquele dispositivo, nomeadamente, através das injúrias, do receio pela sua integridade física e psicológica, do sofrimento que esta já viveu nas mãos do seu ex-marido, do histórico de violência que a Arguida sofreu, das perseguições e das esperas que aquele lhe fez... de tal forma que não foi de ânimo leve que a arguida foi acompanhada pelo dispositivo de teleassistência cerca de ano e meio! Dispositivo esse concedido através de medida atribuída pelo próprio tribunal que agora a condena! 2. Como podem duas pessoas discutir ou estar envolvidos em agressões verbais sem estarem exaltados ou nervosos?? 3. Como pode não ter havido motivo para chamar a intervenção da polícia, se o próprio segurança (testemunha PP) do Centro Comercial (1) foi chamado ao local porque estavam a haver um desacato; (2) ele próprio comunicou o sucedido à PSP (3) foi acalmar uma situação que não havia exaltação ou nervosismo?! 4. Estas duas testemunhas intervieram depois da Arguida ter acionado o dispositivo de teleassistência, e ambas confirmaram que: d) também tinham ligado à PSP – por procedimento ou não; e) ocorreu algo de anormal que motivou a comparência de dois seguranças ao local onde a Arguida e o seu ex-marido se encontravam – “discussão” e “agressões verbais”.

  1. A ocorrência motivou afastarem a Arguida e o ex-marido, “por medida de precaução”.

    1. Só por estes elementos podemos considerar que houve um justo fundamento para que a Arguida acionasse o dispositivo de teleassistência e que a polícia fosse ao local.

    2. O pedido da comparência à PSP foi feito por um assistente da teleassistência à PSP! Houve uma triagem prévia! Se não houvesse um justo receio, fundamentado que foi apresentado ao assistente, se esse não fosse um procedimento comum neste tipo de situações, este assistente não tinha solicitado a comparência da PSP ao local para o efeito.

    3. Os Seguranças também comunicaram o ocorrido à PSP – houve um incidente digno de ser registado e que levou à intervenção de terceiros! 8. Ora, dizer que a Arguida utilizou abusivamente um sinal ou chamada de alarme ou socorro simuladamente é extremamente grave, desproporcional e inaceitável, considerando que estamos a falar de uma vítima de violência doméstica, sinalizada e acompanhada por vários técnicos que, entre outras coisas, dão acompanhamento psicológico e estão formados e sensibilizados para o efeito.

    4. Convenhamos, que a PSP foi ao local porque a teleassistência assim solicitou depois da Arguida ter acionado o dispositivo, porque se assim não fosse, os seguranças também comunicaram à PSP a ocorrência. Só não foram ao local a pedido dos seguranças, porque já iam a caminho daquele verificar a mesma ocorrência...

    5. Ora, se não houve necessidade de a teleassistência ter chamado a PSP ao local, porque razão os seguranças do Loures Shopping também não foram acusados por abuso e simulação de sinais de perigo?! 11. Cabe nos salientar ainda quais são as atribuições da Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (CIG), que é a entidade pública responsável pela instalação e manutenção do sistema de teleassistência (nº5 do art. 2º da Lei 112/2009, de 16 de setembro), entre outras: a) Garantir uma intervenção imediata e adequada em situações de emergência, através de uma equipa especializada e da mobilização de recursos técnicos proporcionais ao tipo de situação apresentada; b) Mobilizar os recursos policiais proporcionais ao tipo de emergência; c) Atenuar níveis de ansiedade, aumentando e reforçando o sentimento de proteção e de segurança das vítimas, proporcionando apoio e garantindo a comunicação 24 horas por dia com o Centro de Atendimento; 12. Há que referir ainda que no termo de responsabilidade que a ora Arguida assinou, in https://www.cig.gov.pt/teleassistencia-a-vitimas-de-violencia-domestica/ , refere no seu artigo 2º o direito de receber uma resposta de proteção adequada às situações de emergência que venham a verificar-se – é notório que após a exposição da Arguida, a Teleassistência achou adequado que a PSP acompanhasse a Arguida a casa, leia-se a local seguro.

    6. Assim, com base no supra exposto, nomeadamente pelo depoimento das testemunhas PP e NN, conjugado com o procedimento e atribuições da teleassistência e da Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (CIG): f) o ponto 5 da matéria dada como provada - Aí chegados, os agentes dirigiram-se à arguida a qual os informou que não sentiu qualquer receio, mas que precisava de transporte para casa – deve ser substituído por outro que refira que os agentes dirigiram-se à arguida a qual informou que sentiu receio que o seu ex-marido lhe fizesse mal, e que precisava que a acompanhassem a casa.

  2. O ponto 6 da matéria dada como provada - Ao agir de forma descrita a arguida sabia que não estava em perigo e que mão tinha qualquer motivo para acionar o sistema de teleassistência – deve ser dado parcialmente provado no sentido em Ao agir de forma descrita a arguida sabia que estava em perigo e que mão tinha motivos para acionar o sistema de teleassistência h) O ponto 7 da matéria dada como provada - Ainda assim a arguida acionou o aparelho, solicitando dessa forma a presença no local de meios de socorro, sabendo que deles não necessitava e que os mesmos poderiam ser necessários para auxiliar alguém que deles realmente precisasse – deve ser substituído por outro que referida que a arguida acionou o dispositivo de forma legitima, tendo a teleassistência solicitado a presença no local de meios de socorro, pois deles necessitava, como os seguranças também solicitaram os referidos meios.

  3. O ponto 8 da matéria dada como provada- A arguida agiu com o propósito alcançado de acionar os meios de socorro e de os fazer deslocar ao local onde se encontrava, sabendo que deles não necessitava – deve ser dado como não provado.

  4. O ponto 9 da matéria dada como provada A arguida agiu livre, deliberada e conscientemente bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei- deve ser dada como não provada.

    1. A atuação da Arguida não se consubstancia um abuso no facto de ter acionado o dispositivo de teleassistência: dadas as circunstâncias em que a Arguida ora recorrente se encontrava e a medida que esse dispositivo visa prosseguir aos seus utilizadores – pelo contrário foi uma utilização legítima e fundamentada.

    2. Não se demonstra subsumível a atuação da Recorrente à ilicitude que o tipo de crime obriga, nem se verifica um abuso de atuação quanto ao enquadramento da própria legislação inerente ao procedimento de utilização da mesma.

    3. Além do mais, não houve em momento algum por parte da Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (CIG), que é a entidade pública responsável pela instalação e manutenção do sistema de teleassistência não informou em momento algum o presente processo de que a Arguida acionou indevidamente o dispositivo de Teleassistência, queixa ou participação nesse sentido.

    4. A Arguida e ora Recorrente deve ser Absolvida.

    5. Equacionando por cautela de patrocínio a manutenção daquela qualificação jurídica, se vislumbra defeito na ora recorrida decisão, pelo que cumpre pugnar pela diminuição da pena aplicada à arguida.

    6. Na verdade a pena aplicada à Arguida apresenta-se excessivamente severa e desproporcional aos fins de prevenção geral e especial que lhe cabe alcançar.

      A resposta à motivação do recurso apresentada pela Sra. Procuradora-Adjunta junto da 1.ª instância, com a adesão total da Sra. Procuradora-Geral Adjunta junto deste Tribunal da Relação, termina com as seguintes conclusões: 1 – O recorrente, na sua motivação não impugna correctamente a decisão sobre a matéria de facto, não preenchendo os respectivos requisitos legais, nomeadamente o disposto no art 412º, nº3 do C.P.; 2 – Ora, o recorrente, no nosso entender, e pese embora, indique os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, não cita sequer uma única passagem, ou depoimento, ou parte dele que transcreva, nem indica suportes magnéticos, limitando-se a dizer por palavras suas, pois que não são citações, partes de alguns depoimentos, que no seu entender levam a determinadas conclusões, que extrai de modo próprio, não referindo assim passagens que traduzam, ou consistam, em provas concretas que impõem decisão diversa da recorrida, na medida em que, nada indica que contrarie a prova indicada na sentença, em que a Mmª Juiz se alicerçou, nem os factos descritos na mesma, limita-se a tirar conclusões suas, que diga-se desde já erradas, sendo certo que até os aspectos que refere indicam é conclusões exactamente ao contrário do que pretende e que corroboram os factos dados como provados exactamente como o foram dados; 3 - Não se vislumbra da motivação quais os fundamentos, ou os motivos da recorrente para considerar que não se deviam ter dado como provados, ou que devem ser alterados, os factos que constam como tal na sentença; 4 - Não são minimamente respeitados os requisitos legais para se recorrer da matéria de facto, nem é apontado em concreto onde se encontra o erro notório sendo certo que o mesmo tem que resultar do texto da decisão; 5 - Refere primeiramente o recorrente que, os factos que indica foram incorrectamente julgados na medida em que...

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