Acórdão nº 128/15.2JBLSB-B.L3-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 04 de Abril de 2019

Magistrado ResponsávelFERNANDO ESTRELA
Data da Resolução04 de Abril de 2019
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na 9.ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa: I – No Proc. n.º 128/15.2JBLSB-B, da Comarca de Lisboa, Juízo Central Criminal de Lisboa, Juiz 2, por despacho judicial de 30 de novembro de 2018, foi declarada a especial complexidade relativamente aos presentes autos em que é arguido AA nos termos do art. 215.° n.ºs 2 e 3 do Código de Processo Penal.

II – Inconformado, o arguido AA interpôs recurso formulando as seguintes conclusões: 1. O Tribunal a quo, com o Despacho que declara a especial complexidade do processo, efetua uma interpretação inconstitucional do artigo 215° n° do Código de Processo Penal, do Código de Processo Penal, através da qual a invocação da alteração dos pressupostos de facto de decisão anterior sobre a mesma matéria permite ultrapassar a exceção de caso julgado e a autoridade de caso julgado em processo penal, interpretação esta que viola o disposto nos artigos 219° n°1, 20° n°s 1 e 4 e 32° n°1 da Constituição da República Portuguesa, artigo 6° n°1 e n°3, alínea a) da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e artigos 47°, 2° paragrafo e 48°, 2° paragrafo, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, na medida em que viola o princípio da legalidade, o princípio do acesso a um processo justo e equitativo, o princípio da igualdade de armas e da proibição da indefesa, o princípio da lealdade processual, o princípio da vinculação temática da acusação e o princípio do respeito pela Autoridade de Caso Julgado, coartando os mecanismos de defesa dos Arguidos, que se vêm assim privados de invocar a seu favor uma decisão favorável já transitada em julgado e que tem implicações diretas com o prazo de manutenção das medidas privativas de liberdade a que se encontram sujeitos.

  1. Face o exposto, verificando-se a violação do disposto nos artigos 219° n°1, 20° nos 1 e 4 e 32° n°1 da Constituição da República Portuguesa, artigo 6° n°1 e n°3, alínea a) da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e artigos 47°, 2° paragrafo e 48°, 2° paragrafo, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, a Douta Decisão Instrutória encontra-se inquinada por invalidade, nos termos do disposto no artigo 3° n°3 da Constituição da República Portuguesa, a qual deve ser declarada, para todos os efeitos legais.

  2. O Tribunal Recorrido nunca poderia declarar, com o seu despacho de 30 de novembro de 2018, a especial complexidade dos presentes Autos, uma vez que existe decisão já transitada em julgado sobre esta matéria no âmbito do presente processo, mormente o Acórdão de 11 de julho de 2018, proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, com o número de processo 128/15.2JBLSB-G.L1 -3, que manteve a douta decisão recorrida, ou seja, não declarando a especial complexidade do presente processo de acordo com a decisão proferida pelo Meritíssimo Juiz de Instrução.

  3. O Acórdão acima referenciado encontra-se, pois, transitado em julgado, tendo-se formado caso julgado sobre o facto submetido à apreciação do Tribunal superior e novamente colocado à apreciação - a especial complexidade - o que equivale a dizer que, com tal decisão, encontra-se este Tribunal vinculado intraprocessualmente à mesma, de onde resulta a preclusão de qualquer poder de nova apreciação sobre este tema e, acima de tudo, a imutabilidade dos pressupostos em que assenta a não verificação, in casu, da especial complexidade.

  4. Mesmo que tal não se verificasse e não se encontrasse o Tribunal a quo impedido de sobre esta matéria se pronunciar novamente, o ora Arguido toma seu a decisão vertida no Aresto supra citado, ou seja, não se verificam os pressupostos de declaração da especial complexidade, pois inexistem, neste momento processual, qualquer dificuldade de investigação, por força da prolação do despacho de acusação, nem se verifica, como já firmado, qualquer especial organização do crime em análise, não tendo sido, sequer, utilizadas técnicas de investigação extraordinárias ou extremamente complexas.

  5. Na verdade, em vista da devida estabilização processual e da preservação do exercício das garantias de defesa e, sobretudo, do contraditório, sendo a acusação que define o objeto do julgamento, os limites de cognição do tribunal e a extensão do caso julgado, a especial complexidade nunca poderá ser apreciada mais de uma vez no mesmo processo.

  6. Inclui-se ainda no princípio da vinculação temática, após a prolação do Despacho de Acusação, a anterior decisão sobre a não verificação dos pressupostos de que depende a especial complexidade do processo.

  7. Do mesmo modo, a autoridade do caso julgado visa evitar que a questão decidida pelo órgão jurisdicional possa ser validamente definida, mais tarde, em termos diferentes por outro ou pelo mesmo tribunal e que possui também um valor enunciativo, que exclui toda a situação contraditória ou incompatível com aquela que ficou definida na decisão transitada e afasta todo o efeito incompatível, isto é, todo aquele que seja excluído pelo que foi definido na decisão transitada.

  8. Assim, quando a anterior decisão que estabelece não ser aplicável ao caso sub judice a especial complexidade do processo se encontrar já transitada, não é possível que nova decisão venha colocar a mesma em causa, ofendendo assim o caso julgado já formado no processo, relativamente à mesma matéria em apreço.

  9. Termos em que, sob pena de violação da exceção de caso julgado e, do mesmo modo, em obediência à autoridade do caso julgado, nunca poderá ser declarada a especial complexidade dos presentes Autos, em função da decisão já anteriormente transitada em julgado que determinou não ser aplicável aos presentes Autos tal especial complexidade.

    Nestes termos e nos mais de Direito aplicáveis, sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deverão: 1. Julgar o presente Recurso procedente, por provado e, consequentemente, 2. Revogar a douta decisão recorrida, por violação da autoridade de caso julgado e da exceção de caso julgado, declarando não poder ser declarada a especial complexidade dos Autos quando decisão anterior, já transitada em julgado, determinou não ser encontrarem preenchidos os requisitos do artigo 215° n°s 3 e 4 do Código de Processo Penal.

    III – Em resposta, veio o Ministério Público na 1.ª instância manifestar-se no sentido da improcedência do recurso interposto.

    IV- Transcreve-se a decisão recorrida.

    Tendo os arguidos sido notificados para se pronunciarem quanto à declaração de especial complexidade veio o ilustre procurador a não se opor tendo os mandatários se oposto, alegando que durante o inquérito houve já decisão proferida em sede de recurso pelo Tribunal da Relação decidir tal questão e a não considerar de especial complexidade o inquérito.

    Cumpre decidir.

    Antes de mais cumpre distinguir as fases processuais que um processo ao longo da sua decorrência pode ter, sendo que a complexidade numa determinada fase pode não existir noutra...

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