Acórdão nº 324/14.0T8STB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 28 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelFRANCISCO MATOS
Data da Resolução28 de Março de 2019
EmissorTribunal da Relação de Évora

Proc. nº 324/14.0T8STB.E1 Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório 1. (…)Transportation Portugal, S.A.

, com sede no Edifício (…), Avª (…), Lote 1.18.01-Piso 11, em Lisboa, instaurou contra Estado Português, representado pelo Ministério Público, ação declarativa com processo comum.

Alegou, em resumo, que há cerca de 40 anos, girando então com a firma (…) – Sociedades Reunidas de Fabricações Metálicas, Lda., entabulou negociações com o R., para a aquisição de um terreno, localizado do estuário do Sado, destinado à implantação de uma infraestrutura fabril para construção de plataformas de prospeção petrolífera.

No decurso do demorado processo, tramitado pelo R., de desafetação do terreno do domínio público, para subsequente venda à A., esta contratou e custeou a realização de diversos e amplos trabalhos de preparação do terreno, até aí constituído por pântanos e sapais, nomeadamente terraplanagens, aterros e dragagens.

Em 1983 a (…) adquiriu o terreno ao R. pelo preço de 13.543.432$00.

O mercado petrolífero entrou em recessão profunda, comprometendo a viabilidade económica do empreendimento e a (…) tentou, por diversas vezes, obter a autorização do R. para vender, arrendar ou alterar a utilização do terreno, o que não veio a acontecer por causas imputáveis ao R.

Em Setembro de 2013, o R. procedeu à resolução do contrato de compra e venda com fundamento na falta de afetação do terreno ao fim a que se destinava, sem indemnizar a A.

A resolução é ilícita por se haver extinguido, por caducidade ou prescrição, o direito de resolver o contrato e por falta de base legal ou contratual e, ainda que assim não fosse, a A. sempre terá direito à devolução do preço pago e a uma compensação pela valorização do terreno ou pelo custo das obras nele realizadas.

Concluiu pedindo se julgue ilícita a resolução do contrato, reconhecendo a propriedade da Autora sobre o terreno; subsidiariamente, se condene o R. a restituir à A. o preço pago pela compra do terreno, atualizado à data da sentença, acrescido de juros, bem como a pagar à A. uma compensação pela valorização do terreno em virtude das benfeitorias úteis realizadas ou, caso assim não se entenda, a indemnizar a A. pelos custos na realização dessas mesmas benfeitorias, a liquidar em execução de sentença.

Contestou o R. argumentando, em resumo, que a resolução do contrato é válida, que a A. age com abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium ao invocar a extinção dum direito que ao longo de anos procurou adiar persuadindo o R. de que não estava definitivamente arredada a afetação do terrenos à finalidade contratualmente estabelecida e que não é devida qualquer indemnização por ser a solução de resulta do contrato validamente celebrado entre as partes.

Concluiu pela improcedência da ação.

A A. respondeu por forma a concluir pela improcedência do abuso de direito.

  1. Foi proferido despacho que afirmou a validade e regularidade da instância, identificou o objeto do litígio e enunciou os temas da prova.

  2. A A. deduziu incidente de liquidação concluindo pela condenação do R., a pagar-lhe a quantia de € 5.312.000,00, a título de compensação, pela valorização do terreno ou, caso assim não se entenda, a pagar à A. a quantia de € 10.485.064,22 ou, pelo menos, a quantia de € 8.500.000,00 a título de custos suportados na realização das benfeitorias, acrescidas de juros.

    O R. deduziu oposição ao incidente por forma a concluir pela sua improcedência.

  3. Houve lugar à audiência de discussão e julgamento e depois foi proferida sentença em cujo dispositivo designadamente se consignou: “Pelo exposto declara-se totalmente improcedente a ação, absolvendo-se o R. do peticionado.” 5.

    Recurso A A. recorre da sentença, concluindo assim a motivação do recurso: “A. O presente recurso vem interposto da sentença proferida nestes autos em 26 de Abril de 2018, que julgou integralmente improcedentes os pedidos formulados pela Autora, ora Recorrente.

    1. A Recorrente não se conforma com a decisão referida e vem recorrer de facto e de direito.

      Do recurso quanto à matéria de facto C. A oposição da Recorrente quanto ao que foi decidido em matéria de facto pela sentença recorrida respeita, essencialmente, aos factos que foram considerados não provados e, por razões de cautela, a um outro facto que não foi referenciado naquela sentença.

    2. Face à prova produzida nos autos, conclui-se que, contrariamente ao propugnado na sentença, deve ser dado como provado que “O estaleiro para produção de plataformas não foi instalado devido à recessão do mercado petrolífero”.

    3. A fundamentação para esta alteração decorre dos seguintes meios de prova: depoimentos da Dra. (…) e (…) e documento n.º 32 junto à petição inicial, acompanhados das interpretações e considerações acima efetuadas.

    4. Havendo o depoimento das duas testemunhas referidas, que viveram os factos diretamente e depuseram com convicção e veracidade, não tendo sido contraditadas por qualquer outra testemunha ou prova apresentada pelo Estado, bem como considerando a prova documental, não se vislumbra existir razão para não dar o facto em apreço como provado.

    5. Contrariamente ao que se concluiu na página 28 da sentença recorrida, que deve assim ser revogada nessa parte, deve considerar-se que ficou provado que “inexistem condicionamentos que impeçam a construção de quaisquer infraestruturas no Terreno em causa nos autos”.

    6. Deve igualmente considerar-se, ao contrário do que foi decidido, que ficou provado que “o terreno, após a realização das obras, mostra-se valorizado no montante de € 5.312.000,00” (cinco milhões e trezentos e doze mil euros).

      I. Se se entender mais adequado, em alternativa, poder-se-á fundir estes dois factos num só, que considere provado que “o Terreno, após a realização das obras pela Autora, ora Recorrente, e caso regresse para o Estado, mostra-se valorizado no montante de € 5.312.000,00 (cinco milhões e trezentos e doze mil euros)”.

    7. Devem, portanto, estes factos ser incluídos na factualidade provada, decorrendo a fundamentação para esta alteração dos seguintes meios de prova: relatório pericial a fls. 609 e segs., esclarecimentos orais prestados pelos Srs. Peritos na sessão de dia 5.02.2018 e depoimento do Dr. (…), tendo também resultado dos vários argumentos e interpretações efetuados acima.

    8. Contrariamente ao que foi decidido, a prova produzida – designadamente a opinião dos peritos e os depoimentos das testemunhas- foi irrefutável no sentido de evidenciar que os trabalhos realizados efetivamente valorizaram o Terreno, e valorizaram-no no montante de € 5.312.000,00.

      L. Embora se concorde genericamente com a ideia referida na sentença recorrida de que o resultado da prova pericial não vincula o tribunal, não é menos verdade que, estando em questão matérias de natureza técnica, da especialidade dos peritos indicados – como ocorre no caso sub iudice –, o afastamento pelo Tribunal das respostas por estes dadas terá que obedecer a exigências especiais de fundamentação e basear-se em razões fortes e facilmente apreensíveis, o que não aconteceu na sentença recorrida.

    9. Conjugando o afirmado no relatório pericial com os esclarecimentos orais prestados pelo Peritos indicados pelo Tribunal e pelo Estado, verifica-se que estes concluíram que (i) nos termos do relatório efetuado, o único condicionamento que poderia obviar à valorização do Terreno era o da manutenção da limitação da afetação desse Terreno à construção de plataformas off-shore e que (ii) revertendo o Terreno para o domínio do Estado, essa limitação de uso deixaria de existir, verificando-se por isso a valorização do Terreno nos montantes quantificados na resposta ao quesito 6.º-A.

    10. O perito indicado pela Recorrente igualmente considerou que os trabalhos realizados aumentaram o valor e utilidade do terreno.

    11. Basta ler o relatório pericial, e concretamente, a resposta ao quesito 4.º, em que se explicaram os trabalhos que foram realizados e os custos incorridos, e aos quesitos 6.º-A e 6.º-B, em que os Peritos explicaram de que forma consideraram que o Terreno foi valorizado, tomando em consideração a natureza do terreno, o previsto nas normas urbanísticas e as utilizações que poderão ser dadas, valorizando em concreto o aumento de valor que foi introduzido, para verificar que o Tribunal recorrido errou flagrantemente, estando as respostas periciais totalmente fundamentadas e enquadradas no caso concreto.

    12. Ao contrário do propugnado na sentença recorrida, na sessão de esclarecimentos os Peritos foram claros ao explicar que não era necessária a realização de testes físicos no terreno, que pela observação efetuada e pela análise dos materiais envolvidos se percebia que o terreno era suficientemente compacto, sendo que a questão de as fundações serem mais ou menos profundas existe em qualquer terreno e quanto a qualquer instalação que se pretenda construir, não afetando o valor do Terreno.

    13. Para além da opinião dos peritos, existiram também depoimentos testemunhais, designadamente do Dr. (…), indicado pelo Estado, que deu conta de que, caso o Terreno revertesse para o domínio público do Estado, ele seria muito valioso e útil para o desenvolvimento de novos projetos.

    14. Sendo inequívoco que, caso a resolução contratual operada pelo Estado seja julgada procedente, o Terreno voltará para a esfera jurídica do Estado, caindo necessariamente a limitação para construção de plataformas offshore que esteve subjacente à sua desafetação do domínio público, isto significa que o terreno voltará sem qualquer limitação e que o Estado poderá dar-lhe a utilização que quiser (sendo que é também o Estado e a Administração do Porto de Sines e Setúbal quem define as regras urbanísticas aplicáveis).

    15. Ao contrário do que foi afirmado pela sentença recorrida, ficou provado que o Terreno, após a realização das obras efetuadas pela (…), se valorizou e que inexistem outros condicionantes que impeçam essa valorização.

    16. No que respeita ao montante...

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