Acórdão nº 153/17.9YHLSB.L1-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 12 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelRIJO FERREIRA
Data da Resolução12 de Março de 2019
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA NO RECURSO DE APELAÇÃO (aqui autuado em 19MAR2018) DA SENTENÇA DE 08JAN2018 PROFERIDA PELO 1º JUÍZO DO TRIBUNAL DA PROPRIEDADE INTELECTUAL (…) NESTES AUTOS DE RECURSO JUDICIAL DE DECISÃO DO INPI ENTRE I..., GmbH [Sociedade de Direito Suíço com sede em …, Suíça] (Patrocinada por (...),(...) e (...),(...), advs., e (...), adv. est.) Recorrente / Apelante CONTRA ASSOCIAÇÃO C...

(Patrocinada por, inicialmente, (...), adv., e, actualmente, (...), pat. ofi.) Recorrida / Apelada E INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL, IP (Patrocinado por .., …, …, … e …, advs., … & Associados, Sociedade de Advogados, RL) Autor da decisão impugnada I – Relatório A Apelada requereu, em 2015/09/10-13:06:11, no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual, IP (INPI) o registo da marca nacional nº 5..., «D...

», destinada a ‘CANECAS DE PORCELANA; CHÁVENAS DE CAFÉ; PRATOS’, da Classe 21, ‘ROUPA DE USO DOMÉSTICO’, da Classe 24, ‘T-SHIRTS’, da Classe 25, e ‘ALIMENTOS À BASE DE FARINHA [FARINÁCEOS]’, da Classe 30, o qual, não obstante a reclamação deduzida pela Apelante (enquanto titular de diversas marcas comunitárias) com fundamento na confundibilidade dos sinais e possibilidade de ocorrência de concorrência desleal, lhe veio a ser concedido por despacho (por subdelegação de competência) da Directora de Marcas e Patentes do INPI de 07FEV2017.

A Apelante recorreu para o Tribunal da Propriedade Industrial pedindo a revogação daquele despacho e a sua substituição por decisão que recuse o registo da marca peticionado pela Apelada invocando semelhança com as suas marcas prioritárias susceptível de induzir o consumidor em erro ou confusão e, ainda, concorrência desleal.

Foi cumprido o disposto no nº 1 do art.º 43º do CPI, tendo-se o INPI limitado a enviar o processo administrativo.

A Apelada nada disse.

Foi proferida sentença que, considerando serem as marcas da Apelante prioritárias, haver identidade ou afinidade entre os produtos que as marcas prioritárias se destinam a assinalar e os produtos que a marca da Apelada se destina a assinalar (com excepção dos ‘alimentos à base de farinhas’ da Classe 30), a inexistência de semelhanças gráficas, fonéticas, figurativas, conceptuais ou outras entre as marcas prioritárias e o sinal registando susceptíveis de induzir o espírito do consumidor em erro ou confusão ou possibilidade de concorrência desleal, negou provimento ao recurso.

Inconformada, recorreu a Apelante concluindo, em síntese, por erro de julgamento.

A Apelada contra-alegou propugnando pela manutenção do decidido.

Pelo relator foi determinado se notificasse o INPI da interposição da apelação para que nela, enquanto parte interessada, pudesse exprimir a sua posição.

O INPI requereu que sobre esse despacho recaísse acórdão.

II – Questões a Resolver Consabidamente, a delimitação objectiva do recurso emerge do teor das conclusões do recorrente, enquanto constituam corolário lógico-jurídico correspectivo da fundamentação expressa na alegação, sem embargo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer ex officio.

De outra via, como meio impugnatório de decisões judiciais, o recurso visa tão só suscitar a reapreciação do decidido, não comportando, assim, ius novarum, i.e., a criação de decisão sobre matéria nova não submetida à apreciação do tribunal a quo.

Por outro lado, ainda, o recurso não é uma reapreciação ‘ex novo’ do litígio (uma “segunda opinião” sobre o litígio), mas uma ponderação sobre a correcção da decisão que dirimiu esse litígio (se padece de vícios procedimentais, se procedeu a incorrecta fixação dos factos, se fez incorrecta determinação ou aplicação do direito aplicável). Daí que não baste ao recorrente afirmar o seu descontentamento com a decisão recorrida e pedir a reapreciação do litígio (limitando-se a repetir o que já alegara na 1ª instância), mas se lhe imponha o ónus de alegar, de indicar as razões porque entende que a decisão recorrida deve ser revertida ou modificada, de especificar as falhas ou incorrecções de que em seu entender ela padece; sob pena de indeferimento do recurso.

Ademais, também o tribunal de recurso não está adstrito à apreciação de todos os argumentos produzidos em alegação, mas apenas – e com liberdade no respeitante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito – de todas as “questões” suscitadas, e que, por respeitarem aos elementos da causa, definidos em função das pretensões e causa de pedir aduzidas, se configurem como relevantes para conhecimento do respectivo objecto, exceptuadas as que resultem prejudicadas pela solução dada a outras.

Assim, em face do que se acaba de expor e das conclusões apresentadas, são as seguintes as questões a resolver por este Tribunal: - da intervenção do INPI; - da concessão do registo da marca.

III – Da Intervenção do INPI Não obstante se poder entender que o despacho do relator que ordena a notificação do INPI da interposição da apelação e dar conhecimento às partes de determinado entendimento do colectivo, em nada afecta os direitos ou posições dos seus destinatários, pelo que deve ser tido como de mero expediente, insusceptível de reclamação ou recurso (artigos 652º, nº 3, e 630º, nº 1, do CPC), e perante o empenho do reclamante em obter uma decisão colegial, entende-se ser de conhecer da reclamação apresentada.

A propósito da intervenção do INPI nos recursos judiciais das suas decisões já este colectivo se pronunciou no acórdão de 20MAR2018 (no processo 272/15.6YHLSB.L1) nos seguintes termos: […]o INPI funda a sua posição no entendimento de que o disposto no n.º 5 do art.º 44º do CPI – “O Instituto Nacional de Propriedade Industrial não é considerado, em caso algum, parte contrária” – preclude em absoluto que o mesmo seja parte na acção e, consequentemente, que possa ser responsabilizado pelas custas da mesma.

Tendo o processo como objecto a impugnação de uma decisão do INPI e visando a sua revogação surge como logicamente anacrónico e violador da estrutura essencial do processo judicial (processo equitativo / fair trial) que o autor da decisão impugnada não seja interveniente no processo; pelo que quase instintivamente somos levados a reflectir sobre a correcção da interpretação defendida da referida disposição legal.

Desde logo se pode obtemperar que, em termos meramente literais, o que a disposição legal em causa afirma é tão só que o INPI não pode ser considerado ‘parte contrária’; resta pois saber o que, na sistemática quer do CPI quer do nosso sistema jurídico, se deve no caso entender por ‘parte contrária’ e se nesse contexto é admissível a existência de outra tipologia de parte.

O INPI é um Instituto Público, integrado na administração indirecta do Estado, que tem entre as suas atribuições a gestão e conservação do registo público dos direitos de propriedade industrial, sendo que das suas decisões que concedam, recusem, afectem, modifiquem ou extingam esses direitos cabe recurso, de plena jurisdição até, em regra, ao Tribunal da Relação (artigos 39º e 46º do CPI).

Essa possibilidade de impugnação judicial não é exclusiva do INPI estando igualmente prevista para outras decisões de entidades administrativas a quem compete a gestão e conservação de registos públicos, designadamente registo predial (1), registo comercial (2), registo nacional de pessoas colectivas (3), registo de propriedade automóvel (4), registo comercial de navios (5) e notariado (6).

Das normas que regem a impugnação dos actos dessas entidades ressalta um regime processual especial, que na legislação referente a custas (7) ganhou a designação de ‘recursos dos actos dos conservadores e notários e outros funcionários’ que se distancia do regime regra do processo civil em que em seguida à interposição da acção pelo autor é citado o réu para se defender, caracterizado pela não sujeição do autor do acto impugnado ao estatuto de réu (8); ao autor do acto impugnado é-lhe imposto que, logo que deduzida impugnação (9) e antes de esta ser enviada a tribunal, reexamine a sua decisão em função da impugnação apresentada para que a sustente ou repare (10).

Não significa tal situação que a entidade recorrida (transpondo para o caso a terminologia das acções administrativas em que se destrinça entre a entidade autora do acto impugnado /recorrida / demandada e os demais ‘contra-interessados’) não seja parte na acção, mas apenas que há um procedimento diverso do procedimento geral para promover a sua intervenção no processo.

A entidade recorrida é parte, porque titular de interesse directo em contradizer (ou, se nos reportarmos aos conceitos do processo administrativo, da relação material controvertida e a quem é imputado o acto praticado) sendo chamada a exercer o contraditório, expressando a sua posição sobre o objecto da causa, ficando vinculada pela decisão que vier a ser proferida. E é como parte que lhe é facultada legitimidade para recorrer da sentença proferida em 1ª instância (11).

O procedimento de impugnação das decisões do INPI não deixa de seguir (12) o modelo apontado: logo que a impugnação é deduzida é-lhe solicitado que responda o que houver por conveniente (art.º 43º do CPI).

Pode ocorrer, no entanto (e ao contrário do que é norma relativamente nos restantes casos de recurso de actos de conservadores ou notários em que a controvérsia se desenvolve apenas entre a entidade administrativa e o requerente que não viu a sua pretensão acolhida), que haja outros interessados na questão objecto da acção – designadamente quem tenha deduzido reclamação ou seja directa e efectivamente prejudicado pela decisão – pelo que há necessidade de regular o modo do seu chamamento e intervenção no processo. A isso se destina o art.º 44º do CPI.

Segundo esse artigo, depois de recebido o processo administrativo e a eventual resposta do INPI, são citados, se os houver, os demais interessados na causa (contra-interessados), que são designados por ‘parte contrária’.

E nessa perspectiva, o...

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