Acórdão nº 1905/18.8PBBRR-A.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 28 de Fevereiro de 2019

Magistrado ResponsávelFILIPA COSTA LOURENÇO
Data da Resolução28 de Fevereiro de 2019
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Decisão sumária, ao abrigo do artigo 417.º n.º 6 alínea b) do Código de Processo Penal.

I.

– No processo nº 1905/18.8PBBRR, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Juízo de instrução Criminal do Barreiro, o arguido AA... de nacionalidade Norueguesa, e com os demais estados nos autos a fls. 22, interpôs recurso a fls. 34 e seguintes, do despacho da Srª Juíza de Instrução Criminal (proferido a fls. 28 até 33), o qual, após interrogatório de arguido detido, determinou que este aguardasse os ulteriores termos do processo sujeito à medida de coacção de prisão preventiva, por se mostrar fortemente indiciado a prática por este, de um crime homicídio na forma tentada, nos termos dos artigos 22º e 131º, do Código Penal, crime esse que é punido em abstracto com pena de prisão entre um ano e seis meses e onze anos, e também um crime de detenção de arma proibida, p.p. pelos artigos 2º, nº 2 al. m) e 86 nº 1 al d) da Lei 5/2006 , alterada pela Lei 17/2009 de 06 de Maio e punido com pena de prisão até 4 anos. Não se conformando com o despacho proferido veio o arguido apresentar as seguintes conclusões, constantes na íntegra a folhas 43 a 46 dos presentes autos, as quais se têm aqui por integralmente reproduzidas, pugnando a final que o recurso deverá merecer provimento e, consequentemente, ser o despacho recorrido objecto de revogação, e substituído por outro que aplique ao arguido, outras medidas de coacção, a saber, apresentações periódicas, proibição de se ausentar para o estrangeiro, entrega do passaporte e proibição de contactar com o ofendido ou caso assim não se entenda, a medida de obrigação de permanência na habitação, com vigilância electrónica, por ser adequada, necessária e proporcional às necessidades cautelares que urge prevenir, JUSTIÇA! O recurso foi admitido, na primeira instância através de despacho proferido a folhas 50 destes autos.

O MºPº junto da primeira instância respondeu ao recurso interposto pelo arguido, a folhas 52 e seguintes, pugnando a final pela improcedência do recurso.

Foi proferido despacho a fls 60 nos termos do artº 414º nº4 do CPP, onde se sustentou a decisão recorrida.

Remetidos os autos para o Tribunal da Relação de Lisboa, a Digna Procuradora Geral Adjunta, proferiu douto parecer, que se encontra a folhas 67, o qual e em suma, acompanha nos seus precisos termos, a correcta e muito bem fundamentada argumentação apresentada pelo Ministério Público junto do Tribunal de 1ª Instância, a cuja argumentação adere e subscreve.

O processo seguiu os trâmites legais.

II.

– Efectuado o exame preliminar foi considerado haver razões para a rejeição do recurso por manifesta improcedência (art.ºs 412.º, 414.º e 420.º, n.º 1 do Código de Processo Penal) passando-se a proferir decisão sumária, ao abrigo do artigo 417.º n.º 6 alínea b) do C.P.Penal revisto. A lei adjectiva instituiu a possibilidade de rejeição dos recursos em duas vertentes diversas, admitida que está, no nosso processo penal a cindibilidade do recurso, princípio acolhido nos arts. 403.º n.º 1, 410.º n.º 1 e 412.º n.º 2: rejeição formal que se prende com a insatisfação dos requisitos prescritos no art. 412.º n.º 2 e a rejeição substantiva que ocorre quando é manifesta a improcedência do recurso.

A manifesta improcedência verifica-se quando, atendendo à factualidade apurada, à letra da lei e à jurisprudência dos tribunais superiores, é patente a sem razão do recorrente.

A figura da rejeição destina-se a potenciar a economia processual, numa óptica de celeridade e de eficiência, com vista a obviar ao reconhecido pendor para o abuso de recursos. A possibilidade de rejeição liminar, em caso de improcedência manifesta, tem em vista moralizar o uso do recurso e a sua desincentivação como instrumento de demora e chicana processual (Ac. STJ de 16 de Novembro de 2000, proc. n.º 2353-3; SASTJ, n.º 45, 61).

A possibilidade de rejeição liminar, em caso de improcedência manifesta, tem em vista moralizar o uso do recurso (…) (Ac. STJ de 16 de Novembro de 2000, proc. n.º 2353-3; SASTJ, n.º 45, 61 e também o Ac. Tribunal Constitucional nº17/2011 , DR, II Série de 16-02-2011, decidiu: Não julga inconstitucional a norma extraída do artigo 417.º, n.º 6, alínea b), do Código de Processo Penal, quando permite ao juiz relator proferir decisão sumária de indeferimento, em caso de manifesta improcedência do mesmo (…) e Ac. TRE de 3-03-2015 : I. A manifesta improcedência do recurso (conceito que a lei não define) nada tem a ver com a extensão da matéria submetida a apreciação, nem com a sua intrínseca complexidade, nem com a prolixidade da motivação do recurso (na procura de deixar bem claras as razões de discordância com a decisão recorrida).

II.

– O que releva é o bem-fundado, a solidez ou o apoio legal, doutrinário ou jurisprudencial, da argumentação usada para atacar a decisão de que se recorre.

III.

–Existirá manifesta improcedência sempre que seja inequívoco que essa argumentação de modo nenhum pode conduzir ao efeito jurídico pretendido pelo recorrente, in www.dgsi.pt ).

Em caso de rejeição do recurso, a decisão limita-se a identificar o tribunal recorrido, o processo e os seus sujeitos e a especificar sumariamente os fundamentos da decisão - art. 420.º, n.º 2 do C.P.Penal.

O objecto do recurso interposto pelo arguido do despacho que ordenou a sua prisão preventiva, o qual é delimitado pelo teor das suas conclusões, suscita o conhecimento das seguintes questões contidas nas suas conclusões: - Alega o arguido que os factos indiciados, ao invés dos crimes pelo que se encontra indiciado, transparecem a prática de um crime de ofensas à integridade física grave, p.p. pelo artº 144º al d) do CP, mais tendo agido em legitima defesa; - A medida de coacção decretada é desproporcional e exagerada, face às exigências cautelares que ao caso cabe, devendo ser decretadas outras medidas de coacção por não se verificarem “ in casu”, os seguintes perigos: perigo de fuga, perturbação do inquérito e de continuação da actividade criminosa, tendo sido violados os artigos 22º,131 e 144 al. d) todos do CPP e artigos 191, 192, 193 nº 2, 198, 200 nº 1 al. b) e d) e nº 3, 201, 202 al. a) e e) e 204 al. a) e c), todos do CPP; - Deverá assim ser revogado o despacho recorrido e serem-lhe aplicadas outras medidas de coacção, a saber, apresentações bi-semanais à entidade policial da área da sua residência, artº 198º do CPP, proibição de se ausentar para o estrangeiro mediante a entrega do seu passaporte à guarda do Tribunal, artº 200 nº 1 al b) e nº 3 do C.P.P. cumulada com a proibição de contactar com o ofendido, artº 200, nº 1 d) do C.P.P. ou caso estas não sejam decretadas que lhe seja aplicada a medida de obrigação de permanência na habitação sujeito a vigilância electrónica, nos termos do disposto no artigo 201º e Lei 122/99 de 20 de Agosto.

Conhecendo, diremos: Tem o seguinte teor o despacho sob censura que se encontra a folhas 28 a 33 dos presentes autos: “DESPACHO Demonstra-se respeitado o prazo a que alude o artigo 141º, n.º 1 do Código de Processo Penal, sendo este Tribunal o competente.

Dos elementos constantes dos autos resultam fortemente indiciados os seguintes factos: 1.

– No dia 02 de Novembro de 2018, pelas 22h30m, o arguido, AA..., encontrava-se na Rua ….

– B..., sentado num banco de jardim na companhia do ofendido, BB..., quando, este perguntou àquele há quanto tempo e a razão da sua vinda para Portugal.

  1. – Sem que nada o fizesse prever e sem responder à questão formulada, o arguido retirou a faca que trazia consigo do bolso e desferiu a mesma no pescoço do denunciante, atingindo-o na zona abaixo do queixo.

  2. – O denunciante, por temer pela sua vida e integridade física, segurou a mão do arguido.

  3. – Como consequência directa e necessária do referido em 2., o ofendido sofreu ferida da base do pescoço paramediana esquerda com cerca de 2 cm de profundidade e 2 cm de diâmetro, com evidência de hemorragia abundante, com trajecto com cerca de 3 cm sem aparente atingimento de grande vaso, cartilagem tiroideia ou traqueia.

  4. – A faca referida em 2., trata-se de uma faca de metal, do tipo, punhal, de marcxa, Cold Steel, modelo, The Spike, com 10 (dez) centímetros de lâmina e 10 (dez) centímetros de cabo.

  5. – O arguido conhecia as características, uso e modo de funcionamento da referida arma e estava ciente de que a sua detenção lhe estava legalmente vedada.

  6. – O arguido não tinha motivo que justificasse a detenção da aludida faca.

  7. – A faca não tem aplicação definida e funciona como instrumento de intimidação e agressão.

  8. – O arguido sabia que não podia trazer consigo a referida faca, e que tal objecto era idóneo a, ao ser utilizado, pôr em risco a vida, a causar lesões corporais ou quaisquer outros danos, resultado que quis e com o qual se conformou.

  9. – O arguido ao atingir o denunciante com a faca, nas circunstâncias acima descritas, agiu com o propósito de lhe causar a morte, intenção reforçada pelo facto de o ter atingido a curta distância, na zona do pescoço, local onde estão alojadas as veias jugulares, resultado que não logrou alcançar por motivos alheios à sua vontade e em face do pronto auxílio médico que foi prestado àquele.

  10. – O arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que as condutas levadas por si a efeito, eram proibidas e punidas por lei.

    Motivação: A convicção do tribunal relativamente aos fortes indícios dos factos relativos à dinâmica do evento (factos vertidos em 1. a 3.) resultaram do depoimento prestado pelas testemunhas CC..., DD... e EE..., tendo todos confirmado a dinâmica do ocorrido.

    As declarações do arguido, por seu turno, não infirmam a credibilidade das testemunhas nem a versão dos factos por, essencialmente, três ordens de razões: (i)– Da putativa ausência de memória: assim que lhe foi dada a palavra para contar a sua versão dos factos, o arguido começa por escudar-se na falta de memória dos acontecimentos em face de ter ingerido bebidas alcoólicas. De facto, a sua...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT